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5 AS PERGUNTAS NO DISCURSO DOS ALUNOS 5.1 As perguntas orais: sua frequência e funções

No documento Interacções na aula de Matemática (páginas 155-158)

As perguntas orais dos alunos, formuladas nas aulas em que se estudaram as questões dos professores foram também objecto de análise e discussão. Este trabalho envolveu 224

alunos dos 8º e 9º anos, tendo-se verificado que, em média, cada aluno faz uma pergunta oral por semana.

Estas perguntas foram também classificadas quanto à sua função, como pode ver-se na Tabela 2, a qual inclui um total de 393 perguntas.

TABELA 2

Perguntas orais dos alunos, classificadas de acordo com a sua função

Verificou-se que as principais funções das perguntas dos alunos são de informação e clarificação (53 %).

Foi ainda encontrada uma percentagem significativa de perguntas solicitando concordância ou algum tipo de suporte (17 %).

As perguntas de rotina têm também um papel relevante (13.7 %), tal como se verificou com os professores.

A maioria das questões são de baixo nível cognitivo, não exigindo grande reflexão da parte dos alunos. Apenas 6 % das perguntas revelaram um pouco mais de raciocínio, quando procuravam orientação na identificação ou resolução de problemas ou quando faziam inferências ou testavam hipóteses.

Em resumo, este estudo mostrou que professores e alunos tendem a usar predominantemente questões fechadas, isto é, de baixo nível cognitivo.

Embora se reconheça que alguns tipos de perguntas podem contribuir fortemente para o desenvolvimento de capacidades importantes, nomeadamente, as de raciocínio crítico e as de pensamento criativo, não são estas as perguntas preferidas pelos professores e alunos. Assim, defende-se cuidado especial com o ritmo das perguntas formuladas na aula e um grande esforço

Reforço da pergunta do professor (repetição do final) Procura de concordância e/ou apoio

Confirmação de “fracções” de informação Pedidos de informação

Pedidos de clarificação

Procura de orientação na identificação ou resolução de problemas

Procura de orientação quando fazem inferências ou testam hipóteses

Procura de orientação em procedimentos experimentais Perguntas de rotina/ questões para gestão da aula

Função 2.8 17 4.3 26.5 26.7 4.8 1.5 2.5 13.7 11 67 17 104 105 19 6 10 54 Frequência Percentagem

para aumentar a percentagem de questões abertas, de modo a contribuir-se para o desenvolvimento cognitivo dos alunos.

5.2 - As perguntas escritas

Vimos que os alunos raramente formulam perguntas orais na aula e que as poucas questões que põem são, na sua maioria, de baixo nível cognitivo. É, por outro lado, consensual que os professores devem estimular os alunos a pensar, e a reflectir criticamente. Também é provável que muitas das perguntas dos professores sejam feitas com esta intenção. Contudo, a investigação não tem provado que aqueles objectivos estejam presentes, normalmente, no acto de questionar.

Segundo Dillon (1982), as questões podem estimular o pensamento do sujeito que as formula e não o do sujeito que responde. Se o acto de pensar/reflectir começa frequentemente com um problema, podem criar-se estímulos para que o pensamento do aluno comece com um problema seu. Sabendo-se que o processo mental associado à elaboração de uma pergunta estimula o raciocínio e pode contribuir para o desenvolvimento intelectual de quem a formula, podemos admitir que a formulação de “verdadeiras” perguntas deve fazer parte integrante do processo de ensino-aprendizagem, não esquecendo que estas podem revelar os esquemas mentais utilizados pelos alunos.

É este o contexto para, também, nós formularmos algumas questões associadas ao comportamento dos alunos nas aulas:

(i) Porque razão (ou razões) os nossos alunos fazem tão poucas perguntas?

(ii) Se lhes forem dadas condições/oportunidades para pôr questões, na aula, serão eles capazes de as formular, isto é, os alunos questionam-se?

(iii) Se os alunos levantarem questões, o que é que elas revelam, isto é, qual poderá ser a sua utilidade?

Reconhecendo-se que há constrangimentos de vária ordem à apresentação de questões pelos alunos, desenvolveu-se uma técnica em que se procurou estimular a escrita de perguntas na aula.

Sabendo-se, ainda, que a escrita é considerada como um dos instrumentos de aprendizagem mais poderosos (Nisbet e Shucksmith, 1986), é proporcionado ao aluno um pouco mais de tempo e uma oportunidade diferente para pensar, para reformular, reflectir, enfim, interagir com maior privacidade com o professor.

Este trabalho foi também desenvolvido em aulas de ciências (física e química) e com alunos do 3º ciclo do E.B. (8º e 9º ano), como no estudo anterior.

Tendo sido feita uma breve reflexão sobre as perguntas orais dos alunos, vejamos agora, muito sumariamente, que ilações tirar das suas perguntas escritas.

5.2.1 - Frequência e funções

Em primeiro lugar, pôde concluir-se que os alunos se questionam e são capazes de expressar as suas dúvidas/incertezas por escrito, durante a aula, desde que lhes seja dada essa

oportunidade.

Os alunos envolvidos neste estudo (382) escreveram, em média, uma pergunta substantiva por aula, para além das perguntas orais, que não foram registadas.

Em segundo lugar, verificou-se que a maioria das suas questões são significativas, isto é, fazem sentido e são de um nível cognitivo mais elevado do que as perguntas orais. Por exemplo: 35% das perguntas são pedidos de informações específicas, 58% requerem uma melhor explicação e 4% correspondem às categorias de levantamento de problemas e de avaliação.

5.2.2 - Identificação de ideias/concepções em tópicos de ciências

Para além dos aspectos anteriormente referidos, foi ainda analisada a semântica das questões, isto é, procurou-se identificar as ideias e/ou significados que podem estar por detrás delas. Deste modo, foi possível identificar não apenas alguns dos esquemas de raciocínio mais comuns usados pelos alunos, mas também a natureza de algumas das suas dificuldades nos tópicos estudados (calor e temperatura e estrutura atómica da matéria).

A título de exemplo, refira-se que, no tópico estrutura atómica, foi possível identificar três tipos de problemas:

• Concepções alternativas associadas ao facto de se utilizarem percepções do dia a dia, de natureza macroscópica, na interpretação de fenómenos ou propriedades a nível atómico, nuclear ou sub-nuclear.

• A visão de modelo versus realidade, traduzindo dificuldades de percepção dos modelos abstractos, de nível microscópico, usados neste contexto.

• Dificuldades associadas à complexidade do tópico, ao detalhe e à quantidade de informação fornecida pelo professor, na expectativa de “diminuir” esta complexidade. Algumas destas dificuldades tinham sido já identificadas em trabalhos de investigação de outra natureza. Contudo, foi ainda possível identificar situações pontuais e novas, ou pelo menos, específicas de determinados alunos. Demonstrou-se, assim, que de certo modo, o ensino pode ser mais personalizado e centrado no aluno.

No documento Interacções na aula de Matemática (páginas 155-158)