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3 O BRICS E A INFLUÊNCIA NA GOVERNANÇA DA ORDEM INTERNACIONAL

3.6 A Potencialidade do BRICS

Esse grupo de países pode vir a desempenhar um papel mais relevante na ordem internacional e o NBD tem condições de ser o vetor para o aumento da influência política e econômica do BRICS, consequentemente das nações emergentes no mundo. Os países do BRICS já mostraram que as suas diferenças não impedem que eles avancem na cooperação, especialmente em relação à governança econômico-financeira. Após a crise de 2008, posicionaram-se em defesa da idéia de criar mecanismos de gerenciamento dos fluxos

financeiros globais e de controle das operações bancárias. Também foram responsáveis pelo fortalecimento do G20, que assumiu o lugar do G8 como principal instância para discutir a arquitetura financeira global. O fato é que o BRICS tornou-se algo muito maior do que a maioria dos analistas ocidentais gostaria de reconhecer, e a institucionalização tornou bastante provável a continuidade da sua existência pelos próximos anos.

Reinaldo Gonçalves (2005) aponta que a conduta dos atores no sistema internacional é determinada por fatores objetivos, e no aspecto político isso se traduz na busca pelo poder. Nesse sentido, pode-se perceber que as condições econômicas influenciam a política internacional, e os países emergentes, representados pelo BRICS, à medida que ganham projeção econômica, buscam maior poder político. Esse autor aponta que o poder potencial de um Estado assenta-se em uma base material de poder, e as variáveis usadas para mensurá-la são a população, o território, a riqueza, a capacitação tecnológica e as forças armadas. Com base nesses critérios, ele conclui que os cinco Estados com o maior potencial de poder são, em ordem decrescente: a China, os Estados Unidos, a Índia, a Rússia e o Brasil. Essa análise é feita com base nas condições individuais de cada Estado, porém, ao considerar que o BRICS reúne quatro dos cinco países com o maior potencial de poder, percebe-se a grande importância que esse grupo poderá ter na ordem internacional. O quinto membro do BRICS, a África do Sul, aparece na décima nona posição. Na figura a seguir, visualiza-se a posição destacada que os quatro gigantes do BRICS ocupam, juntamente com os Estados Unidos.

Gráfico 2: Países com extenso território, população numerosa e PIB elevado.

Fonte: Paulo Fagundes Vizentini (2013, p.119)

Gonçalves explica, contudo, que apesar desse potencial, os países do BRICS não têm poder efetivo equivalente, o que acarreta um grande hiato de poder. Em seu estudo, esse economista conclui que o Brasil, a China e a Rússia estão entre os cinco países com o maior hiato de poder no sistema internacional. Portanto, essas nações buscam acabar com a disparidade entre o seu potencial e o seu poder efetivo, trazendo maior equilíbrio para a ordem internacional. Afinal, a inexistência de poder compensatório permite a adoção de políticas e ações arrogantes e irresponsáveis (invasão ao Iraque em 2003). Nesse sentido, esse autor aponta que processos de cooperação e formação de alianças estratégicas tenderão, cada vez mais, a envolver países com potencial de poder, a exemplo da China, Índia, Rússia e Brasil.

Vale observar, contudo, que apesar da frequência dos encontros em múltiplos níveis de governo, ainda falta ao BRICS coesão interna suficiente ou mesmo habilidade em tomar ações coletivas, para que possa ser considerado uma aliança. Trata-se de um agrupamento com características singulares. Mais do que um conceito inventado, o BRICS é a manifestação da ascensão de práticas informais nas relações internacionais. Como afirma Cooper (2016, p. 36), “...Tanto como projeto diplomático quanto como instituição internacional, o BRICS é fascinante em sua mistura de práticas únicas e genéricas”.Tal singularidade induz muitos observadores a não compreenderem corretamente essa articulação de países emergentes, avaliando-a com ceticismo. Ainda deve-se atentar ao fato de que, obviamente, o

fortalecimento do BRICS não agrada aos poderes estabelecidos, que tendem a questionar a potencialidade do grupo.

Todavia, não há como negar que, hodiernamente, vive-se um cenário de transformações na ordem internacional. É nessa conjuntura que o BRICS pretende inserir-se como algo muito novo, por constituir-se uma importante articulação diplomática entre países, embora ainda seja um processo que demanda tempo para vingar, se consolidar e prosperar.

Uma breve observação do atual cenário político-econômico internacional permite conjecturar que os países emergentes, particularmente aqueles do BRICS, são capazes de contribuir mais para o crescimento global, especialmente quanto à governança econômica. O crescente peso do BRICS na economia mundial, assim como o seu potencial estrutural e de recursos naturais, asseguram a esse grupo condições para constituirem outro polo de desenvolvimento, como alternativa àquele devido ao Comitê de Assistência para o Desenvolvimento da OCDE, resultando em um maior equilíbrio na ordem mundial.

Embora essa perspectiva não pareça ser viável a curto prazo, os membros do BRICS articulam para resistir aos princípios da OCDE, por entenderem que esses princípios privilegiam os interesses dos países ricos em detrimento dos países receptores da ajuda (ABDENUR & FOLLY, 2017). “Se antes as potências tradicionais dominavam quase exclusivamente o sistema de cooperação, agora os chamados emergentes passam a disputar espaço também nesta agenda", como afirma Fátima Mello36, integrante da REBRIP.

Especificamente, os países membros do BRICS criticam as condicionalidades políticas impostas pela OCDE, FMI e BM, e defendem uma cooperação sem este tipo de interferência. Isso não significa que seja uma ajuda desinteressada, pois ao ampliar os seus projetos de cooperação para o desenvolvimento, também estarão aumentando as oportunidades de investimentos para as suas empresas no exterior, enquanto ajudam a promover o crescimento econômico e o desenvolvimento dos Estados parceiros.

O BRICS está introduzindo novos conceitos e valores na cooperação, e a participação social é fundamental para os seus membros avançarem na institucionalização de seus sistemas de cooperação, na transparência e no debate público. Comunga-se a ideia de que a participação da sociedade é o caminho para o enfrentamento das injustiças sociais e para a consolidação da democracia, ainda algo a ser conquistado em alguns países do bloco.

36Em entrevista ao INESC. 8 jul. Disponível em:

https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/Fatima-Mello-Os-BRICS-tem-um-grande-potencial- /6/33936. Acesso em: 20 jan. 2018

Nesse sentido, pode-se perceber que, inicialmente, a interação entre os países do BRICS limitava-se aos representantes dos Estados, o que gerava muitas críticas de parcela da sociedade civil, que demandava a sua inclusão no processo. Para contemplar essa demanda, foi criado, em 2015, o ‘Civic BRICS’, como um canal para ampliar o diálogo entre grupos da sociedade civil e representantes dos Estados. Hoje, já existe uma abertura maior, com a realização do Fórum Acadêmico, do Conselho de instituições ‘think tanks’, Fórum de Cooperativas, Fórum de Sindicatos, Fórum Empresarial, Fórum Internacional de Jovens Cientistas e Empreendedores, Fórum da Mulheres e da Cúpula da Juventude. Stuenkel (2015) aponta que os laços ‘intra-BRICS’ da sociedade civil tiveram um aumento considerável desde que os líderes decidiram desenvolver um formato mais institucionalizado. Na visão de Cooper (2016), essas iniciativas não respondem a todas as críticas, todavia mostram engajamento e apoio por parte do grupo.