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A pesquisa na qual é utilizada a documentação como procedimento para a obtenção ou produção de dados ou informações necessárias à solução ou compreensão de um problema científico é denominada de pesquisa documental224.

A documentação é a ação de documentar, organizar o conjunto de todos os registros encontrados como forma de expressão física ou virtual de informação de primeira mão que interessam à pesquisa. Mas também é o domínio da técnica ou habilidade de tirar o maior proveito possível dos documentos enquanto depositários de conhecimentos; e o documento é um suporte que guarda conhecimentos ainda não processados. Por isso...

Não existe investigação sem documentação. Para realizar o estado da arte, a pesquisa documental é um procedimento central da investigação, pois permite ao investigador: alargar o seu conhecimento teórico; situar comparativamente a problemática; conhecer resultados interessantes225.

Portanto, a documentação é necessária para se proceder qualquer investigação, mormente a pesquisa historiográfica, tão importante para que se tenha conhecimento do passado, se compreenda o presente e trace perspectivas de futuro, daí a assertiva de Marc Bloch: “a incompreensão do presente nasce fatalmente da ignorância do passado. Mas talvez não seja menos vão esgotar-se em compreender o passado se nada se sabe do presente226.

Há unanimidade no que disse Marc Bloch, no entanto, há divergência quando se trata de construir e usar os métodos e as técnicas no ofício de historiador, pois a “história tradicional” é diferente da “história problema” como é explicitado abaixo:

A fonte interpretada pelos métodos da historiografia tradicional só nos comunica aquilo que passou pela reflexão do seu criador: o cronista, o escritor, o religioso, o legislador, o escrivão e, por conseguinte, está condicionada pelas concepções e interesses desse criador. Ela já contém a interpretação dos factos que narra.

224 GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 45-47 225 ESTEVES, [2015]b), op. cit.

Todavia, quando o historiador consegue ouvir o passado e também quando estuda toda uma variedade de objetos materiais, acaba por entrar num contato mais direto com a sociedade estudada e obtém fragmentos não filtrados da autêntica realidade histórica227.

A história tradicional é factual e não abre espaço para a diversidade de pontos de vista, privilegiando a descrição, o “quando” e o “como”; enquanto a nova concepção da história, inaugurada com Lucien Febvre e Marc Bloch, avança para a história problema, priorizando o por quê. Para a história problema, “o conceito de fonte liberta-se do espartilho da fonte escrita, de preferência inédita, para se alargar a tudo o que possa testemunhar a história humana, incluindo os silêncios das próprias fontes ou os fenómenos da natureza”228. Portanto, nessa concepção, “o

bom historiador se parece com o ogro da lenda. Onde fareja carne humana, sabe que ali está a sua caça”229, haja vista que compreende a história como a ação do

homem no tempo e no espaço.

A história é, em essência, conhecimento por meio de documentos. Desse modo, a narração histórica situa-se para além de todos os documentos, já que nenhum deles pode ser o próprio evento; ela não é um documentário em fotomontagem e não mostra o passado ao vivo ‘como se você estivesse lá’230.

Trata-se de informação indireta mediada pelo temporal. “A ‘matéria’ sobre a qual o historiador trabalha é de caráter muito peculiar: restos materiais de atividades humanas, relatos escritos, relatos orais, textos de qualquer gênero, vestígios de todo tipo, documentos administrativos, etc.”231. Os materiais de trabalho do historiador

são as fontes, as quais já se encontram feitas, exceto quando na história presente faz uso da história oral.

A fonte não se constitui no tudo para o historiador, mesmo que o método historiográfico esteja estreitamente ligado às fontes, uma vez que a fonte não é neutra, pois precisa ser construída pelo historiador sob a perspectiva da

227 ESTEVES, [2015]a, op. cit. 228 Ibid.

229 BLOCH, 2001, op. cit. p. 54.

230 VEYNE, Paul Marie. Como se escreve a história. Brasília, DF: EdUnB, 1998, p. 18. 231 ARÓSTEGUI, 2006, op. cit. p. 94.

temporalidade, para que assim possa ser chamada fonte histórica, própria para a operação historiográfica, mediante técnicas. Nesse ponto

... o método é um conjunto de princípios sempre ligados à teoria, enquanto as técnicas, que são as que realmente devem se adaptar em cada caso à natureza do objeto de investigação, podem ser compartilhadas e são intercambiáveis entre diferentes disciplinas”232.

A exemplo do uso do questionário, por quase todas as ciências sociais, ou a exploração do arquivo e outros tipos de fontes escritas, frequentemente por historiadores, no processo de elaboração desta tese intitulada: “De escolas superiores e federação a universidade: uma história da Universidade Estadual do Maranhão (1966-1994)”, dispôs-se de fontes não escritas, escritas, oficiais e não oficiais e estatísticas. Isso porque nenhuma fonte se basta a si própria, pois todas, ao bem da verdade, têm que ser analisadas em associação outras; mas as não escritas merecem um maior cuidado, principalmente na atualidade, pois são mais vulneráveis a manipulações. Portanto, faz-se necessário "interpretá-las com prudência, compará-las entre si e com as fontes escritas disponíveis”233. Das fontes

não escritas são distinguidos quatro conjuntos: a) objetos e vestígios materiais, b) iconografia, c) fontes orais e d) imagem e som registrados. De todas essas modalidades de fontes não escritas foram encontrados exemplares sobre a UEMA, dos quais se lançou mão nessa investigação.

Nesta pesquisa, quanto a objetos e vestígios materiais, foram encontrados instrumentos de trabalho docente, que ao longo desse tempo ficaram obsoletos, tais como episcópio, projetor de slide, retroprojetor, quadro de giz e carteiras escolares duplas; máquinas de escrever e de calcular, bem como as maquinarias das oficinas dos cursos de Mecânica, de Engenharia Civil e de Agronomia; o “trenzinho” e seus trilhos, veículos; os arquivos dos departamentos, das escolas e faculdades, da prefeitura, das pró-reitorias e da reitoria. Também se constituem num volume grande de vestígios as placas de formatura e de inauguração, bem como os prédios e monumentos comemorativos, os escudos ou brasões da UEMA e as logomarcas dos sucessivos reitores.

232 ARÓSTEGUI, 2006, op. cit. p. 96.

233 ALBARELLO, Luc et alii. Práticas e métodos de investigação em Ciências Sociais. 2.ed. Lisboa, PT: Gradativa,

Quanto à imagem e som registrados, há uma abundância de fotografias das mais diversas ocasiões, bem como vídeos ou pequenos filmes, tanto em poder da instituição quanto dos sujeitos que nela tiveram vida ativa ao longo dos 28 anos correspondentes ao marco temporal (1966-1994).

Mas a profusão maior desse bloco de fontes não escritas são as fontes orais não registradas, com testemunhos vivos diretos das ações que provocaram transformações na vida da UEMA, passando de um simples aglomerado de escolas superiores, depois passando a uma federação de escolas e posteriormente obtendo o estatuto de universidade, cuja trilha conheceu a intervenção dos sujeitos: alunos, professores, administrativos, dirigentes e políticos com uma multiplicidade de interesses.

Poderíamos citar aqui as tradições orais, as canções populares (muitas vezes canais de oposição política e social), os discursos, os depoimentos, as entrevistas, as declarações, os debates, as palestras, os boatos ou simplesmente o fato de se ter vivido um acontecimento234.

Tanto num caso como noutro não se pode descartar o acentuado peso das subjetividades, pois ninguém faz uma fotografia ou constrói um prédio de forma neutra, por exemplo, pois as ações dos homens na sociedade estão carregadas de intencionalidades diversas, num jogo de relações objetivas e subjetivas.

As fontes escritas são de três modalidades: os documentos oficiais (arquivos) públicos e privados; as fontes não oficiais, tipo imprensa, revistas e publicações periódicas, livros e documentos intermediários; e as fontes estatísticas (estatísticas correntes e análises estatísticas). Dessas três modalidades, nessa investigação tem-se feito um exame dos documentos oficiais e não oficiais, os quais ainda não receberam um tratamento arquivístico, e que são abundantes.

Todo o conjunto dos documentos foi submetido à crítica externa e à crítica interna, pois o historiador terá que ter sempre presente na sua consciência de que o seu ofício tem um compromisso com a verdade, mesmo sabendo que a verdade absoluta de um acontecimento é algo quase que impossível de ser atingida. Mas o historiador, não obstante os relativismos superabundantes nos tempos pós-

modernos, terá que carregar consigo, sempre, a presunção de que a verdade é possível de ser alcançada por uma criteriosa e persistente investigação científica, muito embora a verdade seja sempre uma construção do historiador na relação com suas fontes em meio a todos os condicionamentos sociais, econômicos, políticos e culturais a que está exposto.