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PEDAGOGIA LASSALISTA: FUNDAMENTOS E MÉTODOS

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CAPÍTULO 3 PROJETOS COMUNITÁRIOS E DESENVOLVIMENTO DE NOVAS

4.7 PEDAGOGIA LASSALISTA: FUNDAMENTOS E MÉTODOS

A presença dos Irmãos Lassalistas em Presidente Médici, na década de 1980, assinalou a criação de um núcleo educacional que alterou significativamente a vida da comunidade local e ainda das cidades vizinhas. Eles implantaram no Colégio Santa Teresa, a pedagogia Lassalista, fundamentada nos preceitos de La Salle, pautada nos valores cristãos, de solidariedade e fraternidade.

As crianças e jovens recebidos nas escolas de La Salle sentiam sempre mais o espirito de acolhimento familiar em sua convivência com os mestres. Estes já não eram personagens alheios, estranhos e desinteressados em relação à vida dos alunos. Graças ao sentido de os mestres viverem como irmãos entre si e irmãos maiores de seus alunos, a pedagogia lassalista, em toda sua história, foi marcada profundamente pela característica da fraternidade. ( RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, P. 19).

Por isso, antes de discorrer mais especificamente na próxima seção, sobre a implantação do projeto de educação lassalista no Colégio Santa Teresa, apresento resumidamente os princípios fundamentais a partir dos quais a pedagogia lassalista se embasou e se originou – tal como descrevo suscintamente algumas características principais de seu idealizador.

67 Seguindo a indicação das setas, da esquerda para a direita, o Ir. Gerônimo, Padre Dinis e Ir. Waldemar, reunidos com a comunidade em frente ao salão paroquial do Centro Comunitário. (1984) Acervo: Colégio Santa Teresa

Essa compreensão histórica permite identificar como as propostas de ensino- aprendizagem elaboradas por La Salle buscaram se adequar aos tempos atuais, e como estes valores aparecem presentes no trabalho que os Irmãos Lassalistas desenvolveram no Colégio Santa Teresa. Não sendo, portanto o objetivo deste trabalho estudar detalhadamente as diretrizes que fundamentaram o legado pedagógico e didático lassalista, mas localizar nele, a essência que tão bem o define e ainda permanece, bem como, as mudanças processadas ao longo de sua história.

Originário da cidade francesa de Reims, La Salle (1651-1719), filho de família abastada, contrariou as expectativas de seguir a carreira do pai, demonstrando desde criança afeição à vida religiosa, e foi por ela que optou e dedicou-se durante sua existência.

João Batista de La Salle era o primogênito de dez filhos de uma família rica, sendo que três faleceram em tenra idade. [...] Nessa condição econômica e de classe social e ambiente privilegiados, João Batista foi educado nos mais sofisticados estilo da burguesia e da nobreza da França e, ao mesmo tempo, nos princípios cristãos adotados com muita seriedade e convicção.

Aos onze anos de idade, La Salle revelou aos pais seu desejo de seguir a vocação sacerdotal. O pai, apesar do projeto que imaginava para o filho, que se tornasse herdeiro de sua profissão, um tanto entristecido, porém como homem de fé, apoiou a escolha.

Assim, aos onze anos de idade, João Batista recebeu a tonsura, rito de iniciação à vida clerical. Devido ao sucesso nos estudos e a seu comportamento, conduzida pela reflexão e solidariedade humana, aos 16 anos foi nomeado Cônego da Catedral de Reims, título que lhe garantia um salário e lhe atribuía o compromisso de rezar o Ofício Divino, diariamente, junto com os demais Cônegos. ( RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, p. 7-8).

A vivência no seminário, as práticas de estágio pastoral, o contato com as escolas elementares para pobres, o conduziu a outra experiência significativa: o envolvimento e a preocupação em oferecer uma educação popular, que desde então, passou a caminhar lado a lado da vocação religiosa ou da escolha pelo apostolado. “A partir dessa perspectiva, La Salle pôde observar a necessidade de organizar o melhor preparo dos professores, com atenção à cultura e à formação para o magistério, com competência para ensinar”. ( RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, p. 8).

Dois anos depois de concluir os estudos teológicos em Reims, ele recebeu em 1678, a ordenação de sacerdote. Na mesma data, assumiu o desafio confiado por “seu amigo e diretor espiritual, Cônego Roland”, que antes de falecer, atribuiu-lhe “o cuidado da Congregação Docente das Irmãs do Menino Jesus”, que havia fundado. La Salle encontrou nessa missão,

as razões que o motivaram a fundar “escolas populares que abririam as portas da educação a todos os meninos pobres da França”. (RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, p. 8).

Essa decisão exigiu e provocou em La Salle a inquietação de “conhecer melhor o mundo da educação de sua época, os escritores pedagógicos de ensino elementar, ainda muito incipientes”. (RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, p. 8).

La Salle criou uma metodologia pedagógica diferente da existente nos idos dos anos 1680-90. Suas técnicas inovadoras contrariaram o sistema de ensino até então vigente, o que resultou por diversas vezes em sua perseguição por representantes da nobreza e da Igreja Católica.

A total gratuidade, oferecendo acesso de todas as crianças à educação escolar, também teve opositores ferrenhos no seio da Nobreza, pela crença de que somente pessoas não-letradas se dedicariam à agricultura.Seus métodos educativos eram por demais inovadores e pertubadores, a exemplo da substituição do latim pelo francês como língua de alfabetização, o que gerou estranheza e reação negativa nos meios eclesiáticos, tão ciosos da importância do latim a igreja. (RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, P. 22).

É importante salientar que a intenção de La Salle, ao adotar a língua francesa no processo de alfabetização, não previa a eliminação do latim, mas apenas uma inversão no uso, pois percebeu que os alunos demonstravam maior facilidade e afinidade com a língua vernácula, sendo esta, portanto, colocada na iniciação dos estudos e somente depois o emprego e ensino do latim. A respeito da introdução da língua francesa, Corsatto (2007, p. 60), esclarece que La Salle não foi o pioneiro, pois “já havia outras experiências na época, na própria França, como a escola de Port-Royal”. Entretanto, ele considera que tal postura chama a atenção pelo fato de que, “se o ensino a partir ou primeiramente do francês começasse a ser comum na França, seria, de certa forma, impensável numa instituição ligada à Igreja, em especial, numa sociedade de professores organizada por um sacerdote”. (CORSATTO, 2007, p. 60).

Dentre as várias publicações e materiais elaborados por La Salle, cujo conteúdo esteve direcionado a orientar os professores, visando à obtenção do melhor desempenho do trabalho docente, ressalto o livro Guia das Escolas Cristãs. A primeira impressão ocorreu em 1720, um ano depois do falecimento do autor. Na opinião de Corsatto (2007, p. 60), “trata-se de um dos mais importantes textos orientativos de como deve ser o dia-adia das escolas de La Salle”.

A publicação é composta de três volumes, que sistematizam e organizam os pressupostos da formação docente e também do comportamento e agir discente na visão do autor.

Isso demonstra que o interesse dele, não se restringiu em oferecer educação gratuita para os desfavorecidos e sem privilégios na sociedade francesa de seu tempo, mas também, na preparação segura e competente dos professores. O tratamento de “irmãos” dados aos lassalistas, conforme explicam Rangel & Weschenfelder (2006, p. 22), surgiu no decorrer do processo pedagógico, quando “os mestres que La Salle formava resolveram chamar-se de irmãos junto aos seus alunos, já em meados de 1683. Esse epiteto nada tinha a ver com o estado religioso, nesses primeiros anos [...], porém foi assumido para dar conotação de maior proximidade com os educadores”. (RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, P. 22).

Já o nascimento efetivo da “Sociedade dos Irmãos das Escolas Cristãs”, se deu em 1686. Sua reconhecida estrutura e identidade leiga representaram um diferencial e incomum para a época, “já que a educação estava entregue aos clérigos em todo o reino de França” (RANGEL & WESCHENFELDER, 2006, p. 12). Contudo, Corsatto (2007,p. 13) cita o ano de 1680 como data oficial do seu surgimento. Acrescenta ainda, que tempos depois, “essa sociedade foi formalmente incorporada à estrutura da Igreja Católica, como congregação religiosa, composta exclusivamente por Irmãos Religiosos, não por Sacerdotes ordenados. A partir desta oficialização, esses professores passaram a chamar-se de irmãos e, ao longo de sua história, de Irmãos Lassalistas, por referência ao seu primeiro líder”. Segundo a afirmação de Justo (2007, p. 155) “é preciso ter presente ser o Irmão um religioso-leigo, isto é, não sacerdote, portanto, sem poder eclesiástico nenhum”.

Quanto à vasta obra que La Salle deixou como referência, Justo, (2003); Rangel & Weschenfelder (2006) e Corsatto, (2007), destacam que ao examiná-la é necessário ter em vista o contexto no qual foi pensada e produzida, para não incorrer em anacronismos. Quando estes afirmam que ele foi um inovador ao estabelecer no manual, uma relação de mais proximidade dos professores com seus alunos, isso não significa, por exemplo, que ele tenha abdicado e abolido os típicos meios disciplinares de seu tempo para corrigir o comportamento dos alunos. Porém, se afastou das fortes punições, amenizando-as.

Da mesma maneira, que o programa de ensino possuía forte veiculação do catecismo às atividades escolares, evidenciando a tendência religiosa presente na realidade da época e um

reflexo da postura ou trajetória pessoal do fundador. “La Salle [...] tinha a intenção explícita, em suas Escolas Cristãs, de propagação da fé católica, havia esta preocupação com o momento do catecismo” e [...] “na linguagem religiosa em que vivia [...] ele considerava a escola como um dos meios de salvação das crianças e o professor como uma vocação especial junto a essas crianças”. (CORSATTO, 2007, 75-147). “O religioso-educador ou o educador cristão procurará diretamente harmonizar seu modo de ser e agir com o do Evangelho” (JUSTO, 2003, p. 146).

Dentre as principais contribuições contidas no guia, os autores consultados, são consensuais ao citarem como sendo as mais significativas: o diálogo; o equilíbrio entre “ternura e firmeza”; a “presença do mestre, próximo ao aluno”; “linguagem acessível”; a preocupação em formar uma consciência de solidariedade; a observação atenta a todos os alunos durante a aula; a utilização da pedagogia da pergunta, ou seja, deixar que os alunos falem mais que o professor; o processo didático, permeado e inspirado em seus propósitos pelos valores humanos e cristãos, do saber, saber viver e saber conviver, de modo fraterno e solidário. (CORSATTO, 2007; RANGEL & WESCHENFELDER, 2006).

Uma característica que faz parte da pedagogia lassalista e que foi nitidamente utilizada no Colégio Santa Teresa é o princípio das metodologias múltiplas. Rangel & Weschenfelder (2006), entendem que “a escola lassalista observa o princípio das metodologias múltiplas, ou seja, da utilização de metodologia variadas, escolhendo-se as mais indicadas para o conteúdo, o aluno e o contexto. Desse modo, o professor procura recursos de ensino que sejam apropriados à natureza do conhecimento e daqueles a quem esse conhecimento se destina” (p. 18).

No Colégio Santa Teresa, os Irmãos Lassalistas procuraram aderir e incorporar, ao processo educacional, diferentes alternativas, técnicas e métodos de ensino, que fossem compatíveis com a filosofia lassalista e que conseguissem enriquecer cada vez mais o ser e fazer pedagógico, principalmente, aquelas inseridas no campo das pedagogias progressistas, como é o caso da pedagogia freiriana.

Retomando a questão que coloquei logo no início, deste item,sobre o pensamento de La Salle na atualidade, Corsatto (2007), explicita que:

Muitas das indicações deste texto lassaliano não se aplicam à nossa realidade, sobretudo pelo avanço que tivemos em relação às ciências que sustentam ou apóiam a Pedagogia. É evidente que esta obra deve ser lida a partir de seu contexto e, somente a partir dele, é possível captar a riqueza de suas indicações”. Revisões e adaptações modernas promoveram mudanças, encaminhando-se para uma nova forma, com outra mensagem. Uma intepretação e releitura na conjuntura atual, se adequando as novas demandas e necessidades, exigências que não se desligaram da sua essência original, o zelo e compromisso com o crescimento intelectual, projetando os valores cristãos de solidariedade, e a o entusiasmos com o trabalho social comunitário. Atendeu as essas novas exigências. (CORSATTO, 2007, p. 144). A abertura e receptividade as diferentes correntes pedagógicas, demonstram que as instituições lassalistas no decorrer do tempo, tiveram a sensibilidade, perspicácia e capacidade de se renovarem e se adaptarem ao conjunto de mudanças e transformações que o cenário educacional atual demanda, preservando, como o autor citou, alguns imprescindíveis e essenciais valores que constituem sua origem e continuam necessários nos dias atuais. “A corrente não se rompeu ao longo da Historia: continuamente elos novos de pessoas zelosas se lhe acrescentaram”. (JUSTO, 2003, p. 163)

Lembrando que “hoje o Guia não é utilizado como regulador das atividades da escola, mas é um documento histórico e inspirador das escolas de La Salle”. (CORSATTO, 2007, p. 151).

Além disso, Corsatto sugere que:

[...] o Guia não pode ser aplicado como tal em nossa realidade, pois refletia uma sociedade e uma concepção, que não existem mais.

A predominância do caráter religioso expresso no Guia não encontra eco na realidade da sociedade de hoje. Esta realidade evidencia um outro princípio, subjacente à própria realidade das escolas iniciadas por La Salle: a intenção primeira da instituição, que recai sobre a educação e não sobre a evangelização ou a catequese, de caráter doutrinário e proselitista. Se fosse de outra forma, não haveria escolas da entidade em países de maioria muçulmana ou cujo ensino religioso fosse terminantemente proibido.

O Guia das Escolas também não se aplica hoje em dia em relação aos castigos físicos, que sequer são mencionados ou levados em consideração. (CORSATTO, 2007, p. 156-157).

Outra prática existente no conceito e diretrizes educacionais lassalistas, que se concretizou e se efetivou nos exercícios no Colégio Santa Teresa, diz respeito à “reflexão”, que “na pedagogia lassaliana, é curta e palpitante exortação de cinco minutos aproximadamente, dirigida aos alunos no início da primeira aula”. (JUSTO, 2003, p. 254). As aulas preservavam esse momento de reflexão preparado pelos alunos, que podia ser a leitura e análise de um pensamento, poesia, trecho de música ou oração.

4.8 A EXPERIÊNCIA EDUCACIONAL LASSALISTA NO COLÉGIO SANTA TERESA.

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