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3.3 Consequências da Gestão das Finanças Domésticas

3.3.2 Poupança

Poupar é evitar o consumo por um determinado período em favor de possibilidades de consumo no futuro. Do ponto de vista psicológico está relacionado à forma como as pessoas lidam com incertezas e como fazem provisões para esse período no futuro a fim de garantir algum recurso para consumo (WÄRNERYD, 1989).

A poupança pode ser entendida ainda como uma atividade complementar ao consumo e função de dois conjuntos de fatores: a habilidade para poupar e a disposição para poupar. A habilidade é determinada em função da renda enquanto a disposição tem medidas subjetivas que consideram o nível de otimismo ou pessimismo da população (KATONA, 1974). O autor define três tipos de poupança: contratual (p. ex. pagamento de financiamentos ou seguros), discricionária (decisão deliberada de poupar, resultante da sobra de dinheiro após a satisfação das necessidades básicas) e, residual (não planejada, reflete a poupança da sobra do orçamento).

Lindqvist (1981) amplia a classificação proposta por Katona (1974) e apresenta uma hierarquia entre quatro motivos ou necessidades de poupança:

a. Gerenciamento do caixa – é a mais básica necessidade de poupança e representa a forma como os indivíduos organizam suas receitas e despesas, onde a categoria poupança residual apresentada por Katona (1974) se encontra.

b. Reserva para emergências – em pesquisas, a reserva para emergências é frequentemente apontada como a razão principal para a poupança.

c. Meios financeiros para alcançar metas desejadas – assim que os indivíduos se vêm frente a um bem desejado que não possa ser adquirido imediatamente, uma das opções é poupar para esse objetivo.

d. Gestão da riqueza ou patrimônio – nessa categoria os indivíduos têm recursos suficientes para investir seu dinheiro.

Wärneryd (1989) apresenta diferentes modelos de poupança desenvolvidos ao longo dos anos por economistas e psicólogos interessados no entendimento do comportamento de poupança dos consumidores. O quadro 2 apresenta esses modelos e suas variáveis intervenientes entre renda e poupança:

Modelo

1. Primeiras teorias

econômicas

Renda atualPersonalidade, frugalidadePoupança individual e total. 2. Hipótese da

renda absoluta Renda atualPoupança individual e total 3. Hipótese da

renda relativa

Renda atualComparação com a maior renda anterior Poupança individual e total

4. Hipótese do

ciclo de vida Renda atualComparação da renda atual com o estágio no ciclo de vida Poupança individual e total 5. A renda no

estágio do ciclo de vida e as mudanças

sociodemográficas

Renda atualComparação da renda no estágio do ciclo de vida para diferentes grupos sociodemográficos Acúmulo e fluxo de poupança total

6. Índice do sentimento do consumidor

Renda atualNível de otimismo/pessimismofluxo de poupança total 7. Pesquisa de

levantamento: atitudes e motivos para poupar

Renda atualatitudes e motivos de poupançaAcúmulo e fluxo de poupança individual

8. Modelo hierárquico de grupos de poupadores

Renda atualGrupos de poupadores com base na hierarquia de necessidades Acúmulo e fluxo de poupança individual

Quadro 2 – Modelos de poupança

Fonte: Adaptado de Wärneryd (1989, p.535).

Desde as primeiras teorias econômicas sobre poupança, variáveis psicológicas são incluídas e retiradas dos modelos que relacionam renda e poupança. Estudos mais recentes em economia comportamental incorporam essas características em seus

estudos na tentativa de enriquecer o entendimento sobre o comportamento dos consumidores em relação à poupança.

Em um estudo relacionando determinantes psicológicos sociais e econômicos, Lunt e Livingstone (1991) concluem que os indivíduos que poupam, em comparação com os não poupadores, possuem maior renda, maior nível de educação, são mais otimistas, acreditam estar no controle de suas finanças, além de fazer um maior monitoramento dessas finanças, sendo menos flexíveis no seu gerenciamento. Com o objetivo de criar uma hierarquia dos motivos para poupar, Canova, Rattazzi e Webley (2005) identificaram 50 metas que foram classificadas hierarquicamente. Na base da hierarquia estão as motivações mais concretas enquanto nos níveis mais altos estão metas de natureza psicológica como autogratificação e autoestima. Este estudo demonstra ainda que a estrutura de motivos para poupar não depende inteiramente de variáveis sociodemográficas.

Cheema e Soman (2008) investigam os efeitos da reserva de dinheiro (earmarking) e da divisão em quantidades menores (partioning) sobre a poupança de famílias de baixa renda. Resultados obtidos dessa investigação entre famílias fora do sistema bancário em uma área rural da Índia apontam para um aumento da quantia poupada quando há a reserva de dinheiro para poupança e quando os valores são divididos em quantidades menores (SOMAN; CHEEMA, 2011). O que explica o efeito da reserva é a culpa sentida pelo indivíduo ao usar o dinheiro reservado para poupança para outra finalidade, flexibilizando seu orçamento mental. Já o efeito da divisão em quantidades menores pode ser explicado pelo aumento da habilidade dos consumidores em exercer autocontrole quando ele é forçado a pensar mais vezes, dando mais atenção às suas decisões de consumo (CHEEMA; SOMAN, 2008; SOMAN; CHEEMA, 2011). Esses resultados sugerem a relação positiva entre o orçamento mental e a poupança proposta na hipótese H1.

Em sua pesquisa sobre poupança, Mackenzie e Liersh (2011) apontam que mesmo conseguindo explicar o funcionamento dos juros compostos, as pessoas têm dificuldade de entender o efeito cumulativo dos juros fazendo com que elas retardem o início da poupança para aposentadoria subestimando o custo dessa espera em começar a poupar. Esse viés pode levar o consumidor a se preocupar menos com a aposentadoria considerando que mais tarde ele poderá se ocupar disso. Os autores

também concluem que ao deixar mais claro para as pessoas o efeito do crescimento exponencial no acúmulo dos recursos ao longo do tempo, as pessoas poupam mais. Herchfield et al. (2011) demonstram que as pessoas deixam de poupar para aposentadoria porque têm dificuldade de se conectar com seu futuro, perdem a capacidade de se ver no futuro e prever suas necessidades. Ao ser apresentado à sua imagem projetada no futuro (seu avatar mais envelhecido) o indivíduo poupa mais para a aposentadoria.

Uma estratégia comum para aumentar as taxas de poupança é encorajar os consumidores a definir uma série de metas e razões para poupar, Soman e Zhao (2011) investigam a influencia da quantidade de metas no comportamento de poupança dos consumidores baseado na teoria de intenção de implementação. Os autores concluem que em determinadas situações uma única meta de poupança é mais eficiente em alterar o comportamento dos consumidores para que poupem mais. A definição de mais de uma meta para poupança pode gerar a necessidade de analisar metas que competem entre si aumentando a complexidade do processo e levando os consumidores a adiar as ações relativas à poupança. Enquanto que a definição de uma única meta evoca uma intenção de implementação mais forte levando o consumidor a mudar seu comportamento em relação a poupar.

Essa vantagem da meta única em relação a múltiplos objetivos é atenuada quando é fácil poupar (p. ex. há recursos excedentes), ou quando as múltiplas metas são possíveis de serem integradas ao invés de competirem entre si (SOMAN; ZHAO, 2011).

Este estudo pretende contribuir para o entendimento do comportamento de poupança dos consumidores ao incluir novas variáveis comportamentais e características pessoais que possam explicar o comportamento de poupança em uma determinada faixa de renda, a classe média brasileira.

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