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Personagens femininas na publicidade de cerveja: uma narrativa masculina

No documento Estudos Culturais / Estudios Culturales (páginas 121-132)

heloisa helena de sousa FranCo oliVeira & asdrúBal Borges Formiga soBrinho

heloisadesousa@hotmail.com; asdru_bal@uol.com.br

Universidade de Brasília

Resumo

Por utilizarem a personagem feminina de forma recorrente, para vender seu produto, a publicidade de cerveja é o objeto de estudo deste artigo, focado na análise da campanha publicitária Skol Folia, lançada durante o carnaval 2013. O objetivo central é observar a construção da personagem feminina, por meio da análise de conteúdo qualitativa dos vídeos veiculados em rede de televisão e internet e de algumas outras peças. Partindo do pressuposto de que a construção de personagens na publicidade é importante para gerar identificação com o público, buscamos discutir que estratégias foram empregadas com esta finalidade, observando como os códigos culturais vigentes na sociedade são utilizados nesta construção e analisando a representação das relações de gênero, no contexto da publicidade de cerveja.

Palavras-Chave: Relações de gênero; publicidade; estudos culturais; personagem presençadapersonagemfemInInana publIcIdade

A presença das mulheres na publicidade é um recurso comumente utilizado desde o surgimento dos meios de comunicação de massa. Edgar Morin (1969) refle- tiu sobre essa presença, discutindo a ligação entre a publicidade e a promoção dos valores femininos.

Nos últimos anos, o conceito de gênero tem se consolidado como um instru- mento analítico importante para dar visibilidade ao caráter histórico e sociocultu- ral dos papéis e dos espaços masculinos e femininos, o que tem contribuído para desnaturalizar a opressão feminina e revelar as bases materiais e simbólicas das desigualdades entre homens e mulheres.

Isto porque:

As justificativas para as desigualdades precisariam ser buscadas não nas diferen- ças biológicas (se é que mesmo essas podem ser compreendidas fora de sua cons- tituição social), mas sim nos arranjos sociais, na história, nas condições de acesso aos recursos da sociedade, nas formas de representação (Louro, 1997: 20-21)

Apesar de todas as transformações ocorridas ao longo do século XX, a condição feminina na sociedade ainda é marcada pela discriminação tanto na esfera pública, como na privada. Diante disso, numa sociedade fortemente mediada pelos meios de

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Na publicidade, imagem e texto constituem uma narrativa que tem como objetivo proporcionar aos consumidores uma leitura clara e objetiva a respeito do produto anunciado, além disso, precisa dialogar com o público a que se destina. Por isso, agenciam representações sociais e trabalham com os códigos culturais presen- tes na sociedade, no intuito de gerar identificação com os receptores. Este público ao se identificar, produz novas significações, que reproduzem ou reforçam as repre- sentações mediáticas. De acordo com Sabat (2005: 94), “cada elemento que compõe um anúncio publicitário é um signo que nos permite ler a imagem de acordo com os códigos que carregamos e/ou construir outros”.

Portanto, para entender as práticas culturais presentes nos media, os Estudos Culturais se tornam um referencial importante na medida em que esta tradição pensou nas relações envolvidas no processo de comunicação de massa como expressão dos códigos culturais presentes na sociedade. Ao mesmo tempo em que os media se alimentam da cultura para construir seus conteúdos, esses conteúdos também geram significações culturais para os receptores.

os estudos culturaIs

Os Estudos Culturais deram sua contribuição à Comunicação, principalmente no que se refere à relação entre os meios de comunicação de massa e o público. Essa tradição parte da premissa de que o público não é desprovido de referências, ele tem um passado essencialmente cultural e, por essa razão, lê as mensagens midiáticas com um referencial cultural semelhante.

Os Estudos Culturais surgem em Birmingham, na Inglaterra, no início dos anos 1960, e são institucionalizados em 1964 com a criação do Centre for Contemporary

Cultural Studies (CCCS). Seus precursores foram Richard Hoggart (1957), Raymond

Williams (1958) e Edward Palmer Thompson (1963). Stuart Hall, apesar de não fazer parte do trio fundador, também foi fundamental no desenvolvimento desses estudos. Nos estudos de comunicação, esta tradição se debruçou em entender a inte- ração dos media com a sociedade, tendo como pressuposto a diversidade cultural do receptor frente aos produtos da indústria cultural. A grande questão dos estudos culturais foi analisar, diante da diversidade cultural dos públicos, como eles se apro- priavam dos conteúdos difundidos pela mídia.

Os estudos culturais nascem entrelaçados ao marxismo, mas se distanciam, por buscar explicar como diferentes pessoas e classes sociais, inclusive as mais explora- das e pobres, produziam cultura. Isso os aproximou do pensamento de Gramsci, que resgatou as contribuições de Marx, acrescentando a categoria da cultura para entender as relações de poder presentes na sociedade e chegando ao conceito de hegemonia. Com esta perspectiva, a cultura passou a ser vista do ponto de vista da diversidade. A partir disso, surgiu a dificuldade, a priori, de seguir um marxismo ortodoxo, onde a infraestrutura (o nível econômico) é um nível mais profundo que produz e determina todos os outros da superestrutura (Estado, instituições políticas e cultura).

Os cultural studies e o marxismo nunca se encaixaram na perfeição em momento algum. Desde o início (...), já pairava no ar a sempre pertinente questão das gran- des insuficiências, teóricas e políticas, dos silêncios retumbantes, das grandes evasões do marxismo – as coisas de que Marx não falava nem parecia compreen- der, mas que eram o nosso objeto privilegiado de estudo: cultura, ideologia, o simbólico (Hall, 1999: 68-69).

Assim, para os culturalistas, não importa estudar cada um dos pólos envol- vidos no processo de comunicação de massa, separadamente, mas sim, entender o processo de comunicação a partir da significação da mensagem, seja no receptor ou em seu próprio conteúdo, observando as práticas culturais vigentes na sociedade, seus diálogos e trocas simbólicas.

descrIçãodapesquIsa

Levando em consideração que os estudos de gênero e culturais são importantes para entender o diálogo entre produto comunicacional, neste caso, entre peças publi- citárias de cerveja e os códigos culturais presentes na sociedade, propomos analisar a construção da personagem feminina na campanha Skol Folia 2013, por meio da análise de conteúdo qualitativa dos vídeos Skol Folia e Skol Tributo aos nossos guer- reiros, procurando responder como as mulheres são representadas nesta narrativa.

Primeiramente é importante dizer que a campanha Skol Folia 2013 foi elabo- rada depois das modificações das normas do Conselho de Autorregulamentação Publicitária (CONAR), realizadas em 2008. Se analisarmos a campanha Skol Folia sem articular esta narrativa com todo o contexto de narrativas publicitárias de cerve- jas, perdemos em entender que a personagem feminina foi um recurso presente em campanhas anteriores. Fato que levou o CONAR a regulamentar a utilização de mulheres na publicidade.

eventuais apelos à sensualidade não constituirão o principal conteúdo da mensagem; modelos publicitários jamais serão tratados como objeto sexual;(...) (CONAR, 2008).

Isto ocorreu depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária tentou restringir a publicidade de cerveja em 2007. Assim, em 2008, o CONAR tomou algu- mas providências reformulando o código e decidindo pela não utilização de animais neste tipo de peça publicitária, nem de personagens tomando cerveja, porque esti- mula o desejo de beber. Também ficou vedado, como citado anteriormente, exibir modelos em eventuais apelos à sensualidade e os sites de marcas de cerveja passa- ram a ter filtros de acesso para menores de 18 anos. No entanto, o CONAR não tem força de lei, pois autorregulamenta a publicidade por meio de códigos éticos.

Por isso, com o intuito de articular esta narrativa publicitária com o contexto em que elas estão inseridas historicamente, iremos mostrar alguns cartazes do início do século XX e também apresentar como eram algumas peças publicitárias, entre os anos 2000 e 2003, antes das modificações do CONAR em 2008. Desse modo, iremos dividir o corpus da pesquisa em: antes das modificações do CONAR (peças

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dos anos 2000 e 2003) e depois delas (Operação Skol Folia 2013), estabelecendo as seguintes categorias de análise para a personagem feminina, com base no critério de personagens e suas relações apresentados por Todorov (1976): personagem femi-

nina corporificada, personagem feminina icônica, relação entre personagens feminino e masculino.

peçasDoinícioDoséculo XX – presençaDapersonagemfemininacorporificaDa

Neste período era comum a presença das mulheres em peças publicitárias de cerveja. As mulheres nos materiais gráficos enfeitavam e contribuíam para vender cervejas, há bastante tempo. A seguir, alguns exemplos de campanhas de marcas variadas do início do século XX, que marcam a presença do recurso persuasivo da personagem feminina como protagonista, a ponto de integrar um repertório conhe- cido pelo público.

Podemos verificar que, mesmo em campanhas publicitárias mais antigas, as mulheres já apareciam marcadas como uma personagem e como recurso ilustrativo.

Figura 1 - Cartaz 1891. Fonte: Memória da propaganda

No final do século XIX, a propaganda brasileira sofria influência da Belle Epóque e da Art Nouveau, numa tentativa de aproximação das tendências européias. Era comum a utilização de desenhistas, ilustradores e pintores na criação destas peças. Na figura 1, temos o anúncio considerado o primeiro ilustrado veiculado pela Companhia Antarctica Paulista, em 1891, que, por sinal, já exibia a figura de uma mulher.

Figura 2 - Cartaz ,1926. Fonte: Memória da Propaganda

Na figura 2, a mulher está em primeiro plano, com o copo de cerveja na mão e trajes de dançarina. Ela é a protagonista da imagem. Apesar de o urso polar está logo atrás da imagem da mulher, num cenário que remete ao frio, ela tem o corpo desnudo.

Figura 3 – Cartaz 1918 Fonte: Memória da Propaganda

Na figura 3, a mulher quase bebe a cerveja, mas sorri e projeta o corpo para frente num movimento que parece nos acompanhar.

Figura 4: Cartaz de 1954. Fonte: Memória da Propaganda

A mulher da cerveja Portuguesa está em aparente desequilíbrio. Ela aparenta ter pouca autonomia, pois com uma das mãos segura a cerveja, que é quase do seu tamanho, enquanto a outra mão é puxada por um homem que não aparece, ou seja, a portuguesa “vai com você”.

É importante ressaltar que as imagens apresentadas nos cartazes, de certa maneira, tornam-se coerentes com a mentalidade da época do início do século XX, segundo a qual as mulheres tinham pouca autonomia e viviam para agradar seus maridos. No entanto, a associação entre bebida e mulheres já tendia a uma sensua- lidade, como no caso da dançarina da figura 2 e da figura 3. Já no cartaz de 1954, na figura 4, percebemos no slogan que a mulher vai com você, numa associação entre a compra da cerveja com a ida da mulher.

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peçasanterioresàsmuDançasDo conar Doséculo XXi (antesDe

2008) – presençaDapersonagemfemininacorporificaDa

Podemos observar como, cada vez mais, o corpo da mulher vai sendo mais descoberto, ficando mais à mostra. Isso pode ser explicado pelo fato de o período posterior à Segunda Guerra ter sido marcado pelo aumento da força de trabalho das mulheres, o que as transformou em agentes econômicos e sujeitos políticos. Além disso, os anos 1970 e 1980 foram marcados pela luta das mulheres pela liberdade sexual, que veio a refletir, mais fortemente a partir dos anos 1990, na publicidade.

No entanto, a exploração da imagem das mulheres pela publicidade parece ir de encontro ao que Simone de Beauvoir disse, numa entrevista a John Gerassi, em 1976:

Por causa da publicidade, a palavra “libertação” está na ponta da língua de cada homem, estando eles cientes ou não da opressão sexual que as mulheres sofrem. A atitude generalizada dos homens agora é “bem, já que vocês foram libertadas, vamos para a cama”.

Figura 5 – Cartaz Sou da Boa, 2003. Fonte: AlmapBBDO

Figura 6 – Cartaz Brahma - 2000. Fonte: Memória da Propaganda

Figura 7 – Cartaz Antarctica Até a água é mais gostosa – 2003 Fonte: AlmapBBDO

Nas figuras 5, 6 e 7, as mulheres aparecem como personagem principal dos cartazes, tendo seu corpo mostrado com ênfase em seios, pernas e barriga. Os slogans também são associados a elas: boa, gostosa.

É possível perceber a padronização do corpo das mulheres, caracterizados por curvas e magreza e exibidos quase desnudos. Há a predominância também, nesses cartazes, da mulher branca.

campanHapublicitária skol folia 2013 – presençaDapersonagem femininaicônica XpresençaDapersonagemcorporificaDaX relaçãoentreapersonagemfemininae masculina

A Skol foi criada em 1967 e, segundo pesquisa Interbrand1 realizada em 2012, ocupa a 5ª posição entre as marcas brasileiras mais valiosas de 2012 e também é a quinta cerveja mais valiosa do mundo, valendo mais de 8 milhões de reais. Hoje é fabricada pela AmBev e comercializada nos tipos Pilsen, beats, chope claro e

escuro. Lançou a primeira cerveja em lata do Brasil (1971) e também foi pioneira nos formatos lata de alumínio (1989), long neck com tampa de rosca (1993), latão (1993), Skol litrão (2008). A estratégia da Skol esteve focada na inovação dos produtos e aprimoramento do design das embalagens, uma forma de se diferenciar das demais marcas de cerveja e associar o visual do produto à singularidade de quem a escolhe.

A campanha Skol Folia 2013 foi criada pela agência publicitária F/Nazca Saatchi & Saatchi, que tem a conta da Skol há 16 anos. Foram produzidos dois vídeos para a campanha: Skol Treino, veiculado entre os meses de janeiro e fevereiro, com 1 minuto de duração; e Skol Tributo aos nossos guerreiros, exibido no mês de fevereiro, com duração de 30 segundos, que iremos descrevê-los seguir:

1 Pesquisa Interbrand Marcas Brasileiras Mais Valiosas 2012, disponível em http://www.rankingmarcas.com.br/marcas/5-

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3.3.1 – víDeospublicitáriosDacampanHa skol folia 2013 - presençaDa personagemfemininaicônicaX presençaDapersonagemcorporificaDa X relaçãoentreapersonagemfeminina emasculina

a . Descrição do vídeo Skol Treino:

Helicópteros no céu, som deles se aproximando, sob uma trilha sonora tensa. Câmera de desloca para o solo e foca no comandante que diz: Tira o pé do chão. É exibido um cenário de guerra. A trilha muda para um ritmo de samba. Soldados correm, gritando e carregando a bandeira da Skol. Num aparente treino militar, soldados pulam corda, caem na lama com um isopor de cerveja e ensaiam uma marcha parecida com uma dança. A trilha sonora muda novamente para trilha de guerra, misturada com um samba, e outros soldados fazem marinheiro com isopor de cerveja nas costas, fazem agachamentos dançando, enquanto o comandante grita:

Vai até o chão!. Mais soldados atravessam o rio, com grades de cerveja na cabeça.

Outros soldados batem palmas acima da cabeça, enquanto o comandante joga confetes de carnaval, gritando: Mais animação! Pula!. Aparecem soldados beijando sacos de boxeador com desenhos de mulheres e homens e o comandante grita: Beija,

Beija! Os soldados beijam os sacos onde as mulheres estão desenhadas. Aparece

outro soldado de capacete camuflado, dentro de um lamaçal. Surge outro soldado agarrado com 3 cervejas long necks. O comandante, com megafone, diz: Pede água?. O soldado responde: Não Senhor! e mergulha no ofuror. Soldados passam embaixo de um arame farpado, com latinhas de cerveja na mão. Um soldado mexe numa radiola e cessa a música. Os soldados param, agacham-se e, num sinal do comandante, correm ao ataque, gritando. Um dos soldados tropeça em armadilha e cai, mas não derrama o copo de cerveja que estava segurando. Entra uma nova trilha alegre e um narra- dor fala: Começou a operação Skol Folia, enquanto alguns soldados jogam lata de cerveja para os colegas e outros soldados beijam manequins na boca (no treino). O narrador continua: Esse ano você pode ser um general dos melhores carnavais do Brasil. Enquanto ele fala, os soldados ficam dançando, com o dedo indicador pra cima, sob o olhar do general. Enquanto soldados treinam agarrando-se com manequins, passa uma soldado mulher e bate com um chicote na mão do soldado que escorreu a mão pelo bumbum da manequim. O Narrador continua: Entre no site e arrisque-se na

promoção. Enquanto isso, soldados dançam dando pulos, enquanto um deles dá um

salto mortal. A trilha sonora muda para suspense e entra em cena um soldado com roupas e equipamentos antibombas. Com alicate na mão, ele tenta tirar um sutiã da manequim, que acaba explodindo, e encerra com o narrador, dizendo: Se for dirigir,

não beba. A frase se repete numa tarja azul, no meio do quadro.

b – Descrição do vídeo Skol Tributo aos nossos guerreiros:

Música lenta remetendo a um estado lúdico de homenagem, com as mesmas imagens do vídeo Skol Treino, mas editadas em 30 segundos. Entra narrador: Esta é

uma homenagem a você, bravo soldado que desceu até o chão, jogou as mãozinhas para cima e mostrou toda a malevolência do nosso jovem baronero. Obrigado nobre guerreiro! Foi uma honra servir ao seu lado. Se for dirigir não beba.

análiseDos filmespublicitáriosDacampanHa skol folia 2013:

A narrativa deste comercial faz uma alusão à Guerra do Vietnã, utilizando uma trilha sonora de uma música clássica, A Cavalgada das Valquírias, composta por Richard Wagner. Utilizando um recurso bem conhecido da Publicidade, a Skol apresentou nesta campanha o bom humor para falar de carnaval como uma guerra. Ou poderia ser da guerra como um carnaval? Trata-se de uma estratégia capaz de conquistar o consumidor, já que o recurso do humor extrapola os códigos vigentes da moral e isso pode levar o público a liberar-se dos padrões sociais, desprender-se da realidade e criar uma ligação mais fácil com o que está sendo anunciado. Além disso, a campanha foi veiculada no período do carnaval, festa do ano caracterizada pela diversão, onde tudo é permitido e relativizado.

Os filmes publicitários tanto apresentam a personagem feminina icônica, na forma de manequins e desenhos em sacos de pancada, como a personagem corporificada, na situação em que aparece uma soldado mulher que chicoteia a mão do soldado que desliza a mão pelo bumbum da mulher-manequim, quanto a relação entre personagens

feminino e masculino. Nestes vídeos, mesmo as manequins sendo seres inanimados, os

soldados (personagens masculinos) as beijam como treino para o carnaval.

O vídeo publicitário começa como um treino de guerra no qual a força e a capacidade de resistência dos soldados são testadas sob o ponto de vista do carna- val, da dancinha, da cerveja. Por outro lado, se as mulheres aparecem como seres inanimados, elas não treinam para o carnaval. Já os homens aparecem como os personagens soldados, que estão se preparando para a diversão do carnaval num cenário de guerra, que pela história da narrativa, parece ser integrado pela cerveja e pela possibilidade de beijar mulheres e estar em conjunto com os amigos. Entretanto, segundo a própria narrativa, é preciso treinar para ganhar resistência. Trata-se de uma história coerente com o cenário do carnaval que remete à abstração do coti- diano e à diversão.

Nesta narrativa, também fica evidenciada a representação do personagem masculino, que, por um lado, desempenha um papel extremamente ativo no treino e, por outro, relaciona-se com uma personagem feminina icônica, passiva, impos- sibilita de corresponder ou reagir às carícias. Na história podemos perceber que o carnaval é uma festa onde o personagem masculino age, enquanto o feminino é imóvel. Na única corporificação da personagem feminina, ela reprime a diversão ou o treino do personagem masculino. O carnaval, segundo Bakhtin (1987), “ajuda a liberar-se do ponto de vista dominante sobre o mundo”, no entanto, a relação entre o personagem feminino e masculino, nesta narrativa publicitária, é baseada na distinção de funções, de modo que o feminino aparece, ao longo da história, como

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