• Nenhum resultado encontrado

Premissa e Objectivos

O perfil da pandemia de SIDA evoluiu até aos dias de hoje, existindo actualmente 35,3 milhões de pessoas infectadas em todo o mundo, o que provoca consequências graves na generalidade dos sistemas de saúde principalmente na sustentabilidade económica dos mesmos.

Apesar das vias de transmissão serem comuns às do VIH-1, a infecção pelo VIH-2, em geral, caracteriza-se principalmente por uma menor virulência, in vivo, situação ainda não totalmente esclarecida. As diferenças mais relevantes observadas entre a patogénese da infecção pelo VIH-1 e VIH-2 verificam-se durante a fase assintomática, onde a taxa de progressão para a doença é, no caso geral do VIH-2, muito inferior.

A escolha do VIH-2 como modelo de estudo prende-se com as características particulares que este vírus apresenta como agente patogénico para a espécie humana. Vários estudos indicam que os indivíduos infectados pelo VIH-2 têm uma concentração vírica plasmática (carga vírica) menor do que os infectados pelo VIH-1; as taxas de progressão para a doença e de mortalidade da infecção pelo VIH-2 são surpreendentemente inferiores quando comparadas com as do VIH-1; os indivíduos infectados com o VIH-2 têm um período de latência clínica (fase assintomática e sem tratamento) que pode durar duas a três décadas; na maioria dos indivíduos adultos, a infecção pelo VIH-2 tem, aparentemente, pouco significado na taxa de mortalidade e, a resposta imunológica do hospedeiro seropositivo para o VIH-2 permite o controlo da infecção duma forma muito mais eficiente e prolongada do que no caso do VIH-1. Por outro lado, no VIH-2, a utilização de co-receptores para a entrada do vírus na célula parece ser muito mais variada do que no VIH-1, sendo frequente encontrarem-se estirpes de VIH-2 capazes de utilizar múltiplos co-receptores com igual eficiência. Vários desses co- receptores não são sequer utilizados pelas estirpes de VIH-1 descritas. Estas

características, ligadas à estrutura oligomérica das proteínas virais constituintes do invólucro do vírus, contribuem para uma menor eficiência do VIH-2 na infecção de novas células.

De forma a contribuir para um melhor conhecimento das bases moleculares da interacção inicial do VIH-2 com a célula, mais concretamente com os seus receptores celulares, e consequentemente, identificar quais os mecanismos e factores que, em consequência dessa interacção, contribuirão para o menor potencial patogénico e menor virulência apresentada por estes vírus, serão apresentados os estudos feitos com estirpes obtidas de indivíduos assintomáticos, em particular duas que revelaram a incapacidade de usar os principais co- receptores CCR5 e CXCR4. (Azevedo-Pereira et al 2003).

Assim, os objectivos específicos de tese que vos é apresentada são os seguintes: 1- Aprofundar o estudo de caracterização de estirpes de VIH-2 relativamente aos co-receptores usados, nomeadamente nas estirpes que revelaram ser incapazes de infectar produtivamente as linhas celulares CCR5 e CXCR4 positivas.

Os vários vírus quiméricos, cujos genes env (ou fragmentos do mesmo) das estirpes caracterizadas foram introduzidos num “esqueleto” do vírus protótipo HIV-2ROD,

clonado no plasmídeo pROD10, foram posteriormente utilizados em testes de infecciosidade usando vários sistemas celulares com o objectivo de identificar quais são as regiões geneticamente determinantes para o fenótipo do VIH-2.

A partir destas experiências espera-se confirmar qual o perfil de utilização dos co- receptores por parte das estirpes primárias de VIH-2 já isoladas e ainda se a entrada do vírus na célula é ou não determinante na infecção abortiva observada nas linhas celulares GHOST expressando os diferentes co-receptores.

Ainda nesta fase, pretende-se avaliar a expressão do gene env destas estirpes em linfócitos T CD4+ nas primeiras horas após infecção.

2- Numa segunda fase, propomos realizar a caracterização molecular do gene env das estirpes primárias de VIH-2 CCR5/CXCR4 independentes, isoladas de indivíduos assintomáticos. Com ela pretende-se encontrar regiões das glicoproteínas SU e TM

que apresentam características que se relacionem com o fenótipo apresentado pelas referidas estirpes.

3- Na última fase, pretende-se caracterizar novas estirpes obtidas a partir dos mesmos indivíduos infectados. Se essas novas amostras não estiverem disponíveis (indivíduos infectados mas assintomáticos e sem terapêutica anti-retrovírica dificilmente comparecem às consultas agendadas de infecciologia do Hospital Egas Moniz), será tentada a adaptação destas estirpes CXCR4- e CCR5- independentes à multiplicação em linhas celulares CCR5+. Estas variantes, a existirem, serão comparadas com as estirpes iniciais por forma a porem em evidência as alterações em termos de fenótipo e de características genéticas do gene env.

Ainda nesta fase, pretende-se identificar a molécula interveniente como co- receptor da célula alvo.

Finalmente, serão identificados os motivos aminoacídicos que se constituem como determinantes genéticos responsáveis pelos fenótipos das estirpes isoladas e caracterizadas nas duas primeiras fases. Para tal, as regiões V1 e V2 dos genes env das estirpes em estudo, usadas na construção de vírus quiméricos, por substituição com regiões homólogas da estirpe protótipo HIV-2ROD (plasmídeo pROD10,

plasmídeo competente contendo toda a informação genética da estirpe padrão HIV-2ROD), serão mutadas por ensaios de mutagénese dirigida. A análise dos vírus

quiméricos iniciais, juntamente com os vírus mutados, vai permitir identificar quais os aminoácidos específicos das regiões V1 e V2 do gene env que são imprescindíveis para os eventos iniciais de entrada destes vírus em células que expressam os co- receptores CCR5 e CXCR4 e, que contribuem/codificam para a independência da utilização dos receptores das quimiocinas mais comuns, CCR5 e CXCR4.

Esta tese pretende contribuir para explicar a menor virulência apresentada em geral pelas estirpes de VIH-2 quando comparadas com as do VIH-1. Além disso, pelos dados obtidos, juntamente com os reagentes entretanto gerados, poderá vir a ser um ponto de partida para o estudo de novas abordagens (vacinas ou moléculas com acção anti-retrovírica) com interesse na prevenção, na profilaxia de pré e pós exposição, no tratamento da infecção pelo VIH e, por fim, na erradicação deste vírus.

IV

Parte

Caracterização de VIH-2 quiméricos incapazes