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CAPÍTULO I – O AUDIOVISUAL NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS

CAPÍTULO 3 – CONTRIBUIÇÕES DA ARTICULAÇÃO FREIRE-CTSA PARA A

3.2 A perspectiva teórica de Paulo Freire

Paulo Reglus Neves Freire (1921-1997) educador, pedagogo e filósofo brasileiro é

considerado um dos mais importantes pensadores na história da Pedagogia mundial, pois

influenciou o movimento chamado pedagogia crítica. Embora sua família fosse de classe

média, Paulo Freire vivenciou a pobreza e a fome na infância, durante a depressão de 1929.

Esta experiência o levaria a se preocupar com os mais pobres e o ajudaria, em 1963, a ensinar

trezentos adultos a ler e a escrever em 45 dias. Seu talento, como escritor e sua dedicação aos

oprimidos, tornou-o uma inspiração para gerações de professores, especialmente, na América

Latina e na África. Foi o brasileiro mais homenageado da história: ganhou 41 títulos de

Doutor Honoris Causa de universidades como Harvard, Cambridge e Oxford e em 13 de abril

37Abordagens temáticas são propostas de intervenção curricular que permita a superação de alguns problemas no contexto escolar. No ensino de Ciências temos a Abordagem temática freireana (Delizoicov, Angotti e Pernambuco, 2009); Temas da situação de estudo (Maldaner e Zanon, 2001; Maldaner, 2007); e da abordagem

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Ciências

de 2012, foi sancionada a lei 12.612 que declarava o educador Paulo Freire, Patrono da

Educação Brasileira.

Durante a ditadura militar, o seu exílio parece ter contribuído, profundamente, para o

seu pensamento de incentivar a busca pelo engajamento, no processo de libertação daqueles

que ele categorizava oprimido. Em seu livro “A Pedagogia do Oprimido”, Freire (1986)

esclarece-nos que a existência polarizada, do opressor e do oprimido, é sustentada pela ação

egoísta do homem, no seu desejo de oprimir para dominar. Freire define eximiamente esta

relação, introduzindo o conceito de oprimido que pode ser entendido como o sujeito

incompleto que busca sua humanização, devido a sua vocação em ser mais, mas, que está

submetido a um estado de imersão dos interesses egoístas dos opressores; egoísmo camuflado

de falsa generosidade

38

.

Nessa busca da libertação pela generosidade verdadeira, caberá ao oprimido

transformar tanto a si, quanto ao opressor. No entanto, o oprimido que ainda não se descobriu

hospedeiro do opressor, poderá estar submetido ao fenômeno da aderência, condicionada

pela contradição vivida. Se aderido, passa a ser uma ponte ao opressor, que prescreve seu

comportamento. A superação da contradição dar-se-á pela libertação, através da práxis

autêntica, ação e reflexão que resulte na sua inserção crítica na realidade (FREIRE, 1987).

No Campo educacional, Paulo Freire propõe uma educação problematizadora-

emancipadora, que esteja condicionada ao trabalho com e pelo aluno (povo), em oposição ao

trabalho para o aluno. Assim, em sua educação libertadora, o educando é sujeito ativo no

processo educacional e não objeto desta, o que contradiz o conceito de educação bancária

39

,

38Falsa generosidade é um mecanismo de controle social que o opressor utiliza para imobilizar o indivíduo. Segundo Freire (1987), só o poder que nasça da debilidade dos oprimidos será suficientemente forte para libertar a ambos, opressores e oprimidos. Por isto é o poder dos opressores, quando se pretende amenizar ante a debilidade dos oprimidos, não apenas quase sempre se expressa em falsa generosidade. Violência disfarçada dos opressores.

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A concepção “bancária” da educação na concepção de Freire (1987): a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos de conteúdos, guardá-los e arquivá-los. O “saber” (...) se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão. Sendo dimensão da “cultura do silêncio”, a “educação” “bancária” mantém e estimula a contradição, anula o poder criador dos educandos ou o minimiza, estimulando sua ingenuidade e não sua criticidade, satisfazendo aos interesses dos opressores. Juntam toda uma ação social de caráter paternalista, em que os oprimidos recebem o nome simpático de “assistidos”. São casos individuais, meros "marginalizados”, que discrepam da fisionomia geral da sociedade. “Esta é boa, organizada e

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introduzido por Freire (1986), ou seja, quando o sujeito é ativo, não se encontrará

disponibilidade passiva para depósitos de informações. Isto significa dizer que o aluno

participa do processo educacional em todas as etapas, inclusive a definição dos temas e

conteúdos que compõem o currículo. Assim, para que a educação seja problematizadora, é

necessário que tenha características de transformação. Freire considera que é necessário um

reconhecimento mútuo, de que:

Faz parte das condições em que aprender criticamente é possível e pressuposição por parte dos educandos de que o educador já teve ou continua tendo experiência da produção de certos saberes e que estes não podem a eles, os educandos, ser simplesmente transferidos. Pelo contrário, nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinando, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim podemos falar realmente de saber ensinando, em que o objeto ensinado é apreendido na sua razão de ser e, portanto, aprendido pelos educandos (FREIRE, 1996, p. 14).

É por meio dessa concepção de educando, que Paulo Freire combate,

veementemente, o modelo de educação bancária. Posto que, dentro desta concepção, seria

inadmissível que o educando participasse do processo de definição dos conteúdos

programáticos e nos desse as contribuições necessárias, vindas de seu universo próximo. Por

outro lado, o opressor serve-se deste modelo de educação para a manutenção de um poder

hegemônico e uma ordem social injusta, onde depósitos e arquivamento de conhecimento são

incompatíveis com o aluno, que é o ator social no mundo, sujeito interativo e colaborador do

professor. Freire (1986), então, sinaliza uma radical transformação, na forma de pensar a

educação e a relação educador-educando (ensino propedêutico), que está enraizado neste

contexto de dominação cultural da América latina, desde sua colonização. Para Freire, o

ponto de partida para uma educação libertadora e problematizadora dar-se-á, a partir da

postura ativa de aluno em suas experiências vividas:

Uma das questões centrais com que temos de lidar é a promoção de posturas rebeldes em posturas revolucionárias que nos engajam no processo radical de transformação do mundo. A rebeldia é ponto de partida indispensável, é deflagração

justa o objetivo dos opressores. Dai que a “educação bancária”, que a eles serve, jamais possa orientar - se no sentido da conscientização dos educandos. Sua falsa visão dos homens simplesmente insere o homem no mundo e não com o mundo e com os outros. Quanto mais adaptados, para a concepção “bancária”, tanto mais "educados e proibidos do pensar verdadeiro. Para manter a contradição, a concepção “bancária” nega a dialogicidade como essência da educação e se faz antidialógica. A concepção e a prática “bancárias”, imobilistas, “fixistas”,

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da justa ira, mas não é suficiente. A rebeldia enquanto denúncia precisa se alongar até uma posição mais radical e crítica, a revolucionária, fundamentalmente anunciadora. A mudança do mundo implica a dialetização entre a denúncia da situação desumanizante e o anúncio de superação, no fundo, o nosso sonho (FREIRE, 1996, p. 47).

Entende-se que as experiências vividas dos oprimidos são essencialmente

opressoras. E para isso, Paulo Freire propõe transformar esta realidade opressora por meio dos

Temas Geradores. Os Temas Geradores são obtidos através da Investigação Temática, que

é utilizada como ferramenta para identificar a realidade vivida pelo aluno, nas experiências

que o cerca. Por exemplo, o professor de ciências e os alunos podem identificar, juntos, os

conteúdos de maior relevância. Neste sentido, considera-se o aluno como um sujeito

sócio-histórico, podendo levar em consideração, inclusive, o contexto econômico, científico e

tecnológico.

Então, no ensino de ciências, a apropriação dos conceitos da Pedagogia do Oprimido

pode permitir o rompimento com a concepção tradicional (avassalador e opressor) da ciência

e da tecnologia corroborada pelo contexto bancário de dominação para opressão e vice-versa,

o que contribuirá para a formação de um sujeito ativo nos processos decisórios dos

direcionamentos da ciência e tecnologia.

Nesse sentido, a Freire (1987) interessa o conceito de horizontalidade, uma vez que

favorece o trabalho ativo do educando e a ação mediadora do educador. Portanto, a

comunicação é um ato importante para Freire (1987, p. 45), pois considera que: “não há

diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens”. Da mesma forma,

amparado neste diálogo, que se começa a busca do conteúdo programático na superação da

contradição educador-educando. Assim, ambos, tornam-se, simultaneamente, sujeitos ativos

de todo processo pedagógico. Então, este preceito pauta-se no respeito e na vocação natural

do homem em ser mais. Onde, no processo de busca de sua libertação, o amor permita o

diálogo necessário que impeça a ação verticalizada da opressão e favoreça a ação

horizontalizada. Esta horizontalização, em que os conteúdos são definidos em conjunto, na

dialogicidade, também tem a função de impedir a invasão cultural sobre o oprimido, que é

outro mecanismo de opressão.

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Nesta dialogicidade horizontalizada, o educador passa a ser educando, à medida que

internaliza o problema local dos alunos e passa a modificá-lo, sem uma invasão cultural. Da

mesma forma, o educando passa a ser sujeito ativo, à medida que decide, junto com o

educador, os conteúdos programáticos obtidos dos temas geradores quando ensina ao

professor, a sua realidade vivida. Neste contexto, a pedagogia de Paulo Freire pauta-se numa

educação libertadora feito pelo e com o aluno e não para o aluno.

No campo científico tecnológico, em conjunto com os alunos, podemos articular

temas locais relacionados às conseqüências sócio-ambientais que o desenvolvimento

científico-tecnológico traz para a realidade vivida dos mesmos. Discutiremos mais adiante,

esta articulação com as contribuições de Paulo Freire e o Movimento CTSA

(Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente).

3.3 Contribuições de Freire para o Ensino-Aprendizagem em Ciências: A Articulação