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Pesquisadora - Ele mora aqui?Ele tem alguma doença degenerativa?

Juiz -

Em XXXXX. Não sei. Não pesquisei essa parte de saúde. Mas ele assim, me abraçou. Daí tirou uma foto com o celularzinho bem simplesinho. Bateu uma selfie comigo. Esses casos... ele faiou• “pô, sempre achei que nunca ia conhecer um juiz", né? Então têm casos que são bem emocionantes, né? Ele saiu dali...E esse menino, esse menino ele morre de medo do pai, deve estar num desses que eu vou ler pra você. Ele morre de medo porque o pai foi uma vez lá na casa dele e fez ele sair da cama... Ele não consegue sair da cama sozinho., pra ir pra cadeira, jogou ele no chão. Ele sonha que o pai vai entrar lá e matar. Então, eu determinei uma medida de afastamento pra ele. Porque o pai dele, se se aproximar, só vai causar prejuízo, não vai ajudar em nada o desenvolvimento dele. Daí eu fiz, o promotor pediu, montei uma decisão determinando o afastamento...o pai dele não sei se já foi intimado. Muito provavelmente sim. Isso já vai dar uma tranquilidade pra ele. Porque ele tem medo que o pai invada a escola, que entre atirando.. Ó a imprensa, né? Que o pai dele entre atirando, que mate outros colegas dele, aí já entra um pouco no déficit dele. [...] daí eu faiei para ele.• próxima vez, você fala pro seu pai que você é amigo do juiz. Coisas assim...

Conhecendo essas histórias, que denomina como fantásticas, o juiz se aproxima dessas pessoas, estabelece com elas conversas que tornam suas existências preocupações pessoais. Essas informações são fundamentais para as determinações feitas aos serviços públicos e o acompanhamento da sua execução, feito por ele e por sua equipe:

[...] até esse é um dos casos que eu tenho que olhar pra ver como é que tá... têm dias que eu não

olho, aí me preocupo.

Essas audiências agilizam os processos, oferecendo mais chances das alunas e alunos retornarem num período em que ainda é possível ter aproveitamento no ano letivo:

Porque aqui a gente faz o seguinte. Esse auto é uma parte da audiência coletiva, o promotor assina. Eu, o promotor, o chefe do Núcleo. Daí aqui o promotor já faz pedidos, conforme ele começa aqui, junto com o auto, já seria o suficiente. Mas aqui a gente já qualifica, a gente já coloca... o promotor já justifica o porquê de tudo isso. Daí ele acaba formatando o pedido inicial pra lavrar o auto e eu já recebo. Aqui a gente já tá unindo o que duraria uns 3 meses. Por que esse auto seria digitalizado e é colocado no processo eletrônico. Daí vai pra mesa do promotor, pro computador do promotor, ele ia formatar esse pedido aqui. Esse processo viria pro cartório, o cartório ia receber e mandar concluso, que é termo que manda pro juiz e a nossa equipe ia preparar essa decisão inicial aqui. Aqui a gente já ganha uns 3 meses. Aí a gente já começa o

acompanhamento da família de imediato, no dia seguinte...

(Juiz)

Segundo o juiz, o objetivo do processo por abandono intelectual não é punir a família, mas poder acompanhá-la durante o tempo em que está em situação de risco, até o retorno dos alunos e das alunas aos bancos escolares. A multa só é aplicada em situação de dolo, quando os familiares intencionalmente dificultam ou impedem a frequência das filhas e dos filhos na escola. Os processos não são encaminhados para o setor de execuções, porque aí ele sairia da Vara da Infância e Juventude, dificultando a possibilidade de acompanhar o caso.

A multa é determinada pelo próprio juiz, que a justifica pelo seu benefício pedagógico. Quando há a determinação de pena pecuniária, que na lei pode variar de 3 a 20 salários-mínimos, o valor é calculado considerando as condições socioeconômicas, podendo ser bem abaixo desse valor. Ela encerra em si duas penalizações: por não cumprir a lei e por não acatar as determinações dos/as operadores/as do Projeto Combate à Evasão Escolar.

Na entrevista, o juiz explica os critérios que utiliza para determinar a multa:

Dolo é aquele que pega o carro e diz■ vou matar o sujeito, acelera e vai matar. Culpa é quando tá dirigindo mais distraído e atropela. Então, na culpa a gente não chega a dar a multa. É mais quando tem um dolo. Aí [o familiar ou o aluno] faia.■ ‘ah, eu não tô nem aí, nem queria tá nessa audiência aqui, esse negócio de estudar não dá em nada... ’ É uma coisa assim... quando a gente não consegue se aproximar e fazer um diálogo. O diálogo ali, ele praticamente...a gente tentou na escola, tentou na audiência coletiva, tentou na Escola de Pais, tentou na audiência judicial, tentou na entrevista psicológica individual e ele não consegue se aproximar daqueles pais. Aí, vai pra multa. Tem alguns casos que é interessante, iem muitas situações que o pai quer que o filho volte a estudar, mas perdeu o controle do filho. Nunca vai dar multa. E tem casos que é ao contrário.■ o filho quer e o pai é omisso. Aí precisaria o pai ajudar, vai atrás de uniforme, toma uma providência mais ativa né? Tinha que ter assinatura lá pra conseguir o transporte de graça, o pai não assinou. E tá lá um mês parado porque o pai não assina. Esses casos a gente vai pra multa.

Mas são casos, assim, que têm uma conduta mais ativa. Uma conduta omitiva, praticamente ativa mesmo. A omissão é por ação, né? Por não fazer de propósito mesmo. Daí independe da classe, sabe. Isso nos preocupa muito porque os casos mais simples.. Tem casos que a gente aplica multa e depois cancela. Ou seja, ele é condenado, mas não vai ter que pagar a multa. Porque é situação de extrema pobreza. E os casos em que a família tem dificuldade, a gente diminui bastante...

Porque aí três salários mínimos dão 2.600, 2.700 reais. Diminui pra 100 reais. Menos de 100 eu nunca apliquei. Mas diminui pra 100 em 10 vezes, em 20 vezes. É um dinheiro que consegue tirar, e não é que vai causar uma falta, mas aquilo vai... mas também se não causar... se for pra dar R$ 1,00... Tem que ter o aspecto pedagógico, né? Vai tirar uma moeda ali que apareceu no chão e deixa no balcão do Fórum... Daí 10 ou 20 reais vai... Puxa, esses 20 eu poderia fazer outra coisa, né.■ Por que que eu tô pagando isso? É uma família com dificuldade? Algumas são. Mas aí o aspecto pedagógico, pra pesar no bolso.

A multa é a última cartada. No jogo que define quem tem culpa e quem tem dolo, vários aspectos são considerados. O juiz entende que existem várias condições que podem provocar a evasão e a infrequência. Essa multa provoca o temor de muitas famílias, que obrigam seus filhos e suas filhas a voltarem a estudar, independentemente da situação pela qual estão passando. Encontrei esse temor nas duas alunas e no pai do aluno que entrevistei:

Pai

de David -

Mas aquele dia que nós estávamos lá, ela falou.■ A matéria dele tem que fazer todo

dia. Mas tem que ir pra aula. Mas não, ele “é pai, eu não vou". Mas vai. Mas tem que ir, homem

do céu! Que que adianta nós prosear com o juiz, e ele não vai, e o juiz me prende eu. De onde é

que vamos tirar três mil reais? E eu vou levar cadeia, e ele vai ficar na boa, porque ele é de