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CAPITULO 5 – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ANÁLISE DOS

5.5 OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS: CONTRAPONTOS ENTRE INTÉRPRETES E

5.5.4 Poder para influenciar:

“Sem intérprete me sinto perdida [...] melhor não mudar [...]” (C.24, 2011)

A citação acima não é a postura assumida pela maioria dos surdos entrevistados, os surdos construíram historicamente um modo de compreender o ILS, é aquele que garante o acesso enquanto direito linguístico, sem ele no ambiente educacional a comunicação fica prejudicada e o surdo vê comprometido seu direito a cidadania.

Segundo Quadros (2004), esse profissional deve ter perfil para intermediar relações e suas responsabilidades não são fáceis de serem determinadas. Por isso o profissional pode ser sobrecarregado com muitas atribuições.

L.33 (2011) destaca que sem o intérprete a batalha é solitária, e que a própria legislação deixa falhas que impedem a exigência de direitos. Na falta do IE o surdo não pertence ao ambiente, sente-se em desvantagem e em condições de exclusão, obrigado a aceitar o pouco que lhe é oferecido; muitas vezes o intérprete com formação ineficiente, que oferece serviço sem clareza de seus limites interpretativos e responsabilidades. Alguns cursos contratam bolsistas, pois na sociedade persiste a ideia de que qualquer pessoa conhecedora ou usuária da língua de sinais pode ser intérprete, comprometendo a qualidade e credibilidade na inclusão do surdo. Tanto o educando quanto o intérprete vivem tentando provar capacidades e potencial.

Os surdos compreendem que a confiança é a essência dessa relação, porque é através do intérprete que registram sua história.

137 B.31 (2011) destaca a importância de o intérprete estar em contanto com outros profissionais, para manter-se atualizado, ainda que seus interesses precisem ser aproximados aos do surdo, buscando formação, tanto prática quanto ética, voltada para diversos ambientes e não único. Destaca ainda a importância de um intérprete de apoio.

B.31 ressalta que o intérprete deve manter-se neutro, mas ao mesmo tempo em que solicita neutralidade, fala da necessidade do ILS sintetizar falas do professor, reconhecendo que é ele quem sabe fazer associações que permitam ao surdo compreender as explicações do professor, reconhece que é ele quem possibilita a compreensão do surdo e pelo surdo no ambiente educacional.

Destaca que quando a dúvida é a língua, o significado de palavras, procura primeiramente o intérprete, compara-o a um dicionário “ou ele ou um dicionário”, entende o intérprete como o dono da língua portuguesa, aquele que a domina. O IE dá sentido à aula, definem significados das palavras, B.31 relata que o intérprete nem sempre é necessário, se o grupo for surdo a comunicação é direta, a confiança está intimamente ligada ao profissional, o ILS tem poder para influenciar, sem ele há aparente situação de dependência e isolamento até as notas são vistas como resultados de trabalho de outros:

Na minha época de escolarização com ouvintes, fazíamos trabalhos em grupo e eu não conseguia apresentar falando ou lendo, então planejávamos juntos e depois alguém do grupo apresentava, eu nunca podia apresentar, ficava isolado (...). Não é mais o tempo de sofrimento e dificuldades onde os ouvintes achavam que eu era um incapaz, minhas notas aparentemente eram resultado do trabalho de outros (B.31, 2011).

O tempo histórico é outro, não se pode aceitar passivamente a situação de isolamento. Para B.2 a presença do IE gera conflito, o ideal para a educação seria uma sala bilíngue, entende que cada ILS é único, são diferentes, e diferentes, portanto, no modo de agir e pensar, assim como os grupos de pessoas surdas, precisam identificar-se.

B.2 associa o IE a um recurso de leitura e escrita, de acesso comunicativo no espaço acadêmico, ouvintes “ouvintes ouvem e lêem um mesmo idioma e vão recordando, o surdo vê um idioma diferente dos livros e muitas vezes o IE é o recurso para a compreensão na leitura que o p rofessor faz da escrita surda” (B.2, 2011).

B.2 destaca que é perceptível quando o IE omite, ou apresenta vocabulário restrito e cita como exemplo quando os ouvintes começam a questionar, perguntar coisas que o IE não disse; pra B.2, acompanhar a aula é acompanhar o ritmo do professor, mesmo sabendo das

138 dificuldades em ouvir e sinalizar simultaneamente ou consecutivamente, compreende que é esse o trabalho do intérprete e o profissional necessita desenvolvê-lo de modo dinâmico; o tipo de relacionamento dependerá do lugar e momento em que surdo e ILS se encontram.

A reclamação mais significativa nos discursos surdos é o fato do intérprete impedi-los de se posicionar em sala de aula, o IE não deve se antecipar, nem influenciar no posicionamento e questionamentos do surdo, ainda que o mesmo seja incoerente ou esteja errado. Muitas vezes no intuito de preservar o surdo, o impede de dizer, deve considerar que no cotidiano ninguém impede o ouvinte que levanta sua mão para falar algo impróprio ou incoerente. Muitos querem impedir porque o surdo pode colocar em evidência seus próprios limites interpretativos, uma pergunta ou questionamento impróprio pode demonstrar tais limites.

E. 54, ao falar de sua vida escolar lembra: “sem o ILS só copiava, nem sei como passei” (E.54, 2011), não é a presença de um intérprete, mas a falta de estrutura da escola para o ensino, nem todas as dúvidas em sala são dirigidas ao professor, algumas vezes o intérprete pode rapidamente responder as questões, pois são referentes a língua e não há necessidade de interromper o trabalho do professor para detalhar algo referente ao seu trabalho; se o professor fizesse uso da língua do aluno e a sala fosse apropriada, as perguntas seriam direcionadas ao professor.

Para E. 54, os intérpretes exercem influência significativa sobre o surdo, nem sempre positiva. O tipo de influência exercida pode criar situações de dependência mútua, onde o ILS se sente único responsável pelo surdo, pelos seus sucessos e fracassos e o surdo não se compreende sem aquele ILS.

(...) os intérpretes geram suas próprias contribuições discursivas na interação, tendo o poder para influenciar o discurso interativo; portanto, não são, simplesmente, condutores da interpretação. Desse modo (...) se questiona e discute a neutralidade como é entendida tradicionalmente, isto é, sem levar em consideração o aspecto humano do profissional intérprete. (LEITE, 2005, p. 60)

Quando há esse tipo de influência, o intérprete e o surdo não aceitam com muita facilidade as trocas necessárias para organização do ambiente educacional, tendem a tomar tais atividades e decisões como pessoais.

O intérprete está completamente envolvido na interação comunicativa (social e cultural) com poder completo para influenciar o objeto e o produto da interpretação (...) o intérprete também precisa ter conhecimento técnico para que suas escolhas

139 sejam apropriadas tecnicamente. Portanto, o ato de interpretar envolve processos altamente complexos. (QUADROS, 2004, p. 27)

Enquanto profissional, pode utilizar seu poder para influenciar de modo positivo, que permita ao surdo crescer como aluno e profissional, não para gerar dependência de uma única pessoa. O trabalho educativo, segundo Duarte (2003, p. 37), diferencia-se das formas espontâneas de educação, a produção é direta, relação entre educando e educador deve ser direta, visto que é processo de formação de indivíduos e na sala de aula o intérprete é quem assume (hibridizando-se com o professor) esta relação direta com o aluno surdo.

Uma das dificuldades significativas na área educacional é estabelecer limites entre o certo e o errado, entre a neutralidade e a produção de sentidos e significados, para tanto precisamos estudar tais fenômenos segundo Duarte (2000), nas suas formas mais desenvolvidas.

5.4.5 No contexto social geral e na educação, com a palavra o profissional intérprete:

(...) não é só a língua, é preciso colocar a diferença cultural também, a língua de sinais de modalidade visuoespacial, o jeito surdo de ser, que o intérprete precisa ter muito claro, quando ele ouve o discurso em língua portuguesa já deve estar refletindo o melhor modo de passar respeitando a cultura daquele que recebe o discurso (...) é uma outra modalidade e características culturais que precisam ser conhecidas pelo intérprete, para que esse seja capaz de fazer a interpretação com qualidade e não como mera transferência linguística, mecânica. Isso não é eficiente (...). Se ele não tem conhecimento bicultural, não consegue fazer a tradução e a maior parte das pessoas acredita que a única diferença está apenas na língua (...) a transferência fiel da língua falada para a sinalização por si, não resolve o problema da compreensão, da comunicação. (Strobel, 2011)

Não seria interessante encerrar o trabalho de pesquisa sem dar voz ao intérprete, pois quando o surdo o relata fala de um recurso de acessibilidade e ao mesmo tempo de uma pessoa que ouve sua fala e fala sua língua.

Quadros (2004, p. 130), relata que a constituição desse profissional se deu a partir de atividades voluntárias e foram sendo valorizadas como atividade laboral na medida em que os surdos foram conquistando seu exercício de cidadania, a participação dos surdos nas discussões sociais representa a chave para a profissionalização dos intérpretes, bem como o reconhecimento da língua de sinais a partir das leis.

140 Os intérpretes na totalidade compreendem-se enquanto mediadores, no entanto, no ambiente educacional necessitam constantemente rever e ressignificar seu trabalho; torna-se o principal responsável pelos sentidos atribuídos ao seu trabalho e a si enquanto profissional.

Há dificuldade em distanciar-se do assistencialismo, o IE quer ser visto como profissional, mas ainda é percebido e age como assistencialista. Os entrevistados destacam que os professores lhes chamam a responsabilidades que são do aluno e não do profissional.

Entendem como ponto positivo a necessidade de formação para ingressar na profissão, no entanto destacam um problema significativo: não há formação continuada; quando há são os mesmos quem organizam e desenvolvem, formação em serviço e a partir de suas próprias práticas.

Não, não existe. A menos que eu procure. (...) O que tem hoje é muito básico, insuficiente. Dentro da instituição também não há, e na verdade, quando há formação continuada somos nós que elaboramos e desenvolvemos de nós, para nós mesmos! (risos). (E.1, 2011)

A excelência na interpretação necessita de tempo e investimento, E.1 compara o trabalho do intérprete de língua de sinais com os intérpretes de línguas orais, remete ao respeito e reconhecimento, até mesmo ao intervalo que não está previsto em lei para os intérpretes de língua de sinais.

Nesse espaço acadêmico, a necessidade de dois ou mais profissionais ILS traz, para sua atuação, melhor qualificação do trabalho a ser realizado. Na maioria das vezes, o tempo de interpretação, nos níveis da graduação e pós-graduação, excede três horas, sendo que a tensão cognitiva e muscular enfrentada por esses profissionais torna visível o cansaço dificultando o processamento das informações tanto na LS quanto no português. O trabalho se torna qualificado se existe a possibilidade da troca entre dois ou mais profissionais ILS, dependendo do grau de dificuldade da interpretação. [...] os ILS não se constroem somente por serem trabalhadores das línguas; junto com eles se ramificam outros componentes, como gênero, religião, cultura, que, também, são constituintes de identidades. [...] vivem sob tensão nos deslocamentos que se movimentam complexamente tanto no grupo cultural de surdos como no de ouvintes. Alguns dos ILS parecem conhecer “intimamente” os dois espaços, de surdos e de ouvintes, mas não pertencem “completamente” a eles e sim transitam por eles. Não são surdos, mas se aproximam deles e, ao mesmo tempo, são ouvintes que desenvolveram características diferenciadas da maioria da população que ouve. Enfim, os ILS são Outros, em que outra identidade emergiu (SANTOS, 2006, p.35-36).

Destacam que as instituições utilizam o trabalho do intérprete com extensão de carga horária e sem previsão de intervalos, há instituições de EAD, onde o intérprete realiza o trabalho por até duas horas, o que pode gerar problemas de saúde física e desgaste cognitivo,

141 o ideal seria trocas aos 20 ou 30 minutos para garantir saúde e qualidade linguística. Segundo Metzger (2010, p. 18), dos estudos que refletem um interesse pelo processo cognitivo, um deles se concentra no intervalo de tempo entre 20 e 30 minutos para evitar a fadiga e competência dos intérpretes e vem se tornando prática comum, bem como o trabalho em equipe.

Importa destacar que a EAD, é um espaço diferenciado, onde o intérprete ocupa um ponto delimitado para registro em vídeo, devendo permanecer nele não podendo realizar movimentos corpóreos que permitam relaxar, pois comprometem a qualidade da gravação, portanto, há necessidade de substituições as quais não estão previstas em lei, que não devem ser ignoradas pelos contratantes.

O rendimento seria muito melhor se valorizasse o tempo máximo para interpretação. Eu tive a experiência de participar de evento onde a empresa trouxe intérpretes de línguas orais (estrangeiras) fazer palestras e o revezamento entre os intérpretes era de vinte minutos, para uma língua oral auditiva. E na Língua de Sinais... Que é uma língua visuoespacial, abstrata, muito mais complexa, o intérprete tem sido explorado, pois às vezes tem interpretado duas, três e até quatro horas de trabalho sozinhos, onde você percebe o esgotamento mental e físico desse profissional e percebe-se que o rendimento dele é zero! Se durante vinte minutos ele consegue manter uma linha excelente de interpretação, depois deste espaço de tempo a qualidade vai caindo. Por isso eu acho que devia haver no código de ética um tempo limite para cada interpretação do profissional. (...) Na educação distância a cada 25 minutos na instituição que eu trabalho há troca de intérpretes, no presencial são quatro horas diárias em sala (E.1, 2011)

Na EAD são em média 30 minutos e depois revezamos, são dois intérpretes; mas em outra instituição de Educação à distância, que trabalhei o intérprete chegava a ficar até duas horas interpretando com cinco minutos de intervalo. Em termos de qualidade, perde muito, pois você não consegue interpretar por duas horas, humanamente falando é impossível, perde muito, há um grande desgaste, pois o trabalho exige um raciocínio muito rápido, temos que estar muito atentos compreender o que o professor está falando, e assim, duas horas não há condições, a Libras acaba se transformando em português sinalizado devido ao cansaço mental do intérprete. As condições físicas interferem sim, pois se você ficar “presa” em uma sala, um estúdio fechado, com ar condicionado sozinha por duas horas, não é fácil, interfere e para pior. (E. 2, 2011)

Observando a fala de E.1 e E.2, remetemos a Marx (2010), o qual destaca a questão da competitividade, onde o que deveria ser explicado é apenas admitido, o resultado desta aceitação do profissional em permitir escravizar-se para além de suas forças, está na competição, onde haverá menos capital na sua mão e mais na mão do capitalista que o contrata, a língua é a mercadoria e a lei não prevê intervalos, no entanto os pesquisadores da área têm buscado comprovar tais necessidades, já identificadas nos resultados do trabalho do intérprete;

Quais as vantagens e desvantagens desta profissão?

Não vejo como desvantagem, mas sim como problema passível de se tornar doença laboral, que é o excesso de trabalho sem interrupção, o que pessoalmente gerou desgaste físico, articular e muscular, o que poderia comprometer a continuidade da atuação. (E.7, 2011)

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Os intérpretes não vêm buscando ativamente consolidar seus direitos, destacam suas percepções e necessidades, no entanto, a maior parte dos entrevistados não conhece a legislação que regulamenta a profissão, Santos (2006), destaca:

(...) falta de articulação entre os profissionais ILS, a competitividade demasiada entre alguns, deixa à mercê as próprias necessidades e reivindicações do grupo, esfacelando-se toda e qualquer tentativa de organização profissional. Também, enfrentado no ensino superior pelos ILS, é a disparidade do discurso a ser interpretado e o nível de conhecimento que os mesmos possuem. (SANTOS, 2006, p. 96)

O intérprete necessita posicionar-se, o modo como se posiciona, a postura que assume, define como será utilizado tanto por alunos, gestão e professores. Os próprios intérpretes reconhecem que o professor necessita deles tanto quanto os alunos, do mesmo modo há reciprocidade, visto que o IE também necessita recorrer ao professor para sanar dúvidas.

Hoje no local que eu trabalho, vejo os profissionais que entraram “novos” como intérpretes preparando materiais, apostilas separadas das aulas para que o surdo tenha material para estudar, passam muito tempo fora de sala organizando material para um aluno que tem professor e de uma disciplina que não é, nem pode ser ministrada por eles, quando sou cobrada por não fazer, me questiono: “mas isso não é minha função!” Mesmo sendo professora, não sou a responsável pela aula, posso indicar caminhos para que o professor produza, mas não sou eu quem tem que produzir. (...) A gestão nesse caso, os considera como os melhores e a

competitividade está fazendo deles produtores de mentira, pois o surdo é quem deve participar, preparar e estudar o conteúdo preparado pelo professor. Chegou o dia em que a gestão chamou e disse: “S.36, você

precisa se adequar, seus colegas estão produzindo, mas você está falhando!”. Eu pensei e disse: “Me adequar a que? (...) Enquanto intérpretes passam seu tempo na frente do computador em horário em que deveriam estar em sala, eu faço meu trabalho, disse isso à gestão, talvez por isso não tenha sido dispensada. Mas não estou livre (risos) a competitividade tem aumentado muito com as produções (risos). (E.5, 2011; destaque nosso)

E.5 (2011), permite a reflexão sobre as atribuições do IE, há importância de que participe ativamente da aula, no entanto não deve assumir o ensino e a organização da prática pedagógica, esse posicionamento pode levar o surdo à real falta de autonomia e dependência do IE e os professores a compreenderem que o ensino do surdo é de sua responsabilidade.

Ao questioná-los quanto a vantagens e desvantagens da profissão, os intérpretes citam como desvantagem o não reconhecimento enquanto profissional na educação:

Desvantagens têm várias, no caso o profissional, a questão de não ser reconhecido, nós temos dificuldades em ter nossos direitos, todas as pessoas tem, nós não. Você é obrigado a trabalhar 40 horas, as vezes até 60

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horas para poder ter o padrão salarial que um professor universitário tem, ontem eu estava explicando para uma professora que a interpretação consiste em que eu tenho que ouvir uma língua e entender essa língua e estruturar mentalmente de forma que ela se expresse na minha mão como uma outra língua, uma língua diferente, nosso caso é mais cansativo. Na realidade, a desvantagem está no cansaço que você tem, no desgaste e que você não é reconhecido. (E.3, 2011)

A desvantagem é que muitas vezes você não é reconhecido profissionalmente, as pessoas às vezes desprezam o profissional ali. Acham que você é um “empregado” do surdo e não um funcionário da instituição, que você deve estar 24 horas à disposição desse aluno para resolver todos os problemas, até mesmo para atender as necessidades particulares deles. Eu vejo isto como desvantagem... O não reconhecimento do intérprete, ainda não está muito claro para as pessoas (...) (E.1, 2011)

Martins (2008) ressalta que a presença do intérprete em sala por vezes causa muitos mal entendidos, o professor se sente vigiado a princípio e tem seu lugar de educador invadido pela presença estranha desse terceiro elemento, o IE sente a hostilização neste espaço “no desejo inconsciente de se fazer educador e de ser “reconhecido” como tal, de ter um nome, um espaço, nesse seu vazio de estar e de se fazer sujeito. (MARTINS, 2008, p. 99). Nos eventos, seminários, palestras e outros, o ILS ocupa um espaço imparcial e neutro, no entanto no espaço educacional não consegue manter-se neutro e nem ao menos ser reconhecido, ainda é uma busca de identidade profissional.

Quando o intérprete fala de autonomia surda, do uso inadequado que surdos e professores fazem de seu trabalho também apontam para si, o que é possível observar no discurso de E.1:

Não, não há relacionamento pessoal nem dentro nem fora da instituição, é só o profissional. (...)

(...) de certa forma você acaba tomando partido, né? Por que aí você vai procurar saber o que está afetando aquele aluno, é a relação familiar? Aí você tenta conversar com os familiares, porque se o aluno não consegue resolver sozinho, você tem que auxiliar, tem que procurar “como eu posso ajudar esta criatura?”, certa vez um aluno passou por problemas na instituição devido a um estresse gerado por problemas na família, é muito sério! De certa forma você fica meio que na dúvida... Tomo partido, ou não? Interfiro ou não interfiro? (E.1, 2011)

Entre o que precisa ser feito e o que realmente faz, embora busque distanciamento pessoal, não se empenha no modo que acredita ser correto, identifica que as falhas estão no próprio profissional:

O não reconhecimento do intérprete [...] isso eu culpo os intérpretes, porque eles ainda não se posicionaram enquanto profissionais; alguns intérpretes têm transformado essa profissão numa relação de amizade “eu sou amigo do surdo”, não! Eu sou o intérprete dos surdos. Então, eu vejo isso como uma grande desvantagem, esta confusão de identidade. Ainda não identificaram, nem se identificaram como profissionais intérpretes,

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pessoa formada, que domina uma língua, que tem um horário de trabalho que não deve ser extrapolado ... Eu acho que ainda falta muito para que este profissional se apresente como realmente deve ser tratado. (E.1, 2011)

Há um conflito entre o profissional, o assistencialista e o amigo, os quais permeiam a formação da identidade do ILS, as representações e imposições a ele no espaço educacional, provindas do modo como se posiciona, da identidade primeira que assume.

E.2 (2011), reforça quando diz que muitos intérpretes devem ser responsabilizados por isso, pois são paternalistas quando é preciso ser firme e por isso os alunos delegam suas responsabilidades a ele. No entanto, há intérpretes que deixam claro desde o início o que cabe a ele fazer e isso facilita a identificação de quem ele é na instituição e também o surdo tem clareza de que há limites entre a relação amigo e profissional e assume suas próprias responsabilidades enquanto aluno.

(...) não tem como não estabelecer vínculo; ele não consegue separar S. amiga (fora) e S. profissional, até

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