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Plataformas de streaming: a música como serviço

2.2 Evolução dos suportes, dispositivos e consumo de música

2.2.6 Plataformas de streaming: a música como serviço

Os serviços de streaming surgem como uma alternativa para as gravadoras que, desde a ascensão das novas formas de consumo de música, a partir das tecnologias digitais de comunicação e informação, assistem as vendas dos formatos físicos caírem (HERSCHMANN, 2010; DE MARCHI, 2011; JANOTTI Jr. et al., 2011; VICENTE, 2014).

As plataformas de streaming permitem que o ouvinte tenha acesso a um catálogo de músicas quase ilimitado, sem necessidade de download, ou seja, sem necessidade de armazenar a cópia digital do fonograma no seu dispositivo, bastando apenas o acesso à internet para receber a transmissão da música ou álbum escolhido dentro do serviço. Elas também funcionam como redes sociais (AMARAL, 2007) ou como radio online (LEÃO; PRADO, 2007; KISCHINHEVSKY; CAMPOS, 2014).

O streaming é uma tecnologia que permite a audição da música por meio da sua transmissão. É possível fazer a classificação do streaming enquanto um serviço, que disponibiliza música para audição, mas não o seu armazenamento, enquanto o

download seria um produto já que o usuário adquire um arquivo do qual passa a ter

propriedade. Os serviços de streaming podem ser divididos em dois tipos: o modelo interativo e o modelo não interativo (LEONHARD, 2008; STOCKMENT, 2009; VICENTE; KISCHINHEVSKY; MARCHI, 2016, VALENTE, 2016).

O modelo não interativo é aquele que se convencionou chamar de webradio, no qual o usuário acessa para ouvir uma programação predeterminada, assim como em uma rádio tradicional. Já o modelo interativo se caracteriza por ser randômico e assíncrono, o usuário seleciona o que vai ouvir, na hora que quiser (PRIESTMAN, 2001; CAVALCANTI; VAN HAANDEL, 2008; VALENTE, 2016).

Os serviços de streaming interativo, que serão alvo desta pesquisa, podem ser do tipo por assinatura, em que o usuário assina um plano mensal ou do tipo subsidiado por anúncios publicitários, em que o usuário consegue acessar o acervo disponibilizado pela plataforma com publicidade inserida durante a transmissão. Assim, muda-se de

um modelo de propriedade, ou seja, produto, para um modelo de acesso, a música como serviço (THOMES, 2013; VALENTE, 2016).

Cabe destacar que existe uma diferença entre as motivações de consumo dos dois modelos de streaming, o interativo e não interativo. As webradios atraem perfis de consumidores que não estão interessados em pesquisar músicas novas e descobrir coisas novas por conta própria. Assim, esse tipo de consumidor prefere um serviço que já lhe oferece uma programação definida por algum tipo de curadoria (VALENTE, 2016).

O que diferencia os serviços de streaming interativo, além do modo de acesso e escuta, é o fato de ele permitir que o usuário tenha à sua disposição um vasto catálogo que ele pode usufruir de maneira ilimitada, no plano por assinatura. O modelo de publicidade impõe algumas restrições de acesso. Neste sentindo, as plataformas de

streaming funcionam tanto como um novo suporte para a música, ou seja, uma nova

tecnologia, quanto também uma loja, um intermediário, que faz a música chegar até o ouvinte. Cada serviço oferece preços e acessos diferentes na modalidade de assinatura e suportadas por anúncios (VALENTE, 2016; CARRONI, PAOLINI, 2017).

O usuário que assina o plano pago também tem a possibilidade de ouvir músicas de maneira offline. Funciona de maneira semelhante ao download: as músicas ficam armazenadas durante um período no dispositivo do assinante para que ele possa ouvi- las quando estiver sem acesso à internet, por meio do aplicativo disponibilizado pelo serviço. Uma modalidade que faz sentido no Brasil em que o acesso à internet costuma ser precário em alguns locais. Além disso, ouvir músicas em streaming consome de forma mais rápida o pacote de dados, no caso de telefonia móvel. Essa funcionalidade é denominada como duo delivery (VALENTE, 2016).

Essas plataformas também funcionam como rede social, já que é permitido seguir outros usuários, perfis de artistas e ver o que eles ouvem, além da funcionalidade de compartilhar músicas em outras redes. Também possuem algoritmos que fazem recomendações para os usuários baseados nos seus gostos, preferências e histórico de interações dentro do serviço. Essa característica faz com que o streaming funcione

como ferramenta de descoberta (AMARAL, 2007; KISCHINHEVSKY; CAMPOS, 2015; VALENTE, 2016).

Outra modalidade de acesso ao serviço de streaming de música se dá por meio dos planos de telefonia móvel, já que operadoras estabelecem parcerias com empresas do segmento para ofertar o serviço gratuitamente a quem adquire um plano. Uma das razões do sucesso dessa modalidade pode estar associada às formas de pagamento, que não dependeriam do cartão de crédito (VALENTE, 2016). No Brasil, a Vivo estabeleceu uma parceria com o Tidal, enquanto a TIM associou-se ao Deezer.

Até o surgimento da internet, a música era comercializada por meio de suportes físicos, como os discos de vinil, fitas K7 e o CD. Cada uma dessas mídias estabelecia protocolos de escuta e consumo de músicas diferentes. Foi a partir do surgimento do disco de vinil que nasceu o conceito de álbum, o principal produto trabalhado pelos artistas e gravadoras (STRAW, 2000; KEIGHTLEY, 2004; CONNOLLY; KRUEGER, 2006). Observa-se que os serviços de streaming emulam formatos físicos: a disponibilização de álbuns e singles, estabelecendo novas formas de consumo em que o formato de álbum tende a ficar em segundo plano para os usuários (HILLER; WALTER, 2015).

Os serviços de streaming permitem ao usuário realizar pesquisas por artistas ou gêneros musicais diversos, além disponibilizar playlists variadas: por artistas, estilos, paradas de sucessos, lançamentos, nacionalidades, épocas, temas ou cronologias. Essas características possibilitam experiências de escuta diferente dos modelos analógicos, uma escuta fragmentada. Ressalta-se, ainda, a possibilidade do usuário criar as suas próprias playlists, bem como os sistemas de recomendação baseado em algoritmos, que mapeiam o gosto dos utilizadores (KISCHINHEVSKY; VICENTE; MARCHI, 2015; KACHKACH, 2016; MOSCHETTA; VIEIRA, 2018).

O diferencial de competitividade dos serviços de streaming é percebido na variedade do acervo disponibilizado ao usuário, nos serviços de recomendação, na capacidade de compartilhamento em redes sociais, etiquetagem e curadoria, características que possibilitam a interatividade e a visibilidade do que se escuta (AMARAL; AQUINO, 2009; SÁ, 2009; GALLEGO, 2011; KISCHINHEVSKY; VICENTE, MARCHI, 2015).

No mundo todo são mais de 400 serviços de streaming de música e estão estabelecidos em mais de 200 países. Como estratégia de competição contra a pirataria, essas empresas oferecem acesso gratuito ou por um custo bastante reduzido a uma grande variedade de músicas de diferentes gêneros, gerando economia de escala. O intuito é atrair o maior número de assinantes possível. Com isso, a música passa de um produto para se tornar um serviço e uma commodity, cujo valor passa a estar nas apresentações e nas estratégias de construção de relacionamento com o público (LEONHARD, 2008; VICENTE; KISCHINHEVSKY; MARCHI, 2016).

Os números mostram que os serviços de streaming revigoraram o consumo de música. A receita total global foi de 19,1 bilhões de dólares, foi um crescimento mais rápido que do ano anterior e o maior desde 1997, quando o IFPI deu início ao monitoramento do mercado. São 255 milhões de usuários pagantes no mundo todo (IFPI, 2019).