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O Povoado de Guia Lopes dá início à sua primeira escola de Ensino Primário

3. ESCOLA VISCONDE DE TAUNAY: A PRIMEIRA ESCOLA DE ENSINO

3.2 O Povoado de Guia Lopes dá início à sua primeira escola de Ensino Primário

Em 1938, o último filho vivo do Guia Lopes, utilizando-se das comemorações e solenidades que envolveram a comunidade para o início do Povoado de Guia Lopes vinculado à época ao município de Nioaque aproveitou os ensejos para enviar uma solicitação ao então Presidente da República Getúlio Vargas para a criação da primeira escola na localidade por meio do telegrama abaixo:

Exmo. Sr. Dr. Getúlio Vargas, DD. Presidente da República, Palácio do Catete, Rio. Qualidade ultimo filho sobrevivente velho sertanejo Guia Lopes, grata satisfação comunicar vossência, doze fevereiro, histórica Fazenda Jardim, minha propriedade, realizou-se grande reunião, fazendeiros, pessoas gradas, exmas. Famílias, municípios Bela Vista, Bonito e Nioaque, fim fundação Patrimônio Guia Lopes homenagem memória saudoso pai, tombou mesmo local, defesa integridade Pátria. Gesto nobre, patriótico, sob auspícios, briosa oficialidade, dignos sargentos 1º Cia. 4.ª B.S. há muito acantonado estas paragens, obteve grandes aplausos população por vir plantar rica vastíssima zona, exemplo verdadeiro civismo e sentimento patriotismo gerações vindouras. [...] Pedindo Vênia vossência solicito nome povo patrimônio apelando sentimento patriotismo eminente chefe, possível fundação pequena escola federal, prática agricultura e pecuária, ramo nosso grandioso Estado, qual trará imenso resultado benéfico região onde tudo é feito sistema rotineiro. Sede Patrimônio, localizada belíssima campanha, sob ponte rio Miranda, margem rodovia construída glorioso 4.º B.S. pouca distância campo Santo onde repousam restos mortais heróis Retirada da Laguna a poucos passos tapera onde viveu inesquecível Guia Lopes. Certo Vossências atendendo apelo prestando essa homenagem, velho sertanejo, imenso prazer dizer-vos que com 76 anos último filho sobrevivente Guia Lopes, morrerá satisfeito benefício mocidade vindoura, abençoado nome nosso Interventor Federal e Ilustre Presidente. Respeitosas Saudações. José Francisco Lopes. (DALMOLIN, 2015, grifo do autor)

Este, portanto, é o registro que pauta o início da primeira Instituição Escolar no Povoado de Guia Lopes, nomeada como Escola Visconde de Taunay19, que, segundo Dalmolin (2015), em 21 de março de 1938 oferecia ensino primário no período diurno aos quarenta e cinco alunos matriculados.

A escola foi idealizada como uma forma de contribuir para que o povoado conseguisse se estabelecer, e se tornou uma referência na região já que, para a época (final dos anos 30) a escolarização era muito valorizada e as poucas escolas existentes não conseguiam acolher toda a demanda de vagas.

Primeiramente acolheu os filhos dos fazendeiros e população local. Mas não só isso, ao estruturar-se ao lado da Igreja São José a mesma contribuiu para o desenvolvimento da cidade.

Dentre os quarenta e cinco alunos matriculados, de ambos os sexos, o ex-diretor D2 relata que também havia matriculado filhos de oficiais do exército que serviam o 6º Batalhão de engenharia, filhos dos fazendeiros e, também, crianças oriundas da região cuja ambição de seus pais era que tivessem oportunidade de aprender as primeiras letras.

Considerando o Quadro Estatístico das Escolas Isoladas de 1927 (MATO GROSSO, 1927) em Nioaque, cujo Povoado de Guia Lopes pertencia, apresentava 95 alunos divididos em três escolas. O início da Escola Visconde de Taunay com quarenta e cinco (45) alunos em comparação aos números anteriores retrata dados bastante significativos haja vista que abarcava alunos de uma localidade em busca de emergir e se estabelecer enquanto município.

A escola vinculada ao Patrimônio Guia Lopes foi nomeada pelos locais, segundo ex- diretora entrevistada (D1), como Escolas Reunidas Visconde de Taunay, no entanto, foi identificada nos documentos do Arquivo Público de Mato Grosso como Escola Rural Mixta da Povoação de Guia Lopes (MATO GROSSO, 1939).

Segundo o Diário Oficial de Mato Grossonº 7991, de 17 de março de 1939,o Decreto de criação da Escola Rural Mista do Povoado de Guia Lopes nº 231 é de 27 de dezembro de 1938.

No entanto, por pertencer ao município de Nioaque, e constituir-se parte das Escolas Reunidas de Nioaque, o Interventor Federal de MT publica em Diário Oficial desse estado em 17 de março de 1939 a localização da Escola Rural Mista do Povoado de Guia Lopes (MATO GROSSO, 1939).

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A escola teria recebido este nome em “Homenagem ao Oficial do Exército Brasileiro, escritor, político, nobre, músico, professor, engenheiro militar, historiador e sociólogo brasileiro que participou no conflito da Guerra da Tríplice Aliança e o Paraguai, nas campanhas pelo sul de Mato Grosso 1866-1867” (DALMOLIN, 2018).

Figura 11. Diário Oficial MT nº 7991 de 17 de março de 193920 – Localiza no Povoado de Guia Lopes uma Escola Rural Mixta criada por decreto nº 231 de 27 de dezembro de 1938.

Fonte: Arquivo Público de Mato Grosso.

Por meio do Ofício nº 21, de 21 de setembro de 1939, ao Diretor Geral de Instrução Pública, Sr. Francisco Ferreira Mendes, a diretoria das Escolas Reunidas de Nioaque21 aponta para a quantidade insuficiente de vagas denotando que o sistema vigente não comportava a demanda atual e crescente da região e um quarto dos alunos deixava de ser atendido nas Instituições Escolares de Nioaque.

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O documento encontra-se em anexo. 21

A escola do Povoado de Guia Lopes por encontrar-se sob a jurisdição de Nioaque estava vinculada às Escola Reunidas de Guia Lopes.

Figura 12.Trecho do Ofício 21 endereçado ao Diretor Geral de Instrução Pública

Nesse ofício denuncia-se a falta de vagas e a dificuldade em conseguir insumos para a manutenção das escolas e documentação das mesmas, referindo-se às necessidades relacionadas às solicitações anteriores que não haviam sido atendidas com relação à aquisição de livros para a escrituração dessas escolas bem como a falta de materiais para o trabalho pedagógico. Além disso, a distância da Capital do estado (Cuiabá) e a falta de atendimento às solicitações realizadas prejudicavam o atendimento aos alunos já matriculados.

Além disso, tal atendimento também apresentava precariedade tanto com relação aos materiais para professores e alunos, quanto pela improvisação de mobiliário. A falta de estrutura física era fato recorrente nas diferentes Instituições Escolares no Mato Grosso, denotando os padrões rústicos com que os ambientes escolares da época estavam organizados e a dificuldade em melhorar a qualidade do ensino.

Uma destas Escolas Rurais Mistas a qual o documento retrata é a do Povoado de Guia Lopes22 que fora construída com taquaruçu rachado e batido e, coberta de folhas de bacuri demonstrando os meios precários, mas que garantiram a possibilidade de abertura da mesma.

Figura 13.Primeira Escola do Povoado de Guia Lopes

Fonte: http://nossaterranossagentenossahistoria.blogspot.com/2015/03/como-nasceu-primeira-escola-em- guia_31.html

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Segundo os entrevistados, houve avanço do comércio, um maior crescimento populacional e consecutivamente do número de alunos. Em meio à necessidade de atender a ampliação do número de vagas, havia também a necessidade de formar professores, os normalistas como eram chamados.

Segundo Garcia e Slavez (2017, p. 10) poucas eram as escolas com essa incumbência e “[...] até 1930, havia apenas três Escolas Normais, uma na capital Cuiabá e duas na cidade de Campo Grande, responsáveis por formar professores para trabalharem nas escolas primárias”, indicando que não era suficiente “[...] apenas o governo expandir escolas em todo o estado, mas carecia também oferecer um ensino eficiente nessas escolas, a propósito, era necessário investir na formação de professores” (GARCIA; SLAVEZ, 2017, p. 13). Evidencia-se que o problema não seria somente a estrutura física das escolas, mas também não havia professores suficientes principalmente em localidades remotas como Nioaque.

De acordo com essas dificuldades, o resultado era um ensino “[...] ofertado nas escolas rurais, espalhadas pelo interior, onde a falta de instalações apropriadas, a deficiência de material escolar, a impossibilidade de encontrar professores diplomados para atuar nelas e a ausência quase absoluta de fiscalização” (GARCIA; SLAVEZ, 2017, p.11) resultavam em uma precariedade educacional.

Devido à escassez de professores normalistas para atendimento na região sul de Mato Grosso, muitas escolas tinham os considerados professores leigos ou possuíam outras profissões e formações de base. Era comum que profissionais como médicos ou oficiais do exército assumissem a função de professores em localidades as quais se instalavam, no entanto, deveriam ter uma reputação ilibada e alto respeito da comunidade.

O primeiro professor a ter seu nome vinculado à Escola Mista Visconde de Taunay foi, segundo Dalmolin (2018), Paulo Nunes Nogueira o qual participou do ato solene de fundação do Patrimônio de Guia Lopes e fora indicado pelos presentes como um cidadão apto a ser o professor da escola. Em 1940, o professor Paulo Nunes Nogueira mudou-se para Jardim permanecendo vinculado somente à Comissão de Estradas e Rodagem CER-3.

O Sr. Martin Honésimo da Fonseca, nomeado como professor por meio do Ato nº 1646, de 5 de abril de 1939 e novamente pelo Decreto nº 3017 em 13 de agosto de 1940 como professor da Escola Rural Mista do Povoado de Guia Lopes, a então Escola Mista Visconde de Taunay (segundo os entrevistados D1 e D2), deu continuidade ao trabalho que estava sendo realizado.

Figura 14.Ofício ao Diretor Geral sobre a nomeação do profº Martin Honésimo Silveira

O Sr. Martin Honésimo da Fonseca, proveniente de Bonito era conhecido, segundo o ex-diretor D2 como Professor Nelsinho e também por ser uma pessoa idealista. Além disso, Dalmolin (2015) relata que o professor lecionava para sala mista e multisseriada, onde os alunos de idades diferenciadas eram atendidos com empenho e dedicação pelo professor nomeado.

Apesar da falta de recursos do Patrimônio de Guia Lopes, Dalmolin (2018) retrata que enfrentava as dificuldades e buscava envolver a comunidade para angariar fundos por meio de festas cívicas e recebia donativos dos fazendeiros e das famílias mais abastadas da região. Houve, segundo a ex-aluna entrevistada A3, quem doasse cabeça de gado para realização de Festas Juninas.

Nessas ocasiões, segundo Dalmolin (2018), os alunos se apresentavam cantando hinos pátrios impressionando aos que os assistiam.

Nelsinho promovia bonitas e animadas festas cívicas em grandes datas nacionais, merecendo por tudo, os melhores encômios pela força correta que apresentava a Escola Visconde de Taunay nessas datas festivas. Impressionava sobremaneira a todos, o entusiasmo vivo das crianças dessa pequena escola, a cantarem com perfeição, com calor, os hinos pátrios (DALMOLIN, 2018).

Figura 15.Foto durante evento realizado na frente da Igreja de São José e da Escola Mista do Povoado de Guia Lopes em 1939 (sentados ao centro José Francisco Lopes, o filho do Guia Lopes seguido do Professor Martim Honésimo da Silveira e Padre Paulo Butle).

Fonte: http://nossaterranossagentenossahistoria.blogspot.com/2015/03/como-nasceu-primeira-escola-em- guia_31.html

Segundo Dalmolin (2015), esses momentos favoreciam os donativos e logo o velho “galpão-de-palha” deu espaço para a construção de um edifício de alvenaria, o qual não conseguiu finalizar, devido a sua morte prematura, em janeiro de 1941.

Figura 16. Edifício cuja construção foi iniciada pelo professor Martim Honésimo da Fonseca, que abrigou a Escola Visconde de Taunay

Fonte: Arquivo da Família Vargas

Após a morte do professor Martim Honésimo, segundo consta no Livro de Registros dos Professores da Escola Rural Mista do Povoado de Guia Lopes23, a Professora Srta. Milca de Souza Santos, normalista formada em Campo Grande no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora foi nomeada no início de julho de 1941 por meio do Decreto nº 3831, e assumiu a responsabilidade de dar sequência ao trabalho que estava sendo realizado.

O ex-diretor entrevistado D2, foi aluno da Escola Mista do Povoado de Guia Lopes e a Professora Srta. Milca de Souza Santos fez parte de seu processo de alfabetização. O entrevistado relata que a escola era dividida em duas séries, o primeiro e segundo ano, no mesmo espaço físico, com crianças de diferentes idades.

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O primeiro ano havia a subdivisão em A, B e C, que determinava o grau de adiantamento da turma; após quatro anos de estudos, a turma encerrava o 2º ano. Essa subdivisão do Ensino Primário era uma prática realizada na época e pode ser constatada também por documentos de escolas do Mato Grosso no final dos anos 30.

Essa moça veio parar aqui na casa de uns parentes e assumiu a Escola Rural Mista. Essa escola tinha duas séries, 1º ano e 2º ano. O 1º ano subdividido em A, B e C. Terminava dando os quatro anos do primário e o 2º ano era colação de grau. O 1º ano C era adiantado, bem puxado. Só depois vinha o 2º ano [...] A sala de aula era única, então o professor quando começava lecionar o primeiro ano, a turma do segundo ano ficava fazendo tarefas, lendo livro, quietinha lá separados. A turma A, B e C ficavam meio juntas. Se respeitava muito os professores naquele tempo. “Esse lado que fica agora comporte-se, a aula é para esse” dizia ela. Enquanto isso no quadro negro ela passava a matéria para o 1º ano e o 2º ano ficava quietinho, já lá estudando (D2, 2018).

Essa organização dos anos escolares e turmas era uma prática comum na época, pois é possível encontrar documentos24 de outras escolas que utilizavam a mesma organização descrita pelo entrevistado.

3.3 A organização do Ensino Primário no Mato Grosso e as Escolas Reunidas Visconde de