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Perfil socioprofissional dos participantes do estudo

Para análise e discussão dos dados, num primeiro momento, traçou-se um perfil socioprofissional dos participantes do estudo.

Os dados pessoais e profissionais evidenciam que os participantes do estudo são 41 trabalhadores do SUS, sendo 34 mulheres e sete homens. A predominância majoritária do sexo feminino (82,93%) reporta a inserção histórica da mulher no setor saúde e, sobretudo, na Enfermagem, que desde os primórdios da civilização era responsável por cuidar dos idosos, crianças e doentes.

Quanto à categoria profissional, foram entrevistados quatro ACS, três cirurgiões- dentistas, 24 enfermeiros, oito médicos, uma técnica de enfermagem e um psicólogo. Cabe esclarecer que a presença do psicólogo está vinculada à realização de entrevista com representante da gestão municipal.

A participação predominante dos enfermeiros também é citada pelos participantes do estudo no decorrer das entrevistas

Lá na minha unidade foram mais as enfermeiras que fizeram o curso (MOC9). Acho que a maioria são enfermeiros, são poucos os médicos. Maioria é enfermeiro (JF13).

A TAB. 4 demonstra os dados que caracterizam os participantes do estudo quanto à profissão e ao sexo.

TABELA 4 - Distribuição dos participantes do estudo por profissão e sexo, Minas Gerais, 2014

Fonte: elaborado para fins deste estudo, 2014.

Em relação à faixa etária dos profissionais pesquisados, observou-se que a de maior prevalência é a dos 30 aos 39 anos (12), seguida pela faixa dos 40 aos 49 anos (11) e, posteriormente, por 25 aos 29 anos (10). A média de idade é de 39,2 anos, o que permite inferir que a equipe é composta de profissionais mais jovens e encontra-se em uma faixa etária produtiva.

Avaliando-se os dados referentes ao estado civil, constata-se que 22 são casados, 15 solteiros, três divorciados e uma viúva.

Em relação à formação, 53,66% dos participantes do estudo se graduaram em instituição pública, sendo que a média de tempo de formado é de 13,25 anos, com extremos entre dois e 43 anos. Apenas no município de Montes Claros é que o dado de formação em instituição de ensino privado supera as instituições públicas.

Respondendo à solicitação de que fizessem uma narrativa sobre a trajetória vivida na formação profissional, alguns participantes relataram aproximação com a temática da saúde pública e atenção primária, no entanto, outros demonstraram distanciamento.

Foi uma trajetória muito boa porque eu podia aproveitar os professores, foram bons, a questão da academia, é, um pouquinho de deficiência na parte de estágio que a gente teve, mas eu procurei fazer estágios extracurriculares para suprir esta demanda. Eu sempre gostei desta área e fazer alguns cursos, mesmo que de curta duração para estar aperfeiçoando meu aprendizado (MOC11).

Profissão Masculino Feminino Total

% % % ACS - - 4 11,76 4 9,75 Cirurgião-dentista 1 14,29 2 5,88 3 7,32 Enfermeiro 2 28,56 22 64,71 24 58,54 Médico 3 42,86 5 14,71 8 19,51 Técnica de Enfermagem - - 1 2,94 1 2,44 Psicólogo 1 14,29 - - 1 2,44 Total 7 100 34 100 41 100

É uma escola nova que tem um novo método de ensino, que é o PBL [Aprendizado Baseado em Problemas]. Então, desde o primeiro ano eu já trabalhei com saúde pública, inserida no serviço de saúde, e acho que foi isso que me norteou assim, para trabalhar mesmo com atenção primária (UBL2). Quando formei tive muito pouca base de Estratégia Saúde da Família, fiz poucos preventivos, trabalhei muito pouco com prevenção, aquela coisa assim. Ainda bem no início percebi que a minha formação na universidade deixou a desejar, então minha formação era mais de hospital (JF17).

No caso dos ACS, que não possuem a exigência de ter ensino superior para desenvolver as atribuições profissionais, sendo a inserção no mercado de trabalho por meio de capacitação introdutória, verifica-se que todos os entrevistados possuem ou estão finalizando uma graduação. Nesta, predomina o Serviço Social, por considerarem a direta relação com o trabalho desenvolvido com as famílias da área de abrangência da ESF.

Verificou-se que 87,8% dos participantes possuem algum tipo de especialização, prevalecendo os cursos Latu Sensu voltados para a área da saúde da família. O interesse pela continuidade do estudo após a graduação foi manifestado como uma possibilidade de ampliação dos conhecimentos e aquisição de competências e habilidades específicas relacionadas à área de atuação, como evidenciado nos discursos.

Tenho especialização em Gestão de Serviço de Sistemas de Saúde, que também foi pela UNIMONTES, que me proporcionou mais uma visão geral sobre o sistema de saúde, sobre o Sistema Único de Saúde, voltado para a saúde pública mesmo (MOC5).

Após a pós-graduação eu consegui inserir no mercado de trabalho e comecei pela prefeitura prestar serviço no pronto-atendimento e logo em seguida recebi uma proposta de ir para a Saúde da Família (MOC8).

Neste período que eu fiquei um ano sem trabalhar na área eu procurei me especializar, fazer umas especializações, fiz em Gestão de Sistemas de Saúde e em Saúde da Família, e aí eu também intercalei elas com cursos de curta duração e média duração para eu poder também estar aperfeiçoando mais o meu aprendizado (MOC11).

O tempo de serviço no estabelecimento de saúde onde atualmente os profissionais se encontram desenvolvendo suas atribuições profissionais apresenta predominância na faixa entre um e cinco anos (18), seguida pelas faixas de menos de um ano e de seis a 10 anos (nove por faixa). Apenas cinco profissionais trabalham há mais de 10 anos no mesmo local.

O tempo de permanência num mesmo estabelecimento é visto pelos participantes do estudo como de fundamental importância para a qualificação das ações de atenção primária, considerando os atributos previstos para este nível de atenção.

São sete anos. Eu falo que a gente é mais que agente de saúde, né? A gente já virou amigo dos usuários, conhece tudo, os problemas, tudo isso (JF1).

Eu nunca mudei de equipe, eu entrei e permaneci, então é mais fácil da gente estar lidando com a comunidade, de estar sabendo, de estar levando (MOC10). A quantidade de profissionais da saúde que estão aí em permuta frequente faz com que esta relação médico-paciente fique prejudicada, a comunidade fica prejudicada e a visão do que é atenção primária também fica prejudicada e o atendimento também fica prejudicado, e faz com que também haja o aumento cada vez maior do pronto socorro, o aumento cada vez maior de cirurgia, o aumento cada vez maior de internações (MOC13).

Foi também apurada rotatividade dos profissionais nos estabelecimentos de atenção primária, conforme se pode constatar nos relatos. Sabe-se que a estabilidade na atenção primária é fundamental na construção do vpinculo, integralidade e continuidade do cuidado.

Por não ter o local para atender eu pedi para me mudarem de local, apesar da minha relação com os pacientes ser muito boa lá (UBL2).

Mas teve muita gente que mudou também (UBL5).

A relação entre a instabilidade profissional e a redução no entusiasmo, descontentamento, insatisfação, além de frustração de expectativas, é comentada por um dos participantes: “Com essa troca, troca, de posto eu fiquei meio desanimada, sabe? Porque você começa um trabalho e nunca consegue dar andamento” (JF12).

Respondendo à solicitação de que fizessem uma narrativa sobre a trajetória no serviço de saúde, alguns participantes relataram dificuldade de inserção profissional, fato especialmente registrado pelos profissionais atuantes no município de Montes Claros.

Só consegui trabalhar depois de três anos e meio. Agora estou com quatro meses com experiência como profissional de Enfermagem mesmo, atuando. Eu atuava na atenção básica como auxiliar de consultório odontológico, mesmo com o técnico (MOC4).

Fiquei o período de 2010 e 2011 sem trabalhar (MOC8).

No município de Montes Claros foi explicitada a inserção dos profissionais na atenção primária por influência de alguns programas, como, por exemplo, o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (PROVAB) e a residência multiprofissional e inserções mais pontuais, como se pode apreender nos discursos.

Eu fui convidada a trabalhar lá para cobrir uma licença maternidade de uma profissional, e aí com 15 dias que eu estava lá eles me convidaram para assumir essa outra equipe, que o profissional tinha pedido para sair do cargo e eu acabei assumindo [...] Quando foi em março eu me desliguei da prefeitura, pedi demissão do cargo e comecei com a residência multiprofissional em Saúde da Família, pelo governo federal (MOC1).

Eu comecei a atuar como enfermeira pelo PROVAB (MOC4).

Eu sempre tive vontade de atuar na atenção primária, então, quando surgiu a oportunidade, que eu fui aprovada na residência, então eu resolvi largar a área hospitalar que eu já tinha muita experiência (MOC9).

No município de Juiz de Fora, para os participantes a inserção dos profissionais nos estabelecimentos de atenção primária é marcada pela vinculação com a realização de concurso público.

Por dificuldades familiares eu acabei tendo que optar por fazer concurso público para poder ter uma estabilidade e ficar em Juiz de Fora (JF1).

Passei no concurso da prefeitura e comecei a trabalhar como enfermeira da Estratégia Saúde da Família (JF2).

A gente sabe que a gente é descartável sendo concursado, imagina não sendo, né? Então teve uma oportunidade numa cidadezinha de fazer Saúde da Família, aí eu fiz concurso numa cidade perto de Juiz de Fora, aí passei [...] Nesse meio tempo meus familiares adoeceram e aí eu tive que voltar para Juiz de Fora, aí veio o concurso e eu passei. Foi uma batalha porque a gente levou quase três anos para ser efetivado na vaga que a gente já trabalhava (JF12).

Em relação ao município de Uberlândia, percebe-se que os profissionais estão inseridos na rede de serviços por diferentes vínculos trabalhistas.

Nós temos no setor sanitário sul da cidade, nós temos a administração deste setor pela Missão Sal da Terra, uma organização social, então são 21 equipes Saúde da Família, duas UAIs [Unidade de Atendimento Integrado] e aí tem uma unidade básica de saúde tradicional, que é, não é da Missão Sal da Terra, mas todo restante do setor sim. Nós temos profissionais que são da Fundação Maçônica Manuel dos Santos, que é uma fundação que administra a cidade há muitos anos, há mais de 10 anos, não se caracteriza como organização social, mas fica fazendo esta administração direta, e que está tendo um processo de transição para uma fundação pública de direito privado que é a FUNDASUS [Fundação Saúde do Município de Uberlândia]. Então todos os profissionais que são Fundação Maçônica passarão para funcionários da FUNDASUS, então está tendo processo seletivo simplificado, temporários ainda, para depois haver o concurso público pela FUNDASUS. Além disso, tem os profissionais da Prefeitura de Uberlândia, então são os vínculos, todos aqueles vínculos de FUNDASUS, Fundação Maçônica e Missão Sal da Terra são vínculos celetistas, CLT [Consolidação das Leis Trabalhistas], e os outros profissionais são vínculos da prefeitura, aí é o estatutário. Então, temos diferentes cenários e diferentes tipos de contratação de vínculos empregatícios no município. G [não informado o número para não

Em relação à existência de outro vínculo empregatício entre os participantes do estudo, seis profissionais (14,63%) trabalham em outro estabelecimento, sendo instituição de ensino (dois), outro estabelecimento de saúde (três) e nestes dois estabelecimentos de forma concomitante (um). Inclusive, a relação de complementaridade entre ensino e serviço é mencionada em um dos discursos. “Eu tento conciliar as duas atividades, a de docente e de cirurgiã-dentista que trabalha na ponta, no serviço, porque uma atividade é complementar à outra” (MOC2).

As narrativas dos participantes, cujo processo de trabalho em atenção primária é problematizado, acabam indicando algumas percepções sobre o SUS e a ESF, modelo organizativo da atenção primária, considerando o espaço onde cada um está inserido.

O pouco que a gente conhecia do SUS eram sempre críticas muito negativas, a partir do momento que você começa a fazer parte do sistema, que é necessário o conhecimento das leis que regem e como é que funciona, como é que se estrutura, eu passei a ser um militante (JF5).

Na Estratégia Saúde da Família é fundamental o trabalho em equipe, com isso você consegue participar, dividir seu trabalho também, sabe, isso tudo é importante, porque a Saúde da Família é imensa, é uma coisa assim, muito grande, então um tem que ajudar o outro, não tem como ficar só o médico, o médico, tem que ser o médico, enfermeiro, assistente social, tem que ser um trabalho de equipe. [...] A Saúde da Família não veio pronta, a cada dia surge uma novidade. É um programa político, tem esse lado também, a necessidade de estar sempre fazendo uma educação continuada, seja on-line, seja cursos aqui na unidade (JF16).

Com a mudança do pensamento dos gestores, e do próprio governo, e depois da implantação da Saúde da Família isso começou a mudar, vieram as atividades coletivas, a parte da promoção da saúde, teve uma mudança muito grande, precisa mudar muita coisa ainda, mas os primeiros passos já foram dados (MOC2).

Apesar da riqueza de informações dadas pelos participantes sobre aspectos importantes do SUS, optou-se por garantir o recorte do objeto deste estudo, que é o potencial dos cursos realizados pelo Canal Minas Saúde em gerar processos de educação permanente no ambiente de produção de serviços de saúde.

Os dados demonstram que os profissionais, diante de uma reflexão sobre o trabalho desenvolvido na atenção primária, em especial no âmbito da ESF, reconhecem a necessidade de processos educacionais que auxiliem na construção do modelo de atenção à saúde.