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3 LEITURA, LEITURA LITERÁRIA E ESCOLARIZAÇÃO DA LITERATURA

3.4 Políticas públicas nacionais de fomento à leitura

3.4.1 PNAIC e a formação para práticas de leitura na escola

O Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) é uma ação do Governo Federal, cuja gestora foi a Secretaria da Educação Básica, e que se fundamenta em uma política nacional de formação continuada para professores alfabetizadores (TONINI, 2016). Constituiu- se em um compromisso formal assumido em 2012 que estabeleceu parcerias entre Instituições de ensino superior (IES), secretarias de educação dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. O PNAIC teve como objetivo, conforme Tonini (2016), assegurar que todas as crianças de 8 anos chegassem alfabetizadas até o final do 3º ano do Ensino Fundamental.

O PNAIC, por meio de ações de formação continuada dos professores, buscou dar apoio para o planejamento das aulas sugerindo práticas, compartilhando experiências e reflexões, e aproximação dos professores aos materiais pedagógicos e informativos disponibilizados pelo MEC, entre os quais estão os acervos de literatura infanto-juvenil, para uma ação mais afetiva na alfabetização das crianças.

Zanchetta Junior (2017) apresenta uma avaliação das práticas de leitura literária sugeridas pelo PNAIC. O artigo é resultado de uma pesquisa de campo realizada no polo de Assis/SP, durante os encontros presenciais entre formadores e cerca de 120 orientadores e coordenadores locais do PNAIC em 2013, ano no qual priorizou-se a área de língua portuguesa. O pesquisador constatou que, no material pedagógico produzido, com relação ao processo de leitura, optou-se por uma concepção ligada à perspectiva de gêneros textuais para tratar os conteúdos relacionados à língua portuguesa e às demais áreas de conhecimento; priorizou-se textos literários, textos de informação acadêmico-escolares e de textos de mídias; sugeriu-se projetos e sequências didáticas baseadas, em geral, neste tipos de textos, para o trabalho com todas as disciplinas do currículo dos anos iniciais do ensino fundamental. Evidenciou-se que o texto literário se tornou o gênero textual referencial para língua materna, que organiza grande parte das atividades didáticas.

Dessa maneira, entendemos que os materiais de apoio do PNAIC valorizam a leitura literária, mas Zanchetta Junior (2017, p.157) ressalta que:

Inseridas dentro de projetos e de sequências didáticas constituídas com base na orientação de Schnewly e Dolz (2004), as obras literárias tratadas no

PNAIC, independentemente do gênero, são abordadas de quatro modos mais frequentes:

a) Pretexto: as narrativas servem como ponto de partida, estímulo ou ilustração para o tratamento de conteúdos curriculares atrelados às diferentes disciplinas. Assim, um clássico da literatura infantil brasileira contemporânea como A bolsa amarela, de Lygia Bojunga Nunes, é sugerido para exemplificar o uso do gênero carta, em conjunto de atividades que reuniriam ainda explicações sobre bilhetes, panfletos e outros textos de comunicação ligeira.

b) Baú de informações factuais: os textos literários servem como repositório de informações que se somam ao ensino de conteúdos curriculares diversos, também em ação pretextual.

c) Baú de lições morais: os textos literários também servem como uma espécie de depósito de experiências socialmente “autorizadas”, de cunho moral, que podem ser utilizadas no cotidiano das salas de aula como exemplos de boa conduta.

d) Deleite: trata-se de proposição de leitura de textos de ficção, bem como de outros textos literários, sem qualquer finalidade avaliativa. Esse tipo de atividade por um lado estimula o gosto e a leitura por prazer, mas, por outro, não implica qualquer estratégia sistematizada.

Podemos observar que na análise de Zanchetta Junior (2017), que o PNAIC acaba por direcionar as orientações para o uso dos textos literários de variados modos, sem, porém, atentar-se para as especificidades do tratamento adequado da literatura para a formação do leitor, tratamento este que Souza e Cosson (2011) enfatizam como importante. Porém, ao analisarmos os Cadernos de Formação do PNAIC de 2015, podemos observar no caderno 5 (BRASIL, 2015b), em um capítulo específico, a abordagem sobre formação de leitores na escola, enfatizando a leitura como prática social, dando uma nova direção para as reflexões sobre leitura literária. Neste caderno, propõem-se aos professores reflexões sobre A oralidade,

a escrita e a alfabetização.

Esse caderno 5 considera que as crianças terão interesse pela escrita se forem proporcionadas a elas diversas situações que são fundamentais para o letramento: “[...] em conversas sobre gêneros, usos e formas da escrita; na presença de material escrito; observando e interagindo com aqueles que usam a leitura e a escrita; no fazer de conta que lê e escreve; ouvindo histórias [...]” (BRASIL, 2015b, p.14). Nesse material de formação, utilizado no terceiro ano de sua continuidade, reconhece-se que ainda é comum em formações de professores a ênfase do ensino da leitura para aquisição de um código linguístico, sendo comum a utilização de textos que não têm a ver com os que circulam na escola.

Entendemos que, contrapondo-se a essa perspectiva, o capítulo do caderno 5, dedicado à formação do leitor, deixa claro que defende o ensino da leitura conduzido para busca de construção de sentido pelo leitor-aluno na interação com o texto, tendo também como base na

seleção de textos autênticos, integrais e diversificados; assume que o ensino da leitura de textos precisa ser realizado desde o início do Ensino Fundamental, mesmo antes da criança dominar o sistema de escrita. Percebemos isso, na afirmação de que é muito produtivo para as crianças ouvir a leitura oralizada pelo professor, pois favorece a aprendizagem do funcionamento linguístico e discursivo da escrita, de comportamentos leitores e de estratégias de leitura (BRASIL, 2015b).

Ao longo do capítulo sobre a formação de leitores como prática social, discorre-se sobre quatro dimensões importantes do ensino da leitura conforme defendido por algumas autoras. A primeira dimensão refere-se à importância de se explicitar os diferentes objetivos que estão envolvidos no ato de ler, além de buscar contemplar finalidades diversificadas e que sejam significativas para as crianças, refletir sobre o contexto em que o texto lido foi produzido. A segunda dimensão trata do estímulo ao desenvolvimento de habilidades e estratégias de leitura. Na terceira dimensão, referente exploração dos recursos linguísticos dos textos, percebemos que o caderno de formação assinala a necessidade de refletirmos como articular o ensino da gramática aos eixos de leitura e produção de textos, considera importante a exploração dos recursos linguísticos de sentidos para compreensão da leitura e na organização da produção textual. (BRASIL, 2015b).

A quarta dimensão importante do ensino da leitura trata sobre reflexão acerca dos critérios de escolha dos temas e como são desenvolvidas as leituras dos textos, em que alguns aspectos ressaltados em detrimentos de outros importantes nas atividades de leitura para formação de um leitor crítico. Assim, são apontadas situações que não favorecem a concepção reafirmada no Caderno 5, de que o ato de ler é uma atividade social, na qual interagimos, nos constituímos sujeito e construímos nossas identidades (BRASIL, 2015b). Algumas práticas apontadas no Caderno 5 são aquelas em que são feitas perguntas que priorizam o desenvolvimento de habilidades cognitivas, sem estabelecer de fato um diálogo com o autor, na busca de refletir sobre as possibilidades de sentido do texto e também práticas que abandonam o texto para discussão sobre o seu tema. Essas práticas não favorecem a formação de leitores críticos, capazes de se posicionarem sobre o que leem (BRASIL, 2015b). Outro aspecto citado é o que se refere ao fato de acontecer escolhas de textos, muitas vezes por estes serem exemplares de determinado gênero textual a ser trabalho, sem reflexão sobre seus conteúdos expressados.

Assim, observamos que as orientações dadas aos professores devem contemplar os quatro aspectos acima citados, dando a importância no diálogo com o autor na interação com o texto, ler é concebido como uma ação interativa. O Caderno 5 (BRASIL, 2015b) assume

também a importância das reflexões sobre os gêneros textuais, no sentido de ajudarem o sujeito a entender as práticas sociais de uso da escrita. Defende, ainda, que sendo a leitura um elo entre os componentes curriculares, e justamente por isso o seu ensino é uma das prioridades da escola, sendo, portanto, os critérios de seleção dos temas dos textos devem ser tendo em vista o que se espera da escola e sujeito queremos formar.

Observamos, então, a intenção da conscientização por parte dos professores do seu papel na formação do leitor, não que eles sejam os únicos responsáveis pela promoção da leitura. Entretanto, como explicita Corrêa e Carvalho (2016), o professor é um agente da escola que tem como uma das funções fomentar a relação do aluno com o conhecimento construído culturalmente, em que a leitura também é incluída. No Caderno 5 do PNAIC (BRASIL, 2015b), percebemos a importância de que o professor entenda que em sua prática pode proporcionar aos alunos novas formas de relação e interação com a leitura, o que, para Corrêa e Carvalho (2016), faz dele um agente de elevado potencial de influência na formação leitora dos alunos.