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162 essa pessoa está doente; então quando ela entra com um afastamento, ou licença, é muito comum ela ser má

vista pelo resto dos funcionários. Comentários como ‘também vou arranjar licença’, ‘eu também estou ruim’, isso é normal.

 Quais são os problemas de doença e afastamento mais recorrentes, segundo sua percepção? Conheço muita gente que já tirou licença, ao longo da carreira, por causa de depressão. Tenho uma amiga que há dois anos vem se consultando com psiquiatra e tomando remédios por causa de pressão no banco, que afeta a saúde inteira. E o resto, todas têm problemas de saúde, que se você for ver, é tudo muito ligado ao emocional. Problemas de gastrite, palpitação, mal estar é muito comum. E isso normalmente você não tem como quantificar e dizer que foi o banco que causou. É muito subjetivo, mas quem está trabalhando sabe, que se levantou bem, dependendo do que aconteceu no banco, volta para casa pior. E se tiver qualquer probleminha, acaba se agravando, e isso não é visível para quem está bem trabalhando.

Tem muita gente que conheço que fica mal, não só de depressão, mas mal também fisicamente. Começa a ter dor de cabeça, dor de estômago, e vai procurar um médico e entra com uma licença. E sempre tem umas brincadeirinhas, mesmo de supervisor, de falar que a pessoa é folgada, que vira e mexe entra com atestado.

 Quando ocorre um afastamento na agência, qual é a reação dos colegas e superiores?

Quando a agência é pequena, é mais fácil de saber o que está realmente acontecendo, ou quando você é próximo da pessoa que está tendo problemas.

A minha amiga tinha LER na mão, chegou a sofrer uma cirurgia, e tinha dores crônicas no corpo – na lombar, nas pernas. Acho que o problema maior mesmo era emocional, de tensão. Ela era uma pessoa muito expansiva, mas que guardava muito para ela. Ela ficava brava na hora, mas você via que ela ficava remoendo aquilo o dia inteiro. Ela se aposentou por invalidez pelo problema na mão, mas ela reclamava muito de dor nas costas, e dor nas pernas. Às vezes ela não chegava a pegar licença, mas tirava um ou dois dias para ir ao médico.

No caso da outra, que é bipolar, para quem está próximo e você vê, quando ela está bem, se nada acontece de muito grave no dia a dia ela fica bem, mas ela é uma pessoa frágil, e também não é muito ativa no trabalho. Se o chefe dela não tiver empatia e compreensão, e cobrar muito dela, ela cai, e por várias vezes, quase todas às vezes, quando ela está na fase ruim, ela pede demissão. Ela nunca saiu do banco porque sempre o chefe sabia da condição dela, ou a gente avisava para não aceitar porque ela é bipolar. Ela ligava chorando e depressiva, e pedia demissão. A hora que ela melhorava, voltava com tudo para o trabalho. Se ela estiver em uma agência muito grande e conviver com pessoas que não conhecem o histórico dela, ela já teria saído do banco, e o pior é que ela não tem condições de arranjar outro trabalho. Numa agência menor é mais fácil de ter solidariedade com quem trabalha com você, mesmo que não seja amigo, ou não seja colega íntimo. Numa agência maior é mais difícil.

É lógico que em toda a agência tem um caso de funcionário que todo mundo sabe que ‘leva com a barriga’, e faz o mínimo possível para voltar amanhã e trabalhar de novo, e não faz mais que isso. Então a gente fala que quando acontece alguma coisa e ele pega um atestado, a gente sabe que ele não está com um grande problema. Mas tem gente que você vê que realmente tem problema, mas numa agência menor é mais fácil as pessoas entenderem, porque estão convivendo com você mais próximo. Mas é normal assim, já trabalhei, por exemplo, na agência Centro de Campinas com 130 funcionários, então eu sei que quando tem muita gente... Eu lembro que quando entrei no banco, e nem sabia o que era LER, uma moça que estava afastada acho que há mais de um ano por causa de LER voltou a trabalhar com restrição por causa de LER. Mesmo assim colocaram-na para entregar holerite, em que ela tinha que ficar o dia inteiro fazendo isso daqui [movimento com as mãos procurando holerites no arquivo]. Ela reclamava e todo mundo caia ‘matando de pau’ em cima dela, e falavam: “nem para entregar holerite ela serve?”. Ela tinha acabado de ter uma LER violenta, e tinha que ficar o dia inteiro procurando holerite. Devia ser um sofrimento enorme para ela, mas para quem está de fora parece que a pessoa está fazendo corpo mole, entendeu? Então, sinceramente piora o quadro da pessoa. Você acha que ela não serve para entregar um holerite, mas se o problema dela foi tendinite, não dá! Se ela fizer isso o dia inteiro, é um movimento curto e repetitivo o dia inteiro. Eu sei, porque a minha tendinite no ombro é gerada por causa da digitação. Eu tenho no ombro, tem gente que tem no antebraço, depende de onde você faz a força e faz a sustentação. Independente onde ela tinha ela fazer esses movimentos com os dedos o dia inteiro... E realmente, para quem está de fora olhando, realmente falava: “o que ela está fazendo no banco, se ela não serve nem para entregar holerite?”. Mas é complicado para a pessoa, joga para baixo mesmo. É muito difícil.

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Sofre.

 Você já trabalhou doente, ou percebeu algum colega seu agindo desta forma? Qual foi a motivação?

Já trabalhei muito doente, e não só trabalhei, como trabalho. Eu tenho enxaqueca, e crises de enxaqueca, que eu sei que em partes é gerada por causa do banco, e às vezes as crises de enxaqueca duram 15 dias. Eu já trabalhei tão ruim com dor de cabeça, que uma vez uma gerente minha me tirou e me levou para o hospital porque eu estava passando mal dentro da agência de tanta dor de cabeça. Com LER, já trabalhei com muita dor, já trabalhei com torcicolo. Tem aquela coisa, quer queira quer não... Para ver como é complicado esse negócio do pessoal achar que você está arranjando motivos para não ir trabalhar. Uma vez, eu estava voltando de férias, e era o meu dia de retorno, e fui descer a escada de casa e escorreguei num degrau e caí sentada com tudo, e bati o cóccix com tanta força que eu não conseguia levantar, e eu estava pronta para ir trabalhar. Eu sentei e fiquei chorando de dor, e minha mãe falou que ia ligar no banco para avisar que eu não ia trabalhar. Eu falei “não, eu vou, vou tomar um analgésico e vou”, porque a gente fica pensando que vão achar que arranjei um motivo para não voltar. Às vezes estou em casa ‘explodindo’ de dor de cabeça, numa situação que normalmente eu iria querer apagar a luz e deitar num quarto e ficar, mas eu troco de roupa e vou trabalhar. Porque para mim, essa situação do povo falar “ela não devia estar com tanta dor assim” ou “está arranjando uma desculpa para não vir trabalhar”, é pior que a sensação de trabalhar com dor. Então por muitas vezes eu vou trabalhar, e a maioria das minhas amigas eu sei que fazem isso, de trabalhar com cólica, dor de cabeça, ou passando mal. Existe a tendência do pessoal em falar: “Ela não está tão mal”, “se ela quisesse, ela podia ter vindo”, e pelo menos para mim, essa sensação é pior do que trabalhar com a dor, então naquele dia eu fui morrendo de dor pelo tombo, mas fui para o pessoal não achar que eu estava emendando minhas férias.

 A quantidade de bancários que sofrem de depressão é relevante para você? É, conheço muita gente que sofre de depressão.

 Você já sofreu ou presenciou algum caso de assédio moral ou sexual? Como foi?

Sexual normalmente é mais difícil de a gente perceber se não for com a gente, e nunca sofri. Mas moral muito. A história mesmo que te falei de eu sendo caixa e a gerente me mandar fazer faxina no almoxarifado, isso para mim é assédio moral, e era nítido. Ela virava e mexia, e me mandava fazer algum serviço que não era da minha função, e sempre um serviço me diminuindo. Isso é muito frequente, de pedir para um funcionário, que você acha que não é bom, para fazer serviço de rua; para mandar ir num outro banco fazer um serviço; ou fazer um serviço que também está sempre abaixo do cargo é muito comum. De comentários em rodinhas; tirar sarro quando a pessoa não está junto, e comentar o jeito que ela trabalha, o jeito que ela trata os clientes, ou que o jeito poderia ser diferente.

 O banco tem algum programa de conscientização do assédio moral?

Se tiver, eu desconheço. Eu sei que o sindicato trabalha muito forte com isso, vivem entregando folhetos.

 Você acredita que o sindicato tem algum papel importante na atuação contra o assédio moral? Como?

Eu acho importante, porque ainda que seja muito difícil conseguir definir o que é o assédio moral, quanto mais a gente ler a respeito, mais você consegue enxergar numa situação que você está vivendo ou ouvindo, você consegue encaixar no que é. Desde que surgiu a expressão ‘assédio moral’, é muito difícil definir o que é o assédio moral. Então se você nunca leu e não se informa você pode ver a situação na sua frente e não saber que aquilo é um assédio moral. Então cada vez que vem uma cartilha, ou alguma coisa falando de todas as situações que se encaixam naquilo, de repente você acorda! Às vezes alguma brincadeira que a gente mesmo faz em rodinha e em brincadeiras, a gente faz sem perceber que a gente mesmo está fazendo assédio moral, ou incentivando. Pois você faz no embalo do pessoal, e está todo mundo meio que tirando sarro de alguém, a hora que você lê algum panfleto ou cartilha que explica, às vezes até a gente mesmo acorda. E isso eu acho legal.

Perspectivas

 Você gosta de trabalhar no banco? Está satisfeito? Você acredita que há maiores perspectivas profissionais?

Sinceramente não gosto. E não estou satisfeita. Eu falo que o banco para mim é acomodação. Quando eu entrei no banco, eu brincava dizendo que eu iria ficar só seis meses, e vai fazer 18 anos. Eu não tinha intenção nenhuma de trabalhar em banco, porque meu pai foi bancário, e se aposentou como bancário. E mesmo na época em que ele trabalhava em banco, apesar de ser muito mais calmo que agora, ele já se queixava que era difícil, por causa da pressão que existia dentro do banco. Eu nunca pretendi trabalhar em banco, e não sei nem porque que eu prestei concurso. Depois que você entra você se acomoda. O problema do

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