• Nenhum resultado encontrado

Plano de análise de dados: organização e interpretação das informações

1. Considerações gerais sobre o percurso metodológico

1.2 Plano de análise de dados: organização e interpretação das informações

O início da sistematização e análise dos dados ocorreu simultaneamente ao período de coleta, afinal, conforme exposto, o Diário de Campo conta com anotações descritivas e analíticas. Ao todo, constituíram o corpus desta pesquisa o registro referente a treze observações participantes, o que totalizou cerca de trinta mil palavras. Contudo, não se pode dizer que o processo de coleta de informações findou com a última observação participante, tendo em vista que através de telejornais e mesmo de conversas no WhatsApp com os parceiros cognitivos11

desta pesquisa, continuavam a surgir informações que, de certo modo, tiveram espaço na pesquisa.

A fim de lidar com o volume de informações, foi realizada leitura exaustiva de todo o corpus, codificação e categorização do material em blocos de discussão. O processo de codificação consiste na busca de frações do corpus que origine ou componha os blocos de discussão. Por sua vez, estes blocos de discussão foram construídos mediante o processo de análise – e não a priori –, tendo como referência os dados empíricos e o quadro analítico do pesquisador.

A fim de auxiliar na realização de tarefas organizativas, necessárias para a sistematização dos dados, utilizou-se os softwares Microsoft Word e Microsoft Excel. No primeiro, todos os diários de campo foram digitados e, no segundo, excertos do diário foram sistematizados de modo que cada linha de uma tabela se referia a um bloco de discussão. Cada

11 Os sujeitos acessados durante o período de pesquisa de campo serão tratados, ao longo do texto desta dissertação,

como parceiros cognitivos. O acesso à essa postura de pesquisa social, denominada parceria cognitiva, que preza pelo fortalecimento dos participantes da pesquisa, ocorreu através do professor Orivaldo Lopes Pimentel, sobretudo, a partir do relato de suas pesquisas nas periferias de Natal. Ainda assim, o modo como esta noção foi significada e utilizada pelo autor pode divergir daquela adotada pelo referido professor.

um destes blocos, por sua vez, originou uma seção deste trabalho, embora existam seções que não foram escritas a partir dos blocos de discussão, especificamente as que compõe o capítulo dois desta dissertação.

Deste modo, os códigos sistematizados em “Capitalismo e desigualdade” serviram como material para a escrita da seção “Das formas de ser um país capitalista, qual é a nossa?”, aquelas informações agrupadas em “Proibicionismo”, por sua vez, foram utilizadas na construção da seção “Notas sobre o proibicionismo: a cegueira da legislação brasileira sobre drogas”, as informações categorizadas em “Atuação da polícia militar” foram expostas na seção “A formação da barbárie e a barbárie da formação: notas sobre a polícia militar brasileira”, e por fim, o bloco “Juventude no fogo cruzado” originou as seções “O poder coercitivo em Mãe Luíza: entre a polícia militar e os agentes do tráfico de drogas” e “A juventude no fogo cruzado: entre a polícia e os agentes do tráfico”.

Certamente o processo de análise dos dados não se trata de um trabalho puramente objetivo, como postulam os cientistas heróis. Trata-se de um procedimento marcado pela interferência subjetiva do pesquisador. Há grande possibilidade, inclusive, de diferentes pesquisadores codificarem e categorizarem o mesmo corpus de maneiras consideravelmente distintas. Nesta pesquisa, houve certa dificuldade em adotar os critérios de exclusividade, homogeneidade e objetividade na categorização das informações, tendo em vista que as informações se inter-relacionam e, seguir estes critérios seria colocar a realidade em uma cama de Procusto. Desta forma, o critério utilizado durante a sistematização dos dados em blocos de discussão foi o de construir uma narrativa que permitisse avançar na compreensão da experiência de jovens negros e pobres em contextos marcados pela presença do tráfico de drogas e da polícia militar.

Destaca-se, também, que esta investigação pretendeu, a partir dos pressupostos da teoria social marxiana, ultrapassar a aparência fenomênica apresentada pelos dados e identificar as determinações fundamentais do fenômeno, permitindo, deste modo, compreendê-lo em sua totalidade. Partindo do pressuposto, já citado anteriormente, de que todo empreendimento científico consiste em uma tentativa sempre inacabada de compreender a realidade, certamente esta produção não esgotará a temática que desenvolve, mas entendendo a realidade como processualidade, buscar-se-á não apenas as efetividades, mas também as possibilidades, ou seja, aquilo que o fenômeno pode vir a ser (Yamamoto, 2016).

Acerca dos procedimentos éticos, é necessário destacar que se adotou, durante a condução deste estudo, uma postura de respeito aos sujeitos envolvidos no processo de pesquisa e fidelidade ao fenômeno em investigação como a base do modo de agir. As questões éticas que orientaram esta pesquisa dizem respeito a uma maneira de atuar que acompanha o pesquisador desde o momento do planejamento até a devolutiva, e entende que o propósito de uma investigação acadêmica é, para além de uma descoberta científica, o fortalecimento subjetivo dos participantes. Isto implica que, por exemplo, durante uma conversa, digressões por parte do interlocutor a assuntos que não interessam a pesquisa sejam permitidas, pois a postura adotada nos momentos de coleta de informações não pressupõe uma orientação egoísta em que a funcionalidade do momento reside apenas em fazer com que o informante sirva o pesquisador de informações estritamente ligadas aos objetivos científicos da investigação. Além disto, de modo a garantir a segurança e sigilo dos participantes, todos são tratados com pseudônimos, tanto nos diários de campo quanto neste manuscrito.

Não há, nesta dissertação, capítulos puramente teóricos ou empíricos. Todos os capítulos que seguem buscam inter-relacionar o quadro teórico-conceitual de referência com as

informações empíricas do contexto estudado, sejam elas primárias ou secundárias. Vale alertar que há muitas vozes ao longo da dissertação. Em várias citações aparecem reflexões do pesquisador durante o processo de pesquisa, de modo que este pode ser acessado ao longo do texto através de pelo menos duas formas, oculto, ao longo da escrita das seções, ou utilizando a primeira pessoa do singular, nos trechos retirados do diário de campo e utilizados como citações ou notas de rodapé neste manuscrito. Há, também, as vozes dos vários parceiros cognitivos que ajudaram a construir o conhecimento exposto neste estudo e aparecem com nomes fictícios ao longo do manuscrito, como Brown, Tupac, Marcela, Aragão, Tomás, Heloísa, João, Mauro, Ice Blue e Dex.

Por fim, informa-se ainda que, não raras vezes foram feitos registros fotográficos de cenários presentes nas observações. Aqueles em que não é exposta a identidade de nenhum sujeito estão reunidos no apêndice desta dissertação, de modo a ilustrar algumas das situações descritas ao longo do texto. Além destas fotografias, realizadas durante as próprias observações, algumas fotos enviadas pelos colaboradores da pesquisa através do aplicativo de mensagens WhatsApp também serão expostas e devidamente sinalizadas.

2. Por que conduzir a investigação a partir de um recorte etnicorracial, classista e