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8 RESULTADOS E DISCUSSÃO

8.1 Significações da velhice em ILPIs

8.1.4 Perspectivas para o futuro

Esta categoria possui 72 unidades de registro, presente nas ILPIs, pública (20UR), filantrópica (18 UR) e privada (34 UR). Os conteúdos aqui organizados apresentam as perspectivas que os idosos possuem em relação ao futuro, incluindo os seus próprios planos e objetivos. Nos três contextos, as perspectivas envolveram normalmente planos de saída da instituição ou a “ausência de planos para o futuro”, consistindo, segundo os idosos, na espera da morte.

Conforme Camarano e Barbosa (2016), estudos mostram que a entrada na instituição de longa permanência geralmente não é acompanhada de uma perspectiva de retorno dos idosos para a comunidade e para os seus familiares, o que é reforçado pelos dados empíricos que mostram muitos anos de institucionalização. Estes dados, contudo, diferem dos apresentados pelos idosos da nossa pesquisa, que apontam para o desejo e até o planejamento de saída da ILPI, inclusive por idosos com longos períodos de institucionalização.

Nas três instituições, encontramos idosos com expectativas de sair da ILPI. Mas, destacamos que na instituição pública, foi dada maior ênfase a este aspecto, incluindo planos de trabalhar. O fator econômico foi apontado pelos participantes como uma das principais causas para ainda permanecerem na instituição e que solucionadas questões de aposentadoria e benefícios sociais, eles pretendem retornar à comunidade.

Sim, é, completar, receber meus trocados do INSS, aí lá fora alugar até o barraco se possível. Porque eu poderia até morar lá no Vasco da Gama, Casa

Amarela, mas se eu tiver de morar fora, também moro, tem problema nenhum. To legal! Aí a vida continua (Benedito, 65 anos, ILPI pública). Querida, meus planos para o futuro, eu tô agora, tem um projeto lá na coisa, que fui eu que dei o nome, lobo-guará, onde eu vou ensinar o povo vai fazer arte, artesanato, bolsa, cinto, brinco, essas coisas. Eu tô bem encaminhado nisso aí, tô esperando sair, chegar a carta (do INSS) aí já para sair da casa (Luciano, 67 anos, ILPI pública).

Embora, considere a possibilidade de viver o resto de seus dias em ILPIs, pela falta de vínculos familiares e por não ter condições de morar sozinha, a idosa Bernadete, residente da instituição pública há cerca de 8 anos, não descarta também a chance de retornar a trabalhar e porventura morar com amigos.

Minha filha, saindo daqui eu vou para o abrigo, eu vou ver se eu consigo rever, renovar meu curso de técnico de enfermagem para botar em dia porque eu não posso ficar parada, né? (Bernadete, 69 anos, ILPI pública). Nota-se que esta categoria é atravessada pelas representações sociais que os idosos possuem sobre a velhice. Apesar de social e culturalmente ser feita uma associação entre velhice e morte (COCENTINO; VIANA, 2011), no contexto da ILPI pública sobressai uma noção de velhice como fase do desenvolvimento ativa e produtiva, contrariando a visão predominante na nossa sociedade de velhice como declínio.

É característico das instituições públicas no Brasil uma atuação no sentido de reversão da institucionalização de modo a viabilizar o retorno dos idosos ao convívio em sociedade, uma vez que estejam em condições necessárias para tal, dispondo de renda e moradia e com acesso aos demais direitos (BERZINS; GIACOMIN; CAMARANO, 2016).

Apesar da ênfase na expectativa de saída da ILPI pelos idosos da instituição pública, o idoso Dionísio foi uma exceção, pois, a sua perspectiva é esperar e preparar-se para a morte, referindo encontrar-se já no fim da vida.

Ao futuro? Eu não tenho mais planos para o futuro, eu vou lhe explicar o porquê. Porque eu estou no fim da vida, estou com 81 anos, a realidade é essa. Meu prazo de validade já venceu-se há muito tempo. Então, não tenho planos para o futuro. Meu plano para o futuro é me preparar para em minhas orações com Jesus pedir a Ele amparo e uma vaguinha no abrigo lá no céu, uma vaguinha para mim lá. (Dionísio, 81 anos, ILPI pública).

Este aspecto também esteve presente nos contextos das ILPIs filantrópica e privada, onde, inclusive, foi mais evidenciado. Nestes contextos, notamos que as representações

sociais de velhice guardam uma relação com a morte, implicando na “ausência de planos para o futuro” nessa fase do ciclo da vida, ou a perspectiva é de espera da hora da morte.

A morte é uma coisa de certeza. Eu vim para aqui esperar o quê? Ela. Vou esperar o quê? Sair daqui e ir para uma casa, ter marido, ter filho, ter um lazer? Não, minha filha. Esperar minha morte, vim para aqui para esperar ela. Se ela chegar agora, tá bom, se chegar amanhã, tá bom. Não tem opção não. Opção de que? Já com 71 anos. (Fernanda, 71 anos, ILPI filantrópica). Que futuro, minha filha, a gente vai ter mais? Tem nada. Tem não. Eu não. O que eu planejo é precisar de ir a uma loja de sapato para comprar uma sandália, olha como ela tá feia. O meu futuro, é o que eu penso, entendeu? Mas, o mais vai ser o quê? 83 anos, qual é o futuro? (riso). Tem não, amor. (Eliane, 83 anos, ILPI filantrópica).

Honestamente, não tem planos. Qual é o plano que eu vou ter com essa idade? Eu peço, o que eu tenho, o que eu penso, o que eu tenho é pedir a Deus que me dê boa hora, é o que a gente espera, boa hora e que proteja a minha sobrinha (…) (Gardênia, 89 anos, ILPI privada).

Os idosos acreditam que devido à velhice não possuem tempo de vida suficiente para planejar um futuro. É, portanto, uma visão carregada de conotações negativas sobre a velhice, encarada como declínio e morte. Sobre isto, Correa e Hashimoto (2012) destacam que ainda que se tenha consciência de que a morte pode chegar em qualquer fase do ciclo da vida, a velhice é concebida como detentora da proximidade da morte.

Essa visão pode ser reforçada pela redução do valor do idoso na nossa sociedade. Potencializa-se a longevidade, ao passo em que a importância social dos idosos é negada, as pessoas querem viver muito, mas não envelhecer ou parecerem-se com velhos (SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008). O idoso que antes era detentor da sabedoria, passa a ser um excluído, e estereótipos negativos atrelados à velhice são muitas vezes assimilados por ele, levando-o a acreditar que mesmo sem ter morrido, sua existência findou (MUNHOZ; GIACOMINI; CARVALHO, 2015).

Além disso, vemos que a perspectiva compartilhada por esses idosos, explícita principalmente no trecho da fala da idosa Fernanda: “A morte é uma coisa de certeza. Eu vim para aqui esperar o quê? Ela. Vou esperar o quê? Sair daqui e ir para uma casa, ter marido, ter filho, ter um lazer? Não, minha filha. Esperar minha morte, vim para aqui para esperar ela (...)”, corrobora o que a literatura mostra sobre as instituições de longa permanência serem lembradas como um lugar onde se vai esperar pela morte (CHRISTOPHE; CAMARANO, 2010; DAVIM et al., 2004; NOVAES, 2003; BORN, 2001).