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CAPÍTULO 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA: ESTUDOS SOBRE A LÍNGUA

5.2 A CATEGORIA LEXICAL NOME

5.2.1 A POSSE DE NOMINAIS EM MAXAKALÍ

Os nomes de posse direta da língua Maxakalí referem-se, normalmente, a relações de parentesco, a relações pessoais e a partes do corpo. Os nomes de posse direta ocorrem sempre com um marcador de pessoa morfologicamente explícito, mesmo quando tais nomes ocorrem isoladamente, quando não-envolvidos em construções genitivas. No caso do Maxakalí, sua ocorrência se dá na forma de prefixos pessoais inativos2

(11) (12)

:

‘Ũg- pata à -yĩm

[ʔɯ̃ŋ paˈtaʔ] [ʔã ˈɲĩɤ̯m̚ ]

1. INAT pé 2. INAT mão

‘meu pé’ ‘sua mão’

(13) (14)

‘Ũ -tak ‘Ũg- pet

[ʔɯ̃ʔ ˈtak˺] [ʔɯ̃ŋ ˈpæɜ̯t̚]

Ele INAT pai 1. INAT casa

‘pai dele’ ‘minha casa’

Os nomes acima ocorrem, necessariamente, marcados pelos prefixos pessoais inativos. Com relação aos nomes de posse indireta, estes têm ocorrência livre, sem necessidade de marcação, desde que não ocorram em construções genitivas, como mostro abaixo:

(15) (16) (17)

Kakxop Hãhãm Nãmxap

[kak̚ˈtʃuɤ̯p̚] [hãˈhãɤ̯̃m] [dãɤ̯̃m̚ tʃaɤ̯p̚]

‘Menino’ ‘Terra’ ‘Pilha’

(18) (19) (20)

Kugmax Xapup Kanãyxaktux

[kɯg̚ˈbaj] [tʃaˈpɯɤ̯p˺] [kaʔˈnãj̃ɲˈtʃak˺ˈtɯj]

‘Jabuti’ ‘Porco’ ‘Rádio’

2

Tratarei especificamente sobre esses prefixos ou marcadores pessoais na seção sobre os pronomes da língua Maxakalí.

Quando envolvidos em construções genitivas, nomes de posse indireta precisam ocorrer com um dos marcadores de posse: yõg [ɲõŋ] ou õg [ʔõŋ]3

. Esses marcadores referem-se, respectivamente, à primeira e à segunda pessoa do singular. As outras pessoas do discurso são marcadas pelo morfema de posse de primeira pessoa yõg [ɲõŋ] adjunta a marcadores de pessoa inativos4

(21)

, como mostro nas sentenças a seguir:

Yõg kakxop [ɲõŋ kak̚tʃuɤ̯p̚] GEN 1. menino ‘Meu menino’ (22) Õg xapup [ʔõŋ tʃaˈpɯɤ̯p˺] GEN 2. porco FP ‘Teu porco’ (23) Ũ- yõg Nãmxap [ʔɯ̃ ˈɲõŋ dãɤ̯̃m˺ˈtʃaɤ̯p̚] 3. INAT GEN pilha

‘Pilha dele’ (24)

Yũmũ -yõg kayak [ɲɯ̃mɯ̃Ɂ ɲõŋɁ kaˈdʒak˺] Nós INCL GEN camisa ‘Nossas camisas’

(25)

‘Ũgmũ -yõg hãm-xop-mã-ax [Ɂɯ̃ŋˈmɯ̃Ɂ ɲõŋ hãɤ̯̃mtʃuɤ̯p˺mãˈɁaj]] Nós EXCL GEN coisa PL CAUS FR NOM ‘Nossas coisas’

3

PEREIRA, 1992, menciona os morfemas ũgyõg e ayõg respectivamente para a primeira e para a segunda pessoa do singular. Não identifiquei, entretanto, tais formas em minha pesquisa.

4

(26)

Ã-xop -yõg Kugmax [ãʔˈtʃuɤ̯p˺ ˈɲõŋ kɯg̚baj] 2. PL GEN jabuti ‘Vosso jabuti’ (27)

Ũ-xohi yõg kanãyxaktux

[ʔɯ̃tʃuˈhiʔ ɲõŋ kaʔˈnãj̃ɲˈtʃak˺ˈtɯj] 3. muitos GEN rádio

‘O rádio deles’

Vê-se, então, que há dois marcadores de posse em Maxakalí: yõg [ɲõŋ] e õg [õŋ]. O marcador yõg [ɲõŋ] forma, com as marcas de pessoa, sete possibilidades de marcação de posse independentes, como disponho na tabela abaixo:

TABELA 1

MARCADORES DE POSSE INDIRETA/ALIENÁVEL

Como se pode ver na tabela acima, o marcador de primeira pessoa do singular yõg [ɲõŋ] deriva as formas correspondentes às outras pessoas, com exceção da segunda do singular, cuja forma correspondente é õg [õŋ]. As formas derivadas são compostas pelo marcador yõg [ɲõŋ] antecedido de marcadores de pessoa inativos.

Segundo Ribeiro (2002), os marcadores de posse alienável do Maxakalí yõg [ɲõŋ] e õg [ʔõŋ] são prováveis cognatos com os marcadores de posse alienável

Pessoa MARCADORES DE POSSE

1a yõg [ɲõŋ]

2a õg [õŋ]

3a ũ-yõg [ Ɂɯ̃ˈɲõŋ ] 1a incl. ũg-mũn-yõg [ʔɯ̃ŋmɯ̃ɜˈɲõŋ ] 1a excl. yũmũg-yõg [ɲɯ̃ˈmɯ̃ŋˈɲõŋ] 2a ã-xop-yõg [ʔãhˈtʃuɤ̯p˺ˈɲõŋ] 3a ũ-xohi-yõg [ʔɯ̃htʃuˈhiɁˈɲõŋ]

existentes em outras línguas Macro-Jê: o em Bororo, u- em Karirí5

Em Maxakalí, nomes de posse indireta, por não terem inerentemente qualquer posse indicada, necessitam ocorrer com marcadores de posse em construções genitivas. Nessas construções, nomes alienáveis coocorrem com o morfema de posse

yõg [ɲõŋ] encabeçando o núcleo nominal do composto, como mostro a seguir:

e õ em línguas Jê do Norte, como Apinajé, Kayapó, Panará, Parketejê, Timbira, etc.

(28)

Xapup -nãg yõg hãm ãg-tux

[tʃaˈpɯɤ̯p ˈnãŋ ɲõŋ hãɤ̯̃mãŋˈtɯj] catitu DIM GEN coisa falar ‘História do catitu’

(29)

‘Ũn-xop yõg tuhut

[ʔɯ̃ɜ̃ˈtʃuɤ̯p˺ ɲõŋ tɯˈhɯɜ̯t˺] Mulher FR PL GEN rede FP ‘Bolsas das mulheres’

(30)

‘Ũ- yĩm-xox yõg tut-pe

[ʔɯ̃ˈ ɲĩɤ̯̃mˈtʃoj ɲõŋ tɯɣɜhˈpæʔ] Ele INAT marido INAL GEN rede

‘Rede do marido’ (31)

Notot yõg xahap

[doˈtoɜ̯t˺ ɲõŋ tʃaˈhaɤ̯p˺] Médico GEN chave FP ‘Chave do médico’

(32)

Ãyukuk yõg mĩm-tut-mõg

[ʔãdʒɯˈhɯk˺ ɲõŋ mĩɤ̯̃mˈtɯɣɜˈmõŋ] Não-índio GEN casa ir

‘Carrro do não índio’

5

Tais formas cognatas são, consoante RIBEIRO, 2002, uma das evidências apontadas por RODRIGUES, 1992, 1999, do parentesco genético entre o Karirí e outras línguas Macro-Jê.

Nas construções genitivas acima, o marcador de posse yõg [ɲõŋ] encabeça o núcleo. Ao contrário dos nomes de posse indireta, nomes de posse direta são inerentemente marcados por prefixos possessivos e prescindem, por essa razão, dos marcadores de posse yõg [ɲõŋ]/õg [ʔõŋ], ocorrendo em justaposição com o núcleo, como mostro por meio das construções genitivas a seguir:

(33) Ãmãxux puk [ʔãmãˈtʃɨj ˈpɯk˺] Anta assobio ‘Assobio de anta6 (34) ’ Xupapox yĩm-kup [tʃɨpaˈpoj ɲĩɤ̯̃mˈkɯɤ̯p˺] Lontra mão acha ‘Braço de lontra’ (35) Kuptap xuuk [kɯɤ̯p˺ˈtaɤ̯p˺ tʃɯʔˈʔɯk˺] urubu ovo ‘Ovo de urubu’ (36) Kakxop xe [kak˺ˈtʃuɤ̯p˺ ˈtʃæʔ] Menino cabelos ‘Cabelos do menino’ (37)

Yãmĩy-xop kutex

[ɲãˈmɪ̃j̃ˈtʃuɤ̯p˺ kɯhˈtæj] espírito PL canto ‘Cantos de espíritos’

A seguir arrolo exemplos com os dois tipos de construção genitiva:

6

GENITIVO DE NOMES ALIENÁVEIS

(38)

Xapup -nãg yõg hãm ãgtux ũ-mai xẽẽ-nãg [tʃaˈpɯɤ̯p˺ ˈnãŋ ɲõŋ hãɤ̯̃m Ɂãŋˈtɯj ʔɯ̃baˈiɁ tʃẽˈɁẽŋn̥ˈnãŋ Porco DIM GEN coisa falar 3. INAT ser bom verdadeiro DIM ‘A história do catitu é muito boa’

(39)

Ũn-xop yõg tuhut tuthi mĩy

[ʔɯ̃ɜ̯̃Ɂˈtʃuɤ̯p˺ ɲõŋ tɯˈhɯɜ̯t˺ tɯɜ̯ˈhiɁ hã mɪ̃j̃ɲ Mulher FR PL GEN bolsa embaúba por meio de fazer ‘As bolsas das mulheres são feitas de embaúba7

(40)

Ũ-yĩmxox yõg tutpe ũ-pip hãm tu

[ɯ̃ɲĩɤ̯̃m˺ˈtʃoj ɲõŋ tɯɜ̯ɁˈpæɁ ʔɯ̃ˈpiɤ̯p˺ hãɤ̯̃m˺ ˈtɯɁ] 3. marido GEN rede 3. INAT ser deitado chão em ‘A rede do marido (dela) está no chão’

(41)

Notot yõg xahap yãy kõyõy kaxĩy hã [doˈtoɜ̯t˺ ɲõŋ tʃaˈhaɤ̯p˺ ɲãj̃ɲ kũˈɲũj̃ɲ kaɁˈtʃẽj̃ɲ ˈhãɁ] Médico GEN chave REFL quebrar ontem durante ‘A chave do médico quebrou ontem’

(42)

Ãyukuk yõg mĩmtut-mõg ũ- takat xẽẽ-nãg

[ʔãdʒɯˈhɯk˺ ɲõŋ mĩm˺ˈtɯɣɜˈmõŋ ʔɯ̃ taɁˈkaɜ̯t˺ tʃẽˈɁẽŋn̥ˈnãŋ] Homem-não índio GEN casa ir 3. INAT ser caro verdadeiro DIM ‘O carro do não-índio é muito caro’

GENITIVO DE NOMES INALIENÁVEIS

(43)

Ũn -te ãmãxux puk ã-pak

[ʔɯ̃ɜ̯̃n ˈtæɁ ʔãmãˈtʃɯj pɯk˺ ʔãˈpak˺] Mulher FR ERG anta assobio ?? escutar ‘A mulher escutou o assobio da anta’

(44)

Xupapox yĩm kup ũ- hẽ-nãg

[tʃɨɁpaˈpoj ɲĩɤ̯̃m˺ ˈkɯɤ̯p˺ ʔɯ̃ ˈhẽj̃ŋ̥ˈnãŋ] Lontra mão bastão ele INAL torto DIM ‘O braço da lontra8

7

Árvore da família Cecropiaceae, de cuja casca os Maxakalí produzem fios que servem para a confecção de bolsas e redes.

(45)

Kuptap xuk yãy koho

[kɯɤ̯p˺ˈtaɤ̯p˺ tʃɯk˺ ɲãj̃ɲ koˈhoɁ]

Urubu ovo REFL chocar

‘O ovo do urubu chocou’ (46)

Yãmĩy -te kakxop xe mep

[ɲãˈmĩɪj̃ ɲ ˈtæɁ kak˺ˈtʃuɤ̯p˺ tʃæɁ ˈbɛɤ̯p˺] Espírito ERG menino cabelos cortar PL ‘O espírito cortou os cabelos do menino’

(47)

Yãmĩy-xop kutex ũ-xohi

[ɲãmɪ̃j̃ɲˈtʃuɤ̯p˺ kɯɁˈtæj ɯ̃ɁtʃuːːˈhiɁ] Espírito PL canto 3. INAT abundar ‘Há muitos cantos de espíritos’

Na próxima seção, trato sobre a flexão de número em nominais.

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