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O T ÉLOS DA I DEIA NA H ISTÓRIA

4.4. O presente como resultado

Para Hegel (Enc. I, § 1, pp. 39-40; Enz. I, § 1, p. 41), o objeto da filosofia é a verdade e, nesse sentido, seu objeto é o mesmo que o da religião. Contudo, a filosofia não tem para si imediatamente o seu objeto, porquanto na imediatez é pura indeterminação. Nesse sentido somente como resultado das mediações do ser como Sujeito esse objeto será compreendido. A religião, por outro lado, tem esse mesmo objeto na representação e enquanto tal é distinta da filosofia, que tem esse objeto como resultado no conceito. O resultado da filosofia da história hegeliana é de que a razão governa o mundo e, nesse sentido, a vontade de Deus que é representada na religião revelada, a religião cristã, é compreendida no conceito, na filosofia como aquela que governa a história. Desse modo, a história é compreendida como uma teodiceia, como efetividade da vontade de Deus no mundo, em que os homens em suas paixões e os povos em suas singularidades atuam para o cumprimento do desígnio divino na unidade do Espírito.

Para Hegel, o cristianismo é a religião revelada, na qual o humano e o divino, no Cristo, se unificam em corporeidade em um momento singular, para, na sequência, constituir uma comunidade em Espírito. E nesse sentido, Hegel considera que na história, com o cristianismo “[...] é chegado o fim dos dias (das Ende der Tage voll gerworden): a Ideia já não pode ver no cristianismo nada insatisfeito [...]” (LFHU, p. 571; VPhG, p. 762). Para Löwith (1956, pp. 64-67), a filosofia hegeliana da história é uma teodiceia e enquanto tal justifica nos acontecimentos humanos o desígnio de Deus. E Hegel por considerar que a religião revelada é a cristã, a efetivação do princípio cristão seria a realização plena da história e a Europa é, na concepção hegeliana, segundo Löwith (1956, p. 66), o local dessa realização. Segundo Hegel (LFHU, p. 571; VPhG, pp. 762-763), no mundo cristão não há uma relação de dependência com o exterior como ocorria nos outros momentos da história mundial; o externo não é absoluto, é somente relativo enquanto suprassumido. Nesse sentido, o mundo germânico de acordo com Hegel se caracteriza pela interioridade, pois a finalidade absoluta é nele efetivada:

O espírito germânico é o espírito do mundo moderno, cujo fim é a realização da verdade absoluta, como autodeterminação infinita da liberdade, que tem por conteúdo sua própria forma absoluta. Esta ideia deve agora se fazer presente na consciência de si mesma no mundo real. O princípio do Império Germânico deve ser ajustado à religião cristã. O destino dos povos germânicos é o de fornecer os portadores do princípio cristão. O princípio da liberdade espiritual, tanto em sentido temporal como religioso, o princípio da reconciliação, foi depositado no espírito ingênuo e inculto ainda daqueles povos, aos que se encomendou a tarefa de servir ao espírito universal, não só tendo por substância religiosa o conceito da verdadeira liberdade, senão formando-se conforme a ele, para que o verdadeiro conceito se realize neles e se manifeste livremente no mundo, saindo da consciência subjetiva. (LFHU, p. 571, VPhG, p. 763).

No Império Germânico, a Terra é reconhecida como esfera e os europeus a circunavegam: “[...] Com a instauração do princípio cristão, a terra se fez do espírito” (LFHU, p. 571; VPhG, p. 763). Desse modo, o movimento do mundo germânico é efetivado em direção a si mesmo, trata-se de um princípio distinto dos momentos anteriores da história mundial, que tinham um princípio anterior e um posterior, como vimos anteriormente neste capítulo48. No mundo germânico, a finalidade é presente.

48 Cf. pp. 155-156.

O terceiro período, o dos últimos tempos, o de nosso tempo, é comparável com o mundo romano. É também uma unidade do universal; mas não uma unidade de dominação mundial abstrata, senão a hegemonia do pensamento consciente de si, que quer o universal e governa o mundo. O fim inteligente do mundo se acha agora no presente. (LFHU, p. 574; VPhG, p. 766).

Para Paulo Arantes (1981, p. 281), o presente (Gegenwart) em Hegel é uma noção especulativa que contém uma gama de variações circundadas por dois extremos, o “agora”, como presente finito, e a “eternidade”, como o presente absoluto. De acordo com o comentador (1981, pp. 284-285 e nota), a concepção hegeliana de presente absoluto não se vincula a um agora de uma sucessão abstrata de acontecimentos extrínsecos; ao contrário, a perspectiva hegeliana de presente absoluto “extrai seu sentido da infinidade racional do encadeamento histórico” (ARANTES, 1981, p. 284). Esse encadeamento do devir histórico é, segundo Arantes (1981, pp. 281 e 284), a exposição efetiva do devir da Ideia em sua imanência, numa relação interior que ocorre na dialética do Presente Finito e do Presente Infinito (eternidade), em que finito e infinito são inseparáveis. Essa compreensão de Paulo Arantes é condizente com a concepção hegeliana de Deus, tendo em vista que o Deus hegeliano se diferencia de Si e se reconcilia, na unidade do finito e do infinito.

É inegável a importância dada por Hegel à religião revelada para a concepção de um Deus que se diferencia de Si mesmo. Outrossim, esse Deus se diferencia na consecução de um télos, a partir de um princípio interno de caráter teleológico.

O presente em seus dois sentidos permite compreender o caráter teleológico, a determinação interna e o significado do motor imóvel na história. O presente finito, tal qual pode ser notado na natureza, no início do Espírito e em seu percurso histórico, é um dado, e como tal se vincula às dimensões do tempo finito que está no âmbito da exterioridade em momentos: presente, futuro e passado, e desse modo. O tempo assim compreendido, como finito, é considerado por Hegel como o agora, distinto do presente absoluto. Trata-se do devir. Na Enciclopédia, na Filosofia da Natureza, Hegel explicita as dimensões do tempo com as seguintes palavras:

As dimensões do tempo, o presente, futuro e passado são o vir-a-ser, como tal, da exterioridade e a sua [do vir-a-ser] dissolução nas diferenças do ser como do passar para nada e do nada como do passar para ser. O imediato desaparecer dessa diferença na singularidade é o presente como agora, o qual [agora] – enquanto

excluindo a singularidade e sendo ao mesmo tempo simplesmente contínuo para os outros momentos – é ele próprio apenas este esvaecer de seu ser em nada e do nada em seu ser. (Enc. II, § 259, pp. 57-58; Enz. II, § 259, pp. 51-52).

O presente como agora, como dado, é o que Hegel (Enc. II, § 259, A, p. 58; Enz. II, § 259, A, p. 52) define como o afirmativo dos outros momentos que são o negativo, o passado como recordação e o futuro como esperança. Nessa dimensão finita do tempo, futuro e passado são o vir-a-ser que nega as singularidades e, enquanto negação, são caracterizados por Hegel como espaço (Enc. II, § 259, A, p. 58; Enz. II, § 259, A, p. 52), finitude. No âmbito do finito, portanto, o presente é o afirmativo, ou a positividade e, enquanto tal é parcial, assim como o futuro e o passado, como negativos. E como vimos49, no início do Espírito há uma determinação interna, que o impulsiona para a consecução dos seus próprios desígnios.

Trata-se do futuro como esperança, que é próprio do tempo finito, ainda vinculado à exterioridade. De acordo com Kojève (2002, p. 352), o reconhecimento do conceito no mundo equivale a um homicídio. Segundo o comentador (2002, pp. 352ss.), enquanto o conceito está encarnado na existência sensível, não é possível destacar-lhe o conceito por si mesmo, na medida em que um singular, um animal na natureza, por exemplo, um leão singular não é o conceito de leão. Para Hegel (Enc. II, § 246, Z, p. 19; Enz. II, § 246, Z, p. 16), só existem leões singulares, não existe um leão universal, este só existe como pensamento. Contudo, se o conceito não está encarnado na entidade, no singular, ele é somente uma palavra distinta da realidade sensível e essa realidade sensível, segundo a interpretação de Kojève (2002, pp. 352ss.), está morta; logo, somente como mortal, como finita é que a realidade pode ser conceitualizada; é quando ela deixa de ser sensivelmente existente que o Espírito pode destacar o seu conceito. E como para Hegel a realidade histórica é conceitual, segundo Kojève (2002, p. 359), a história mundial em Hegel seria finita.

[...] se o conceito é tempo, isto é, se a compreensão-conceitual é dialética, a existência do conceito – e por conseguinte do Ser revelado pelo conceito – é essencialmente finita. Logo, a própria história deve ser finita; o homem coletivo (a humanidade) tem de morrer como morre o indivíduo humano; a história universal deve ter um fim definitivo. (KOJÈVE, 2002, p. 359).

49 Cf. pp. 147, 153 e 154, desta tese.

Kojève, como pode ser notado na citação acima, desenvolve o argumento segundo o qual para Hegel a história mundial é finita como conclusão lógica da premissa de que a história é conceitual. Contudo, como veremos a seguir, se considerarmos a interpretação de Weil, em Hegel e o Estado, essa conclusão não é necessária. Kojève, nessa passagem, não considera que a história mundial se torna efetiva por meio dos espíritos dos povos finitos no cumprimento de apenas uma tarefa na história mundial. Além disso, Kojève não considera que a finitude de cada espírito de povo é uma singularidade e somente essa singularidade poderia ser finita e não a história mundial como um todo. Para Dale (2014, pp. 88-89), a interpretação de Kojève não condiz com os textos hegelianos, porquanto Hegel assim como Aristóteles tem uma filosofia teleológica, e, por isso, não terminal. De acordo com Dale, a filosofia hegeliana amplia a teleologia aristotélica em uma perspectiva dialética, de um avanço teleológico que se apropria das contingências do mundo, num processo sempre contínuo.

Por outro lado, a afirmação de Kojève também é plausível na medida em que é a história como um todo que se torna conceito no mundo germânico. E a questão então permanece em aberto: o fim do mundo germânico por reconhecer a história mundial conceitualmente representaria o fim definitivo da história mundial?

Eric Weil (2011, pp. 120-121), em Hegel e o Estado, considera que o conceito significa o envelhecimento e perecimento de um momento histórico. Contudo, diferentemente de Kojève, para Weil (2011, p. 121), essa morte do Mundo Germânico, o presente hegeliano, não significaria o fim definitivo da história mundial. E isso se deve, como veremos a seguir, segundo o comentador, à compreensão hegeliana do Estado Prussiano e o reconhecimento de que o fim da história mundial “permanece por realizar”.

De acordo com Weil (2011, p. 21), o Estado Prussiano do presente hegeliano, o da monarquia absolutista, de Frederico II a Frederico Guilherme III, passou por transformações profundas em decorrência das guerras napoleônicas. Com a derrota em Jena (1806), diversos traços da sociedade feudal foram banidos da Alemanha em apenas quatro anos devido às reformas profundas ensejadas pelo monarca (e não pelo povo), pois essas mudanças possibilitariam uma força nacional capaz de se opor a Napoleão. Para Weil (2011, pp. 22-23), a Prússia da Restauração é um estado administrativamente mais avançado do que a França, a Inglaterra (antes de 1832) e a Áustria, pois mantém em seus domínios as mesmas instituições do Império Napoleônico, tais como a propriedade, a lei e funcionários profissionais no âmbito do Estado (WEIL, 2011, p. 25).

De acordo com Rosenzweig (2008, p. 360), com o declínio do Império napoleônico em 1815, Hegel passa a ser favorável a uma monarquia constitucional em Württemberg. A partir de 1817 e por todo o período de Berlim, Hegel reconhece no Estado prussiano o avanço do sentido da liberdade. Segundo Weil (2011, p. 22), quando Hegel assume sua cadeira na primeira Universidade dessa Prússia renovada, em 1818, constitui-se um momento adequado ao desenvolvimento do Espírito na medida em que a lei preserva a liberdade individual e o desenvolvimento científico:

Ele [Hegel] pensa que o momento é favorável à filosofia: o Espírito demasiado ocupado com o exterior na época precedente, pode voltar agora a seu próprio domínio. [...] E, se o momento é favorável, o lugar o é igualmente: Hegel fala na capital da Prússia, de um Estado que acaba de se igualar aos Estados mais ricos e maiores. Ela adquiriu todo o seu peso na realidade e na política com a ajuda do Espírito: é na Prússia que o progresso das ciências constitui um dos momentos essenciais da vida do Estado. A Prússia é o Estado do Espírito. (WEIL, 2011, p. 22).

Nesse sentido, de acordo Weil (2011, p. 25), a Prússia do período hegeliano era reconhecida pelo filósofo, em comparação com a Inglaterra, como um Estado muito mais avançado porquanto era um “modelo de liberdade realizada” (WEIL, 2011, p. 25) no Estado, com a prevalência da lei em sua universalidade. É somente no Estado que, segundo Hegel, é possível a efetividade racional em si e para si da unidade da particularidade elevada à universalidade, no qual a liberdade alcança o seu mais alto direito (FD, § 258, p. 247).

Essa prevalência da lei no sentido da preservação da liberdade é o que Hegel reconhece como características centrais do Estado Moderno, que segundo o comentador é “o Estado de Hegel” (WEIL, 2011, p. 66), o “Estado que realiza o pensamento moderno” (WEIL, p. 85). O comentador define o Estado de Hegel do seguinte modo:

[...] este Estado é uma monarquia, mais precisamente uma monarquia constitucional, fortemente centralizada em sua administração, largamente descentralizada no que concerne aos interesses econômicos, com um corpo de funcionários profissionais, sem religião de Estado, absolutamente soberana tanto no interior quanto no exterior. Em suma, é o Estado moderno tal como existe ainda hoje em dia em todas as partes, com uma exceção apenas, na verdade importante aos olhos de Hegel: o princípio monárquico. (WEIL, 2011, p. 66).

Weil (2011, p. 71) explica que o fato de o Estado hegeliano ser uma monarquia se deve ao “fracasso do princípio republicano” no período revolucionário francês, conhecido como Terror. Além disso, segundo o comentador (WEIL, 2011, p. 72), a forma monárquica de governo evita que interesses particulares se sobreponham aos interesses públicos e dá um caráter orgânico na continuidade do Estado.

Uma característica destacada por Weil (2011, p. 69) em relação ao Estado hegeliano, o Estado Moderno, é o seu caráter racional, a liberdade dos indivíduos é preservada; os cidadãos não são submissos ao Estado, mas se reconhecem em unidade nesse povo. O Estado hegeliano não é um aglomerado de indivíduos incluídos, mas a organização mesma desses indivíduos que se reconhecem nessa unidade do espírito do povo (WEIL, 2011, p. 72).

Nesse sentido, segundo Weil (2011, p. 91), “o Estado é perfeito”, porquanto reconcilia a universalidade e a individualidade pela consciência individual das leis e da moral sob a soberania do Estado. Contudo, para o comentador, embora o Estado seja perfeito, as manifestações particulares dos Estados na história não são perfeitas. Nesse sentido, de acordo com Weil, o Estado Prussiano carrega algumas características do Estado moderno; entretanto, a compreensão hegeliana do Estado Prussiano como um Estado moderno não significa que esse seja o fim definitivo da história mundial. Para Weil (2011, p. 92), Hegel justificou o Estado Prussiano como um cientista justifica um fenômeno, demonstrando racionalmente suas características. A história mundial julga os povos particulares em sua negatividade e, segundo Weil, no presente hegeliano “o julgamento derradeiro ainda não foi pronunciado” (WEIL, 2011, p. 93) 50.

Segundo Weil (2011, p. 108), quando Hegel afirma que nenhum Estado “deve mostrar-se como multidão desorganizada”, esse dever já revela que o Estado particular não é perfeito como seria o conceito de Estado. Além disso, a conhecida passagem do voo do pássaro de Minerva do Prefácio da Filosofia do Direito, de Hegel, revela essa condição do presente hegeliano:

Sim, Hegel “justificou” o Estado moderno, o Estado representado pela Prússia de sua época; sim, foi a Prússia que produziu a consciência desta etapa do devir do espírito, da realização da liberdade. Sim, a Prússia é justificada enquanto estado do

50 De acordo com Inácio Helfer (2003, pp. 362-363), Weil muda sua compreensão do fim da história em

Hegel em um texto de 1976 intitulado “La philosophie du droit” et la philosophie de l’histoire hégélienne, quando afirma que o fim do percurso histórico revela o eterno e foi por meio do Estado enquanto efetividade racional no mundo que essa consciência foi possível.

pensamento – justificada e, por isso mesmo, condenada; o espírito se prepara para dar um novo passo. Hegel tão bem o sabia, que o disse em sua Filosofia do Direito, num texto que provavelmente é o mais citado de todos os textos hegelianos e que, no entanto, ao que parece, é obstinadamente não lido. (WEIL, 2011, p. 121).

Portanto, sob a perspectiva de Weil, o perecimento do espírito de um povo é a efetividade do conceito na história mundial. Há um certo consenso entre os comentadores nesse ponto. Além disso, há consenso em relação ao sentido da história e de que a concepção hegeliana de história há uma reconciliação total, equivalente a um fim definitivo (embora não haja consenso em relação a quando isso acontece, se é no Mundo Germânico ou em outro momento), como afirma Weil ainda em seu texto de 1950:

[...] Mas esta compreensão já contém [...] uma predicação, um juízo sobre a tendência histórica: a reconciliação e a mediação total vão realizar-se; senão a história seria absurda, a luta do homem contra a natureza não teria êxito, a negatividade não conseguiria suportar por seu trabalho o imediato, o natural, a determinação dada, o arbitrário, o acaso, e não haveria razão real para o homem. (WEIL, 2011, p. 92).

Weil (2011, pp. 38-39) salienta que o homem no mundo só é para si mesmo quando se reconhece em sua reflexão. Somente em sua negatividade é que ele se põe para si mesmo, toma consciência de si. Somente quando o homem nega a condição dada é que ele se torna consciente de si em sua liberdade. Logo, a liberdade só se torna efetiva pelo pensamento, no conceito, numa ação conforme a uma finalidade, quando o homem nega a condição histórica dada.

Tanto Weil quanto Kojève notaram a importância da negatividade para os desdobramentos históricos e também reconheceram que na filosofia da história hegeliana há um fim determinado, o fim último (Endzweck) absoluto do Espírito no mundo. Contudo, não se debruçaram sobre o presente como eternidade51, o que impede uma compreensão mais adequada acerca do pensamento hegeliano da história. A eternidade, o presente que na história é resultado precisa ser compreendido para que se tenha uma dimensão mais precisa acerca da filosofia da história hegeliana.

Perry Anderson (1992, pp. 17-18) reconheceu o presente em Hegel como resultado, sob uma perspectiva de história que tem mais uma característica teleológica do que de

51 Embora Kojève tenha considerado que o tempo histórico parte do futuro, essa concepção não se

encerramento, porque podem ser notados os conceitos de Ziel, Zweck e Resultät na filosofia da história hegeliana, enquanto que os Ende ou Schluss não fariam parte do léxico histórico hegeliano.

A interpretação de Perry Anderson é plausível do ponto de vista teleológico, contudo, no que se refere à concepção de encerramento, não é possível afirmar o mesmo, porque na Filosofia da História hegeliana podemos notar o conceito de Endzweck, (VG, p. 5; VG-H, p. 29) conceito este de uma determinação enquanto objetivo final.

Diferentemente de Kojève e de Weil, Bourgeois (2004, pp. 191ss.) reconhece os dois sentidos do presente em Hegel, ao mesmo tempo em que não desconsidera a questão do Endzweck, contudo o faz sob um conceito nebuloso de “imagem móvel da eternidade”. Considerando mais claramente o conceito hegeliano do tempo, pode-se notar o tempo natural, finito, e a eternidade, a intemporalidade absoluta:

A intemporalidade absoluta é diferente da duração; é a eternidade que é sem o tempo natural. Mas o próprio tempo é, em seu conceito, eterno; pois ele, não qualquer tempo, nem [o] agora, mas o tempo-enquanto-tempo, é seu conceito; este mesmo porém, como cada conceito em geral, [é] o eterno, por isso também [é] presente absoluto. (Enc. II, § 258, Z, p. 56; Enz. II, § 258, Z, p. 50).

De acordo com Bourgeois ( 2004, p. 205), Hegel afirma conceitualmente em sua filosofia da história o que a religião cristã é a religião absoluta, que representava Deus em sua eternidade para si e Deus em sua eternidade encarnado no tempo. Essa encarnação do eterno no tempo é, para Bourgeois (2004, p. 205), a própria história, que se faz em duplo caráter: “de um lado como história centrada, de outro como história finita” (BOURGEOIS, 2004, p. 205).

Esse duplo caráter da história, segundo Bourgeois (2004, p. 206) significa a efetivação do tempo espiritual do eterno e também a espiritualidade do homem também como ser natural na finitude de uma história universal. Por isso que, segundo Bourgeois (2004, p. 206), a história universal assim concebida, tem um começo e um fim absolutos, que para ele é o “mundo cristão-germânico”. Contudo, se analisarmos o texto das Lições

sobre a Filosofia da História esse fim (Endzweck) é o absoluto que é liberto por meio da determinação histórica do mundo germânico pela filosofia:

Importante é compreender que o Espírito só pode se libertar na efetividade. A liberdade objetiva, as leis da liberdade efetiva exigem a submissão da vontade

contingente; pois esta é sempre formal. Quando o objetivo é racional em si, o conhecimento deve responder a essa razão, e então existe também o momento essencial da liberdade subjetiva. Nós consideramos exclusivamente esse progresso do conceito, e renunciamos ao incentivo de descrever a felicidade detalhadamente, os períodos de florescimento dos povos, a beleza e a grandeza dos indivíduos, o interesse de seu destino na dor e a alegria. A filosofia só deve se fixar no esplendor da Ideia, que se reflete na história universal. A filosofia se livra do cansaço que causam os movimentos das paixões imediatas na realidade, entregando-se à