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2. R EVISÃO DE L ITERATURA

2.2 FUNCIONAMENTO DO SISTEMA DE CONTROLE POSTURAL

2.2.1 Percepção-ação

Para a realização de um movimento coordenado e com objetivo funcional, há necessidade de obtenção de informações sensoriais e realização da ação motora de forma que a informação sensorial e a atividade muscular estejam intimamente relacionadas através de um ciclo contínuo de percepção-ação. O sistema de controle postural utiliza o ciclo percepção-ação para que através da obtenção de novas informações seja possível ajustar a manutenção da postura executando atividade muscular apropriada, a fim de obter equilíbrio e orientação postural coerente.

Para que o funcionamento do controle postural seja compreendido é necessário que seja esclarecido como a informação sensorial e a ação motora estão relacionadas durante a manutenção da posição corporal desejada. Este relacionamento se apresenta de forma muito complexa, pois a partir do momento em que é fornecida alguma informação, o sistema de controle postural deve, a partir destas informações, realizar os ajustes posturais necessários produzindo ativação muscular apropriada para manter a postura, controlando o corpo como um todo. Essa é uma tarefa complexa, pois o corpo humano é um sistema multisegmentado, composto por inúmeros graus de liberdade, além de apresentar diversos subsistemas que interagem entre si e uns com os outros.

De forma geral, para a manutenção da postura ou qualquer outra atividade motora, primeiramente algumas informações dentre tantas disponíveis devem ser selecionadas. A partir destas informações obtidas, deve ser definida uma ação motora apropriada. Desta forma, o relacionamento entre as informações sensoriais obtidas e a atividade motora ocorre de maneira dinâmica, e não pode ser analisado separadamente, pois a informação sensorial guia a ação

motora que por sua vez influencia a aquisição de uma nova informação sensorial (BARELA, 1997).

O sistema de controle postural recebe as informações de três canais sensoriais: visual, vestibular e somatosensorial (NASHNER, 1981; HORAK; MCPHERSON, 1996). Cada um desses sistemas sensoriais fornece informações que possuem características únicas, pois cada classe de receptores opera de maneira ótima em uma freqüência e amplitude específicas. Entretanto, há uma redundância nas informações fornecidas pelos canais sensoriais, para que em determinadas tarefas ou ambientes, a manutenção da postura seja mantida mesmo quando a informação de um ou mais canais sensoriais não esteja disponível ou então seja informação errônea (HORAK; MCPHERSON, 1996). Para que o sistema de controle postural obtenha uma informação precisa, os estímulos sensoriais devem ser integrados no sistema nervoso central. A partir desta integração, todas as informações provenientes dos canais sensoriais desempenham um papel importante durante a manutenção da postura. Segundo Latash (2000), o termo redundante implica em algo desnecessário, enquanto que o termo abundante apresenta uma conotação positiva, se encaixando melhor neste contexto onde as diversas possibilidades são vistas de maneira benéfica. Na realidade, estas informações disponíveis no ambiente quando são redundantes, são pela abundância e riqueza de informações que cada um dos canais sensoriais fornece, é que permite que o indivíduo seja capaz de manter a postura em situações de conflito sensorial ou durante a ausência de alguma fonte de informação.

A ação motora e a obtenção de informações sensoriais ocorrem de maneira dinâmica e contínua, não havendo apenas uma relação de causa e efeito entre elas (BARELA, 2000), uma exerce influência sobre a outra. A partir deste intrincado relacionamento forma-se o chamado padrão (SCHÖNER, 1991) ou ciclo (BARELA, 1997) percepção-ação. Dentro do ciclo percepção- ação, é importante mencionar que não basta haver um forte relacionamento entre informação

sensorial e ação motora para que o controle postural seja alcançado; também é preciso que este relacionamento seja coerente e estável (BARELA, 1997; BARELA; JEKA; CLARK, 1999; BARELA; GODOI; FREITAS JÚNIOR; POLASTRI, 2001). Para isso, o indivíduo deve buscar manter sua relação com o ambiente o mais estável possível para que o controle postural seja alcançado da maneira desejada (BARELA, 2000).

Uma maneira de analisar o acoplamento entre informação sensorial e ação motora é manipular a informação fornecida a um sistema sensorial e verificar as respostas motoras desencadeadas. Esta abordagem foi muito utilizada para verificar a influência da informação visual no controle postural a partir dos estudos de Lee e colaboradores (por exemplo, LISHMAN; LEE, 1973; LEE; ARONSON, 1974; LEE; LISHMAN, 1975), sendo denominada paradigma da sala móvel. Este paradigma foi utilizado com bebês (por exemplo, LEE; ARONSON, 1974; BUTTERWORTH; HICKS, 1977; BETENHAL; BAI, 1989; DELORME; FRIGON; LAGACÉ, 1989; HIGGINS; CAMPOS; KERMOIAN; 1996; BARELA; GODOI; FREITAS JUNIOR; POLASTRI, 2000; BARELA; FREITAS JÚNIOR; GODOI; POLASTRI, 2001), crianças (por exemplo, SCHUMUCKLER; 1997; BARELA; GODOI; FREITAS JUNIOR; POLASTRI, 2001), adultos e idosos (WADE; LINDDQUIST; TAYLOR; TRET-JACOBSON, 1995; FREITAS JUNIOR; BARELA, 2002; POLASTRI; BARELA; BARELA, 2001). Nestes estudos as paredes e/ou teto de uma sala eram movimentados independentemente do solo, criando uma situação de manipulação da informação visual.

De uma forma geral, os resultados indicam que os participantes foram influenciados pelos movimentos da sala. Quando a sala era movimentada para frente e para trás, oscilações corporais correspondentes foram observadas. Em alguns casos onde a sala foi movimentada bruscamente, a manutenção da postura ereta foi afetada, ocorrendo até quedas (LEE; ARONSON, 1974).

No entanto, embora muitos estudos a respeito do desenvolvimento do sistema de controle postural tenham sido realizados, poucos abordaram os aspectos funcionais, ou seja, quais os

parâmetros do funcionamento deste sistema que leva às alterações comportamentais verificadas. Barela (1997) sugeriu que as alterações observadas no funcionamento do sistema de controle postural em crianças podem ser decorrentes não apenas de alterações nos sistemas sensorial ou motor, mas sim de alterações no relacionamento ou acoplamento entre as informações sensoriais e ação motora, ou seja, alterações no ciclo percepção-ação (BARELA, 1997). Sendo assim, aspectos desenvolvimentais do ciclo percepção-ação relacionados ao controle postural serão abordados a seguir.

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