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A inserção portuguesa na prática de cooperação cultural transnacional está diretamente relacionada ao processo de internacionalização deste setor no país, etapa que depende em grande parte das estratégias políticas adotadas pelo governo vigente. Ações e iniciativas como as Capitais Europeias da Cultura fortalecem e estimulam a prática portuguesa de cooperação cultural a nível internacional. Contudo, antes de apresentar os meios adotados em Portugal que viabilizam essa prática é necessário compreender a visão e o compromisso governamental com tais aspectos culturais.

Ao realizar uma breve revisão da Constituição da República Portuguesa (2005) é possível identificar no Art. 9.º que os direitos culturais, assim como os econômicos, sociais e ambientais, devem ser assegurados pelo Estado, objetivando garantir e difundir a qualidade de vida do povo português. A proteção e a valorização do patrimônio cultural nacional também surgem como tarefas fundamentais (Constituição da República Portuguesa Sétima Revisão Constitucional – 2005, 2015). Nesse mesmo documento, é também atribuída ao Estado a promoção de uma democratização da cultura, de modo a incentivar e assegurar, em colaboração com agentes culturais, “o acesso de todos os cidadãos à fruição e criação cultural” (Constituição da República Portuguesa Sétima Revisão Constitucional – 2005, 2015, Art. 73.º), incluindo a articulação da política cultural com as demais políticas setoriais.

Em termos práticos, o estímulo e o apoio direto à cooperação cultural transnacional em Portugal, por vezes, surge através de ações de apoio à internacionalização mediadas por estruturas como o Instituto Camões e a DGArtes, e programas de bolsas concedidas por instituições como a Fundação Calouste Gulbenkian. Além destes, destaca-se também o GEPAC, estrutura que representa um importante serviço da Administração Direta do Estado e tem por função “garantir o apoio técnico à formulação de políticas culturais, ao planeamento estratégico e operacional, e às relações internacionais” (Gabinete de Estratégia, Planeamento e

Avaliação Culturais, website). A Direção e Serviços de Relações Internacionais,

unidade orgânica que compõe o GEPAC, visa, entre outros objetivos, o apoio ao estabelecimento da política de internacionalização da cultura. De acordo com as informações disponibilizadas pelo próprio GEPAC, Portugal tem estabelecido acordos de cooperação multilateral e bilateral com diversos países, através da participação no Conselho da Europa, na Organização de Estados Ibero-americanos, na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e na UNESCO.

A já mencionada DGArtes desenvolve um importante papel no que concerne ao apoio às artes, evidenciando ser uma das principais estruturas geridas pelo Estado a fomentar este setor, apesar disso, funciona como um serviço central munido de autonomia administrativa. Apresenta como objetivos promover e qualificar a criação artística no país, proporcionar o acesso à arte de forma igualitária garantindo a diversificação e a descentralização da produção artística, e estimular a criação e difusão das artes por meio de “incentivos adequados” (DGArtes, website).

No âmbito da internacionalização, a DGArtes tem como atribuição promover e projetar internacionalmente, artistas, produtores, criadores e outros profissionais do setor cultural de maneira a viabilizar o acesso a canais de promoção e distribuição. Uma das ferramentas de atuação para que estes objetivos e metas sejam atingidos é o financiamento público, para o qual foi criada a linha de financiamento Apoio à Internacionalização das Artes. A finalidade desta modalidade de apoio é o desenvolvimento de projetos artísticos fora do país (DGArtes, website) tendo como prioridades estratégicas a difusão internacional da cultura e das artes contemporâneas portuguesas, juntamente com o trabalho autoral e a apresentação de projetos em África, Ásia, América ou Oceânia (DGArtes, 2014). Os apoios são concedidos mediante aprovação em procedimento concursal, aberto pela própria DGArtes.

Além do apoio à internacionalização, a DGArtes oferece ainda as modalidades: Apoio Pontual; Apoios Diretos Quadrienais, Bienais e Anuais; Acordos Tripartidos; e Apoio ao Associativismo Cultural, Bandas de Música e Filarmônicas, esta ultima destinada à região de Lisboa e Vale do Tejo. Os Acordos Tripartidos e o Apoio à Internacionalização são as únicas modalidades que inserem a prática da cooperação nacional e transnacional nos critérios e parâmetros de apreciação das propostas. Contudo, apenas no Apoio à Internacionalização a cooperação surge efetivamente entre os objetivos gerais e as prioridades estratégicas (DGArtes, 2012; 2016).

A interação e a cooperação cultural entre Portugal e outros países europeus concretizam-se também através de ações comunitárias como as Capitais Europeias da Cultura. Conforme mencionado anteriormente, três cidades Portuguesas receberam esta nomeação. A primeira foi Lisboa em 1994, a segunda foi a cidade do Porto em 2001, e a terceira foi Guimarães em 2012. “O título de capital europeia da cultura deixou muitas vezes uma herança duradoura às cidades em causa, sob a forma de novas infra-estruturas e actividades culturais” (Comissão Europeia. 2011, p. 10); no caso do Porto 2001, uma dessas heranças foi a Casa da Música.

Segundo Tibor Navracsics, representante da European Union Commissioner

for Education, Culture, Youth and Sport os programas Capitais Europeias da Cultura

e Europa Criativa estão diretamente ligados:

The European Capitals of Culture are an integral part of the Creative Europe programme 2014–20, whose ambition is to promote Europe’s cultural diversity and cultural heritage and to reinforce the competitiveness of our cultural and creative sectors. Creative Europe helps artists, cultural professionals and cultural organisations to adapt to the digital age and globalisation, work across borders and reach as many people as possible in Europe and beyond. It also supports efforts to improve access to finance through the setting-up of a new financial guarantee facility. (European Capitals of Culture 30 years, 2015, p. 1)

As premissas que regem e estimulam a criação de programas como as Capitais Europeias da Cultura e o Europa Criativa fortalecem-se na ideia de que a difusão, a cooperação e o intercâmbio diminuem a distância causada pelo desconhecimento da diversidade cultural existente e inerente a diferentes povos. Em uma dimensão prioritariamente europeia, o Europa Criativa e as Capitais Europeias da Cultura adotam como princípio a discussão incitada por Franz Boas, segundo a qual diferentes culturas representam pluralidade, e não uma única, linear e evolutiva cultura em que os povos são classificados como evoluídos e não evoluídos. Deste modo, compactuando com as ideias de que não existe uma linha evolutiva em termos

culturais, e de que o valor de um determinado povo ou grupo consiste nas suas particularidades, a cooperação cultural torna-se uma prática bastante promissora, uma vez que esta pressupõe a não-competição e possibilita o crescimento mútuo através de características e singularidades que podem tornar-se também complementares.

2. DOS PROGRAMAS MEDIA E CULTURA AO EUROPA