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São amplas as possibilidades de comunicação do espetáculo com o público e o momento social e político do Brasil em que se inseria Tantos deles encontram-se

mapeados por Cláudia de Arruda Campos74, que empreendeu um esforço em perceber as

74 CAMPOS, Cláudia de Arruda. Zumbi, Tiradentes (e outras histórias contadas pelo Teatro de Arena de São Paulo). São Paulo: Perspectiva, 1988. A obra, resultado da dissertação de mestrado desenvolvida junto ao Departamento de Letras Clássicas Vernáculas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da

referências ao cenário daqueles dias, que se pode n o tar em alusões a figuras políticas, práticas de g uerra e rep ressão e até m esm o a pró p ria retórica habitual de um sistem a que exaltava determ inados valo res da preten sa sociedade em construção, enquanto m arginalizava e crim in alizav a a oposição p o lítica dos cham ados “ su bversivos” a quem se deveria p erseguir.

São com posições que partem do uso de estratégias alegóricas, que apenas adquirem significado em função do repertório do p ú blico e dos tem as caros para aquele m om ento tantas nuances do espetáculo que, ainda hoje, nos cham am a atenção, com o o ainda em brionário S istem a C oringa que se experim en tav a naqueles dias, antes m esm o que levasse esse n o m e. E n tretan to p u lsav a a cada apresentação, p ara o dim in u to público do A rena, a crítica que a resistên cia h istó rica de Z u m b i era capaz de fazer ainda aos dias que se enfrentavam nos p rim eiros anos do reg im e m ilitar. F az-se tam b ém a crítica da nociva alian ça75 das classes trab alh ad o ras com os ditos setores m ais progressistas da b u rg u esia brasileira, interp retação que em erge ainda m ais em A re n a co n ta Tiradentes. E nfim , Z u m b i rep resen tav a o início de u m a trajetó ria que se to rn aria clara de fato a partir de Tiradentes, em que se teo rizaria de fato o S istem a C oringa enquanto um novo m étodo de encenação que d aria as diretrizes para próxim as produções do conjunto.

O sistema “Coringa” é o aprofundamento e a cristalização da técnica já experimentada em Arena conta Zumbi. Como teoria, coloca-se no apogeu, sendo a mais inteligente formulação de um encenador brasileiro. O texto de Tiradentes é incomparavelmente superior ao de Zumbi e supera as limitações propositais a que ele se submeteu. Entretanto, Zumbi era um espetáculo muito mais vivo e comunicativo, de uma disciplina contagiante de comicidade.76

A re n a conta T iradentes seria igualm ente u m a realização coletiva77, de autoria

tam bém assinada p o r G ianfrancesco G uarnieri e A ugusto B oal, e realizad a dentro de u m a

Universidade de São Paulo, empreende um esforço de sistematizar algumas das principais realizações do Arena debruçando-se sobre as temáticas abordadas, as influências assimiladas pelo grupo e especialmente sobre a relevância adquirida pelo mesmo no momento histórico em que foram atuantes. Ao longo desse capítulo, no entanto, optamos por não nos debruçar sobre as interpretações construídas pela autora uma vez que o centro da discussão proposta para esse momento é perceber o olhar da crítica para a trajetória do grupo. Mais adiante será determinante retomá-la em nosso trabalho para que possamos refletir acerca da reelaboração das interpretações de crítica teatral na construção de conhecimento histórico sobre a História do Teatro Brasileiro.

75 Às críticas ao pacto policlassista tinham espaço nas discussões levantadas pelos artistas e dramaturgos do período. Ainda sobre isso é possível encontrar denso debate em : PATRIOTA, Rosangela. Vianinha:

um dramaturgo no coração de seu tempo. São Paulo: Hucitec, 1999.

76 MAGALDI, Sábato. Um palco brasileiro: O Arena de São Paulo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1984, p.80.

77 Vale ressaltar que as atribuições de “criação coletiva” de algumas obras nesse período deram-se a partir de um consenso e, deste modo, quando hoje temos essas referências ao buscarmos por tais obras, não devemos excluir o debate do processo criativo que nos revela que a autoria do texto em questão carrega a marca de Guarnieri e Boal.

concepção de g rupo p rio rizad a pelos integrantes do A rena. M esm o p reocupados com a realização de u m a p esq u isa h istó rica, o m ote de suas p roduções ainda resp o n d ia a b u sca p o r u m a m obilização u tilitária desse conhecim ento, q u e d everia servir ao debate v o ltado para q u estõ es do p resen te, ex plorando, po rtan to , a construção de alegorias capazes de ressignificar tem as e obras em fu n ção de um pro jeto estético e político. V oltad o s para esse com prom isso esses sujeitos libertavam -se p ara qu e no p rocesso criativo pudessem explorar a sensibilidade n ecessária para to car n aq u ilo que lhes era m ais caro no m om ento. D esse m odo, em T iradentes assim com o em Zum bi, um m o v im en to de resistência do período colonial em erge para fa zer p en sar no m o m en to presente, n u m a análise p o lítica e social bastante elaborada e ainda m ais afinada do que a anterior, sendo já capaz de tecer u m a crítica aos m oldes capitalistas e a lu ta de classes que p arecia m ais palpável dentro do contexto histórico que se lev av a ao palco naq u ele m om ento, pois “ d esv en d ar estruturas capitalistas to rn a-se m ais fácil em T iradentes onde não se tem , com o em Z u m b i, a oposição entre duas sociedades absolutam ente heterogêneas, m as contradições dentro da m esm a sociedade regida p elas leis do lucro, do cap ital” .78

M ais u m a vez o T eatro de A ren a co m u n icav a-se com seu p ú blico e com seu tem po, traçan d o um p aralelo entre m om entos históricos. D essa v ez os enredos que desem bocaram no golpe de 1964 são postos no centro da discussão através m etáfora da In co n fid ên cia m ineira, e novam ente a crítica ao m ovim ento que p reten d ia subverter a ordem v ig en te v ê-se d errotado diante das forças que a abafam :

Na perspectiva adotada pelos autores, o paralelismo se estabelece de maneira rigorosa, servindo para diagnosticar tanto as causas do malogro da Inconfidência como daqueles que, dentro do Governo João Goulart e por intermédio dele, pretenderam subverter a estrutura antiga do país. Inconfidência palaciana seria o seu epiteto pejorativo, bem como os indiciamentos revolucionários, feitos recentemente sem a participação do povo, significaram um jogo de cúpula, destinado ao inevitável esvaziamento.79 E n cen ad a pela p rim eira v ez em 1967, A ren a co n ta T iradentes trazia consigo a p reocupação de pela p rim eira vez explicar o S istem a C oringa, que agora encontrava-se aperfeiçoado. D essa vez m ais do que n arrar a história, m ais do que a peça em si, a com unicação com o p ú blico se estreitava ainda m ais, atingindo um novo nível ao levar ao esp ectad o r os aspectos m ais essenciais do processo criativo que p recede a encenação que se v iria a assistir. M ais do que o fun cio n am en to do espetáculo e a ex plicação do 78 CAMPOS, Cláudia de Arruda. Zumbi, Tiradentes (e outras histórias contadas pelo Teatro de Arena

de São Paulo). São Paulo: Perspectiva, 1988, p. 101.

79 MAGALDI, Sábato. Arena conta Tiradentes. O Estado de São Paulo, São Paulo, Suplemento Literário, 01 jul. 1967, p. 5.

S istem a C oringa, o p ú b lico ficaria a p ar das escolhas que direcionaram aq u ela realização. Tais escolhas, estéticas e políticas, são responsáveis pelo pro d u to final que se lev a ao palco e a fo rm a com o se escolhe abordar aquelas tem áticas, n arrar aquela h istó ria e com unicar-se com o m o m en to histórico vivenciado.

A adoção do S istem a C oringa em T iradentes ex ig ia u m a m aio r preo cu p ação com a id entificação dos personagens, que deveriam ser reco n h ecid o s individualm ente, não sendo m ais suficiente iden tificá-lo s com o p arte de b lo co s antagônicos com o hav ia sido em Zum bi. A variação dos atores que in terpretam cada um dos personagens dentro desse m étodo ped iria então m arcas e adereços que perm itissem essa id entificação dentro da d inâm ica p roposta da encenação, u m a v ez que apenas o p ro tag o n ista era rep resen tad o por um ú n ico ator pela m aio r necessid ad e de identificação do m esm o.

Um grande mérito do espetáculo, assim, é o de abandonar o preconceito de um estilo único. Como preferir, nas manifestações artísticas modernas, esse ou aquele ismo, quando todos exprimem aspectos da nossa experiência? Quem sabe até, dentro de cincoenta anos, alguns ismos que parecem contradizer-se não serão enfeixados como ramos de um único tronco da arte? Parece-nos salutar essa beberagem por todo canto, desde que não se instaure o caos estilístico, e a unidade é produzida pela presença do Coringa, comentador e também personagem, que entra numa cena quando cabe preencher um vazio, exatamente como no jogo de cartas.

A justaposição de estilos exprime também um dos impasses da criação moderna, esgotada na tarefa de inventar sempre uma pequena originalidade. Ao invés de acrescentar um novo ismo, que exclua os demais, talvez seja mais fecundo tentar uma síntese de todas as expressões, na procura da consolidação de um monumento. Esse ou aquele ismo não passa de uma formula raquítica, dentro da complexidade das manifestações de hoje. Enfrentar sem pudor esse desafio enriquece a pesquisa de “Tiradentes”.

Outro aspecto positivo do espetáculo está na identidade das teorias de encenação e literatura dramática. Pode-se afirmar que a peça ilustra o primeiro sistema nacional de montagem, o que o método de representação foi motivado pelas exigências especificas do teatro. Já aí se nota um parentesco inicial com Brecht, que desenvolveu paralelamente, na sua dramaturgia e nos espetáculos do “Berliner Ensemble”, a teoria do teatro épico.80

N aq u ele m om ento o M éto d o C oringa atingia seu ápice e S ábato M agaldi reconhecia n essa realização o potencial de u m a n o v a fo rm a que, ao invés de ten tar sobrepor-se as dem ais criando um novo estilo, ex p ressava a b u sca p ela síntese das expressões até então em pregadas. A ssim , n u m a aproxim ação notável com a teoria b rech tian a81 do T eatro É pico, o S istem a C oringa b u scav a afirm ar-se, através dessa realização enquanto o prim eiro sistem a nacional de m ontagem .

80 Idem.

81 Vale apontar que, enquanto o crítico reafirma aspectos que permitem notar um caráter de aproximação com a teoria brechtiana, as críticas passam ao largo de um aspecto de distanciamento importantíssimo entre as produções do Teatro de Arena (especialmente na fase de implementação do Sistema Coringa e dos musicais “Arena Conta) a o pensamento de Bertold Brecht. A presença marcante dos heróis nessas

A síntese de estilos se completa com a síntese dos dois métodos fundamentais do teatro moderno - Stanislavski e Brecht unidos com o propósito e se vivenciar uma experiência e ao mesmo tempo comentá-la para o espectador.82 P erceb e-se que p o ssiv elm en te a adoção de tal m étodo de encenação gerav a certo estranham ento e talv ez m esm o algum a confusão n a plateia, m as resp o n d ia agora a u m a escolha estética elab o rad a e necessária dentro da realidade do conjunto. Justam ente quanto ao p rotagonista cabem algum as críticas, a exploração nad a in éd ita de u m a im agem ro m an tizad a de T iradentes, análoga a Jesus C risto. D esse m odo acabam frustradas as expectativas em torno das possibilidades de abo rd ar essa fig u ra a p artir de outros aspectos, oferecendo m ais u m a vez essa id en tid ad e hero ica do p ersonagem histórico da Inco n fid ên cia M ineira.

D en o ta-se enfim a existên cia de um inim igo, portan to a possib ilid ad e de evitá-lo. Tanto em Z u m b i quanto em Tiradentes, esse inim igo é um p o d er que age de m odo a frear ou d errotar os m ovim entos em questão. A interp retação que aponta p ara a existên cia de u m a au tocrítica da pró p ria esquerda, é aquela que p ercebe nesse inim igo u m a alusão às alianças estabelecidas com os setores progressistas n a b u rg u esia b rasileira às v ésp eras do golpe, e n essa alianças o prelúdio do fracasso do projeto revolucionário que se encam inhava.

Há crítica impiedosa e suave autocrítica, se entendermos como tal o reconhecimento de culta de Tiradentes. Abandonou-se adesão incondicional aos derrotados, que enfraquecia Zumbi. O que resta da complacência fica contido agora na suposição da existência de uma linha correta, embora incapaz de tomar a direção do processo. E não é pouco. A verdade, a linha correta, é carregada pelo herói com o qual o espectador pode, e até deve, pelos recursos usados na concepção o personagem, identificar-se. Ninguém precisa assumir a carapuça de intelectual nefelibata, burguês pseudo-revolucionário ou traidor. Basta confirmar-se a Tiradentes, exemplo de postura revolucionária, assim como a ele aderem os autores da peça.83

O diálogo com a realidade social em que se insere e a com unicação d ireta com a p lateia perm anecem na ordem do dia para o A rena. O conjunto, através desse novo épico, m ergulhado a fu n d o no S istem a C oringa, dessa v ez explicado e teorizado, ainda se p reocupa em p rim eira in stân cia com as questões de seu próprio tem po, e m ais u m a vez elabora a crítica a resistên cia derrotada. E ssa nuance, pouco sutil, não escap a ao o lhar do

montagens afasta-se do pensamento do dramaturgo que repelia de certa forma a presença e a necessidade dessa figura. Enquanto Boal faz a defesa da necessidade de heróis nacionais, Brecht, em outro extremo, deixou-nos máxima afirmada em Galileo Galilei, que aponta a pobreza da nação que precisa de heróis.

82 Idem.

83 CAMPOS, Cláudia de Arruda. Zumbi, Tiradentes (e outras histórias contadas pelo Teatro de Arena

crítico, que de m an eira sistem ática esteve acom panhando a trajetó ria do conjunto, o que fica claro ao lerm os em S ábato M agaldi:

Arena Conta Tiradentes é a história da Inconfidência Mineira, revista como autocrítica da esquerda, em face da política daquele momento. Os autores sublinharam, nos episódios de 1791, as correspondências com a situação brasileira de 1967, de molde a explicar a derrota de 1964. O texto conclui com uma exortação para o aparecimento de heróis que proclamem a liberdade a liberdade, sempre que necessário.84

Tendo em m en te as questões já apontadas p o r S ábato M agaldi em outros tex to s de crítica teatral, sabem os de sua p reocupação quanto à n ecessidade de ad m inistração das com panhias e grupos teatrais enquanto em presas. D iante disso, o crítico não se fu rta a análise da u tilid ad e prática do M éto d o C oringa naq u ele m om ento p ara o A rena. T ratava- se de u m a solução econôm ica p ara um im passe. O Teatro de A ren a co n tav a com poucos assentos n a plateia, de m odo que u m a p rodução d em asiadam ente onerosa não era viável, ten d o em v ista a p o ssibilidade de p ú blico pagante. A lém disso, o palco d im inuto im pedia tam bém um espetáculo com um elenco m uito num eroso. D essa m aneira, o C oringa era tam bém u m a saída p ara que o grupo não estivesse condenado a lev ar a p ú blico apenas peças de poucos personagens. A lém de rep resen tar a criação de seu pró p rio sistem a de representação, o M éto d o C oringa so lucionava p ro b lem as de ordem p rática e econôm ica do grupo.

A solução encontrada por Boal racionaliza ainda um problema de natureza econômica: pela área limitada da arena e pelo número reduzido de assentos na plateia (150), a produção não deve ser dispendiosa, sob pena de não pagar-se. Em termos tradicionais, o grupo só levaria peças de poucas personagens, com prejuízo do alcance artístico, ou aceitaria como condição normal de trabalho o déficit. A circunstancia de interpretarem os atores vários papéis, além de facultar o efeito do estranhamento, permite concentrar o desempenho num núcleo pequeno e fixo, que se desdobra em numerosas personagens. Um papel pode ser encarado numa cena por um ator e na seguinte por outro, e assim sucessivamente, de acordo com as necessidades da distribuição. Com essa liberdade, a personagem não se confina as características de um intérprete, incorporando os achados de todos.85

N o entanto, a solução trazid a pelo M éto d o C oringa era resp o sta àquelas questões que se abatiam sobre o A rena. A d ificuldade de g aran tir u m a m argem segura de lu cro com u m a p lateia red u zid a pode te r sido d eterm inante p ara o encontro dessa solução. Som ente assim , u m a p eça que trazia um m aio r n úm ero de p ersonagens caberia nos lim ites do palco de arena, sem que o déficit da co m panhia fosse p arte dos planos. E n tretanto, ainda que

84 MAGALDI, Sábato. Um palco brasileiro: O Arena de São Paulo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1984, p. 74.

85 MAGALDI, Sábato. Arena conta Tiradentes. O Estado de São Paulo, São Paulo, Suplemento Literário, 01 jul. 1967, p. 5.

ten h a sido um recurso de considerável sucesso e u m a im p o rtan te inovação em term o s de encenação, Sábato atentava p ara os p erigos da repetição exau stiv a desse m odelo:

Ganhou sobretudo a liberdade de movimentos, com ampliação imensa do horizonte, dentro de um esquema reativamente simples de trabalho. Julgamos, porém, que esse método é uma decorrência dos problemas específicos do Arena e que não seria aplicado com o mesmo rendimento na dramaturgia tradicional. Ele está intimamente ligado a figura do Coringa em cena, “deus- ex-machina” que preside a apresentação. No próprio Arena, julgamos perigosa a repetição do sistema, pelo cansaço que inevitavelmente provocaria no espectador.86

Tiradentes vem enfim cristalizar o S istem a C oringa, já experim entado desde Z um bi. D essa vez, a técnica atinge seu apogeu, e m esm o po r isso é a essa m ontagem que

se rem ete crítica de grande acuidade de S ábato M agaldi. A in telig ên cia da form ulação e da execução n ão lhe perm ite duv id ar que se trata de um tex to m ais rico do que Z u m b i, superando lim itações que foram severam ente m ais sentidas p o r este. N u m a p erspectiva diversa o crítico aponta, entretanto, que a ex trem a racionalização do espetáculo, que recupera a narrativ a da in co n fid ên cia m in eira e faz com que o m esm o p erca um pouco do “ encanto” , o que se trata apenas de um cansaço frente ao m olde de realizações do grupo.

O sistema “Coringa” é o aprofundamento e a cristalização de uma técnica já experimentada em “Arena conta Zumbi”. Como teoria, coloca-se no apogeu, sendo a mais inteligente formulação de um encenador brasileiro. “Tiradentes”, como texto, é incomparavelmente mais rico que “Zumbi”, e supera as limitações propositais a que ele se submeteu. Entretanto, “Zumbi” era um espetáculo muito mais vivo e comunicativo, de uma indisciplina contagiante de comicidade. A racionalização excessiva de “Tiradentes” rompeu-lhe o encanto o impacto teatral. Mas sentimos que, nessa menor comunicação, uma parte da responsabilidade cabe a volta do mesmo processo, que já faz até o público sem preconceitos políticos referir-se um pouco enfadado ao “jeito de sempre do Arena”.87

T alvez frente ao receio desse desgaste do público em relação à fo rm a que, para o T eatro de A rena, v in h a se torn an d o habitual, Sábato encerra a crítica ressaltan d o o reconhecim ento da m atu rid ad e atingida pelo grupo, m as tem en d o tam bém que a chegada a esse auge possa significar o in ício de um declínio ao dizer: “N ão querem os que o A rena, agora que alcançou m atu rid ad e teó rica e a m elh o r realização dram ática de A ug u sto B oal e G ianfrancesco G uarnieri, prin cip ie tam bém seu d eclínio.” .88

O pondo-se a questões específica do espetáculo, com o o uso excessivo da m úsica e a po u ca pro fu n d id ad e psico ló g ica dada ao p ersonagem de G onzaga, o que se sobressai da crítica de S ábato M agaldi é a id eia d a existên cia de u m a auto crítica da esquerda. E ssa

86 Idem. 87 Idem. 88 Idem.

interpretação, pró p ria do crítico em questão m erece ser d iscutida em m ais p ro fundidade u m a vez que pode ser rep en sad a p erante a interpretação de D écio de A lm eid a P rad o 89 que tem um olhar afiado ju stam en te ao apontar a ausência dessa auto crítica no espetáculo,