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CAPÍTULO 4 OS SUJEITOS DOCENTES DA EDUCAÇÃO EM TEMPO

2 QUESTÕES ORIENTADORAS E ANÁLISE DESCRITIVA DAS ENTREVISTAS

2.6 Percepção sobre os programas

Apesar das dificuldades relatadas pelos docentes do PEI como baixos salários, ausência de espaços adequados, falta de horário para o planejamento das oficinas na escola, grande número de alunos por turma, rejeição do programa e da equipe de trabalho pela escola, também levantaram pontos positivos que de certa forma foram responsáveis pela permanência dos mesmos no programa. Notar a mudança de comportamento e o crescimento dos alunos, bem como apoiá-los no dia a dia ajudando-os a superar situações difíceis, foi uma das grandes satisfações dos educadores ao final do ano, conforme relatos da Bolsista B e da Agente Cultural X abaixo:

Os positivos são essencialmente a questão dos alunos, o crescimento deles. Porque a gente pega alguns no início do ano que, nossa! E vê no final como eles estão. Chegar no final do ano, eles agradecerem. Sabe, é diferente. Igual, tem um professor de jiu- jítsu (...) Ele sempre tem uma fala: "Vocês vão ser o que vocês quiserem". "Vocês têm capacidade para ser o que vocês quiserem". “Você pode ter escutado por aí, ou na sua casa que você não vai ser ninguém, mas nós estamos aqui”. “Vocês vão ser alguma coisa, vocês vão ser o que vocês quiserem”. Então ver o crescimento deles é um dos pontos positivos (que eu acho que a gente prossegue muito mais por isso do que por qualquer outra coisa). (Bolsista W – Escola B).

(...) por exemplo, nós temos casos de muitas meninas adolescentes, aquele tipo de adolescente revoltado que dá problema o ano todo na escola, que chegou no final do ano, esse ano, a gente olhar para ela e dizer: "nossa, essa menina melhorou muito". E fazer um grupo de dança, futebol, essas coisas assim que o programa oferece para elas. (Agente Cultural X – Escola B).

Para o Agente Cultural Y, o diferencial do programa era a valorização do tempo de criança.

Porque é uma educação fora da sala de aula. Não é de “cê” ficar preso dentro “duma” sala de aula e ficar ali só escrevendo, só escrevendo, só escrevendo. Criança automaticamente, ela não aguenta isso tudo direto, ela tem que ter a hora dela. Então a escola integrada veio para ela ter a hora dela, de aprender mais coisas, né? (Agente Cultural Y – Escola B).

De certo modo, os monitores acreditavam no programa pelos benefícios oferecidos aos alunos a partir das experiências diferenciadas proporcionadas pelas oficinas, pelo afastamento das crianças e adolescentes das ruas, pela convivência dos alunos, pelas oportunidades de lazer ofertadas e pelo diálogo constante com os educadores.

Os professores também reconheceram a importância do PROETI e destacaram o afastamento dos alunos das ruas e apoio dado a eles no projeto como alimentação, cuidado, lazer e suporte para os estudos como os principais aspectos positivos.

O ponto positivo é que o menino às vezes não tem lugar de ficar, os pais trabalham e tudo... além de estar tendo alimentação, estar tendo a ajuda num para casa que, em casa, às vezes não tem... o pai é analfabeto, a mãe trabalha também... esse é um dos pontos positivos... Ponto positivo que o menino vai estar tendo vários tipos de brincadeiras, atividades, para melhorar sua qualidade de vida e a questão de socialização com os outros alunos... (Professor de Educação Física 1 – Escola A).

A Professora Regente de Turma 3 reforça a positividade do projeto que para ela não apresenta pontos negativos, tendo em vista que os alunos estão sendo ajudados:

Pontos positivos, eu acho que é de ajudar o aluno, tirar ele da rua. Essas coisas todas, né? Acho que esse é um ponto positivo. Ponto negativo, eu não consigo encontrar nenhum, não porque se ele “tá” fazendo isso pra ajudar o aluno, eu acho que não consigo encontrar um ponto negativo pra ele. Se todas as oportunidades estão sendo dadas... eu tenho uma colega que trabalha comigo que ela costuma dizer que: “a obrigação do aluno do projeto é tá sempre progredindo e não regredindo”, porque o governo dá tudo. “Cê” tem aula especializada, “cê” tem material, “cê” tem uma professora que te acompanha na sua tarefa de casa, “cê” tem atividades lúdicas, entendeu? Então, assim, como pessoal, é claro que não dá pra eu te dizer que ele não tenha problema nenhum, porque tem né? Mas como aluno, acho que não tem um ponto negativo não. (Professora Regente de Turma 3 – Escola A).

Os professores, apesar das dificuldades, demonstraram acreditar no projeto pelos benefícios oferecidos aos alunos pelo prolongamento do tempo deles na escola, afastando-os das ruas, e pelas oportunidades de lazer e acompanhamento pedagógico que muitos não teriam em casa.

As professoras regentes de turma demonstraram bastante satisfação no trabalho que estava sendo realizado por elas e pelo projeto, com isso tinham a perspectiva de continuar na escola no ano de 2013. Já os professores de educação física que relataram ao longo deste estudo muitas das suas insatisfações tiveram opiniões diferentes. O Professor de Educação Física 2 demonstrou satisfação com seu trabalho ao lado dos alunos. No entanto, demonstrou- se insatisfeito com o projeto que para ele possuía muitas falhas, tais como, a ausência de apoio da escola, a falta de coordenação do projeto, pouca disponibilidade de uso da quadra, realização de atividades pré-determinadas (futsal e basquete), etc. Apesar disso, manifestava interesse em permanecer no projeto no ano de 2013, caso mudanças fossem realizadas. Já o Professor de Educação Física 1 foi mais categórico em dizer que não estava satisfeito nem com seu trabalho pelas dificuldades encontradas nem com o projeto, sem interesse em permanecer no cargo em 2013.

Na verdade não, pelo que eu falei desde o início. Porque além do salário, o horário está muito confuso... O horário de projeto [...] Começou num horário, falou que a gente ia receber "tanto" e não recebeu... 27 aulas... nós demos aulas a mais, sem receber. Aí depois começou num horário e depois passou para outro horário. Hoje o

horário é de oito e vinte a meio-dia e quarenta, acaba perdendo o horário de almoço, se você trabalha à tarde... acaba chegando atrasado no lugar, fica muito ruim o horário, sendo que o horário normal é de sete e meia as onze e vinte... aí você tem que pegar oito e vinte para largar meio-dia e quarenta. (Professor de Educação Física 1 – Escola B).

No PEI, todos os monitores tinham interesse em permanecer em 2013 e disseram satisfeitos com o trabalho que realizaram e com o programa, apesar de as bolsistas enfatizarem a presença de problemas ainda a serem resolvidos. Os monitores, pensando na melhoria do trabalho no programa, destacaram medidas como a presença de um psicólogo e a realização de atividades interdisciplinares pelos educadores do PEI como necessárias; enquanto os professores do PROETI destacaram medidas como a maior participação dos pais, mudanças na carga horária com a inserção de horários para o planejamento das atividades na escola, cursos de capacitação, disponibilidade dos espaços físicos, entre outros.

Eu penso que a gente tem que ter alguns cursos é... de capacitação, porque, por mais que a gente busque fazer cursos, né? Eu estudei, fiz a minha graduação, fiz uma pós- graduação e “tô” querendo fazer um mestrado, mas isso eu acho que o estado também tinha que ter alguma maneira dele “tá” apoiando a gente, sabe? Tudo que a gente faz, a gente tem que gastar do nosso bolso. O salário é muito pouco, então às vezes eu deixo de “tá” fazendo cursos por causa da renda que... que vai pesar no meu orçamento. Aí eu deixo de fazer algum tipo de aperfeiçoamento por causa da questão financeira, né? (Professor de Educação Física 2 – Escola A).

Já para o Professor de Educação Física 1:

Precisa de um coordenador, de um espaço físico disponibilizado mais vezes e arrumar os horários, planejar os horários certinhos (...) Têm os monitores que foram prometidos para gente que não estão ajudando as atividades específicas da banda de fanfarra, alimentação... Os monitores até hoje não chegaram... (Professor de Educação Física 1 – Escola A).

Por fim, ao serem questionados se o programa estaria contribuindo para a melhoria da qualidade da educação, a maioria respondeu de forma afirmativa. A Bolsista Z destacou da seguinte maneira o assunto:

Sim... eu acho que têm muitos furos... não tem fiscalização... não tem nada para garantir qualidade mesmo... agora... eu acho que os alunos estarem aqui à tarde ao invés de na casa deles jogando videogame, fazendo sei lá o que que eles estariam fazendo... eles estão interagindo com outras pessoas... aprendendo coisas novas... eles estão aprendendo a lidar com outras pessoas, então, querendo ou não, contribui na qualidade... ainda não é o que se espera, mas já é ajuda... (Bolsista Z – Escola A).

Eu acredito. Eu acredito porque a gente, igual eu falei, a gente trabalha muito com valores, com respeito, com a convivência, com a forma com que cada um tem que conviver e respeitar o próximo, amar o próximo. Então eu acredito que isso aí nem que seja assim, uma semente que vai germinar daqui a um tempo, mas isso tem que fazer a diferença, né? (Professora Regente de Turma 3 – Escola A).

Diante de tudo que foi destacado nos relatos dos respondentes da pesquisa, verificamos que, apesar de experiências distintas de educação integral, o PROETI e o PEI apresentaram muitas dificuldades e condições de trabalho pouco adequadas para o bom desempenho das atividades dos docentes e de acolhimento dos alunos. Problemas de infraestrutura física, falta de horário para elaboração de atividades e planejamento, sobrecarga de trabalho e baixa remuneração foram alguns aspectos recorrentes nas falas dos profissionais das duas redes de ensino. Vimos que a docência nas experiências de educação em tempo integral tem suas especificidades e demandas diferenciadas das desenvolvidas pelos docentes no turno regular das escolas. No entanto, é oferecida aos novos educadores pouca capacitação e/ou formação para atenderem às novas exigências da docência. Seriam os docentes da educação em tempo integral capazes de assumir as novas práticas diferenciadas e inovadoras pretendidas com a pouca ou nenhuma formação recebida, orientação e tempo de planejamento? A inserção de novos sujeitos docentes como agentes culturais com saberes práticos, mas sem uma formação específica ou experiência docente, e estudantes universitários seria suficiente para proporcionar as mudanças pretendidas na educação? Discutiremos a seguir um pouco das mudanças sofridas pelo trabalho docente ao longo das últimas décadas e a inserção dos novos sujeitos docentes da educação em tempo integral na escola.