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Políticas públicas e o exercício da maternidade e paternidade no Brasil

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.5 Políticas públicas e o exercício da maternidade e paternidade no Brasil

Na seara da administração pública inexiste um consenso no tocante à conceituação de políticas públicas. Todavia, elas podem ser entendidas como ações do Estado que buscam a garantia de direitos à sociedade. Essas ações estatais, na opinião de Dalari (1998), incidem na regulamentação da participação da iniciativa privada em setores como saúde, educação, transporte e segurança, e agem como a mão invisível do Estado, garantindo, teoricamente, que a iniciativa privada não ultrapasse os limites da razoabilidade e mantenha acessível, a todos os cidadãos, os direitos que lhe são essenciais. Essa intervenção estatal ocorre, ainda que de maneira falha e na seara teórica, uma vez que o próprio Estado tomou para si, por meio da instituição da República, a administração e o dever de garantir o bem-estar de seus cidadãos (DALARI, 1998).

Nesse sentido, em razão da multiplicidade de interesses existentes entre os indivíduos de uma nação, bem como dos inúmeros problemas públicos que lhe atingem, atores tidos por policy makers entram em ação com o objetivo de conciliar esses interesses

e solucionar os referidos problemas, mediante a criação e implementação de políticas públicas. Dessa maneira, de acordo com Secchi (2010), políticas públicas podem ser entendidas como diretrizes e determinações, em nível estrutural e/ou operacional, formuladas estrategicamente por atores estatais ou não estatais, de maneira formal ou informal, com o objetivo de solucionar, pacificamente, um problema público (não privado). Ainda conforme o autor, o custeio das políticas públicas pode ser feito pelo Estado, ou seja, pela coletividade, por meio de impostos, e também por particulares interessados, o que ocorre, por exemplo, no caso de associações civis e cooperativas. O fato é que as políticas públicas são criadas na intenção de corroborar o aumento do bem- estar social e da qualidade de vida dos cidadãos, sendo observada uma determinada localidade e um contexto temporal específico.

Assim, as políticas públicas tratam da substância real e abstrata de decisões políticas, dentro de um contexto temporal e territorial, podendo ser estabelecidas como uma ação do Estado ou de uma instituição privada sobre os cidadãos, em nível estrutural e/ou operacional, e não se limitando à formulação de diplomas legais (SECCHI, 2010). Morra-Imas e Rist (2000) incrementam essa conceituação, apontando que, para que determinada política pública alcance sucesso, é importante que ela tenha adesão social, que seja implementada corretamente e que se submeta a um acompanhamento constante de sua situação, de modo a permitir a correção de falhas e reformular ações planejadas, aplicando-se eventuais ajustes que se façam necessários à situação fática.

Sob esse aspecto, verifica-se que o aumento de 15 dias no prazo da licença- paternidade, praticado no Brasil desde 2016, tanto para servidores públicos federais, como para os empregados regidos pela CLT e pelo RGPS, é uma política pública, especificamente, implantada por meio do Programa Empresa Cidadã e do Marco Legal da Primeira Infância.

O Programa Empresa Cidadã foi criado em 2008, como uma iniciativa da União de ampliar o prazo de licença-maternidade no setor privado (BRASIL, 2008a). Em troca do custeio da licença pelos empregadores, o Estado concede descontos fiscais aos empresários, em valores iguais aos gastos tidos por eles, em termos salariais, no período de inatividade extra de seus funcionários. O objetivo do Programa é fomentar a paternidade responsável, o que fica claro quando verificado o ônus do funcionário participante. Aos trabalhadores beneficiados pelo Programa é obrigatória a participação em curso ou atividade de fomento aos laços familiares e cuidado infantil.

Dessa maneira, verifica-se que o Programa busca, inicialmente, educar a população no tocante à paternidade responsável e, em segundo lugar, viabilizar o convívio da criança com a família, garantindo-lhe, consequentemente, o apoio nas áreas da saúde, afeto e educação. Ao mesmo tempo, o Programa visa garantir o desenvolvimento educacional e familiar da criança, o estreitamento de vínculos afetivos na família e o reforço da atenção dos responsáveis durante o período de pós-parto (DIDONET, 2010).

Em 2016, por iniciativa da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente no Congresso Nacional, em apoio à Rede Nacional da Defesa dos Direitos Infanto-Juvenis, foi aprovado o Marco Legal da Primeira Infância (BRASIL, 2016a). Em decorrência desse Marco Legal, o Programa Empresa Cidadã sofreu uma alteração significativa, passando então a contemplar, como beneficiários, também os pais, por meio da prorrogação da licença-paternidade por 15 dias, mantidas as cominações referentes à empresa e à família, principalmente no tocante à participação em atividade de orientação sobre a paternidade e responsável.

Apesar de as intenções do Programa serem visivelmente positivas para a população trabalhadora, dados levantados pela Receita Federal do Brasil (BRASIL, 2016d) e pelo IBGE (2014) apontam que apenas 19.641, de um total de mais de 2 milhões de empresas brasileiras, até 2016, tinham aderido a ele. Um indicativo dessa baixa aderência é o fato de o incentivo fiscal fornecido pelo Estado não ser aplicável a todas as empresas, mas apenas à minoria tributável sobre o lucro líquido. Outro indicativo da baixa aderência ao Programa é o aumento do custo do trabalhador para o empresário, seja em razão da diminuição de sua produtividade média, seja em razão dos custos adicionais causados pela necessidade de reposição do empregado, conforme salientam Almeida, Pereda e Ferreira (2016). Por causa de sua baixa aderência, tratando-se de uma política pública de âmbito nacional, mas de abrangência minoritária, questionam-se a efetividade e os reais interesses da política pública implantada, bem como a necessidade de sua reformulação.

Diante do exposto, nota-se que a proposta apresentada neste trabalho se caracteriza como uma possível política pública, por buscar o bem-estar da coletividade, especificamente, por meio do estreitamento de laços familiares e da valorização das relações afetivas entre pais e filhos(as). Trata-se, ainda, de uma política pública passível de avaliação, a ser realizada previamente à sua implantação, sob a ótica dos diversos atores políticos que ela envolve, a exemplo dos trabalhadores beneficiários, das crianças, da família, dos empresários, da sociedade em geral e do governo. Também nessa linha, a

forma de custeio de uma possível prorrogação da licença-paternidade, como defendida neste estudo, poderá ser fruto de novas pesquisas, principalmente na seara econômica, que levem em consideração as descobertas alcançadas com o resultado deste estudo.