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4.1 Pesquisa qualitativa: análise de conteúdo

4.1.4 Percepção de valor

Todos entrevistados enxergam o preço cobrado pelo streaming como justo, sendo o consumidor visto como a parte que mais se beneficia dessa relação, que deve ser boa para o artista e avaliam que gera visibilidade e facilita o acesso à sua obra. Eles também apresentaram o entendimento de que é lucrativo para as empresas detentoras desses serviços. Dentre os entrevistados, 2 chegaram inclusive a afirmar que o serviço poderia ser mais caro.

Pra ser bem sincero eu acho que o valor poderia ser até mais caro, para nós consumidores é lindo, coisa linda. Quando eu utilizava o Spotify era o plano família, então acabava que não dava nem três reais por mês, então isso nem fazia diferença pelo o que a plataforma me entregava (CRHIS CORNELL). Acho que sim, acho que não é um valor agressivo, assim, eu entendo que não é um valor agressivo, às vezes consumidor gasta dinheiro com coisas mais irrelevantes pagando muito mais caro, então, eu acho que é um valor tranquilo, é um valor acessível (BRUCE DICKINSON)

Apesar de considerar o preço justo, 2 entrevistados consideraram que o preço está no limite e que o plano família apresenta melhor custo benefício já que é cobrada uma assinatura com um valor um pouco mais alto, mas que permite a utilização de até 4 pessoas, assim, é possível dividir o valor. Um dos entrevistados que utiliza o plano gratuito destacou o fato de que já havia assinado o plano, porque dividia com amigos e, quando essa divisão não se tornou mais possível, optou por voltar para o plano gratuito.

Pra mim não faz tanta falta por que eu pago acho R$ 7,00 reais por mês, por que é um plano família, divido por cinco pessoas, aí fica bem barato, mas eu acho que aquele individual é um pouco mais caro. Ai já não sei se compensaria tanto, então eu acho que quem quiser fazer é legal juntar uma galera e fazer o família que todo mundo sai ganhando e não é tão caro. Você gasta mais lanchando na faculdade um dia (TARJA TURUNEN).

Eu tinha assinado porque eu tinha feito um plano família, com duas amigas minhas, a gente todo mundo dividindo esse preço e depois optamos por cancelar, parar de usar e deste então eu fiz o plano de novo (FREDDIE MERCURY).

Os entrevistados que utilizam plataformas de streaming disponibilizadas gratuitamente por operadoras de telefonia relataram que tal oferta não foi levada consideração na hora de adquirir o plano. O entrevistado Jimi Hendrix, um dos que

utilizam o Deezer nessa modalidade, chegou a afirmar que desconhece o preço e que não estaria disposto a pagar: “Na verdade eu nem sei quanto que custa esse Spotify, esse Deezer, fora de operadora [...] (JIMI HENDRIX).

A maioria dos entrevistados (12 no total) entende que a disponibilização de música ilimitada é algo que contribui para valorizar a música, já que ela passa a estar presente na vida das pessoas, podendo ser consumida em momentos que antes não eram possíveis ou era possível de maneira limitada. A variedade e diversidade de músicas também contribuem nesse sentido, já que valoriza nichos de consumidores e facilita o acesso, oferecendo variedade a baixo custo. O trabalho de Moschetta e Vieira (2018) também encontrou a mesma percepção.

Eu acho que valoriza [...] Porque mostra a diversidade, como se eu entrasse em uma biblioteca, numa biblioteca física, e tivessem poucos livros, ok, né, eu não sei qual que é o tipo de condição, o motivo para terem poucos livros, quando entro numa biblioteca com vários livros, com muitas opções, eu vejo que ali tem muitas opções para escolher então, isso torna o lugar mais valorizado, a mesma coisa é o Spotify [...] Eu acho que valoriza, não interfere, acho que a música não perde valor. Claro que tem que ter uma boa logística, uma boa forma de pesquisar, se o acervo é ilimitado, não vejo problema (JOAN JETT).

Você tornando ela mais acessível, vamos dizer assim, ela fica mais popular. Ás vezes, eu vou falar o meu caso, você escuta uma música num filme, eu vou lá naquele aplicativo Shazam, que grava um pedaço da música, e entra na internet e já te dá o nome do artista, o nome da música, então ele é conectado com o Spotify e já abre direto nele, então se eu não encontro essa música, como vou reconhecer aquele artista, então acho que valoriza mais por se tornar mais acessível (JANIS JOPLIN).

A variedade é apontada como atributo de valor para Freddie Marcury:

Acho que para valorizar, porque pela plataforma mesmo quando você cria as suas próprias playlists, eles te fornecem novos artistas, novas músicas como sugestão, e eu conheci muita gente que eu não conhecia, muito música que eu não conhecia por causa disso (FREDDIE MERCURY).

Contudo, uma parte dos entrevistados (3) entende que os serviços de streaming contribuem para desvalorizar a música, já que banaliza o consumo. Além disso, o excesso de informação, na percepção deles, faz com que o artista precise disputar a atenção dos usuários, caso queira entrar nas paradas de sucesso. Isso contribui para a perda de qualidade da música, já que os artistas priorizariam apenas hits ou músicas de acentuado apelo comercial, na visão dos entrevistados. Essa percepção está de

acordo com o que foi observado no estudo de Hiller e Walter (2015) que concluiu que o modelo de remuneração de artistas pelos serviços de streaming - que é calculado pelo número de audições - incentiva os compositores a criarem músicas que estimulem a repetição.

A esse respeito a opinião do entrevistado Chris Martin é interessante:

[...] é muito comum que as pessoas queiram ouvir o que está sendo mais ouvido. E isso faz com que um artista pense na hora de criar a sua música, ‘não quero criar algo legal, eu quero criar algo que vá para a lista das mais ouvidas’, eu acho que isso tem uma influência negativa, mas isso não é uma coisa que o serviço fez, é uma coisa que acontece naturalmente e não tem o que fazer (CHRIS MARTIN).

Ou seja, a ideia de se criar músicas com foco na parada de sucessos não é algo que teve início com o streaming, remonta o próprio surgimento da indústria da música e as estratégias de lançamento de discos (KEIGHTLEY, 2004).

Relacionado com o conceito de valor e percepção de valor discutido no referencial teórico (ZEITHAML, 1988; SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2001; WOODAL, 2003), observa-se que as plataformas de streaming oferecem uma equação de valor avaliada pelos usuários como bastante satisfatória, já que plataforma “entrega muito’, conforme destacou Bruce Dickinson. Os entrevistados entendem que o aumento da oferta, ou seja, o fato das plataformas de streaming tornar a música abundante contribui para aumentar a utilidade da música.