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É muito complexo definir o perfil epidemiológico da AIDS, por ser uma doença dinâmica e que apresenta uma variabilidade muito grande de comportamento nas populações que acomete. Desde a tentativa da OMS de traçar um perfil para a epidemia, seu comportamento vem mudando e, com isso, criando dificuldades na sua aplicação. A importância desta classificação, apesar de já ter desempenhado papel mais destacado na década de 80 que hoje, é que ajuda a fornecer uma idéia da dinâmica da transmissão do HIV pelo mundo.

A OMS definiu três padrões epidemiológicos para classificar a infecção pelo HIV (1989[110]), apoiando-se em dois critérios: na forma da infecção e na sua incidência. Apesar de serem reconhecidos dois sorotipos do HIV (1 e 2), o aspecto biológico do vírus não foi incluído como um critério. Apesar do HIV 1 ser hoje mais estudado e, conseqüentemente, mais conhecido, não foi observada uma diferença muito grande no que diz respeito à patogenicidade e transmissibilidade das duas formas: a forma de transmissão e a doença desenvolvida basicamente são semelhantes. O HIV 1 é a forma mais disseminada em todo o mundo, enquanto que

o HIV 2 tem sua disseminação mais limitada, tendo importância epidêmica em algumas regiões na África Ocidental.

Pelo padrão I, observado principalmente na América do Norte, do Sul e Oceania, onde exite uma intensa disseminação do vírus, principalmente associada ao homo/bissexualismo masculino e usuários de drogas de ambos os sexos. A doença atinge muito mais homens que mulheres. Esta diferença entre os sexos, que era de 15:1, está diminuindo com o passar do tempo, atingindo hoje valores mais equilibrados ao redor de 6:1 (1994[115]). A incidência em nível populacional é baixa, quando comparada com os outros perfis (menor que 1%).

Pelo padrão II, observado especialmentre na África e algumas áreas do Caribe, a transmissão se dá principalmente pelo contacto sexual, na modalidade heterossexual; a infecção acomete proporções semelhantes de homens e mulheres, e como consequência, o número de crianças acometidas é elevado decorrente principalmente da transmissão vertical.

Pelo padrão III, observado principalmente nas áreas do Sudeste da Ásia, a doença é considerada de importação, isto é, os indivíduos adquirem a doença no exterior, em regiões de padrão I ou II ou com os estrangeiros, que se deslocam para lá. Com um início mais recente (metade da decada de 80), sua prevalência é relativamente baixa, porém cresce de importância a transmissão através de UDI e heterossexual.

Posteriormente, foi definido um padrão intermediário Padrão I/II; engloba países do padrão I, que nos últimos anos vêm apresentando uma mudança da forma de transmissão, aparecendo uma significativa proporção de infecção heterossexual.

Com relação ao HIV 2, após sua descrição, em 1986, em pacientes com passagem na região ocidental da África, passou-se ao mapeamento das áreas acometidas pelo vírus, que foram bastante restritas, com ampla disseminação no oeste da África e, mais esporadicamente, em regiões que, de alguma forma, mantiveram contato com estas populações.

Desde o início da epidemia, observou-se uma mudança da participação dos casos, segundo a forma de transmissão. Se no início os casos eram predominantemente de transmissão homossexual masculina e bissexual, atualmente a transmissão heterossexual já passa a ser a mais importante, contribuindo com cerca de 70% dos casos (1991[111]). O aumento do número de

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infecções entre as mulheres traz, como conseqüência, um aumento de infectados entre as crianças.

Este comportamento dinâmico observado na AIDS, que apresenta variações temporal, local e individual, cria a necessidade de se obter um instrumento mais adequado para analisar a epidemia. O objetivo de se definir em padrões é o de conseguir desenvolver uma estrutura suficientemente sensível, a ponto de ser capaz de fornecer respostas acerca do fenômeno estudado - (a epidemia de AIDS), padrões esses que contemplem os pontos comuns, individual e populacional e que consigam incorporar mudanças, demonstrar a variabilidade e evoluções locais, nacionais e regionais, sem perder de vista a visão global da epidemia e dos avanços relacionados com seu controle.

Uma vez que a definição destes perfis epidemiológicos começa a se mostrar limitada na atual fase, algumas propostas de mudança são sugeridas, como, por exemplo, o do agrupamento das regiões afetadas em 10 diferentes categorias. Estas categorias são classificadas de acordo com três fatores: epidemiológicos, operacionais e sociais. Dentre os fatores epidemiológicos estariam os principais modos de transmissão, proporção de casos rural e urbano, masculino e feminino, disponibilidade de dados, entre outros. No que se refere aos fatores operacionais, poderíamos citar a disponibilidade política e econômica para o controle, e finalmente, quanto aos fatores sociais, o desenvolvimento humano, liberdade de regime político etc. Maiores detalhes podem ser obtidos em 1992[90].

Tendências

Na Europa, por exemplo, a Escandinávia está vivendo uma epidemia, onde a grande maioria de casos ocorre por transmissão homossexual, enquanto na Espanha e Itália menos da metade dos casos é devido a esta via. Nos EUA, apesar do número de infecções por transmissão homo/bissexual e UDI ter-se estabilizado, a via heterossexual cresceu pouco. Outra tendência observada é na América Latina, onde a categoria de transmissão homo/bissexual diminuiu e tem-se observado um grande número de casos em heterossexuais, explicado, pelo menos em parte, pelo aumento do número de UDIs.

No sudeste Asiático, observou-se que, quando a epidemia atingiu os UDIs e as prostitutas, cresceu acentuadamente o número de casos (Bangcoc, na Tailândia e

Yangon na China), e trouxe, como conseqüência, uma maior magnitude na participação do padrão heterossexual na epidemia da região (1994[95]). O fato de a

região contar com metade da população mundial, tendo a via heterossexual como um importante padrão na transmissão, leva a crer que um grande desastre se aproxima, caso os mecanismos de controle não sejam eficientes.

Em contrapartida, na região SubSaara africana, a infecção claramente definida como heterossexual, não teve mudança quanto à principal via de transmissão, porém sai dos centros urbanos e dirige-se para as regiões rurais, onde a população é maior, o que irá implementar as características desastrosas desta epidemia.

De uma maneira geral houve mudança, refletida na razão homem/mulher, em vários países. Nos EUA, este perfil mudou pouco, mas, mesmo assim, as mulheres estão se contaminando mais que no início da epidemia. Nas Américas (sem EUA) já atingiu a casa dos 20:1 e hoje chega a 5:1 (1994[115]). Isto pode ser

atribuído, pelo menos em parte, à infecção, que vem ocorrendo predominantemente através da transmissão sexual com parceiros que se infectaram pelo contato bissexual, ou utilizando drogas injetáveis (1994[115]).

No Brasil

O Brasil é o país que apresenta o maior número de casos notificados de AIDS da América Latina, com 55.894 casos, e é superado, no quadro mundial, somente pelos EUA com 401.789 casos (1995[109]). Sua incidência continua a

crescer de maneira significativa, atingindo faixas etárias cada vez mais jovens. A distribuição de casos acumulados notificados de AIDS no Brasil referente a atividades de risco, pelo ano de diagnóstico, é a seguinte (1994[20]).

• sexual 51%

• transfusional 28%

(UDI) (23%)

• perinatal 2%

• não definida 19%

Como já foi referido anteriormente, as notificações de AIDS, segundo o ano de diagnóstico, estão sujeitas a uma série de erros, que necessitam de correção. Segundo o MS, estas notificações caminham da seguinte forma: 45 % no ano do

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diagnóstico, 30 % no ano seguinte e os restantes 25 % nos anos subsequentes (1994[20]).

O Estado de São Paulo participa com aproximadamente 60% dos casos notificados no Brasil (1994[20]) e a distribuição, segundo as atividades de risco, basicamente acompanha o panorama nacional (1994[23]).

• sexual 51%

• transfusional 35%

(UDI) (32%)

• perinatal 2%

• não definida 11%

O problema da transmissão do HIV, através do uso de drogas injetáveis, assume papel de grande importância. Para ilustrar tal afirmativa, podemos citar a cidade de Itajaí, Santa Catarina, que, como outras, era poupada pela infecção do virus e, devido a esta forma de transmissão, aparece hoje com a segundo maior coeficiente de incidência acumulada por habitante do país (1980-94), 306,6/100.000 hab. (313 casos) perdendo somente para Santos com 364,0/100.000 hab. (1686 casos) que contribuem com 0.5% e 2,9% dos casos do Brasil respectivamente (1994[20]).

Por ocasião do estudo, o coeficiente de incidência de casos na cidade de Santos era de 62,7/100.000 habitantes; hoje este coeficiente está ao redor de 67,7/100.000 habitantes (1994[20]), contribuindo com 3% dos casos notificados do

Brasil e 5% do Estado, sendo a segunda cidade do Estado e ficando atrás de S.Paulo com 53% dos casos.

Segundo a Secretaria Municipal da Saúde de Santos, a cidade contava em 1991, com 1502 casos de AIDS em pacientes adultos e sua distribuição na cidade evidencia a Orla e o Centro como os principais locais de ocorrência da doença (1991[17]).

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