• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3 – RESULTADOS MODALIDADE DA PERFORMANCE: ANÁLISE

3.3 Participação do outro na performance musical dos alunos

3.3.3 A perspectiva da pianista

Ao acompanhar os alunos de violino nos recitais de formatura, a pianista Bárbara comentou sobre os diálogos dos ensaios com as crianças e destacou algumas perguntas que sempre faz aos alunos:

O que você achou? O que você sentiu, né? Se eles respondem nada, tem alguma coisa errada. Porque, se nem eles estão sentindo, eu até falo: você não tá sentindo, se você não tá sentindo, então como é que você vai transpassar isso pro público? Tem que tá sentindo alguma coisa, tem que tá ou sabendo de alguma coisa. Tem que se ouvir e tudo mais. Então eles começam esse trabalho de querer se ouvir e muda isso, às vezes. Eles começam a ouvir primeiro os erros, ficam ouvindo só os erros.

Para a pianista, o elemento de sentir está bem nítido: “O que você errou eu sei, tá escrito na minha partitura, eu sei. Eu quero saber o que estava lá dentro de você. O que você sentiu ao errar, ou o que você sentiu ao alcançar certa nota, ou o que você sentiu ao fazer o trinado e tudo mais, dependendo da música”. Segundo ela, o foco para os alunos são as sensações, conforme destacou: “(...) Então, eu acho que eles têm que sentir alguma coisa pra começar a expressão”. Ao detalhar esse “sentir algo” que os alunos precisam buscar, a pianista descreveu como ela trabalha expressividade musical nos ensaios:

Então, a expressividade é realmente saber, né?! Poder colocar uma expressão ou sentimento da criança na música. É bem interessante que alguns colocam história, outros colocam cores, né?! E... A gente às vezes constrói história juntos, a gente discute, a gente escuta bastante em aula outras versões de outros violinistas, no YouTube e até no

Spotify. No Spotify tem bastante, é bem rico, assim. (...) Então eles buscam isso, eles começam a discutir o que está escrito na partitura, o que eles ouviram, o que foi a interpretação que eles mais gostaram. Para a pianista, a expressividade musical está em sentir algo durante a performance. Mas, o que seria “sentir algo”? Nessa perspectiva, a professora apresenta algumas estratégias que ela utiliza durante os ensaios para ajudar o aluno a construir suas próprias habilidades expressivas. Dentre elas, estão: criar histórias, construir ideias para a música, cores e também a instrução e a discussão dos elementos expressivos e musicais que fazem parte da partitura. Outro aspecto importante é a apreciação musical, que se encontra neste processo de construção da expressividade musical, segundo a pianista: “Todos os professores incentivam a ouvir, né?! Mas eu peço bastante, até em sala eu já tive que explicar, isso faz parte do ensaio, a gente vai parar pra ouvir uma peça. E são peças orquestrais, são peças de violino, tem muitas peças pra tudo”. A partir da apreciação musical, os alunos são incentivados a ouvir várias interpretações das peças que estão tocando.

Durante a entrevista, a pianista comentou que, à medida que os alunos vão avançando nos livros, começa a surgir um pequeno atrito em relação às suas preferências musicais. Nesse sentido, a pianista relatou: “A gente continua ouvindo bastante e a gente começa a ver o conflito entre Suzuki e entre as gravações das músicas originais. Então, é bem importante deixar claro que a gente vai fazer como Suzuki; na verdade, eu deixo isso claro desde o primeiro ensaio do livro um”. Assim, os alunos são incentivados a ouvir as músicas dos CDs do método desde a iniciação do instrumento. Porém, conforme os alunos vão amadurecendo musicalmente, eles vão construindo o seu próprio senso crítico e gosto musical.

A pianista ainda fomenta a discussão nas escolhas dos alunos que já estão nos livros três e quatro e ressalta: “Eles já têm consciência, a maioria já tem uma consciência. Fulano disse isso, fulano disse aquilo, eu escutei isso. O que eu gosto mais de cada um? O Suzuki tá assim, com a tal violinista tá assim, tá”. Além disso, a pianista falou que cada aluno opta por uma maneira de tocar. Ela acrescenta que cada um escolhe de um jeito e detalhou os jeitos distintos das performances dos alunos, as maneiras que eles decidem tocar:

São vários jeitos, ou mais lento ou crescendo mais aqui ou decrescendo ali, ou essa nota mais forte, ou não, ralentando mais ou não... Assim... Qualquer expressividade diferente é... E o importante é não anular, só desse jeito está certo. O importante é a criança se

identificar e ela entender que existem outras maneiras, né? É muito perigoso a gente ensinar que existe só uma maneira correta de tocar. Torna um padrão, legal, mas também torna criança, quando ela tiver ouvindo né, não, não é essa a maneira que eu toco, então tá errado, então não gosto de recusar. Não, olha, você gostou assim, mas essa maneira também está certa. A gente vê tanto isso, em profissionais sérios, assim... Profissionais, né? No nosso instrumento, que uma música tocada de maneira tão diferente. Então, por que não a criança entender que existem maneiras diferentes também de tocar?

No ponto de vista da pianista, os alunos querem tocar de maneiras diferentes, através das mudanças nas dinâmicas e nos andamentos das peças. Nesse sentido, ela incentiva os alunos a conhecerem as possibilidades dos elementos expressivos para executarem as peças, e não ter apenas um padrão correto. Por meio da fala da pianista, foi possível identificar um preparo adicional nos ensaios a fim de que as crianças construam suas próprias maneiras de tocar, através da apreciação e da discussão sobre os elementos musicais e expressivos da partitura. E, principalmente, que sejam capazes de conhecer as possibilidades ao tocarem e tomem decisões de expressividade no violino. A pianista ainda questionou os alunos:

Sobre o que você acha? Vamos tocar assim? Agora vamos ouvir assim? Agora vamos ouvir esse? É... O que você acha que está acontecendo com o piano, harmonicamente? Né? Eles começam a ouvir o piano, é... Realmente, aqui tem que soar mais forte, é mais uma discussão mesmo, bilateral.

A pianista conclui que segue a intenção dos alunos “porque eles se sentem mais confortáveis com o que eles se identificam”. Conforme a descrição dos ensaios, dissertada pela pianista Bárbara, foi possível identificar uma construção de decisões de expressividade musical através de discussões sobre as dinâmicas e sobre os andamentos das peças. Isso acontece por meio da apreciação musical e da observação na partitura musical feita por alunos e pela acompanhadora. A pianista enfatiza para as crianças que não existe uma maneira de tocar e, sim, possibilidades diferentes de se expressar. Além disso, notou-se a construção das habilidades expressivas através da criação de histórias, ideias, cores e principalmente das trocas de ideias musicais que acontecem entre pianista e alunos de violino.