• Nenhum resultado encontrado

4. CARACTERIZAÇÃO DO ESPAÇO

4.2. C ARACTERIZAÇÃO DA R EGIÃO

4.2.1. Caracterização Socio-económica

4.2.1.8. Povoamento e Espaço Construído

Devido à existência de uma população com fracos recursos financeiros, as condições de habitabilidade e de conforto não são agradáveis, uma vez que ainda faltam infra- estruturas básicas nos alojamentos e muitas casas têm carência de conservação.

A população emigrante tem tendência a construir, fora do centro da aldeia, casas de materiais não tradicionais, que não respeitam a arquitectura tradicional e que desfigura a paisagem. Contudo, a crescente procura de casas nas aldeias para residência secundária é um veículo motor para a dinamização de espaços abandonados.

O topo da serra, tem como recurso fundamental o pasto, que em alguns casos é completado pelo cultivo de terras. A intensificação agrícola é apoiada pela fertilização das

terras por parte do gado, assim como pela presença permanente de água para rega, principalmente dos pastos.

O nível de culturas permanentes situa-se nas partes baixas das encostas onde os solos são mais profundos e férteis pelos contínuos fornecimentos minerais, orgânicos e hídricos desde as vertentes, assim como pelo uso continuado, com o consequente aumento de fertilizantes ou condicionamento do terreno.

Nos meses de verão, a falta de precipitações, a estagnação dos cursos de água, de carácter pluvial e o forte escoamento produzido pelos acentuados declives, resulta num défice hídrico, dependendo das possibilidades de regas. A criação de uma rede de regadios que traduzem água captada nas partes mais altas da montanhas, nas nascentes dos cursos de água, e durante quilómetros de percurso é distribuída pelos campos através de um complexo para rega.

A organização social baseia-se na abundância de mão-de-obra e uma forte coesão nas relações de trabalho. Uma vez que só assim se podem manter os sistemas de pastoreio (vezeiras) e investiram-se grandes esforços na conservação das estruturas de exploração (trilhos, etc.) e na sustentação de práticas comunitárias na gestão do espaço.

As condições naturais unidas à forte fragmentação do relevo, provocam a divisão do meio condicionando a sua ocupação. A distribuição do povoamento reflecte a influência dum conjunto de condicionantes físicas muito marcadas, consequência da evolução do meio e dos processos que afectaram o espaço geográfico, tanto do ponto de vista dos processos naturais como dos de carácter humano. Assim, a ocupação do espaço relaciona-se com a actividade económica, com os diferentes usos do solo no que diz respeito à sua aptidão, e com o comportamento integral de toda a área como consequência das fortes restrições que o meio impõe.

Os núcleos de povoamento concentram-se numa reduzida área, no sopé das montanhas, ficando a maior parte do território isenta de ocupação habitacional se bem que não de uso.

O funcionamento em sistema fechado e auto-suficiente implicou um mecanismo auto- limitante: o território foi explorado ao máximo das suas capacidades sem ultrapassar os seus limites de produção e renovação, sob pena de destruir o património natural e os suportes produtivos para as gerações futuras. Trata-se de um sistema inteligentemente estruturado e funcional, com um longuíssimo tempo de amadurecimento, a aptação e experimentação, o qual, pela sua solidez resistiu às adversidades políticas, sociais e económicas ao longo dos anos, permanecendo em funcionamento até aos nossos dias.

Da observação do terreno parece ser que os primeiros lugares, num processo de ocupação progressiva, foram localizados nas áreas mais favoráveis, onde puderam, com menor dificuldade, explorar maior área de cultivo.

Ao abordar o habitat rural em zonas de montanha, deparamos com invariáveis nos factores de localização dos lugares – o Homem elegeu a implantação da sua ladeia em função de condicionantes e requisitos básicos ao desenvolvimento da actividade agro- pastoril. Respondeu à localização numa área intermédia entre campos e serra, ao aproveitamento máximo do terreno arável, à escolha de um local protegido das enxurradas, aprovisionado de água, resguardado dos ventos e bem orientado.

Para além da condicionante geográfica, o modelo cultural e a economia agro-pastoril têm também um papel decisivo na interpretação do aglomerado. Cada núcleo em si, resulta de um processo de ocupação relativamente alargado no tempo. Deste decurso no tempo resulta necessariamente um conjunto de imponderáveis traduzido no carácter espontâneo que achamos na fisionomia dos aglomerados.

Embora a forma dos aglomerados surja assim condicionada por factores físicos e humanos e cada um dos locais de implantação dê lugar a soluções próprias, existem, dado que se trata de uma mesma concepção de espaços e de uma idêntica cultura aplicadas em situações distintas, esquemas funcionais e de estrutura semelhantes.

A forma do núcleo aproxima-se à da área de menor ou nula aptidão agrícola, seleccionada para a sua implantação. A estrutura da rede de caminhos no interior do aglomerado é condicionada pela necessidade de acesso aos campos, aos regadios, às eiras e aos locais de trabalho. O conjunto edificado adquire um carácter homogéneo, resultado da repetição constante de pequenas unidades de construção que se associam por forma a criar uma variedade de soluções. À excepção das eiras, os espaços livres entre construções são os estritamente necessários para a passagem de pessoas, carros de bois e para algumas actividades de trabalho.

As aldeias Barrosãs são pequenas e estreitamente aglomeradas, e localizam-se distantes umas das outras, nos vales ou nas encostas, protegidas assim contra as ventanias. As casas, alinhadas ao longo de ruelas tortuosas, em regra toscamente calcetadas, são ajustadas a uma economia pobre e de pequena propriedade; extremamente rudes e primitivas, de granito, pequenas, quase sempre em blocos apenas talhados à medida e sem qualquer reboco exterior, têm dois pisos, com escassas e toscas aberturas, antigamente com cobertura de colmo, e abrigam, algumas delas, as pessoas no andar de cima e os animais e produtos da terra no andar de baixo.

Estas aldeias possuíam uma organização e determinadas instituições de tipo comunitário, que ainda podem ser visíveis hoje; ex. a Vezeira – cada pessoa levava, à vez, para os pastos do monte o boi do povo que tinha estábulo e pastagens próprias, a cargo de todos; cada aldeia dispunha de um conselho, onde em conjunto deliberavam acerca de questões que respeitavam à comunidade, utilização de baldios comunais, a vezeira, o boi do povo, etc.; há moinhos, forjas, fornos do pão, etc.

De economia ainda hoje rural, agrícola e pastoril e o isolamento em que o Barroso viveu até há poucos decénios dão a razão de uma atmosfera muito especial, de um grande arcaísmo e cariz comunitário, que se respeita nestas aldeias, e da sobrevivência, de algumas destas remotas formas, respeitantes ás actividades pastoris e à criação de gado, e também a determinados aspectos da vida do grupo, em especial aqueles em que se evidencia um forte sentido de unidade e coesão vicinal como os trabalhos agrícolas que requerem muita gente e animais ao mesmo tempo.

Com a melhoria das condições de vida das populações, devida em grande parte à emigração, iniciou-se um grande surto de construção, com utilização de novos materiais actualmente disponíveis, mas nem sempre bem utilizados construtiva e economicamente.

O desperdício de dinheiro começa quase sempre pela demolição das casas velhas, sem condições de habitabilidade, para que no espaço deixado livre se erga um novo edifício que vá enfim proporcionar a comodidade desejada. Mas cada vez que uma casa velha é destruída, desaparece um pouco da vivência colectiva.

O homem construía as casas para se defender e abrigar da própria natureza. As casas tradicionais são o resultado de milhares de anos de aperfeiçoamento e adaptação ao meio ambiente. Os homens construíam as próprias casas, com os materiais que a experiência recomendava e a maneira de construir era um conhecimento comum, pois pertencia à cultura dos povos.

Todos os povos têm a sua cultura e a arquitectura popular é sem dúvida um dos seus aspectos mais importantes. Com a evolução da técnica, surgiram novos materiais de construção cuja aplicação garante bons resultados, mas não resultam da experiência e conhecimento popular. Com a aplicação destes novos materiais e de outras formas e processos de construção, trazidos de outras terras e aos quais se chegou pelas condições climatéricas e ambientais desses locais, vem-se perdendo o conhecimento popular da construção, ou seja, parte da própria cultura.

O desaparecimento constante de construções que testemunham toda uma organização agro-pastoril do mundo rural, tem preocupado várias gerações. Os espigueiros, moinhos, fornos, lagares de azeite, pisões, serrações de madeira e abrigos do gado e do pastor são

peças etnográficas e arquitectónicas de elevado valor que fazem parte do nosso património histórico e antropológico. O seu enquadramento paisagístico, as diversas formas de adaptação ao local, os vários exemplos de aproveitamento energético, todo o tipo de trabalhos comunitários que os envolve, entre outros aspectos, fazem deles elementos importantes na história destas comunidades serranas. Representam importantes testemunhos de um tipo de organização sócio-económica, de raiz antiga e aperfeiçoada geração após geração em que o Homem dominava uma tecnologia simples de aplicação de força animal e energia hidráulica, enfrentando no dia-a-dia o desafio da auto-suficiencia e da sobrevivência com os simples trunfos da perseverança, da solidariedade da comunidade e do respeito pela natureza.

Documentos relacionados