• Nenhum resultado encontrado

2 R EFERENCIAL TEÓRICO

2.4 – POLÍTICA DE COMÉRCIO EXTERIOR BRASILEIRO

Historicamente, a política de comércio exterior brasileiro envolveu grande debate nacional. Cervo (1997) atrela a política a três paradigmas de inserção internacional: o liberal conservador do século XIX, que se estendeu até os anos 1930; o do estado desenvolvimentista que vai até 1989; e o novo paradigma de inserção liberal dos anos 90.

• O Período do Nacional-Desenvolvimentismo (1930-1990)

Até o início do licenciamento das importações (1947), não havia no país uma continuidade das políticas comercias. De modo que os regimes aduaneiros eram traçados de forma empírica, ora ponderando um elemento de cálculo, ora outros. Cervo (1997) ressalta que se buscava expandir as exportações de forma que favorecesse o regime de livre comércio, ou então, para defender a indústria do país, utilizava-se de protecionismo do mercado interno. De forma que o Brasil vive fortes oscilações entre protecionismo e livre comércio.

Essa oscilação aconteceu com o advento da tarifa protetora de 1844, onde o protecionismo exacerbado daria vez aos interesses da agroexportação, e vice-versa. Isso pode ser notado com a criação da tarifa Rui Barbosa de 1890 (fortemente protecionista), que foi alterada pela tarifa Rodrigues Alves de 1896 (focada no livre comércio), e esta seria novamente alterada pela tarifa Bernardino de Campo (1897), significando uma volta ao protecionismo. Em 1899, a Tarifa Joaquim Murtinho estabelece certa ordem para o comércio exterior, que permitiria ao Executivo utilizar a tarifa dupla; esta funcionaria taxando fortemente importações de países que não favorecessem a entrada dos produtos do Brasil, e minimamente países que favorecessem as entradas dos produtos nacionais.

A grande depressão de 1929 representava um novo desafio para os formuladores de políticas de comércio exterior. É neste período que acontece a ascensão do governo Vargas (1930), com o grande desafio de promover o comércio exterior como forma de alcançar resultados de modernização interna. Tal modernização fez com quem, a partir de 1935, a política de comércio exterior saia do discurso do governo, este passando a “agir e reagir de acordo com as tendências e circunstâncias do mercado internacional” (CERVO, 1997, p.7). Com esta atitude, o governo estaria numa situação imparcial, podendo evitar pressões externas entre blocos contrários. Todavia, essa imparcialidade não foi total, uma vez que foi assinado um tratado de nação mais favorecida com os Estados Unidos em 1935, e outro de comércio compensado com a Alemanha e a França em 1936. Este obteve bastante sucesso por atender tanto os interesses burgueses como os da agroexportação. Todavia, deixou

claro que o papel do governo não era de promover mudanças estruturais na economia, e sim de defender os interesses nacionais através da constante vigilância da esfera internacional.

Já o governo Dutra (1945 -1950), decidiu apoiar as concepções liberais dos Estados Unidos. Tais concepções apregoavam o liberalismo universal e ilimitado do comércio internacional dos capitais, bens e finanças. Entretanto, essa crença foi percebida como ilusória, fato revelado através do déficit gerado, o que resultou, em 1947, na implantação do controle de importações, e em 1949, o sistema de câmbio com licença prévia. Foi este governo que criou um ambiente favorável à implantação do Nacional-desenvolvimentismo através do modelo de substituição de importações.

Viana (1987) destaca que a política de comércio exterior brasileira tornou-se mais introspectiva e autônoma. O controle de câmbio e o regime de licenças para as importações condicionavam os dispositivos dos tratados bilaterais.

Neste contexto, acontece a volta de Vargas ao poder (1951), o que traria novamente os ideais do nacionalismo econômico na política exterior. No entanto, a conjuntura internacional não era favorável a esse posicionamento, pois os órgãos internacionais defendiam a intervenção mínima do Estado no controle do comércio e das finanças. Vargas, por sua vez, defendia a necessidade do desenvolvimento dos pequenos e tratava a defesa econômica como fator central da política exterior dos povos.

Após a segunda guerra, o governo brasileiro passa a ressaltar a negligência com que a América Latina foi tratada pelos Estados Unidos em detrimento à reconstrução da Europa. Este pensamento multilateralista reagiu à criação do Mercado Comum Europeu, argumentando que seria prejudicial à competitividade do comércio internacional. Assim, em 1958, o então presidente Juscelino Kubitschek, através da operação Pan-Americana, passa a defender a orientação da política exterior do país como um programa de esforços conjuntos de todo o continente para o desenvolvimento deste. Criando, assim, um multilateralismo regional. Cervo (1997) salienta que esta política compreendia inúmeros fatores:

b) Reordenamento das relações internacionais para enfrentar os problemas de atraso e gerar desenvolvimento.

c) Pensamento Cepalino (Substituição de Importações).

d) Desenvolvimento econômico dinâmico do Brasil exigia maior cooperação internacional.

O grande argumento desta operação era que as nações da América Latina necessitavam de medidas enérgicas para remover os obstáculos ao desenvolvimento, de forma que pudessem industrializar-se e aproveitar seus recursos naturais e ativos.

Nas décadas de 60 e 70, o modelo de substituição de importações não foi modificado, porém foi complementado pelo modelo de substituição das exportações, haja vista que o parque industrial do país já estava implantado e necessitava de mercado externo para escoamento da produção.

• Regionalização e Globalização dos anos 90

No Brasil, os anos 90 foram marcados por grandes transformações na política externa. Três períodos curtos marcaram essa década: o governo Collor (1990-1992), que abriu mão do nacional desenvolvimentismo em detrimento da abertura da economia. Em seguida, o governo Itamar Franco não deu prosseguimento à abertura da mesma forma que o governo Collor, inclusive denotando uma pequena volta ao nacional-desenvolvimentismo, sem abandonar, no entanto, a necessidade de adaptação dos novos tempos. Em 1995, assume o governo o então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, que adere à globalização do capitalismo e abandona o nacional-desenvolvimentismo. Atitude que gerou grande número de protestos e pressões dos segmentos sociais.

O Governo Collor centrou seu discurso na modernização e num “salto à frente” da inserção do Brasil no contexto mundial. Todavia, na prática, restringiu-se a duas decisões: a simples abertura de mercado e a privatização de empresas públicas. De forma que gerava uma dependência do desenvolvimento nacional ao capital estrangeiro.

Com a queda de Collor, seu sucessor, Itamar Franco, retoma o desenvolvimentismo e apregoa a integração do cone Sul. O que prevaleceu como conceito de política de comércio internacional foi o “multilateralismo ortodoxo e uma integração inevitável” (CERVO, 1997, p.18). Assim, a estratégia de comércio exterior ficava resumida à:

1 – Abertura de novas frentes de comércio.

2 – Busca de maior liberalização de fluxos comerciais.

3 – Exploração de nichos comerciais nos centros desenvolvidos. 4 – Consolidação das exportações nos países em desenvolvimento.

Iniciando o Governo Fernando Henrique (1995), o pensamento do governo é que o Brasil não deveria buscar projetos de desenvolvimento nacionais, pois estes estariam atrelados ao capital internacional. A abertura do mercado aconteceria sem grandes negociações, e as privatizações deveriam acontecer de forma a atender à nova conjuntura de Estado mínimo. Assim, os pilares de sustentação da política desse governo seriam: o multilateralismo, o regionalismo, a relação com os Estados Unidos e com a União Européia. Todavia, Cervo (2003) evidencia que este quadro gerou equívocos em diversas áreas:

a) Comércio exterior: deixou de ser o promotor da produção interna e da formação de capital, adquirindo um caráter de dependência à estabilidade de preços. Deixando, assim, de ser um instrumento estratégico.

b) Fluxo de capitais e dependência financeira: os déficits gerados com os equívocos no comércio exterior suscitaram uma busca de capitais externos pelas autoridades econômicas. As conseqüências puderam ser sentidas na debilidade do sistema de produção interno.

c) Dependência tecnológica: com o fim de projetos de desenvolvimento nacional, as novas tecnologias passaram a estar disponível apenas no mercado internacional.

d) Abertura como estratégia: gerou vulnerabilidade externa e conseqüente perda de poder sobre o cenário externo.

Estas medidas liberais do governo Fernando Henrique geraram tensão na opinião pública, que confiou ao governo Lula a tarefa de modificar a política de comércio exterior do país.

• Governo Lula

O governo Lula defende que a retomada do desenvolvimento deve estar baseada num crescimento econômico sustentável.

As ações, nessa área, voltam-se para a expansão sustentada das exportações e para a ampliação da base exportadora pela incorporação de novos produtos, empresas e negócios. Inclui: a) apoio às exportações, com financiamento, simplificação de procedimentos e desoneração tributária; b) promoção comercial e prospecção de mercados; c) estímulo à criação de centros de distribuição de empresas brasileiras no exterior e à sua internacionalização; d) apoio à inserção em cadeias internacionais de suprimentos; e) apoio à consolidação da imagem do Brasil e de marcas brasileiras no exterior.

Para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (2003, p.13) “a crescente inserção internacional deve se dar de forma tal a não onerar a balança de fretes, já altamente deficitária. Isso significa articular a modernização de estaleiros e da armação nacionais, contribuindo para a retomada dos serviços de cabotagem”. Esta assertiva está de acordo com o programa de Governo, que é baseado nas premissas de crescimento sustentável, emprego e inclusão social.

O mesmo documento defende ainda que, para o sucesso da política de comércio exterior, é necessário articular a nova política regional, contribuindo para uma maior integração nacional e para a redução das disparidades regionais entre estados e sub- regiões.

Voltando ao tema geral da inserção externa, este governo trabalha na implementação do programa Brasil Exportador, que está sendo elaborado pelo MDIC e pela APEX. Esse programa visa aumentar a intensidade tecnológica dos produtos e

processos, além de promover certificação (selo) de origem, marca e padronização produtiva.

Dessa forma, tem-se a política de comércio exterior do Governo Lula galgada em quatro forças:

1 – Recuperação do universalismo e do bilateralismo: o governo esforça-se para que existam outros pólos de equilíbrio além dos Estados Unidos.

2 – Foco na América do Sul: dedicar-se à regionalização como reforço para as economias locais.

3 – Sanar dependências estruturais e promover a inserção interdependente: o governo busca minimizar a vulnerabilidade da política de comércio exterior, antes centrada somente na abertura.

4 – Promover nacionalismo cooperativo: zelar pelo respeito da ordem e preservar a cordialidade entre os países vizinhos, de modo a minimizar os efeitos da subserviência econômica e política dos países do cone Sul.

Desta maneira, Cervo (2003) destaca que o ideal para uma política de comércio exterior do país seria adotar o paradigma do Estado logístico, no qual o comércio exterior, puxado por uma política exterior mais altiva, tem peso extraordinário.

O Estado logístico, conforme Sombra Saraiva (2004), supõe a superação tanto do modelo de inserção liberal desenfreada, quanto do desenvolvimentismo nacionalista de antes. Por esse novo paradigma, o repasse de responsabilidades do Estado empresário cabe mais à sociedade. Essa estratégia não significa, no entanto, o desprezo ao empreendimento estatal, desde que este apresente capacidade de construir competitividade sistêmica global. São dois os componentes da formulação logística posta em marcha: por um lado, advoga-se a construção de meios de poder e, por outro, sua utilização para fazer valer vantagens comparativas de natureza intangível, como a ciência, a tecnologia e a capacidade empresarial.

Dessa forma, tem-se uma política de comércio exterior atual voltada para a superação da dependência estrutural em relação aos fluxos financeiros voláteis

internacionais e orientados para a superação da crise de financiamento e poupança internas.