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Percepção das Pessoas com Deficiência no Processo de Inclusão no Mercado de

CAPÍTULO III – O TRABALHO NA PERSPECTIVA DE INCLUSÃO DAS

3.2. Percepção das Pessoas com Deficiência no Processo de Inclusão no Mercado de

A análise da inserção das pessoas com deficiência no mercado de trabalho em Mossoró-RN tem como ponto de partida o pressuposto de que o trabalho é o principal meio de satisfação de necessidades humanas, sejam elas de natureza material, sejam elas de natureza espiritual, constituindo-se também determinantes da emancipação humana. Portanto, a ausência do trabalho, o desemprego, o subemprego e o trabalho precário conduzem o ser social a situações de extrema vulnerabilidade, a exclusão social.

Para a reafirmação do pressuposto acima, mister se faz esclarecer que os dados relacionados às pessoas com deficiência entrevistadas no tocante a sexo, faixa etária, escolaridade, estado civil, bem como a identificação de setores com maior índice de empregabilidade, atividades desenvolvidas, período de maior concentração de admissões, além de como se dá o processo de admissão, ascensão profissional, salário pago às pessoas com deficiência, foram contemplados alcançando os mesmos resultados apreendidos nas informações dos gestores, conforme expusemos no segundo capítulo. Mesmo assim, alguns aspectos são retomados neste capítulo, por compreendermos que a articulação entre os resultados obtidos possibilita a apreensão de distintas percepções dos sujeitos acerca das mesmas questões, favorecendo a observação das contradições, das (des) vinculações entre os dados.

Neste sentido, quando retomamos o dado referente ao estado civil, tem-se como finalidade enfatizar que 59% dos entrevistados são compostos por pessoas casadas, sendo

compreensivo que a posição deles nas relações familiares seja predominantemente de chefes de família. Essa constatação é relevante no contexto analítico, uma vez que, articulada com os dados relativos à renda, torna-se indicativa e imperativa em relação ao grau de pobreza a que esse segmento está submetido. Pobreza que se intensifica em face da deterioração dos serviços sociais públicos e do acesso restrito aos mesmos, nas áreas de assistência social, saúde, educação, habitação, para citar alguns exemplos.

Observa-se que o acesso restrito aos serviços sociais públicos é conseqüência das orientações neoliberais que, sob o argumento de crise fiscal, chancela cortes nos gastos sociais, bem como, preconiza a sua transferência para a esfera privada, implementando-se, assim, a lógica dualista, a qual configura-se em uma política pobre para os mais pobres e uma política rica para os mais ricos.

No desdobramento dessa lógica dualista, prevalece, neste momento histórico, em âmbito nacional, em se tratando de proteção social para a classe pobre ou segmentos da classe pauperizada, política de assistência social, numa clara distribuição de responsabilidade entre o Estado (nas esferas Federal, Estadual e Municipal), instituições privadas e organizações da sociedade civil, com tendência à “refilantropização”, respaldada na insistente evocação à solidariedade e ao voluntariado.

No tocante ao endereço residencial dos entrevistados, observamos que essas pessoas moram em bairros periféricos, portanto, distanciados do centro da cidade, corroborando, destarte, para evidenciar que as desigualdades sociais geradas pela distribuição desequilibrada de riquezas e renda estendem-se também nas formas de ocupação da cidade. Quando as entrevistas foram realizadas nas residências pudemos observar o tipo de habitação e os utensílios/eletrodomésticos utilizados por seus habitantes, conduzindo-nos a afirmar que são residências muito pequenas, em condições parcialmente precárias, com móveis e eletrodomésticos simples e/ou obsoletos, reveladores do baixo poder aquisitivo e da pobreza em que esse segmento populacional encontra-se.

Contudo, as desigualdades sociais traduzidas na ocupação espacial periférica ampliam- se quando vinculadas à questão da acessibilidade. Um olhar sobre a cidade de Mossoró capta imagens flagrantes da ausência, ou de recentes e, em geral, inadequadas, ações direcionadas para a eliminação de barreiras arquitetônicas, voltadas para facilitar o acesso, com segurança e autonomia, das pessoas com deficiência, nos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, nas edificações, nos transportes e nos sistemas e meios de comunicação. Tais barreiras, ao inviabilizarem o acesso dessas pessoas aos serviços e bens comunitários, convergem para

segregá-las, confiná-las ao espaço doméstico, alijando-as de seus direitos, dentre eles o de ir e vir. Nega-lhes, assim, o direito à cidadania, ao tempo em que se reforça o preconceito para com esse segmento social.

Entretanto, as barreiras arquitetônicas espraiam-se também no interior das organizações, contribuindo para reduzir consideravelmente o número de pessoas com deficiência a serem inseridas no mercado de trabalho. Tais barreiras, ao lado de outras, por um ângulo, funcionam como uma seleção da seleção, entre os próprios deficientes, onde são rejeitadas as deficiências mais graves. Por outro ângulo, representam o subterfúgio dos empregadores para a contratação desproporcional ao designado na legislação. Em ambas as situações, reproduz-se o que deveria ser eliminado: a discriminação.

A esse respeito, um dos entrevistados mencionou, entre as dificuldades de inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho local, “a falta de transporte coletivo adaptado”. A compreensão dele caminha em direção à nossa no sentido de que a inclusão das pessoas com deficiência, em qualquer âmbito, requisita políticas transversais, com ações articuladas em distintas áreas, senão tais ações correm o risco de naufragar.

Nessa perspectiva, longe de considerar a inclusão como processo linear, mas apreendendo-o como uma sucessão de iniciativas que se interpenetram e são interdependentes, iniciado com a valorização, o reconhecimento, o apoio incondicional da família, vão-se adensando oportunidades de acesso relacionadas à educação, a saúde, a qualificação, a acessibilidade, dentre outras, como pré-requisitos à possibilidade de inserção no mercado de trabalho. Tal inserção conduz a novos acessos, os quais devem ser balizados na direção do respeito às diferenças, na redução das desigualdades e não como forma de reproduzi-las, pois assim se estaria caminhando na contra-mão da inclusão social ou reforçando a exclusão social.

O processo de admissão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho traz à tona duas denúncias. Uma diz respeito à atualidade dos traços históricos da cultura clientelista e de apadrinhamento da sociedade brasileira, identificada nas expressões dos entrevistados: “minha admissão foi através da senhora Prefeita”, “foi através de amigos, parentes”. As admissões realizadas nestes parâmetros denunciam o falso argumento da competência e da qualificação tão disseminados pelos gestores.Entretanto, outras admissões rompem com essa lógica e tendem a utilizar a via democrática materializada através de concurso público, em processos seletivos por meio de entrevista; ou como mencionam três entrevistados: “botei

uma ficha lá e fui chamado”, “minha admissão foi mediante a Associação de Deficientes Físicos de Mossoró - ADEFIM”, “eu sou concursado”.

Dos resultados apreendidos, observa-se a ênfase atribuída ao papel desempenhado pelas associações, em particular a ADEFIM, como suposta agenciadora de emprego desse contingente populacional no mercado de trabalho local. Para as pessoas com deficiência entrevistadas, essa associação é sinônimo de inserção no mercado de trabalho. Esse entendimento pode ser observado com o seguinte depoimento:

Eu passei foi quase 4 anos atrás [de emprego] pra cima e pra baixo, todo dia eu saía, e eu não encontrava emprego não, porque logo eu dizia que era deficiente, levava o papelzinho de deficiente. [Quando] me informaram a ADEFIM [...]. Aí quando eu fui lá na ADEFIM mandaram eu fazer ficha. Quando dei fé a assistente social ligou pra lá e [o presidente da ADEFIM] pegou e ligou pra mim. Você apareça aqui, que você tá empregado, e eu comecei a trabalhar Aí foi quando eu consegui um emprego (Sic, PEDRO).

Essa percepção comporta duas observações. A primeira diz respeito ao papel da associação como mediadora de emprego. Com isso, não estamos obscurecendo a importância da associação nessa direção, sobretudo considerando a conjuntura atual extremamente favorável ao desemprego, mas chamando a atenção para que ela não se restrinja à essa ação e, assim, distancie-se e se desvirtue do seu papel político. Destarte, estaria aderindo ao engodo dos que se sentem ameaçados por uma classe efetivamente combativa. A segunda, intimamente relacionada à primeira, requer o desenvolvimento de um trabalho político- educativo sobre as verdadeiras atribuições da associação. O alcance dessa finalidade remete, indubitavelmente, à ampliação e difusão da associação como meio de canalizar e fortalecer as lutas, defender interesses e aspirações das pessoas com deficiência, exige que se faça uma discussão dos direitos/deveres, no sentido de dar visibilidade, pressionar e fazer ecoar nos espaços públicos a efetivação dos seus direitos, assim como sugerir ações que possam ser introduzidas na agenda governamental, de forma a possibilitar novos acessos rumo ao atendimento de suas reivindicações, não apenas restritas as necessidades vitais, mas também em direção a uma vida emancipada. Eis, pois, um longo caminho a percorrer, um desafio instigante para aqueles que acreditam em uma nova ordem social diferente da instituída.

Nos depoimentos das pessoas com deficiência evidencia-se, de forma contundente, a desconexão entre o processo de admissão e o alcance, mesmo que limitado e seletivo, da política nacional relativa às pessoas com deficiência. Essa afirmação é inconteste, pois em

anos que precederam a legislação, salvo raríssimas exceções, as empresas privadas não disponibilizavam vagas para pessoas com deficiência. No entanto, essa mudança não os remete a questionar por que, em tão pequeno espaço de tempo, as empresas introduziram em seus quadros funcionais pessoas com deficiência, se a cultura que atravessa a sociedade brasileira, e em particular a classe dominante, nesse sentido, permanece praticamente inalterada? Que razões poderiam explicar então esse redirecionamento de atitude em relação a esse segmento populacional?

Ora, seria ingenuidade pensar que os capitalistas, num lapso ético, redefiniram suas concepções e ações sobre a lógica que os movem e passaram a creditar às pessoas com deficiências um potencial de produtividade e eficiência igual ao das pessoas sem deficiências. Para os detentores do capital, em sua grande maioria, o que as diferencia é que em tese as pessoas com deficiência produzem menos, no tempo socialmente necessário, comprometendo, por conseguinte, o alcance da mais-valia. De fato, o que foi alterado neste sentido decorre da intervenção e regulação estatal, conformando a Política Nacional para a Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência, cuja operacionalização redireciona esse processo, ainda que atendendo a interesses contraditórios, pois de um lado viabiliza, embora nos parâmetros determinados pelo capital, o acesso de pessoas com deficiência no mercado de trabalho e, por outro lado, insere apenas uma ínfima quantidade em relação ao definido por cotas, o que não corresponde, em geral, conforme apontamos no capítulo anterior, nem ao alcance das próprias cotas, nem tampouco ao contingente das pessoas com deficiência desempregadas e em condições de serem inseridas no processo produtivo.

A análise da Política Nacional para a Integração das Pessoas Portadoras de Deficiência remete inexoravelmente a situá-la entre as políticas sociais, o que, por sua vez, suscita uma breve retrospectiva de como essas se constituíram e qual a formatação que assumem na contemporaneidade, sobretudo particularizando a realidade brasileira.

Neste sentido, parte-se da concepção de política social, apreendida em Mota (2000), como um mecanismo de intervenção e regulação do Estado, implementado nos marcos do capitalismo monopolista, em resposta a um conjunto de necessidades sócio-econômicas, jurídicas e políticas, originárias das relações entre capital-trabalho.

É perceptível, a partir da concepção precedente, a relação entre Estado, sociedade e economia, donde as políticas sociais são expressões de enfrentamento da questão social, a partir do seu reconhecimento pelo Estado como direito e responsabilidade pública. Nessa perspectiva, as primeiras legislações e medidas de proteção social ocorrem somente a partir do final do século XIX, tendo como pioneiras a Alemanha, sob inspiração de Bismarck

(1883), e Inglaterra, sob inspiração de Beveridge (1879). Ambas implantaram o seguro social para cobrir as perdas salariais motivadas por incapacidade ao trabalho (velhice, acidente de trabalho, invalidez, doença, desemprego).

Originárias da relação entre Estado, sociedade e economia, emergem as diferentes formas de regulação das relações sociais, ora com preponderância do Estado de Direito, ora com o protagonismo do mercado. Por conseguinte, são as formas de regulação hegemônicas em determinadas conjunturas que determinam a natureza das políticas sociais.

Assim, para os liberais, o mercado é a via natural de regulação das relações sociais. Através de sua ação espontânea e invisível haveria um equilíbrio entre os indivíduos. A intervenção do Estado deveria ser mínima, apenas para “proteger” os indivíduos que, em razão de suas debilidades pessoais ou sociais, encontrar-se-iam em situação de desvantagem em relação aos demais. Portanto, sob o liberalismo, as políticas sociais caracterizam-se como compensatórias, residuais, focalizadas tão somente naqueles que não conseguiram atender a suas necessidades mais prementes através do mercado, da família ou da comunidade.

Contudo, segundo Behring (2000), no final do século XIX e início do século XX, as idéias liberais são postas em xeque, ante os acontecimentos políticos e econômicos, dentre eles destacam-se: o movimento operário, a Revolução Russa de 1917, a instauração e difusão do fordismo, a concentração e o monopólio do capital e a crise de 1929/33, denominada de grande depressão, que impactaram os detentores do poder econômico e político, conduzindo- os a reconhecer os limites do mercado auto-regulável.

A contestação aos argumentos liberais potencializa-se na Teoria Geral de Keynes, a qual indica também a legitimidade do Estado para intervir com medidas econômicas e sociais, ou seja, com medidas “anticrise” ou “anticíclicas”. Estas atendem, simultaneamente, tanto às necessidades de reprodução dos trabalhadores, através de emprego e serviços sociais, quanto aos interesses do capital, uma vez que funcionam como “uma baforada de oxigênio”, ao gerar uma “demanda efetiva”, ou seja, disponibilizam meios de pagamento e garantem investimentos, mediante a apropriação pelo Estado do valor socialmente criado e pelo controle de alguns empreendimentos do processo produtivo, resultando numa certa redistribuição de renda materializada em forma de salário indireto e de serviços sociais, por meio de políticas sociais.

É, pois, no pós Segunda Guerra Mundial, numa conjuntura de franca expansão do capitalismo em sua fase monopolista, acompanhado do paradigma fordista e sob a regulação estatal nos moldes Keynesiano, que se funda, expande e consolida, na Europa Ocidental, o Estado de Bem-Estar Social, assentado no tripé: pleno emprego, serviços sociais e assistência

social. Entretanto, os anos finais da década de 1960 sinalizam uma crise de superprodução acompanhada de uma queda da taxa de lucro, alçando proporções extremas em 1973. Instala- se, a partir de então, um novo período depressivo, cuja conseqüência principal para a classe trabalhadora manifesta-se no desemprego estrutural, no subemprego e no emprego precarizado.

Esta crise criou as condições propícias à introdução e difusão do receituário neoliberal. Para os neoliberais, a crise resulta, de um lado, do poder excessivo dos sindicatos, pressionando os salários e os gastos sociais do Estado e, do outro lado, da redução dos lucros e do crescimento da inflação. Em outros termos, a crise é tributada ao keynesianismo e ao Estado de Bem-Estar Social. Portanto, a sua reversão está diretamente relacionada ao ataque das suas causas, tendo como principal foco a redução do Estado, mormente em se tratando dos gastos sociais e do desmonte dos direitos sociais conquistados anteriormente.

No Brasil, as políticas sociais surgem lentamente, tardiamente e de forma segmentada. A primeira medida de proteção social data do final do século XIX, quando “em 1889 os funcionários da Imprensa Nacional e os ferroviários conquistam o direito à pensão e a 15 dias de férias” (BEHRING & BOSCHETTI, 2006, p.79). Não obstante, o marco da política social brasileira foi a lei Eloy Chaves, de 1923, determinando a instituição de Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) para algumas categorias estratégicas, como: ferroviários, portuários, bancários, dentre outras. Nos governos Vargas, amplia-se a criação de significativos direitos trabalhistas, sistematizados na CLT, numa dupla intenção de antecipar as reivindicações da classe trabalhadora e a busca de legitimação política. No período subseqüente, até 1964, outras regulamentações foram incorporadas, assim como foram criadas instituições correlatas. Contudo, o que se pretende reter são as características da política social no período demarcado, que são: fragmentadas, seletivas e corporativistas.

No período da ditadura militar, o bloco militar, em busca de adesão e legitimidade das classes subalternas, expande, moderniza e introduz o sistema dual de acesso às políticas sociais: para quem pode e para quem não pode pagar. Todavia, mantém as características dos períodos precedentes, ou seja: políticas sociais compensatórias, seletivas, fragmentadas e setorizadas.

Na Nova República, implantada numa conjuntura de crise econômica e de plena efervescência política rumo à redemocratização, elabora-se e aprova-se a Constituição de 1988, a qual introduz, no âmbito da ordem social, “princípios de universalização, responsabilidade pública e gestão democrática”, numa nítida intenção de reforma da política social brasileira. Porém, a partir dos anos de 1990, até os dias atuais, têm sido de “contra-

reforma do Estado e de obstaculização e/ou redirecionamento das conquistas de 1988” (Op. cit. p.147), cujas implicações para as políticas sociais traduzem-se, de um lado, na efetividade parcial daqueles princípios, e do outro, na radicalização da redução do orçamento para a área social, conformando o desmonte dos direitos sociais.

No atual contexto de hegemonia neoliberal, as políticas sociais brasileiras avançam regressivamente ao substituir a universalização pela seletividade, privatização; o dever do Estado pela parceria com organizações da sociedade civil e a gestão democrática por práticas decretistas, medidas provisórias. Logo, como refém dessa lógica, personifica as características que lhes são imanentes ou, parafraseando Sonia Draibe (1988), no neoliberalismo as políticas sociais assentam-se no trinômio articulado da focalização, privatização e descentralização.

Neste contexto, e com essas características, as políticas sociais expõem e reafirmam um paradoxo: de um lado, há uma crescente demanda por programas sociais, do outro lado, as demandas do capital exigem a redução com tais despesas.

Portanto, a política social atende tanto as necessidades do capital quanto as dos trabalhadores, isso leva a supor que:

O significado da política social não pode ser apanhado nem exclusivamente pela sua inserção objetiva no mundo do capital nem apenas pela luta de interesses dos sujeitos que se movem na definição de tal ou qual política, mas historicamente, na relação desses processos na totalidade [...] (e) serão sempre resultado de um processo conflituoso de negociação e luta de interesses, que se colocam em condições desiguais nas arenas de negociação disponíveis no Estado democrático de direito (BEHRING, 2000, p.35/6).

O percurso teórico oferece-nos subsídios suficientes para indicarmos que a Política Nacional para a Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência está sintonizada com o perfil que as políticas sociais adquirem no neoliberalismo. Isto porque incorpora e reflete tal marca à medida que focaliza suas ações num segmento extremamente vulnerabilizado – as pessoas com deficiência; rege-se pelo sistema de cotas, não deixando margem para ambigüidades quanto ao seu caráter seletivo, assim como revela a natureza contraditória, pois à medida que se propõe à inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, cria, ao mesmo tempo, as condições de limitar o acesso de um grande contingente desse segmento; sua materialização efetiva-se em articulação entre os entes federados, organizações privadas e entidades da sociedade civil.

As políticas sociais com base no sistema de cotas recebem inúmeras denominações, tais como: políticas de ação afirmativa, discriminação positiva, reserva de vagas, ação compensatória. Segundo Moehlecke (2002), essa discussão origina-se nos Estados Unidos, na

década de 1960, e passa a ser veiculada no debate e na agenda pública brasileira a partir da década de 1980, quando é formulado o projeto de lei nº. 1.332, de 1983, propondo uma “ação compensatória” para reparar os afros descendentes das discriminações, mas o mesmo não encontra respaldo no Congresso Nacional.

Entretanto, a Constituição de 1988 incorpora em seu texto, no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, capítulo II – Dos Direitos Sociais, o direito ao trabalho, dentre outros, e o Título III – Da Organização do Estado, capítulo VII – Da Administração Pública, Art. 37, define “a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão”. Instaura-se, a partir de

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