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3 CONSTRUINDO A POLÍTICA INSTITUCIONAL DE INSERÇÃO DOS

3.1 Plano de Ação Educacional: primeiras aproximações

Antes de proceder ao detalhamento das ações do Plano de Ação Educacional (PAE), retomo alguns aspectos que fundamentam cada uma de suas proposições.

A sugestão de um concurso público regionalizado tem como objetivo central minimizar três pontos: dificuldade de algumas escolas comporem um quadro profissional permanente; as implicações pedagógicas que acarretam o fato de certos professores serem forçados a trabalhar, por três anos seguidos, em locais que não se identifiquem; a exaustão emocional e física do professor, que é gerada pelo extenso trajeto entre sua residência e a escola ou entre o outro local de trabalho e a escola.

Os estabelecimentos educativos que têm dificuldades de manter seu quadro profissional se encontram, via de regra, em áreas de risco e de vulnerabilidade social. Com baixos indicadores sociais, esses locais são caracterizados pela presença de um número expressivo de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, fora do mercado formal de trabalho, sem direitos previdenciários e trabalhistas. A presença acanhada de políticas públicas nesses espaços pode ser dimensionada pela quantidade de pessoas analfabetas, pela baixa escolaridade da população, pela ausência de saneamento básico e pela falta de espaços de lazer. Além disso, a capilaridade do tráfico nesses locais faz com que a insegurança e o medo tomem conta não somente daqueles que aí residem, mas principalmente daqueles que, por alguma razão, se desloquem para essas áreas.

Não é preciso destacar o papel estratégico que a educação ocupa nesses espaços no processo de inclusão e de promoção da cidadania. No entanto, graças à grande rotatividade de professores nesses locais esse papel fica comprometido. Como vimos no capítulo um, alguns professores se exoneram antes do término do estágio probatório e outros optam pela transferência assim que o conclui. Dessa forma, a escola não constrói uma identidade e nem seus profissionais se constituem como uma equipe de trabalho.

Com a obrigatoriedade da permanência do servidor nos três primeiros anos do estágio probatório, alguns professores insatisfeitos ficam excessivamente faltosos, o que acaba interferindo na organização do trabalho escolar. O outro ponto que detectei, durante a pesquisa de campo, foi o grande volume de atestados e licenças médicas em decorrência do adoecimento de professores, o que significa

que a insatisfação do professor com o local de trabalho gera não somente o absenteísmo, mas principalmente problemas de saúde.

A exaustão emocional e física do professor gerada pelo extenso deslocamento interfere diretamente na condição docente. Analisei, no capítulo dois, a situação de uma professora que, após encerrar seu trabalho às 11h30 da manhã tem apenas uma hora para chegar até a outra escola. Nesse processo, além de depender de carona de outras professoras, ela não tem tempo para almoçar, passando o dia apenas com o lanche que faz quando seus alunos estão na aula de Educação Física com outra professora. No capítulo um, descrevi os depoimentos da gerente da Gerência de Planejamento Escolar (GEPES), que nos conta que a expectativa do professor é trabalhar próximo à sua residência ou ao local onde possui outro vínculo empregatício. Com a implantação de um concurso público regionalizado, acredito que, além de reduzir a rotatividade de professores, situações como a que foi descrita anteriormente podem ser resolvidas, melhorando a condição do trabalho docente.

A segunda proposição neste plano de ação, o acolhimento do professor pelo poder público municipal, antes de seu ingresso no exercício profissional, originou-se dos depoimentos e das observações que realizei durante minha pesquisa de campo. Antes de assumir o trabalho docente, a única formação que a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), através da Secretaria Municipal Adjunta de Recursos Humanos (SMARH), tem oferecido ao professor recém-ingresso na carreira é a palestra sobre o uso adequado da voz. Trata-se de uma abordagem técnica, de caráter fonoaudiológico, que enfatiza a importância da hidratação das cordas vogais durante a realização de uma aula expositiva, bem como salienta a necessidade de realizações de alguns exercícios de preservação das cordas vocais. Além disso, o curso orienta sobre os tipos de alimentos, a temperatura ideal para serem ingeridos e alguns procedimentos que professor precisa adotar para manter sua saúde vocal.

Conforme vimos nos primeiros capítulos, os profissionais em estágio probatório se ressentem pelo fato de não ter nenhum tipo de orientação sobre a política educacional, sobre o plano de carreira e sobre o Estatuto do Servidor. Para muitos, sua inserção na RME/BH ocorreu de forma abrupta, sem preparo para a nova realidade com que se deparou em sua vida profissional. A expressão “de repente, caí de paraquedas em sala de aula” traduz o sentimento de muitos professores. Pressuponho que a segunda proposição irá reduzir esse tipo de

ansiedade, dando confiança e segurança ao educador para investir na carreira docente.

Por terem um caráter pontual, as duas primeiras proposições que aqui apresento não são capazes de sozinhas intervirem em pontos estruturais e fundantes da profissão docente. Refiro-me aos chamados saberes da prática, aos processos formativos e representacionais do trabalho pedagógico e às condições do trabalho docente. No capítulo dois, quando abordei essas categorias analíticas, verifiquei que a formação acadêmica inicial não é suficiente para assegurar que professor recém-ingresso na RME/BH realize, de forma adequada, seu trabalho profissional. A proposta de formação continuada dos professores em estágio probatório e de supervisão de sua prática pedagógica em sala de aula pode, no entanto, se configurar como uma possível solução para as questões desenvolvidas ao longo deste trabalho.

Como abordei nos dois primeiros capítulos, a existência de professoras com experiência docente em outras redes não significou ausência de problemas na prática pedagógica; o que demonstra que essa política, se implementada, precisa ser para todos os professores que iniciam sua carreira na RME/BH. A pesquisa de campo revela que predominam entre as professoras alguns sentimentos no exercício inicial da profissão, como ansiedade, frustração, incompetência, insatisfação, insegurança e solidão, que não podem ser ignorados pelo poder público.

Durante a realização das entrevistas com as docentes, percebi forte tensão na relação entre professores e condutas indisciplinadas de alguns estudantes. Notei que o diálogo entre as educadoras e os educandos é, muitas vezes, tenso. O primeiro ponto detectado no capítulo dois diz respeito aos saberes da prática. As professoras estavam frustradas porque os alunos, de modo geral, ignoravam as rotinas da sala de aula. Como veremos mais adiante, essa é uma questão para ser abordada na formação continuada.

O segundo ponto que observei diz respeito à identidade e às representações sociais que as professoras possuem sobre o trabalho docente. O fato de não se identificar com sua atividade profissional faz com que algumas professoras descrevam seus alunos de forma pejorativa e se vejam como pessoas sofredoras que merecem ser reconhecidas não pelo aprendizado de seus alunos, mas pelo desgaste que têm em sala de aula. Esses elementos interferem na condição do trabalho docente. Como este não diz respeito apenas à materialidade, mas às

relações sociais que se estabelecem no contexto escolar e às relações com os educandos, é necessário que se intervenha sobre o mal estar que se instaura sobre os profissionais que se encontram no estágio probatório.

Os dados das pesquisas realizadas sobre as políticas de apoio aos professores iniciantes no Brasil, apresentados no capítulo dois, mostram que apenas dois estados e três municípios desenvolvem programas com ações formativas, seja no momento de ingresso no concurso ou na fase inicial da docência. Há de se considerar que são iniciativas recentes e importantes, que podem contribuir para a elaboração de novos programas. No entanto, os dados indicam a necessidade de estudo e de intervenção nessa questão, de tal forma que sejam elaboradas políticas de inserção profissional à docência em todo o Brasil, respeitando-se as especificidades de cada rede de educação.

Apesar do reconhecimento das gestoras escolares e da Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte sobre a necessidade de oferecer apoio e acompanhamento aos professores iniciantes na docência e na carreira pública, foi constatado que ainda não há um programa institucional na RME/BH que promova formação nos concursos de ingresso ou durante o estágio probatório. Da mesma forma, a equipe gestora da escola não promove ações sistemáticas para o acolhimento e acompanhamento dos professores novatos, demonstrando a necessidade de formação para os diretores, vice-diretores e coordenadores pedagógicos.

A seguir apresento, de forma detalhada, as proposições que compõem este Plano de Ação Educacional.