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PORTE DE ARMAS E ARMAMENTO INSTITUCIONAL

4 RECEITA FEDERAL E SEGURANÇA PÚBLICA

4.3 PORTE DE ARMAS E ARMAMENTO INSTITUCIONAL

Esta seção apresenta breve histórico da evolução legal do porte de armas no âmbito da Receita Federal do Brasil, associando ao convencimento do legislador da efetiva necessidade de porte em função da evolução das atividades desempenhadas.

O tema do porte de armas de fogo é sensível à sociedade brasileira e vem sendo amplamente debatido nas últimas décadas. Em razão disso, a legislação que rege a utilização de armas de fogo acompanhou o ritmo dos debates e sofreu algumas alterações.

O Estatuto do Desarmamento, aprovado pela lei nº 10.826/2003, em sua redação original não autorizava o porte de armas aos integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil (ARF)32. Somente em 2005 a Lei nº 11.118

(BRASIL, 2005b) incluiu o inciso X, ao artigo 6º do Estatuto, dando aos integrantes da Carreira ARF o direito de portar armas de fogo para sua defesa pessoal. Naquele momento a autorização referia-se a armamento pessoal, de propriedade do servidor, sem previsão de aquisição de armamento institucional pela RFB. Em consulta ao Diário da Câmara dos Deputados, onde são registrados todos os debates realizados entre os Deputados, encontra-se a justificativa33 para a inclusão do citado inciso X:

em agosto de 2018.

32 Integrada pelos cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário, a Carreira de Auditoria da

Receita Federal do Brasil, conforme disposto no artigo 5º da Lei nº 11.593, de 06 de dezembro de 2002 (BRASIL, 2002), passou a denominar-se Carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil, por força do artigo 5º da Lei nº 13.464, de 10 de julho de 2017 (BRASIL, 2017a)

33 Disponível em http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD30MAR2005.pdf#page=124

Com relação às Emendas de nº 12, 13, 14 e 15, de autoria do Deputado Jovair Arantes, verificamos que a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, chamada de Estatuto do Desarmamento, no seu artigo 6º, dispôs claramente que: “É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para” outras nove categorias profissionais, ai citados os militares das Forças Armadas, os integrantes dos órgãos de segurança pública, os integrantes das guardas municipais, os agentes da Agência Brasileira de Inteligência, os policiais legislativos, as empresas de segurança privada e os desportistas credenciados Quase todas essas categorias citadas exercem atividades constantemente sujeitas a graves riscos contra a vida, cuja necessidade de utilização de arma de fogo é intrínseca do tipo de cada atividade. Verificamos, no entanto, que há uma categoria de servidores que, embora não se encontre na lista do citado artigo 6º, exercem, permanentemente, atividades de grande risco contra sua segurança pessoal. Trata-se dos integrantes da carreira de auditores da Receita Federal, os auditores-fiscais e os técnicos da Receita, que constantemente se deparam com contrabandistas, traficantes de armas e de entorpecentes e muitos outros integrantes de quadrilhas do crime organizado. Isso se torna ainda mais patente quando esses servidores são designados para atividades em portos, aeroportos e postos de controle, nas fronteiras. Assim, por incrível que possa parecer, esses servidores da Receita participam de equipes de repressão a crimes violentos contra a Fazenda Nacional e estão a descoberto, quanto à sua própria proteção (BRASIL, 2005a, p. 09068-09069, grifo nosso).

O Decreto nº 5.123/2004 (BRASIL, 2004b), que regulamentou o Estatuto do Desarmamento, estabeleceu no artigo 12, inciso I, que para aquisição de arma de fogo de uso permitido o interessado deveria declarar a efetiva necessidade (dentre outros requisitos), considerando presente esta condição para os agentes públicos envolvidos no exercício de atividades de poder de polícia administrativa (artigo 12, parágrafo 7º, inciso I, alínea “e”).

Nesta mesma linha o Comando do Exército, no exercício da competência que lhe é atribuída pelo artigo 27 do Estatuto34, editou a Portaria nº 969, de 08 de

agosto de 2017 (BRASIL, 2017b), autorizando a aquisição de armas de fogo de uso restrito, para uso particular, aos integrantes da Carreira ARF, diretamente envolvidos no combate e na repressão aos crimes de contrabando e descaminho. Neste mesmo dia, com o mesmo objeto e pelas mesmas razões, o Comando do Exército editou as Portarias nº 967 e 968, aplicáveis aos integrantes da Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, Polícia Civil, Polícia Militar e Corpo de Bombeiro Militar

34 Lei nº 10.826/2003, artigo 27: “Caberá ao Comando do Exército autorizar, excepcionalmente,

dos Estados e do Distrito federal e Agentes das Polícias Legislativas do Congresso Nacional. Ao se consultar notícia sobre a publicação dessas portarias, na página do Exército Brasileiro35, encontra-se a afirmação de que um dos princípios para edição

das portarias foi o princípio da razoabilidade entre os órgãos, “uma vez que tal calibre de uso tributo já é utilizado em atividades de serviço pela maioria daqueles agentes”.

No que se refere a armamento institucional, ou seja, aquele adquirido pela Instituição para uso de seus servidores, a redação original do Estatuto do Desarmamento não previa tal possibilidade, o que se refletia no Decreto 5.123/2004 (BRASIL, 2004b) que, ao regulamentar o cadastrado de armas institucionais no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (SIGMA), em seu artigo 2º não mencionou a Receita Federal no rol de Instituições.

A Medida Provisória (MP) nº 379, de 28 de junho de 2007 (BRASIL, 2007b), alterou a redação do parágrafo 1º, do artigo 6º, da Lei nº 10.826 (BRASIL, 2003), para prever aos integrantes da Carreira ARF o porte de arma de fogo fornecida pela Receita Federal, mesmo fora de serviço, bem como armas de fogo de propriedade particular, na forma de regulamento em ambos os casos. Esta MP vigorou por pouco tempo e foi revogada36 pela MP nº 390, de 18 de setembro de 2007 (BRASIL,

35 Disponível em http://www.dfpc.eb.mil.br/index.php/ultimas-noticias/500-exercito-brasileiro-

autoriza-o-uso-de-armas-de-fogo-de-calibre-restrito-para-uso-particular-por-integrantes-de-algumas- instituicoes-publicas. Acesso em 10/08/219.

36 A justificativa para a revogação da MP nº 379 encontra-se na Exposição de Motivos nº 158 –

MJ/SRI-PR (Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República), de 18/09/2007, e não guarda relação com o mérito da questão:

“Encontra-se em tramitação, no Congresso Nacional, a proposta de Emenda à Constituição nº 50, de 2007, que altera o art. 76 e acrescenta o art. 95 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, prorrogando a vigência da desvinculação de arrecadação da União e da contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira. 2. Trata-se de matéria da mais elevada relevância e urgência, posto que, sem que seja apreciada

tempestivamente pelo Poder Legislativo a prorrogação de ambos os instrumentos de política fiscal, haverá sérios prejuízos às contas públicas e à governança do Governo Federal, como um todo, impedindo a consecução dos objetivos relacionados não somente ao Programa de Governo de Vossa Excelência, aprovado pelas urnas no pleito de 3 de outubro de 2006, mas ao interesse de toda a sociedade brasileira.

(...)

4. Ocorre, todavia, que a Medida Provisória nº 379, de 29 de junho de 2007, que “altera dispositivos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas - Sinarm e define crimes”, está trancando a pauta de votações da Câmara dos Deputados em razão do transcurso de prazo a que se refere o § 6º do art. 62 da Constituição de 1988, acrescentado pela Emenda Constitucional no 32, de 11 de setembro de 2001. Assim, impõe-se a necessidade - imperiosa e urgente - de revogar a Medida Provisória em causa, de modo a desobstruir a pauta de votações da Câmara dos

Deputados. (...)”

2007c), posteriormente convertida na Lei nº 11.579, de 27 de novembro de 2007 (BRASIL, 2007a).

A Medida Provisória 693/2015 incluiu o artigo 5º-A (BRASIL, 2015e) na Lei nº 10.593, de 06 de dezembro de 2002 (BRASIL, 2002), estabelecendo que “os servidores integrantes da Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil poderão portar arma de fogo institucional, em serviço”. A exposição de motivos da MP afirma:

11. A proposta se justifica pelo fato de que, no exercício de suas atividades, os servidores da RFB frequentemente se deparam com o cometimento dos mais diversos ilícitos tributários e aduaneiros, tais como: contrabando, descaminho, tráfico de entorpecentes, armas, munições, explosivos e animais silvestres, além de pirataria, contrafação, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. Sobretudo na atividade de repressão aos ilícitos aduaneiros, o risco se mostra ainda maior, pois o perfil dos criminosos aponta seu elevado grau de organização e de periculosidade. A imprevisibilidade e a frequência da atuação nesse tipo de ilícito – os quais frequentemente são cometidos em locais remotos e de difícil acesso - caracterizam situações de alto risco à integridade física e à vida dos servidores. 12. É público e notório o risco à integridade física de autoridades fiscais e mais especificamente o risco de morte, bastando que se aponte que, nos últimos anos, ocorreram mais de 15 (quinze) atentados contra servidores da RFB, dos quais 8 (oito) resultaram em morte. A maioria dos atentados e ameaças – 87% (oitenta e sete por cento) – ocorreram fora do horário de serviço, na ausência de qualquer proteção policial, quando o servidor adentrava sua residência ou garagem de sua residência, ou mesmo enquanto conduzia seu veículo.

13. Assim sendo, propõe-se que os servidores integrantes dos cargos que compõem a carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil tenham tal prerrogativa estabelecida na Lei nº 10.593, de 2002.

14. A relevância e a urgência na aprovação dessa medida decorrem da necessidade de outorgar maior segurança aos servidores RFB que atuam nas atividades de fiscalização, repressão do contrabando, descaminho e demais delitos praticados na faixa de fronteira brasileira. (BRASIL, 2015d, não paginado)

Atualmente está em vigor o Decreto nº 9.847, de 25 de junho de 2019 (BRASIL, 2019g), trazendo nova regulamentação para a lei nº 10.826, de 22 junho de 2003 (BRASIL, 2003), aí incluído o armamento institucional da Receita Federal do Brasil e o porte de armas particulares adquiridos por integrantes da Carreira Tributária e Aduaneira da RFB.

da Receita Federal do Brasil37 elaborou Estudo Técnico, intitulado “Porte de Arma:

Uma das Prerrogativas Inerentes ao Cargo de Auditor-Fiscal da RFB – Análise do PL nº 3,722/2012”, de onde se extraem dois trechos:

[…] prevê o porte de arma funcional para Auditores. Estes têm como atribuições de seu cargo, dentre outras, a fiscalização (em sentido amplo), a constituição do crédito tributário, o controle aduaneiro e a repressão de ilícitos de natureza tributária [...] executando atividades de risco nas fronteiras terrestres, nas estradas, nos portos e aeroportos, combatendo o contrabando, o descaminho, o tráfico de drogas, armas e munições. (p. 3)

[...]

O contato do Auditor-Fiscal com o crime organizado não se faz unicamente por meio da organização, supervisão, e execução de blitz e barreiras de combate ao contrabando e descaminho. Ele também participa de Mandado de Busca e Apreensão em empresas ligadas ao crime organizado, fiscaliza in loco não somente empresas e pessoas físicas de boa índole, mas também as organizações criminosas e empresas “de fachada” as elas associadas; os crimes financeiros internacionais; “lavagem de dinheiro” em nível nacional e internacional, etc.

As pessoas físicas e jurídicas praticantes dos ilícitos e crimes acima descritos, também muita vez desenvolvem atividades permitidas pela lei, objetivando encobrir aquelas praticadas ao arrepio da lei. Assim, o Auditor-Fiscal, ao fiscalizar uma dessas pessoas, não tem conhecimento das atividades ilegais praticadas por elas […] (p. 14- 15) (BRASIL, 2012).

Ratificando este entendimento, o Departamento de Polícia Federal emitiu a Instrução Normativa nº 23, de 1º de setembro de 2005 (BRASIL, 2005d), relacionando, no art. 18, parágrafo 2º, as atividades profissionais de risco para efeitos do porte de arma federal, regulamentando assim o inciso I, do parágrafo 1º, do artigo 10, da Lei nº 10.826/03 (BRASIL, 2003). O inciso I, do parágrafo 2º, nomeia as seguintes profissões: “servidor público que exerça cargo efetivo ou comissionado nas áreas de segurança, fiscalização, auditoria ou execução de ordens judiciais” (grifo nosso). O Auditor-Fiscal, portanto, enquadra-se no rol de atividades profissionais de risco, conforme a classificação da Polícia Federal.

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