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Conforme já exposto anteriormente, o presente estudo é baseado no procedimento da execução por quantia certa, que de acordo com o art. 646, do CPC, tem por objeto a expropriação de bens do devedor para satisfazer o direito do credor.

Assim, o mencionado procedimento é composto por quatro fases, quais sejam: fase da proposição, da apreensão de bens, da expropriação e do pagamento, sendo que a penhora integra a fase de apreensão (DONIZETTI, 2012).

Ao discorrer sobre a penhora, pertinente se faz uma primeira análise de seu conceito, bem como a abordagem de suas funções, sua natureza jurídica, seus efeitos e, principalmente, seu objeto, ponto importante para adentrar no desenvolvimento do objeto do presente estudo.

No processo de execução de quantia certa, ao contrário do que ocorre no processo de conhecimento, onde o réu é citado para responder a ação, o executado é citado para pagar a quantia no prazo de três dias sob pena de seus bens serem penhorados para garantia da dívida, de acordo com o que dispõe o art. 652, caput e § 1º, do CPC.

Logo, se o executado não pagar a quantia no referido prazo, serão apreendidos os bens necessários para penhorá-los, a fim de suprir o valor da dívida. Assim, Liebman (1946 apud SILVA, 2000, p. 87) conceitua a penhora como: “[...] o ato pelo qual o órgão judiciário submete a seu poder imediato determinados bens do executado, fixando sobre eles a destinação de servirem à satisfação do direito do exequente.”

Dessa maneira, penhorados bens do devedor, a satisfação do débito ocorre com a expropriação e pode se dar de forma direta, por meio da adjudicação, ou seja, quando o próprio bem penhorado for entregue ao credor, ou de forma indireta, no caso de alienação do bem penhorado para com o produto pagar ao credor.

Assim, os bens penhorados necessitam ser avaliados a fim de se definir os limites da expropriação. Essa avaliação ocorre no ato da penhora e é realizada pelo próprio oficial de justiça, conforme dispõem os arts. 143, V e 680, ambos do CPC. Somente em casos que demandarem conhecimentos específicos é que o juiz nomeará um avaliador.

Em alguns casos não é necessária a avaliação. Segundo Donizetti (2012), são hipóteses que dispensam a avaliação: a não impugnação pelo executado do valor que foi atribuído aos bens indicados pelo exequente; a aceitação pelo exequente da estimativa feita pelo executado (na hipótese de o executado requerer a substituição do bem penhorado, atribuindo-lhe o valor); e quando se tratarem de títulos e mercadorias com cotação em bolsa.

Sendo a penhora a apreensão dos bens do executado para garantia da dívida, existem três corrente distintas para explicar sua natureza jurídica. A primeira entende que a penhora é ato cautelar; a segunda que é ato puramente executivo; e a última entende tratar-se de ato misto (cautelar em conjunto com executivo). Predomina a segunda corrente, a qual entende ser a penhora um ato puramente executivo, uma vez que seu objetivo é a apreensão dos bens do devedor para individualizar a responsabilidade patrimonial e então realizar os atos expropriatórios do processo executivo para pagamento ao credor (DIDIER Jr. et al., 2010).

A doutrina explica que não se trata de ato cautelar, porque embora possua a função de guardar os bens até que se promova a expropriação com o pagamento ao credor, não se desenvolve em processo autônomo exclusivamente com o intuito de preservar os bens como ocorre nos procedimentos cautelares. Pelo contrário, constitui ato essencial do procedimento executório com a finalidade de individualizar os bens do devedor que servirão para satisfazer o credor (THEODORO Jr., 2011).

De igual modo, também não tem natureza jurídica de ato misto (cautelar e executivo), pois o objetivo principal é a individualização dos bens que responderão pela execução, dando início a invasão ao patrimônio do devedor, enquanto a função cautelar de assegurar os bens possui caráter secundário (DIDIER Jr. et al., 2010).

A penhora, portanto, trata-se de um ato executivo, cuja principal função é individualizar a responsabilidade patrimonial. De acordo com Marques (1960 apud THEODORO Jr., 2011, p. 273, grifo do autor), com esse ato inicial de expropriação,

a responsabilidade patrimonial, que era genérica, até então, sofre um processo de

individualização, mediante apreensão física, direta ou indireta, de uma parte

determinada e específica do patrimônio do devedor.

Tanto Didier Jr. et al. (2010) como Theodoro Jr. (2011), contudo, apontam que a penhora possui tríplice função: a) individualização e apreensão do bem; b) seu depósito e sua conservação; e c) atribuição do direito de preferência ao credor.

Sendo assim, diante do não pagamento pelo executado, e não havendo indicação pelo credor de bens do executado para serem penhorados, o oficial de justiça, munido de mandado judicial, procederá à individualização e apreensão dos bens necessários para a satisfação da dívida. Após, os referidos bens serão entregues ao depositário (que pode ser o próprio executado) para guarda e conservação a fim de evitar o seu extravio ou deterioração, lavrando o respectivo auto. Diante disso, ocorre a indisponibilidade desses bens para o credor e terceiros.

A indisponibilidade dos bens apreendidos, no entanto, é relativa, visto que o executado continua sendo o proprietário dos bens, permanecendo com todos os seus direitos sobre eles, podendo inclusive transferi-los a terceiros. Todavia, como aduz Silva (2000), esse ato de alienação do bem penhorado é ineficaz para o credor penhorante, que prosseguirá com a atividade executória sobre o bem gravado mesmo contra o adquirente.

Quanto à função da penhora de atribuir ao credor o direito de preferência, o art. 612 do CPC estabelece que sendo o executado solvente, o credor que primeiro penhorou o bem tem preferência sobre os demais credores quirografários, resguardados os títulos legais de preferência, estabelecidos no art. 958 do Código Civil. Pode haver mais de uma penhora sobre o mesmo bem, cuja hipótese é descrita no art. 613 do CPC, a qual prevê que não havendo títulos legais de preferência, receberá primeiro o crédito aquele que antecipadamente penhorou o bem (MARINONI; MITIDIERO, 2012).

Realizada a penhora, surtirão efeitos para o credor, o devedor e também para os terceiros. Nesse sentido, com a penhora o credor saberá exatamente os bens que irão garantir

seu crédito, bem como terá o direito de preferência anteriormente referido, ao passo que o devedor perderá a posse direta e a liberdade total de disposição desse patrimônio, pois o mesmo ficará vinculado à execução para posteriores atos expropriatórios e pagamento ao credor.

No que tange aos efeitos perante os terceiros, estes são afetados no momento em que adquirem o bem do devedor executado. Como bem assevera Carnelutti (1973 apud THEODORO Jr., 2011, p. 277, grifo nosso):

[...] a penhora atua em prejuízo de terceiros que tenham adquirido um direito real ou pessoal, ou ainda somente um privilégio, sobre o bem penhorado, no sentido de que, não obstante tal aquisição, o bem continua submetido à expropriação em

prejuízo do terceiro em favor do credor exequente e dos credores intervenientes.

Como anteriormente mencionado ao tratar da indisponibilidade relativa dos bens do executado, portanto, este pode dispor de seus bens, mas os atos de disposição não possuem eficácia perante o credor exequente, o qual seguirá com o processo executório sobre o bem alienado ao terceiro adquirente, que restará prejudicado. Por isso, Theodoro Jr. (2011) afirma que o terceiro deve evitar negociar o bem objeto da constrição com o executado, haja vista que terá de responder com esse bem.

A realização da penhora normalmente se dá pelo oficial de justiça, entretanto, a penhora pode ser efetivada por termo nos autos ou por meio eletrônico, como se verá adiante.

Quando o oficial de justiça for efetuar a penhora, irá apreender tantos bens do executado quantos forem necessários para suprir o valor da dívida, juros, custas e honorários (art. 659, CPC). Sendo o valor dos bens penhorados superior ao da dívida, a penhora será igualmente efetivada, pois após o pagamento do credor o que sobrar será restituído ao devedor. Sendo o valor inferior, também será efetivada porque pode haver o reforço de penhora se o devedor tiver outros bens. A penhora só não será efetivada se o valor for tão ínfimo que seja absorvido pelo pagamento das custas da execução, sem sequer satisfazer a pretensão do credor (DONIZETTI, 2012).

Salienta-se que a Lei nº 11.382/2006 alterou a redação do art. 652, § 2º, do CPC, permitindo que o credor na própria petição de execução, indique bens do devedor à penhora,

sendo que essa indicação é uma faculdade ao exequente quando este conhece o patrimônio do executado e deve obedecer à ordem estabelecida no art. 655, do CPC, que dispõe:

Art. 655. A penhora observará preferencialmente, a seguinte ordem:

I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; II - veículos de via terrestre;

III - bens móveis em geral; IV - bens imóveis;

V - navios e aeronaves;

VI - ações e quotas de sociedades empresárias; VII - percentual do faturamento de empresa devedora; VIII - pedras e metais preciosos;

IX - títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado;

X - títulos e valores mobiliários com cotação em mercado; XI - outros direitos. (grifo nosso)

O credor deve observar ainda o disposto no § 1º do mesmo artigo, o qual prevê que havendo execução de crédito com garantia hipotecária, pignoratícia ou anticrética, a penhora recairá preferencialmente sobre a coisa dada em garantia.

Segundo Donizetti (2012), havendo indicação de bens pelo exequente, cabe ao executado impugnar a nomeação que não obedecer à ordem legal e não o fazendo, a penhora torna-se eficaz. Também, se o exequente não fizer a indicação, poderá o executado fazê-la.

Assim, a ordem estabelecida no referido dispositivo não é absoluta, o que pode ser observado na própria redação do seu caput, na redação dada pela Lei nº 11.382/2006, podendo ser relativizada quando essa escolha justificar o atendimento das circunstâncias do caso concreto, à satisfação do crédito e à forma menos onerosa ao executado (THEODORO Jr., 2011).

Quanto à penhora efetivada por termo nos autos, Didier Jr. et al. (2010) esclarecem que é aquela feita em cartório, pelo próprio escrivão, quando não há necessidade de deslocar- se até o local dos bens para penhorá-los, por exemplo, no caso de indicação de bens pelo credor ou pelo devedor; de bens imóveis acompanhados da respectiva matrícula; de penhora on-line, ou ainda, no caso de substituição de bens penhorados.

Outra forma de penhora é a aquela realizada por meio eletrônico, mais uma inovação trazida pela Lei n. 11.382/2006 que acrescentou tal modalidade no art. 655-A, do CPC:

Art. 655-A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.

A penhora eletrônica, ou penhora on-line, é uma modalidade especial de penhora que permite ao magistrado, por meio de senha devidamente cadastrada no sistema de consulta desenvolvido pelo Banco Central (Bacenjud), obter informações sobre a existência de ativos em nome do executado em qualquer instituição financeira. Em caso positivo, pode bloquear esses valores no limite do valor da execução para que o exequente possa penhorar o dinheiro (MARINONI; MITIDIERO, 2012).

Havendo valores suficientes, o juízo será informado do bloqueio da quantia e da instituição financeira onde a mesma se encontra. O valor bloqueado pode ser menor se o que for encontrado não suprir o da execução, mas jamais pode ser maior. Só então será lavrado o termo de penhora e intimado o executado da constrição (THEODORO Jr., 2011).

Cumpre referir ainda que essa forma de penhora por meio eletrônico não viola o princípio da menor onerosidade, nem o sigilo bancário do executado, tutelado na CF/88, em seu art. 5º, XII, uma vez que o exequente tem o direito à efetiva e adequada prestação executiva. Nesse caso, o sigilo dos dados será mantido, pois não serão conhecidos os valores de depósitos na conta do executado, apenas será informada a existência de valor suficiente para suprir a execução (MARINONI; MITIDIERO, 2012).

Em qualquer modalidade de penhora o executado deverá tomar conhecimento da constrição, que pode ser mediante intimação do oficial de justiça, que no mesmo ato, munido do mandado, cita o executado e já apreende, penhora, avalia e deposita os bens. Ainda, a intimação da penhora pode ser feita pelo correio, quando o executado já tiver sido citado, ou ainda, por meio de advogado constituído (se tiver).

Finalmente, a penhora tem por objeto o patrimônio do executado e dos terceiros responsáveis, conforme preceituam os arts. 591 e 592 do CPC, que já foram objeto de análise em item precedente. Este patrimônio consiste em bens corpóreos (dinheiro, pedras, metais precisos, móveis, veículos) ou incorpóreos (títulos de dívida pública, títulos de crédito que tenham cotação em bolsa ou direitos) (DIDIER Jr. et al., 2010).

Entretanto, não é todo o patrimônio do devedor que responde pela dívida, embora a regra seja a possibilidade de penhora de todos os bens do devedor que possuam valor econômico estimável. A lei, contudo, põe a salvo da execução alguns bens, considerados impenhoráveis.

Destarte, as regras de impenhorabilidade encontram-se estabelecidas no Código de Processo Civil, bem como em leis extravagantes como, por exemplo, na Lei nº 8.009/90 que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Contudo, proceder à análise de todas essas, por tratar-se de conteúdo bastante amplo, daria ensejo à elaboração de novo estudo.

Serão analisadas, portanto, no decorrer do próximo capítulo, as hipóteses de restrição à penhora previstas tão somente no Código de Processo Civil, em seus arts. 649 e 650.

3 A EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL EXECUTIVA DIANTE DAS REGRAS DE IMPENHORABILIDADE DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

No capítulo anterior examinou-se o princípio da responsabilidade patrimonial, enfatizando seu conceito e suas espécies, bem como as condutas de má-fé do devedor traduzidas na fraude contra credores e fraude à execução. Além disso, discorreu-se sobre a penhora e seu objeto para, finalmente, chegar ao objeto principal do presente estudo, qual seja, as regras de impenhorabilidade constantes no Código de Processo Civil e a efetividade da tutela jurisdicional executiva.

Neste capítulo, em um primeiro momento faz-se uma apresentação geral da impenhorabilidade para, em seguida, compreender a impenhorabilidade absoluta e relativa. Ao mesmo tempo, tendo em vista a iminente reforma do Código de Processo Civil atual, será feita uma análise do Projeto de Lei nº 8.046/2010 em trâmite na Câmara dos Deputados e ao Projeto Substitutivo do Deputado Paulo Teixeira que faz referência ao tema.

Ao final, serão analisados alguns julgados proferidos por diferentes tribunais, o que possibilita verificar que a aplicação dessas regras de impenhorabilidade, por vezes impõem dificuldades no recebimento do crédito pelo exequente, prejudicando a efetividade da tutela jurisdicional executiva.

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