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CAPÍTULO 4 – PESSOA SURDA – IDEIAS A SEREM CONSIDERADAS

4.2 Perspectiva sobre pessoas surdas diante dos sistemas de ensino

Todos devemos usufruir de novos padrões e normas que efetivem uma verdadeira inclusão em todos os âmbitos da sociedade. No caso das pessoas com surdez, têm a cultura e a identidade surdas, e devem ter reconhecimento das suas potencialidades e respeito às suas limitações cotidianas, apesar de não se definirem por isso. Os estudantes surdos costumam ter uma experiência ótica e visual bastante repleta de significados e também podem usufruir dos mais variados processos e recursos subjetivos para que haja uma identificação com outras pessoas – como pessoas surdas e não surdas –, assim como dos

artifícios que facilitem sua inclusão. A questão didática, do conhecimento, relacionada aos surdos e às interações que a regula devem ser criticamente discutidas e reconstruídas (SKLIAR, 2005).

Além das crianças surdas possuírem a potencialidade da aquisição da língua de sinais, elas têm o direito de se desenvolverem numa comunidade de pares, e de construírem estratégias de identificação [...], uma política de identidades surdas, onde questões ligadas à raça, à etnia, ao gênero, etc., sejam também entendidas como “identidades surdas”; identidades que são, necessariamente, híbridas e estão em constante processo de transição. (SKLIAR, 2005, p. 27).

Comunidades surdas podem ser entendidas como ambientes em que pessoas surdas estão e costumam se sentir próximas umas das outras por dividirem a mesma cultura e linguagem. Pessoas surdas “não trabalham em um mesmo local. Em alguns centros urbanos, eles encontram seus pares surdos somente duas ou três vezes por semana e passam a maior parte de seu tempo em um mundo ouvinte” (KARNOPP, 2010, p. 162). A comunidade surda não é composta só de pessoas surdas, podendo ter participantes não surdos, como componentes da família, intérpretes, educadores, colegas e outros que têm os mesmos interesses em comum, em um determinado local — associação de pessoas surdas, federações de surdos e igrejas (STROBEL, 2009). As pessoas surdas podem ter contato com outras pessoas surdas apenas em momentos como esses e é de grande importância para se reafirmarem como um grupo no qual possuem características que podem ser semelhantes e que podem ser compartilhadas, como a própria língua, “pois é através da experiência de compartilhar uma língua de modalidade gestual-visual que eles têm oportunidades de trocar experiências, conversar, aprender” (KARNOPP, 2010, p. 157). Elas são singulares, assim como qualquer outra pessoa, e não podem seguir um paradigma imposto a elas, pois são pessoas com potencialidade a ser sujeito.

Os estudantes não podem ser entendidos a partir de um padrão estipulado pela sociedade e “ser compreendido na sua singularidade possivelmente livraria muito desses alunos de rótulos estereotipados procedentes da desconsideração da forma diversa que eles têm de compreender e de se posicionar frente ao conhecimento” (TACCA; GONZÁLEZ REY, 2008, p. 145). A escola tem maneiras de compreender cada criança e pode observar suas necessidades conforme vão surgindo e de acordo com contextos diferenciados

(TACCA, 2006). As pessoas surdas, por exemplo, utilizam uma linguagem distinta e precisam de materiais diferentes no âmbito educativo, por exemplo (DECHICHI; SILVA; FERREIRA, 2011). Elas podem conquistar um espaço maior no processo de educação, sendo comtempladas com diversos recursos e materiais específicos para uso individual e coletivo e que favoreçam suas formas de comunicação, assim como acesso a pessoas intérpretes de sinais. Quando este acesso a pessoas e a recursos ocorre em um contexto educacional, pode ser gerador de sentido subjetivos, de forma que se criam significados para os estudantes e podem haver movimentos autotransformadores - processo que vai se constituindo como subjetivo, mas não absoluto e inato. Isto é, o estudante surdo ser compreendido em sua singularidade favorece seu campo de possibilidades com acessos a tudo e a todos, e a educação bilíngue é um exemplo desta adaptação à relação social dos estudantes surdos com outras pessoas.

Atualmente, observamos a educação bilíngue como uma possibilidade de desenvolvimento cognitivo linguístico para a criança surda, e, assim pode se relacionar com não surdos e surdos (LACERDA, 1998) por meio de diversas maneiras, no cotidiano. De acordo com Morais, Rocha e Mendonça (2013), atualmente, muitas pessoas surdas se relacionam com não surdos e com outras pessoas surdas por meio de aplicativos como o WhatsApp, o Facebook, o Instagram, e quando elas têm acesso à língua portuguesa, especialmente em sua modalidade escrita, esta comunicação e interação são facilitas. Ainda segundo Morais, Rocha e Mendonça (2013), o uso destes aplicativos pode, também, viabilizar a comunicação com pessoas que não sabem Libras ou que a conhecem pouco. A educação bilíngue tem o intuito de minorar as dificuldades escolares vivenciadas pelos estudantes surdos em sua aprendizagem que estava norteada pelo fracasso escolar (LIMA, 2004).

Diante do exposto, mesmo colocando os benefícios do bilinguismo, nem sempre a educação ocorre assim e, em muitas situações, os estudantes surdos não têm acesso a ele. Queremos lembrar que “não é o surdo que não aprende a língua portuguesa, por exemplo, é a escola ou o meio social que ainda não encontrou uma maneira adequada e bem-sucedida de ensinar isso a ele” (CORDOVA; TACCA, 2011, p. 221). Mas, mesmo assim, “o grau de compreensão da língua portuguesa não permite que crianças surdas compreendam certos conceitos abstratos” (KELMAN, 2011, p. 202). Sendo isso, “diante da dificuldade de

escrita e leitura, em outras palavras, de utilizar o português em sua modalidade escrita, os sujeitos surdos têm seus conhecimentos e suas possibilidades comunicativas praticamente restritos ao uso da língua de sinais com quem a domine. (CORDOVA; TACCA, 2011, p. 218). Nessa esfera, lembrando que não há hierarquia nem prevalências entre as pessoas, pois o sujeito se constitui nas relações, a pessoa intérprete educacional está presente para auxiliar, de alguma forma, o estudante surdo.

No Brasil, Libras é o meio de comunicação entre os estudantes surdos. Para finalizar, alguns autores como Goldfeld (1997) e Kroeff (2009), defendem que a criança deve aprender a língua de sinais com seus pais ou de outra maneira, nesta fase, porque facilita sua comunicação e diminui as chances de sofrimento quando tiver que solucionar tarefas, controlar ações e comportamentos, e se socializar. Sendo assim, chegamos a um fato importante no nosso trabalho, pois a pessoa intérprete educacional se relaciona com o estudante surdo de maneira direta, em sala de aula, e utiliza Libras. O estudante surdo e a pessoa intérprete educacional podem ter uma relação que favoreça a aprendizagem.