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Presença no interior do aparelho de Estado

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Participação em Eleições

2.3.3 Presença no interior do aparelho de Estado

Feita análise a respeito das filiações partidárias e da disputa de eleições pelos dirigentes da Farsul, cabe agora refletirmos sobre a presença destes agentes no interior do aparelho de Estado. De forma ilustrativa, será analisada sua presença em cargos de secretarias do Poder Executivo Estadual, buscando identificar a presença destes agentes em tais espaços e refletir a respeito de alguns dos significados deste processo para a representação de interesses da classe.

Na presente pesquisa, dentre o universo dos trinta e dois dirigentes analisados, identificou-se a presença de quatro deles ocupando cargos de secretarias junto ao executivo estadual: o produtor rural e advogado João Salvador de Souza Jardim, que além de prefeito de Guaíba (1969-1972) pela ARENA, foi Secretário Estadual de Indústria e Comércio (1980-1982), durante o governo de José Amaral de Souza (ARENA), e de Agricultura (1982-1986)91, durante o governo de Jair Soares (PDS); o empresário José Alfredo Marques da Rocha, que além de ter sido eleito vice-prefeito de Santo Antônio da Patrulha em 1988 pelo PDS, ocupou cargo de Secretário Estadual de Agricultura (1982- 1983)92, durante o governo de José Amaral de Souza (ARENA); o Coronel da reserva João Oswaldo Leivas Job, que foi Secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul (1979-1982)93, também durante o governo de José Amaral de Souza (ARENA); e, por fim, o produtor rural João Carlos Fagundes Machado, que além de ter sido eleito prefeito de Camaquã pelo PPB/PP em 2000, 2004 e 2012, ocupou cargo de Secretário de Agricultura, Pecuária e Irrigação (2007-2010)94, durante o governo de Yeda Crusius (PSDB).

Primeiramente, no caso de João Jardim, chama atenção que este dirigente passou a fazer parte da diretoria da Farsul durante o exercício de seu mandato como prefeito

91 Fonte: http://www.paginarural.com.br/entrevista/694/joao-salvador-souza-jardim-agropecuarista- politico-e-dirigente-rural. 92 Fonte: https://estado.rs.gov.br/secretaria-da-agricultura-completa-70-anos. 93 Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/geral/noticia/2014/12/Quem-sao-os-gauchos-responsabilizados- por-crimes-da-ditadura-4660617.html. 94 Fonte: http://www.onlinecomunicacoes.com.br/camaqua/joao-carlos-machado-homenageado-pela- secretaria-da-agricultura.html.

167 municipal de Guaíba, já que foi incorporado na direção da entidade na gestão de 1968- 1970, oportunidade em que a Farsul foi presidida por Luiz Fernando Cirne Lima. Além disso, o dirigente em questão integrou a gestão da Farsul de 1974-1976, quando a entidade foi presidida por Alamir Vieira Gonçalves. Somente depois disso Jardim assume os referidos postos nas secretárias estaduais, em um período que vai do ano de 1980, inicialmente a frente da Secretaria de Indústria e Comércio, até o ano de 1987, já na secretária de Agricultura do estado. Posteriormente, Jardim é reincorporado na diretoria da Farsul, integrando a gestão da entidade de 1988-1991, na segunda gestão de Ary Marimon na presidência.

Diante deste cenário, pode-se perceber forte vinculação da trajetória de Jardim na política partidária e ocupando cargos no interior do aparelho de Estado, com sua trajetória sindical na Farsul, já que seu ingresso na diretoria da entidade se dá em concomitância ao período em que exercia o cargo de prefeito de sua cidade, o que nos permite supor que a entidade, ao incorporá-lo em seus quadros de direção, tenha buscado fazer uso dos capitais políticos acumulados por ele em âmbito municipal. Por outro lado, Jardim só assume postos de direção nas referidas secretarias estaduais após ter atuado por duas gestões na diretoria da Farsul, o que nos permite supor que sua trajetória sindical na entidade tenha contribuído para alcançar o destaque e a legitimidade necessários para assumir as referidas tarefas no aparelho de Estado.

Além disso, chama atenção, conforme destacou Heinz (1991, pp. 209-210), que ao reincorporar este dirigente em seus quadros de direção em 1988, após o mesmo ter sido secretário estadual por cerca de sete anos, em duas pastas diferentes, “a entidade está a reconhecer sua dedicação na defesa dos seus interesses em um espaço privilegiado de representação, que é o posto de secretário de Estado”.

Já em relação ao caso de José Alfredo Marques da Rocha, destaca-se que este dirigente ocupou o cargo de Secretário Estadual de Agricultura em período anterior ao seu ingresso na diretoria da Farsul, já que tal fato ocorreu no ano de 1985, dois anos após ter deixado a secretaria. Ao todo, Marques da Rocha permaneceu seis anos na diretoria da Farsul, compondo a gestão de 1985-1988, que teve Ary Marimon na presidência, e a gestão de 1991-1994, que teve Hugo Paz à frente da entidade.

Processo semelhante é verificado no caso do militar João Oswaldo Leivas, que ocupou cargo de Secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul entre os anos de 1979 a 1982, ingressando, posteriormente, na diretoria da Farsul. O referido dirigente fez

168 parte das gestões da entidade de 1991-1994 e 1994-1997, quando Hugo Paz era o presidente.

Portanto, nos dois casos mencionados, pode-se supor que os ingressos de tais agentes, nos quadros de direção da entidade, tenham como motivação, além de outros possíveis fatores, tentativa da Farsul incorporar os capitais políticos acumulados por estes agentes ao longo de suas trajetórias na política de Estado. A presença, em seus quadros dirigentes, de atores com privilegiadas relações e capacidades de transitar entre agentes do poder público confere à Farsul condição privilegiada de acesso a estes espaços.

Por fim, o caso de João Carlos Fagundes Machado, semelhante ao que se refletiu sobre Jardim, também demonstra um caso onde o dirigente assume o posto de secretário de estado após ter sido dirigente da Farsul. Cabe frisar que este dirigente ingresso na diretoria da Farsul no ano de 1991, permanecendo ali até o ano de 2003, totalizando quatro gestões na diretoria da entidade, período em que esta foi presidida por Hugo Paz e Carlos Sperotto. Durante este período Machado foi eleito prefeito de Camaquã em 2000 e posteriormente a sua saída da direção da entidade reelegeu-se ao executivo municipal em mais duas oportunidades, 2004 e 2012. Também após sua saída formal da Farsul tornou- se secretário de estado (2007-2010), dado que nos permite supor uma possível influência da Farsul na indicação de seu nome para este posto.

Especificamente em relação à Secretaria de Agricultura do estado, a capacidade da entidade influir nas indicações de secretário pode ser percebida a partir da histórica relação de proximidade da entidade com os secretários da referida pasta. Em seu estudo, Gasparotto (2016) apontou que, entre os presidentes e vice-presidentes da Farsul do período de 1959-1964, um deles havia ocupado tal posto, trata-se de Balbino de Souza Mascarenhas que foi Secretário da Agricultura, Indústria e Comércio95 entre os anos de 1947 e 1951, durante a gestão de Walter Jobim (PSD).

Mas, além dos casos apontados até aqui, considerando-se toda a história de existência da Farsul, detecta-se a presença de outros três dirigentes da entidade ocupando tal posto: Aníbal Di Primio Beck, membro da direção da Farsul na gestão de 1933-1935 e presidente da entidade em duas gestões, entre os anos de 1935 e 1939, ocupou o cargo de secretário da pasta estadual entre os anos de 1936 e 1937, quando era presidente da Farsul; Adolfo Antonio Fetter, que foi dirigente da Farsul na gestão 1972-1974 e ocupou o cargo de Secretário de Agricultura entre os anos de 1963 e 1966; e Balthazar de Bem e

95 A referida secretaria teve esta nomenclatura até a década de 1950, quando a pasta agrícola recebeu autonomia.

169 Canto, que foi presidente da Farsul na gestão de 1982-1985, logo após ter ocupado a cadeira de Secretário da Agricultura do Rio Grande do Sul entre 1979 e 198296.

Estes dados demonstram que há significativa relação estabelecida pela entidade em torno dos nomes que ocuparam o principal posto de gestão desta pasta ao longo da história. Analisou-se aqui somente os casos em que diretores da Farsul ocuparam tais postos, não levando em consideração outras relações de proximidade que possam ter sido estabelecidas entre a entidade e demais agentes que dirigiram a pasta. De todo modo, nas situações analisadas, mesclam-se casos em que os secretários de estado fizeram parte da diretoria da Farsul antes, durante ou depois de terem ocupado os referidos cargos na estrutura de Estado.

Desta forma, percebe-se que a entidade constrói diferentes tipos de relação com estes agentes, seja incorporando-os em suas gestões e fazendo uso dos capitais acumulados por eles – já que possuíam circulação e legitimidade na esfera da política estadual, tendo sido secretários de Estado - ou, ao contrário disso, servindo como porta de entrada de alguns de seus dirigentes aos referidos espaços de poder do Estado, posteriormente à passagem destes pela diretoria da entidade. Em um caso limite, verificou-se que um dos presidentes da Farsul assume a Secretaria de Agricultura do estado em concomitância ao exercício de seu mandato como presidente da entidade, demonstrando claramente o peso desta agremiação em tal indicação.

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A partir do que foi exposto ao longo deste tópico, em primeiro lugar, pode-se concluir que é expressiva a participação dos dirigentes da Farsul em partidos políticos, já que dos trinta e dois dirigentes analisados, identificou-se a filiação de vinte deles a estas legendas. Neste processo, destaca-se a ampla predominância dos partidos do chamado campo conservador, em especial daqueles originados da antiga ARENA, que detêm a ampla maioria das filiações destes agentes.

Da mesma forma, é significativa a participação dos dirigentes analisados em disputas de eleições a cargos do executivo e legislativo, já que entre os vinte dirigentes com filiação partidária, pelo menos dezesseis deles participaram de tais pleitos em algum momento de sua trajetória. Percebe-se que tais participações se concentram e têm mais êxito no âmbito das disputas municipais, sobretudo em relação ao poder executivo.

170 No que se refere às candidaturas de nível local, percebe-se que, em sua maioria, ocorrem anteriormente à chegada destes agentes na diretoria da Farsul, demonstrando que alguns dirigentes possuem importantes capitais políticos construídos em suas trajetórias locais, os quais, inclusive, podem influenciar em ingresso na entidade.

Já no que se refere às candidaturas ao legislativo federal percebe-se realidade oposta, já que as duas candidaturas registradas neste âmbito são de ex-presidentes da Farsul, que se candidatam a tais postos durante o exercício de seus mandatos a frente da entidade, o que indica a centralidade da Federação na definição de tais candidaturas e o peso de seus capitais políticos durante estes processos.

Por fim, identificou-se a presença de quatro dirigentes da Farsul em secretarias do Poder Executivo Estadual, quais sejam, as pastas da Secretaria de Indústria e Comércio, da Secretaria de Segurança Pública e da Secretária de Agricultura. Aliás, a ligação dos dirigentes da Farsul, ao longo da história, com esta última pasta parece ser muito relevante.

Em geral, percebe-se que a passagem dos referidos dirigentes por estes espaços de gestão se dá em governos dirigidos por partidos do chamado campo conservador, ocorrendo em diferentes momentos em relação a sua passagem pela diretoria da Farsul, o que demonstra que, em alguns casos, a entidade busca incorporar em sua gestão atores políticos com profundo transito no cenário da política estadual – já tendo passado por tais cargos – e, em outros casos, a Farsul serve como porta de entrada de seus dirigentes para tais cargos na estrutura de Estado – já que passam a ocupa-los depois de terem sido dirigentes da entidade.

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