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Antes de se falar das estratégias político-eleitorais dos parlamentares maranhenses que escreveram livros, é preciso demonstrar as estruturas oficiais que estavam em disputa. Os níveis de cargos legislativos no período imperial e republicano são quatro. No Império: vereador, deputado provincial, deputado geral e senador. O presidente do conselho de ministros (primeiro-ministro) tinha natureza executiva36. Na república: vereador, deputado estadual, deputado federal e senador.

No âmbito regional, o Executivo cabia aos presidentes de província, esses últimos nomeados pelo monarca após as indicações partidárias derivadas da configuração da maioria e minoria parlamentares.

O cargo de presidente do conselho de ministros, ou primeiro-ministro (o máximo da Administração Pública que poderia ser alcançado por um cidadão, tomado aqui, por isso, em paralelo com o de presidente da república, em que pese as diferentes e bem marcadas configurações de um e de outro) foi abolido em 1891 com a adoção do presidencialismo. Sua criação se dera pelo decreto imperial nº 523 de 20 de julho de 1847:

Crea hum Presidente do Conselho dos Ministros.

Tomando em consideração a conveniencia de dar ao Ministerio huma organisação mais adaptada ás condições do Systema Representativo: Hei por bem crear hum Presidente do Conselho dos Ministros; cumprindo ao dito Conselho organisar o seu Regulamento, que será submettido á Minha Imperial Approvação. Francisco de Paula Sousa e Mello, do Meu Conselho d'Estado, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio, o tenha assim entendido, e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte de Julho de mil oitocentos quarenta e sete, vigesimo sexto da Independencia e do Imperio. (BRASIL, 1847)

Seu exercício, por agentes vinculados às ―organizações partidárias‖ imperiais se deu da seguinte forma:

Durante o Segundo Reinado a presidência do Conselho de Ministros foi ocupada por políticos vinculados ao Partido Liberal em 17 oportunidades, enquanto os políticos conservadores estiveram à frente por 15 vezes. Entretanto, quando observamos o

36 Com efeito, ele era escolhido pelo Imperador, e não pelo parlamento. Essa percepção atribui ao Poder

Moderador um protagonismo efetivo na condução da política central do Segundo Reinado. Faoro (2001), por exemplo, entende que o Imperador escolhia o partido que ascenderia ao poder nas eleições legislativas, definindo também os instrumentos que proporcionariam a obtenção da maioria parlamentar, e isso através da nomeação de determinados agentes em postos-chave, incluindo aí o presidente do conselho de ministros, constituindo assim o governo. Daí se acreditar que os ministérios, ordinariamente, no parlamentarismo brasileiro, não eram produzidos pelas eleições, antes o contrário. Durante a monarquia, a organização da estrutura de poder se dava a partir de um ―parlamentarismo tácito‖ ou ―consuetudinário‖, pois não estava previsto formalmente na Constituição Política do Império do Brasil, de 1824.

tempo de permanência de cada um destes partidos à frente do órgão, este aparente equilíbrio é rompido, ficando os Conservadores à frente do governo por um total de 27 anos, enquanto os Liberais estiveram no poder por apenas 15 anos e cinco meses, praticamente a metade do tempo. (ALMEIDA, 2014, s/p)

Detinha uma função menos importante, comparativamente, à do presidente da república, mas próxima dela em termos de concentração de poder institucional. O que se destaca, no entanto, é o fato de que nenhum dos dois cargos jamais foi alcançado por qualquer dos deputados-escritores.

No governo do país, durante o Império, esteve em sua chefia o maranhense João Bráulio Moniz (Maranhão, 1796 - Rio de Janeiro, 1835). Foi ele deputado-geral pela província de nascimento, integrou o Conselho Geral da Província, e a chamada ―Regência Trina Permanente‖, como representante político do Norte (incluindo o atual Nordeste), entre 1831 e 1835.

Concluiu o curso de direito na Universidade de Coimbra, e na década de 1830 foi residir em São Paulo, onde fundou com colegas de faculdade – futuramente quadros dirigentes do governo central – a primeira tipografia daquela cidade. Moniz dedicou-se a publicar seus posicionamentos políticos em periódicos como ―Astrea‖ e ―O Pharol Paulistano‖, e não editou livros. Sendo assim, por suas características particulares, não integrou o conjunto dos deputados-escritores.

Quanto ao período republicano, outro maranhense estivera em posição similar: Urbano Santos da Costa Araújo (Guimarães, 3 de fevereiro de 1859 – em viagem naval entre o Maranhão/Rio de Janeiro, a 7 de maio de 1922). Seu pai foi Antônio Brício de Araújo, senhor de engenho que se instalou na Capitania de Cumã (município de Guimarães) no início do século XIX. Da ―família‖ Costa Araújo saiu mais de uma liderança política. Antônio Brício de Araújo Júnior, por exemplo:

Antônio Brício de Araújo nasceu na comarca dos Guimarães (MA), filho de Antônio Brício de Araújo. [...] ingressou na carreira política filiando-se ao Partido Republicano, em cuja chapa, encabeçada por Herculano Nina Parga, foi eleito primeiro vice-presidente do Maranhão em 1914. Com o afastamento do titular para concorrer a uma cadeira na Câmara dos Deputados, assumiu o governo do estado em 20 de março de 1917. Para o quadriênio 1918-1922, foi eleito presidente estadual seu irmão Urbano Santos, então vice-presidente da República [...]. Assumiu então o governo o segundo vice Raul da Cunha Machado, até 21 de outubro, quando Urbano Santos foi empossado, para logo se licenciar. Deputado estadual por duas legislaturas, Antônio Brício deixou a Assembleia estadual em agosto de 1922 para assumir a intendência (prefeitura) de São Luís em substituição a Raimundo Gonçalves da Silva [...]. Em 1929 foi eleito senador pelo Maranhão. Concomitantemente, elegeu-se vice-presidente do estado na chapa liderada por José Pires Sexto, cujo governo durou pouco mais de sete meses – de 1º de março a 8 de outubro de 1930. (CARNEIRO; LOPES, [2013?a], p.1)

Esses irmãos eram netos do 2º Barão de Jaguarari, Marcos Antônio Brício, com ramificações e propriedades no Pará (COUTINHO, 2005b, p. 457). Durante a pesquisa, encontrou-se referência a um deputado nomeado de ―Costa Araújo‖ (COUTINHO, 1981).

No entanto, o nome político de Urbano Santos da Costa Araújo era apenas ―Urbano Santos‖. É possível, contudo, que assinasse ―Costa Araújo‖ nas atas parlamentares, e o que Coutinho (1981) deve ter achado é o mesmo ―Urbano Santos‖. Porém, sem absoluta certeza, ele não constou no rol dos deputados-escritores.

Elegeu-se deputado federal de 1897 a 1905, governador do Maranhão em 1913, senador entre 1906 e 1914, vice-presidente da República entre 1914 e 1918, assumindo a presidência em 1917. Mais ainda, foi reeleito para a vice-presidência na chapa de Arthur Bernardes em 1922 (morreu à caminho da posse), não consta que tenha publicado livro.

Segundo o sítio do Senado Federal, é de sua autoria apenas um artigo jurídico, publicado em revista: ―Impostos sobre a transmissão de apólices e embarcações: direitos da União aos terrenos de marinhas. Revista de Legislação, Doutrina e Jurisprudência, v. 96. p. 185-192, jan./abr. 1905‖. (BRASIL, 2015b)

Figura 5 - Senador Urbano dos Santos

Dessa maneira, pode-se afirmar que os deputados-escritores maranhenses não ocuparam os cargos mais elevados do primeiro escalão eletivo do poder nacional, mas alcançaram posições próximas, na Câmara dos Deputados e Senado, no Império e na República. Na primeira dessas casas legislativas, com uma única presidência, a Gomes de Castro, na década de 188037, e a segunda, já no século XX, com uma vice-presidência em 1936, por Clodomir Serra Serrão Cardoso. Veja-se o quadro que segue:

Quadro 9 - Cargo legislativo eletivo mais alto ocupado38

Cargo Número Deputado provincial/estadual 24 (presidente da casa/vice) 6 Deputado geral/federal 25 (presidente da casa/vice) 1 Senador 10 (presidente da casa/vice) 1

Presidente do conselho de ministros -

Total 59

Fonte: Coutinho (1981), e outros

Do total de 59 deputados-escritores, 24 conseguiram alcançar tão-somente a deputação regional (40,67%). Número semelhante foi o daqueles que ascenderam até a deputação geral/federal (foram parlamentares maranhenses antes ou depois, com 42,37%), e apenas 10 atingiram o senado imperial/federal (16,94%), ocupando, portanto, as funções parlamentares maranhense e nacional, além desse último. Cerca de 10% ocupou a presidência/vice da Assembléia, e apenas 1,69% o posto de liderança na Câmara dos Deputados e Senado (Império/República).

Na verdade, em termos absolutos, o número encontrado é próximo da nulidade (1), resultado da progressiva periferização do Maranhão na distribuição do poder nacional, e a

37 Augusto Olympio Gomes de Castro é pai de dois deputados-escritores. O mais velho, magistrado no Rio de

Janeiro, Francisco José Viveiros de Castro. O mais novo, tornado ministro do que é o atual Supremo Tribunal Federal – STF, Augusto Olympio Viveiros de Castro. ―Gomes de Castro‖ (seu nome político) foi ―chefe‖ da chamada ―ala castrista‖ do Partido Conservador, tornada republicana após o golpe militar de 15 de novembro de 1889, que instalou a República. Foram os chamados ―Republicanos de 16 de Novembro‖, muito estimados pelo governo central provisório do Rio de Janeiro. Para a aceitação da República no Maranhão, foi fundamental o apoio de Gomes de Castro, pois a outra ―ala‖ dos Conservadores, a ―maísta‖ (batizada assim por causa do deputado-escritor José da Silva Maia) era minoritária, assim como o chamado ―Clube Republicano‖, ambos com pouquíssima expressão eleitoral. Os membros do antigo Partido Liberal, naquela conjuntura, tentavam se reorganizar, porque o gabinete deposto com a monarquia, o do Visconde de Ouro Preto, pertencia a ele.

esmagadora concorrência com outros deputados-escritores, especialmente das entidades políticas centrais: Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco. Como dito alhures, nenhum deles logrou ascender à presidência do conselho de ministros.

Os cargos executivos de primeiro escalão (chefias do Poder Executivo) não foram uma alternativa prevalecente, mas, sem dúvida, importante. A rigor, os agentes que os acessaram conseguiram outros níveis superiores de poder, em especial a deputação geral/federal. Essa, por sua vez, diversificava bastante a entrada nos principais quadros administrativos nacionais, como os ministérios. De fato, dos 59 deputados-escritores, 35 foram parlamentares na Assembleia Geral/Congresso Nacional (Câmara e Senado), ou seja, 59,32%. Enquanto isso, cerca de 39% foram presidentes de província/governadores:

Quadro 10 – Cargos executivos ―eletivos‖

Cargo Número de deputados Número

de nomeações / mandatos / assunção ao cargo

Prefeito (intendente/equivalente) 6 6

Presidente de província / governador / interventor / vice

23 38

Presidente da república/vice - -

[Não ocupantes] [30] -

Total 29 44

Fonte: Coutinho (1981), e outros

A presidência de província tinha previsão legal na Constituição Política do Império do Brasil nos art. 165 e 166, do Título 7º, ―Da Administração e Economia das Províncias‖, Capítulo 1º ―Da Administração‖ (BRASIL, 1842, p.76). Os presidentes eram nomeados pelo Imperador, escolhendo-se, ordinariamente, alguém que não fosse nativo da província a ser presidida, conforme as indicações fornecidas pelo partido que se estabelecesse no poder nacional após as eleições legislativas. Por definição, não possuía um mandato39, e nos termos do art. 165, exonerado ―quando entender que assim convém ao bom serviço do Estado‖ (BRASIL, 1842, p.76). Essa circunstância de flagrante instabilidade, para o mandatário, foi bem narrada por um dos deputados-escritores maranhenses, João Francisco

39 Era técnica que, se acreditava, impediria o domínio de um único ―partido‖ no poder provincial, em torno do

mandato do presidente mandatário. Isso, teoricamente, ―enfraqueceria‖ os agrupamentos locais em face do poder central.

Lisboa (1995, p. 51-52):

[...] sua excelência despertava em sobressalto, e banhada a fronte em gélido suor, ao ruído de um pretendido tiro de canhão, mensageiro importuno que lhe anunciava a chegada de um imaginário vapor40. E nas salas esplêndidas do baile, ou no meio das

alegrias dos banquetes que a inesgotável hospitalidade da província ainda não tinha cansado de oferecer ao seu digno administrador, quantas vezes não se surpreendia ele, pobre Baltasar temporário e amovível, a ler no papel acetinado das paredes, traçados por uma mão proterva e invisível, os funestos e fantásticos caracteres, que dançando e fulgurando com magia infernal aos seus olhos e à sua alma atribulada, diziam a palavra fatal e abrasadora: - DEMISSÃO!

Ora, em virtude disso, cumpria ao Poder Legislativo da província escalar os vice- presidentes, esses sim ―nativos‖, e plenamente engajados nas disputas pelos cargos administrativos regionais. Ocupando ―interinamente‖ o poder, enquanto um novo presidente não era nomeado pela Corte, e assumisse a respectiva função, os vice-presidentes de forma direta operavam o poder, formando e fortalecendo suas redes de apoiadores – e opositores. Sendo assim, vários parlamentares que escreveram foram presidentes de província, como Augusto Olympio Gomes de Castro, no Piauí, de 28 de agosto de 1868 a 3 de abril de 1869, e no Maranhão, nestes períodos: de 28 de outubro de 1870 a 19 de maio de 1871; de 14 de outubro de 1871 a 29 de abril de 1872; de 4 de outubro de 1873 a 18 de abril de 1874; de 28 de setembro de 1874 a 22 de fevereiro de 1875, e de 7 de julho a 25 de julho de 1890.

Mesmo nos casos das nomeações à presidência de outras províncias, essas foram, majoritariamente, ―próximas‖ do Maranhão, como no caso de Antônio Jansen de Mattos Pereira, que também exerceu a do Piauí em 1886 ou de Heráclito Graça, presidente da Paraíba, de 25 de junho a 11 de novembro de 1872 e do Ceará, de 23 de outubro de 1874 a 1 de março de 1875. No particular, a Província do Piauí foi prevalecente, com ao menos cinco casos identificados. É bem se perceber que, já no século XIX, essa era uma das divisões administrativas menos relevantes do país, em termos econômicos.

40 Na década de 1840, quando se passa a narrativa, as notícias e despachos do governo central chegavam ao

Maranhão através de embarcação própria, vulgarmente nomeada de ―vapor‖. No entanto, não era um vapor ―puro‖ (típico das últimas décadas do século XIX), pois, àquele tempo, a tecnologia conjugava o motor à vapor ao sistema de mastros e velas. Quando as embarcações despontavam no horizonte, a guarda da Fortaleza de São Marcos (SILVA FILHO, 1998, p.185), montada sobre um promontório defronte à baía de mesmo nome (a fortaleza original tinha um farol, e ambos desapareceram, tombados à praia pela erosão, mas, em lugar próximo, atualmente, há outro sinalizador de pequeno porte da Marinha do Brasil, o que lhe faz ser nomeado de ―Ponta do Farol‖), disparava salvas de canhão, a fim de que, com os estampidos, a cidade de São Luís, geograficamente atrás, soubesse da aproximação do navio. No caso em comento, uma pequena multidão já aguardava no porto a embarcação – acorreram ao local após os avisos da guarda de São Marcos – e viram, no mastro principal, a flâmula do Império, exclamando ―[...] todos a uma voz: - Bandeira imperial no tope grande!‖ (LISBOA, 1995, p. 55). De fato, pelo vapor, naquela hora, chegavam as exonerações a mando do governo central: ―Presidente para o Maranhão! anunciou o fatal telégrafo [...]‖ (LISBOA, 1995, p. 56).

Foi esse o caráter que definiu a ocupação do Poder Executivo provincial pelos deputados-escritores: senão apenas o Maranhão, as províncias próximas, mas em geral marginais na hierarquia do poder nacional. Raros foram os casos que fugiram a esse padrão. Fábio Alexandrino de Carvalho presidiu a Província do Pará em 1863. Em que pese a posição limítrofe dela com o Maranhão, tinha certo destaque (muito aumentado por causa da borracha no Entresséculos XIX/XX), posta a importância de sua capital, Belém, cidade comercial e estratégica para o domínio da foz do Amazonas e, portanto, das vastidões rio acima.

Havia mesmo uma simbologia que envolvia a região, vez que a Constituição do Império outorgava, automaticamente ao filho primogênito do Imperador, o título de ―Príncipe do Grão-Pará‖: ―Art. 105. O Herdeiro presumptivo do Imperio terá o Titulo de ―Principe Imperial‖ e o seu Primogenito o de ‗Principe do Grão Pará‘ [...].‖ (BRASIL, 1842, p.32). Além disso, o presidente demitido – que logo em seguida caíra entorpecido ante a infausta notícia trazida pelo vapor – como consolo, ouvia de seus próximos: ―Há de ser bispo – dizia um. Ou então presidente do Pará – acudia outro.‖ (LISBOA, 1995, p. 56). Ora, pelo dito, esse não parece mesmo ser um cargo menor. Ao contrário, é quase como se uma promoção fosse, tão relevante quanto a posição de um bispo católico.

Figura 6 – ―Para: vue prise sur le fleuve‖41.

Fonte: Reclus (1894)

41 ―Pará: vista a partir do rio‖. Cidade do Pará, Belém, no final do Oitocentos (RECLUS, 1894, s/p). Note-se o

Já o de governador, por sua vez, é oficialmente criado pelo permissivo constitucional de 1891, que adota, em termos jurídicos42, o modelo norteamericano, organizando as antigas províncias em estados federados que, em tese, formariam a entidade autônoma ―União‖, superior a eles e governada pelo presidente (e vices) da República. O próprio nome oficial da nação passa a ser ―República dos Estados Unidos do Brasil‖ (BRASIL, 1891). Conforme o novo arranjo, desaparecia a nomeação oriunda do poder central, e a eleição do governador se dava segundo a lógica do cargo de presidente: ―Art 47 - O Presidente e o Vice-Presidente da República serão eleitos por sufrágio direto da Nação e maioria absoluta de votos.‖ (BRASIL, 1891).

Na primeira constituição republicana maranhense, a ―Constituição Política do Estado do Maranhão‖, também do ano de 1891, a técnica eleitoral para a chefia do Executivo estava prevista no art. 50, ―Seção II, Das eleições do Governador e Vice-Governadores‖, com suas atribuições descritas nos art. 56 e 57 e responsabilidades (criminais) no 58 (COUTINHO, 1981, p. 180-182). O eleito passava a deter um mandato de quatro anos.

A forma federativa, enquanto articulação importada, tomou contornos próprios no Brasil, estabelecidos essencialmente no ―conflito‖ da prescrição legal com a materialidade das operações institucionais. Afastada do pressuposto de relativo equilíbrio político-econômico entre os estados norteamericanos, maximizou, na República dos Estados Unidos do Brasil, a distância hierárquica entre os agentes políticos regionais na organização do poder central.

Os níveis de importância das províncias já haviam sido parcialmente reconhecidos na Constituição de 1824, quando da definição do número de cadeiras nos parlamentos locais: ―Art. 73. Cada um dos Conselhos Geraes constará de vinte e um Membros nas Provincias mais populosas, como sejam Pará, Maranhão, Ceará, Pernambuco, Bahia, Minas Geraes, S. Paulo, e Rio Grande do Sul; e nas outras de treze Membros.‖ (BRASIL, 1842, p.27).

Mas, na ordem republicana, tal estratificação ―desaparecera‖ do documento constitucional, vez que a constituição de 1891 delegou a essas unidades federadas sua própria organização, mantendo-as no mesmo patamar de tratamento jurídico. A diferença residia na representação nacional, segundo o quantitativo de deputados na Câmara, que disponibilizaria assentos proporcionais à população dos estados.

42 O que, para os Estados Unidos da América do Norte foi uma construção política progressiva até sua

independência, no Brasil, tal formato foi dado por decreto, o primeiro da República, no dia de sua instalação: ―Decreto nº 1, de 15 de Novembro de 1889. Proclama provisoriamente e decreta como fórma de governo da Nação Brazileira a Republica Federativa, e estabelece as normas pelas quaes se devem reger os Estados Federaes. [...] Art. 2º. As Províncias do Brazil, reunidas pelo laço da federação, ficam constituindo os Estados Unidos do Brazil.‖ (BRASIL, 1889).

Contudo, para além do Direito, não só as divisões subsistiram, como se reconfiguraram, em demérito do Maranhão. Apesar de eventuais divergências teóricas a respeito disso, invariavelmente, na República, ele tomaria um papel subalterno, ou, no máximo, simbólico:

Barbosa Lima Sobrinho foi responsável pela disseminação de um esquema que dividia as oligarquias estaduais em três classes ou grandezas: Minas, São Paulo e Rio Grande do Sul pertenciam à primeira; Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia, à segunda grandeza; os demais estados brasileiros, à terceira grandeza. As oligarquias dominantes tinham seu poder fundamentado em uma economia dinâmica, na união interna de suas elites e na sua grande representação no Parlamento, em função do grande número de eleitores de que dispunham. As demais caminhavam ao reboque da História, disputando, entre si, as migalhas da soberania, distribuídas pelo triunvirato hegemônico [...]. (VISCARDI, 2012, p. 32)

Como dito anteriormente, o Maranhão possuiu um único vice-presidente da República (e que não era deputado-escritor), no final da década de 1910, em meio a uma das recorrentes crises de representação do ―Triunvirato‖ (VISCARDI, 2012), quando o nome de Urbano Santos foi lançado na candidatura ―conciliatória‖ de Wenceslau Brás (presidente entre 1914-18). Tal se deu por indicação de Pinheiro Machado43, um dos artífices da Primeira

República em sua fase civil, para conter as facções que se organizavam na formação das candidaturas do Partido Republicano Conservador e do Partido Republicano Paulista, que poderiam romper o pacto de revezamento de poder, então estabelecido (VISCARDI, 2012, p. 221).

Com efeito, naquele momento, e mesmo no pleito seguinte, Urbano Santos, apesar de figura de destaque no PRC, nem figurava como um nome de vanguarda, nem representava o protagonismo maranhense na política nacional. Ao contrário, estava lá apenas para bloquear determinadas ―correntes‖ mais radicais dos estados de ―primeira grandeza‖. Assumiu o poder,