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Perspectivas da emoção

No documento carloshenriquegoncalves (páginas 61-65)

CAPÍTULO 3: PSICOLOGIA DA EMOÇÃO

3.3. Teorias cognitivas da emoção

3.3.2. Teoria da emoção de Richard Lazarus

3.3.2.2. Perspectivas da emoção

Para uma maior compreensão sobre a emoção, Lazarus (1991b) apresenta uma série de perspectivas sob as quais propõe que o estudo da emoção seja realizado. As emoções pareceriam diferentes de acordo com cada perspectiva, seriam elas: a individual, o do observador, a da sociedade e a da espécie biológica.

Perspectiva individual: Sob a perspectiva individual, ou seja, do indivíduo que sente a emoção, para Lazarus, ocorre que, diante de uma emoção intensa nossa atenção se concentra nos danos ou benefícios, e o que devemos fazer sobre o evento. Nesse momento, somos envolvidos na relação que estamos estabelecendo com o meio ambiente, na urgência de reagir, nas sensações associadas com esta relação, e nas reações que são provocadas. Realça também que embora a análise do fato, sendo feita como se estivéssemos destacados como observadores de nós mesmos durante a experiência, estivéssemos sujeitos a uma falsificação subjetiva. Segundo o autor, é provavelmente mais fácil ser um observador ou fazer uma análise de nossa emoção depois que a experiência terminou, do que durante a vivência da experiência. Tal reflexão é explicada por Lazarus pelo fato de que uma atitude analítica poderia obliterar ou enfraquecer a emoção; onde o desprendimento intelectualizado se mostra como um método poderoso de regulação ou enfrentamento da emoção.

Geralmente nos lembramos do que aconteceu no momento em que vivenciamos a emoção, não necessariamente de tudo, o que indica que nos observamos ao longo da experiência. Para Lazarus é uma conjunção confusa entre o que observamos e a experiência em si, porque experimentar e lembra-se envolve percepção e julgamento, e quando nos lembramos da experiência nossa a perspectiva se assemelha mais a de um observador exceto pelo fato de termos acesso a uma gama maior de informação do que o observador: temos a oportunidade de perceber alguns de nossos pensamentos, atos impulsivos e sensações corporais, melhor do que qualquer observador externo.

Diante de um debate sobre se a emoção interrompe ou interfere num fenômeno, se organiza ou desorganiza um comportamento, Lazarus prefere entender que a emoção muda o

foco da atenção da pessoa com relação ao que estava fazendo antes da emoção para uma outra preocupação, ou seja, a demanda focal da experiência e a emoção que a experiência cria. Emoções direcionam o foco da atenção em certas preocupações, e dentro desta lógica distraem a atenção de outras preocupações que não estão pressionando no momento.

Lazarus cita um aspecto desorganizador da emoção atuando na fragmentação do pensamento e da ação, além da característica da mudança de foco atencional, faz menção aos interesses de pesquisadores em seus estudos, principalmente nas décadas de 50 e 60, de como emoções fortes poderiam interferir na capacidade de resolução de problemas e pensamentos. Quando uma pessoa está em uma situação traumática, percepção e pensamentos podem estar debilitados, bloqueados, distraídos ou até mesmo paralisados. Um exemplo de como não prestamos atenção, ou levamos em consideração informações fornecidas logo após um evento catastrófico é mostrado na situação a seguir: um paciente recebe a notícia de seu médico sobre o diagnóstico de um câncer inoperável e logo em seguida este mesmo médico lhe fornece informações acerca do caso. É presumível que, diante da emoção ocasionada, este paciente não preste atenção nas informações subsequentes, e nem sequer as escute. Neste caso, seria recomendável que um tempo transcorresse entre uma informação e a outra. Outro exemplo citado por Lazarus acerca da repercussão emocional no indivíduo seria como funcionamos diante da avaliação de uma ameaça ou de um desafio. Diante de uma ameaça nos sentimos incomodados, ansiosos, o que não seria unicamente desconfortante mas também teria a capacidade de restringir a habilidade de pensamento e o desempenho. Esta restrição estaria conectada a um grande esforço de autoproteção diante da antecipação de um perigo. Já diante de um desafio, nos sentiríamos bem e aptos a uma considerável expansão de nossa funcionalidade, com a capacidade de produção de pensamentos relevantes.

A emoção, para Lazarus, seria também informativa ao indivíduo que a experimenta. Seria como uma fonte de insights sobre si e sobre o que está acontecendo, e que quando reagimos com raiva, ansiedade, alegria, ou outra emoção, existiria uma certa consciência e entendimento de como a emoção surgiu assim como a sua reação. Sabemos logo depois, fruto de uma reflexão, que estamos aborrecidos e o motivo foi a forma hostil, crítica ou irresponsável com que alguém se dirigiu a nós; ou que estamos ansiosos porque estamos vulneráveis a uma situação que nos parece ameaçadora. O ponto relevante do exposto, segundo Lazarus, é o fato de que se prestarmos atenção, as emoções podem nos informar sobre processos psicológicos que podem não ter sido percebidos.

Perspectiva do observador: O observador (Lazarus, 1991b) é todo aquele que infere a presença de uma emoção em outro, pelo que pode observar e ouvir. Pode ser um amigo, inimigo, um pesquisador em função de estudar o fenômeno da emoção, um clínico em tratamento terapêutico junto a um cliente com queixa de desconforto emocional, e até mesmo pessoas que estão experimentando a emoção mas que estão em observação a si mesmos. Observar emoções pressupõe a capacidade intrínseca dos mamíferos de comunicar, e neste caso a comunicação da emoção, seja de forma proposital ou não, através de suas expressões emocionais, suas ações intencionais e o seu discurso acerca de suas experiências subjetivas. Nosso comportamento social é constantemente guiado por dicas que interpretamos das emoções dos outros, dicas estas que nos revelam as ações, impulsos e intenções dos outros. Decodificamos e interpretamos comunicações e falhas nas comunicações que as pessoas muitas vezes enviam e recebem em suas relações sociais, que muitas vezes são conflitantes. Não confiamos em quem aparenta ser hostil em nossa direção, e ainda interpretaríamos como uma ameaça, comprimentos verbais ou expressões acolhedoras que nos pareceriam desconectadas se pressentíssemos maldade, mas ao mesmo tempo poderíamos entender intenções benignas em pessoas que superficialmente tem atitudes de ameaça. Tais circunstâncias ilustram, para Lazarus, a complexidade dos julgamentos que fazemos.

Uma suposição importante e que está às vezes implícita no exposto acima acerca da perspectiva do observador, é o fato de que podemos verdadeiramente entender os estados mentais de outras pessoas e as implicações para o nosso próprio bem estar ao fazermos inferências dos sinais percebidos de nossa visão, audição ou outros sentidos.

Lazarus (1991b) aponta quatro aprendizados que podemos ter das reações emocionais em outras pessoas:

1. A partir da premissa que emoções são fenômenos baseados em regras e não sistemas caóticos, a qualidade e intensidade das emoções nos diz sobre os relacionamentos contínuos entre o indivíduo e os seus ambientes. Se a emoção é raiva, sabemos que o relacionamento envolve danos, ameaças e insultos, dependendo de como se conceitualiza a raiva. Se a emoção é ansiedade, certamente envolve ameaça e o impulso de evitar ou escapar.

2. A emoção também pode nos dizer o que é importante e o que não é importante, em um encontro ou na vida. Não nos aborrecemos com o que não é importante. Se existe aborrecimento com algo em que as evidências apontam para a falta de importância, algo do ponto de vista pessoal está em jogo, e portanto é importante, mesmo que seja negado.

3. Observando como uma pessoa avalia seus relacionamentos com seu meio e as emoções resultantes, podemos saber muito sobre as crenças da pessoa sobre si e o mundo.

4. Uma emoção pode nos dizer como uma pessoa avaliou um evento com relação a sua importância para seu bem estar, e também fornece dicas das estratégias e formas de avaliação da pessoa para com os eventos relevantes de sua vida. (pp. 22 – 23)

Para Lazarus, a emoção que os pacientes experimentam é a fonte mais rica de informação sobre os aspectos psicodinâmicos, especialmente as emoções recorrentes do contexto social em que ocorrem, e sob uma ótica terapêutica, é considerado uma ferramenta universal a observação das reações emocionais no aqui e agora, e em algumas ocasiões sugerir ao paciente que revisite sua aflição emocional de uma experiência vivenciada em um passado distante ou recente.

Perspectiva da sociedade: De acordo com Lazarus, o que é revelado sobre as pessoas e suas reações emocionais, também serve como informação das comunidades sociais e seus padrões emocionais compartilhados, o que é de interesse também a sociólogos e antropólogos preocupados com os sistemas sociais e culturas. Revoltas sociais, distúrbios coletivos, podem ser pensados como variantes sociais de raivas individuais envolvendo atitudes de agressão, e pânico generalizado como variantes sociais de medos individuais envolvendo atitudes com o fim de escapar ou evitar. A relevância desta perspectiva estaria na possibilidade de cientistas sociais avaliarem as instituições sociais e seu resultado na saúde física e mental coletiva. Lazarus complementa apontando não ser difícil conceber os estados emocionais positivos ou benignos como a felicidade, o amor, o orgulho, a gratidão como contribuintes para a preservação da estrutura social.

Perspectiva da espécie biológica: Do ponto de vista biológico, Lazarus vai dizer que dois temas são observados: o primeiro diz respeito à neurofisiologia, através das diversas porções do cérebro, o sistema nervoso periférico e hormônios que servem como neurotransmissores e reguladores das atividades metabólicas e motoras; e o segundo se refere a um processo biológico hereditário, ou programa emocional. De um ponto de vista filogenético, as emoções devem ter contribuído para promover a sobrevivência da espécie humana, e Lazarus (1991b) cita duas funções, que no seu ponto de vista estão relacionados à sobrevivência, ambos sociais e fisiológicos, são eles a comunicação social, e o outro é sustentar a mobilização psicológica e fisiológica diante de ameaças.

No documento carloshenriquegoncalves (páginas 61-65)