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CAPÍTULO II – POLÍTICAS INCLUSIVAS

2.2 POLÍTICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO

2.2.1 A política de acesso nas universidades

O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) foi implantado pelo INEP, em 1998, com a finalidade de avaliar o desempenho dos estudantes ao fim da escolaridade básica. Mas, ao longo da implantação, várias instituições públicas começaram a utilizar as notas do ENEM como processo seletivo e mecanismo alternativo de acesso à educação superior.

Em 2010, ocorreu a implantação do Sistema Seleção Unificada (SISU), também como estímulo à inclusão. Criado e administrado pelo Ministério da Educação, o SISU é um sistema pelo qual as instituições públicas de ensino superior oferecem vagas a candidatos de todo o país, por meio da realização da prova do ENEM e tenham zerado a redação. No SISU, diferentemente dos vestibulares tradicionais, o aluno primeiro realiza a prova do ENEM, e só então, escolhe a universidade e o curso desejado.

A partir de 2013, várias instituições públicas de educação superior adotaram este sistema em seus processos seletivos, e as notas do ENEM passaram a substituir o tradicional vestibular. Este novo formato é realizado de forma unificada, com conteúdos baseados na matriz curricular do ensino médio, e permitem aos candidatos realizarem as mesmas provas, em localidades mais próximas da residência, além de terem a opção de se inscreverem em mais de um curso, podendo habilitar-se a concorrer para as diversas universidades credenciadas.

Os autores Santos; Silva (2012, p.458) referem o seguinte:

o fato mesmo de o governo federal praticamente ter eliminado a forma anterior de ingresso nas universidades federais, o tradicional vestibular, parece-nos uma iniciativa muito positiva de nacionalização das vagas, favorecendo uma benvinda mobilidade estudantil em território brasileiro, e de superação dos gargalos elitistas que, no mais das vezes, fechava às portas do ensino superior púbico aos advindos da escola estatal.

Nesse sentido, as ferramentas de inclusão democrática perpassam pelo novo formato da política de acesso. Cabe lembrar dos processos seletivos meritocráticos que se perpetuaram por muito tempo, e isso desconsiderou pensar nos fatores sociais e educacionais, que são decisivos na política de inclusão.

A universidade pública brasileira deixou de ser exclusiva, com a adoção da política de ações afirmativas, alterando os critérios de acesso e mudando o perfil de ingresso de estudantes nas universidades públicas. Agora presenciamos uma universidade com mais diversidade, com a inclusão de novos segmentos sociais: os estudantes pretos, pardos, indígenas, quilombolas, provenientes de escolas públicas e outros. Estes fazem parte do novo perfil de estudantes inclusos no espaço universitário público, até pouco tempo elitizado.

A esse respeito, o reitor em exercício da UFSB, professor Naomar A. Filho (2015, p.211), em entrevista publicada na revista Lusófona de Educação, também teceu críticas quanto ao modelo de universidade pública brasileira:

[...] pois a universidade brasileira falha como instrumento ou dispositivo de inclusão social. No sistema de reprodução social do nosso país, age mais como promotora de desigualdades. Vagas em universidades públicas de melhor qualidade e nos cursos de maior prestígio social eram (e ainda são, em grande medida, apesar das políticas de ações afirmativas compensatórias) destinadas quase que exclusivamente a uma minoria.

Ainda nas palavras de Fernandes (1975, p. 129), “um absurdo que um país pobre financie com recursos oficiais o ensino dos ricos e para os ricos. Na medida em que não ocorrer uma revolução social, o poder continua nas mãos das mesmas classes dominantes e das suas elites políticas.”

Em consonância com as ideias de Fernandes (1975, p. 130), a educação precisa cumprir o seu papel, de ser: inclusiva, democrática e popular:

[...] A gratuidade do ensino em todos os níveis, portanto também no ensino superior, representa um valor social de natureza democrática. Em nosso entender, o desafio presente não vem da imperiosidade de mercantilizar o ensino oficial e da prática de uma tortuosa justiça às avessas. Eles provêm das necessidades educacionais do povo. Impõe-se atentar para os problemas da educação popular e abrir todas as escolas, inclusive as universidades, ao povo.

A universidade pública, tenta superar modelos de exclusão educacional, os quais oportunizavam a educação somente para as elites econômicas e culturais, muitos deles oriundos de escolas de educação básica de alto padrão e residentes em grandes centros urbanos.

Cabe apresentar dados do Censo da educação superior de 2014, para elucidar um pouco da dinâmica que envolve atualmente a democratização do educação superior nos espaços públicos.

Fonte: <http://portal.inep.gov.br/basica-levantamentos-microdados>. Notas estatísticas sobre o Censo da educação superior 2014. Acesso em: 14 fev. 2016.

Conforme gráfico acima, observa-se um crescimento, em 2014, quando mais de 3,1 milhões de alunos ingressaram em cursos de educação superior de graduação. Desse total, 82, 4% em instituições privadas. Isso representa desafios históricos no sentido de mudar esse cenário, em que a maioria das vagas pertencem ao setor privado, ou seja, dificultando o acesso de estudantes de menor poder aquisitivo. A democratização da educação superior nos espaços públicos vem acontecendo, não na velocidade que de fato precisa, mas é necessário mais investimentos para gerar mais oportunidades de acesso, principalmente aos grupos vulneráveis.

O Plano Nacional de Educação (PNE) de 2001 não conseguiu cumprir a meta estabelecida da educação superior de jovens entre 18 e 24 anos. O PNE (2014-2024) continua trazendo a proposta de diminuir as desigualdades de oferta, ainda presentes em diferentes regiões. Entre as estratégias, aponta: ampliar e interiorizar o acesso à graduação e ampliar a oferta de vagas por meio da expansão e interiorização da rede federal de educação superior. Com isso, mantém a mesma meta, acrescentando chegar a 40% das matrículas nas IES públicas.

A oitava meta do PNE (2014-2024) preconiza elevar a escolaridade média da população de 18 a 24 anos para chegar, pelo menos, a 12 anos de estudo para pessoas provenientes do campo, das regiões com menor índice de escolaridade do país, inclusive entre as pessoas das camadas populares. Além disso, a referida meta visa a equiparar a escolaridade média de pessoas negras (pretas e pardas) e não negras, visto que diversas pesquisas têm apontado diferenças significativas na escolaridade média de pretos, pardos, brancos, indígenas e amarelos.

A meta doze propõe o aumento de vagas nas instituições federais de ensino superior e tecnológico, com o oferecimento de um terço das vagas em período noturno, ampliação dos programas de inclusão e assistência estudantil, e acesso ao ensino superior para egressos do sistema público de ensino, com foco na expansão do atendimento a populações do campo e indígenas, no que se refere ao acesso e à permanência na universidade (PNE, 2014-2024).

Com base nesses dados, faz-se urgente pensar em novos formatos, novas estratégias que alterem esse processo de exclusão. Caso contrário, ainda veremos, por muito tempo, jovens de classes populares ingressando em instituições de ensino privado, tendo de pagar com recursos próprios seus estudos, enquanto os filhos da elite econômica, por frequentarem cursinhos ou escolas de alto padrão, e ainda disporem da mobilidade estudantil, terão mais

probabilidade de assumir as vagas limitadas das instituições públicas, principalmente nos cursos de alto prestígio social.

Como se sabe, a desigualdade de acesso envolve vários fatores e variáveis, como: a formação com qualidade nos níveis fundamental e médio, a renda familiar e o nível de escolaridade dos pais, as questões étnico-raciais, a territorialidade, entre outras variáveis, que geralmente estão associadas entre si. Essa realidade exige das instituições públicas uma tomada de decisões quanto ao uso dos recursos e das prioridades com que serão executadas as ações afirmativas de acesso e de permanência.

Com adoção das políticas de ações afirmativas, de caráter obrigatório, em várias universidades estaduais e federais, a ampliação do acesso vem acontecendo para estudantes de classes populares, de baixa renda, oriundos de escolas públicas, incluindo também os negros e indígenas que chegam à educação superior. Entre as políticas públicas implementadas, reiteramos a política de cotas, que traduz o mecanismo mais forte de promoção à democratização da educação superior – uma ação que vem promovendo a inclusão social e democratizando os espaços públicos.

Nesse contexto, pesquisas sobre acesso à universidade pública já demonstram maior preocupação quanto ao detalhamento, ao monitoramento e à avaliação das políticas de ações afirmativas adotadas, visando a diminuir a distância da seletividade social no acesso à educação superior e possibilitando a entrada e permanência da diversidade cultural, econômica e social de estudantes.