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Pressupostos legais e as diretrizes para a criação e estru- estru-turação dos núcleos

A necessidade de institucionalização de um núcleo ou setor correspondente na educação superior, além de ser um imperativo ético, moral e de direito humano do público-alvo da educação especial, garante o acesso à educação em todos os níveis e modalidades da educação que está presente na Constituição Federal do Brasil (BRASIL, 1988). Soma-se a isso um conjunto de legislações e documentos diretivos que funciona como determina‐

ções jurídicas a serem cumpridas com prazos especificados.

A exigência de que os cursos de graduação contemplassem nos currículos a formação do‐

cente e de outros profissionais que atuam diretamente com o público com deficiência e superdotação aparece na Portaria n.º 1.793, de dezembro 1994 (BRASIL, 1994), a qual si‐

naliza a necessidade de que os projetos pedagógicos dos cursos de graduação insiram te‐

máticas relacionadas ao trabalho e interações com pessoas com deficiência dos mais va‐

riados perfis e existência de um núcleo de acessibilidade. Assume-me assim a responsabi‐

lidade de estabelecer diálogos e orientações a respeito da presença da educação especial

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em cursos de licenciatura e de conteúdos sobre inclusão, direitos da pessoa com deficiên‐

cia e acessibilidade em cursos de bacharelado.

Outro documento publicado em 1996, no formato de Aviso Circular n.º 277 do MEC (BRA‐

SIL, 1996a), delega às universidades a responsabilidade de promover uma política educaci‐

onal voltada para o público até então denominado de “portadores de necessidades especi‐

ais”, assim como orienta para uma “adequação estrutural das IES”.

Nesse âmbito, a ideia da transversalidade da educação especial na educação superior de‐

senvolve-se em duas linhas centrais: uma seria a contemplação de temas voltados para os direitos das pessoas com deficiência nos cursos de graduação e pós-graduação, assim como em programas e projetos de extensão e pesquisa; a segunda vertente representaria o desenvolvimento de uma política educacional na perspectiva inclusiva, além de compro‐

var como as universidades fariam transformações estruturais abrangendo as múltiplas di‐

mensões da acessibilidade: arquitetônica, física, tecnológica, programática, atitudinal, pe‐

dagógica, na comunicação e informação e instrumental.

No mesmo ano, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/LDBEN n.º 9.394/96 (BRASIL, 1996b) é aprovada dedicando um capítulo inteiro à Educação Especial, o qual for‐

nece premissas fundamentais para o desenvolvimento de sistemas de ensino inclusivos.

As universidades se inserem nesse cenário, apropriando-se de legislações voltadas para a seguridade de direitos mais amplos como a Lei n.º 10.048/2000, que versa sobre a priori‐

dade de atendimento às pessoas com deficiência, a Lei n.º 10.098/2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Mais detidamente, a Lei n.º 10.436/2002, que re‐

conhece a Língua Brasileira de Sinais-Libras (BRASIL, 2002), funciona como componentes jurídicos norteadores para a criação de núcleos de acessibilidade, definição de seu papel, campo de atuação, objetivos, linhas de ações, público-alvo, serviços em educação especial e acessibilidade na perspectiva inclusiva.

Em 2003, a Portaria do MEC n.º 3.284 (BRASIL, 2003) dispôs a respeito dos requisitos de acessibilidade de pessoas “portadoras de deficiências”, com vistas a orientar sobre pro‐

cessos de autorização e de reconhecimento de cursos e de credenciamento de instituições de educação superior. Esses condicionamentos e exigências, progressivamente, mesmo que ainda de forma tímida, determinam iniciativas das universidades públicas federais a buscar institucionalizar políticas de acessibilidade e inclusão. Os parâmetros avaliativos de padrões de acessibilidade passam a reger processos de avaliação para autorizar e re‐

conhecer cursos, assim como credenciar o funcionamento das universidades, avanço im‐

portante que provoca ações institucionalmente.

Adicionalmente, cumpre destacar que a Lei n.º 10.845, de 5 de março de 2004 (BRASIL, 2004a), instituiu o Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especiali‐

zado às Pessoas Portadoras de Deficiência. Essa lei apresenta componentes diretivos que

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impactavam a oferta de serviços em educação especial a alunos com deficiências, trans‐

torno do espectro autista e altas habilidades/superdotação, aplicáveis à educação superi‐

or e que deveriam constituir uma das diversas linhas de ação dos núcleos de acessibilidade.

Com a Lei n.º 10.861, de 14 de abril de 2004 (BRASIL, 2004b), foi instituído o Sistema Na‐

cional de Avaliação da Educação Superior - Sinaes (Regulamentado pelo Decreto n.º 9.235, de 15 de dezembro de 2017), o qual consolida critérios de acessibilidade e prestação de serviços de apoio especializados aos universitários com deficiência como um requisito de‐

cisivo nas avaliações dos cursos. A esse respeito, considera-se que há várias orientações direcionadas aos avaliadores, que terminam por funcionar como indicadores importantes de papel e linhas de ação/atuação para as equipes dos núcleos de acessibilidade. Apesar de sua finalidade estar voltada para o olhar dos avaliadores nos processos de avaliação e reconhecimento dos cursos e credenciamento das universidades, este documento, em duas diferentes versões (SINAES, 2013, 2016d), serviu de base para se pensar a atuação do NAIA/Unifesspa, desde a construção do seu projeto de criação 33 , sua implementação, estruturação e funcionamento.

Os núcleos de acessibilidade poderão fundamentar-se nos parâmetros do Sistema Nacio‐

nal de Avaliação da Educação Superior (SINAES). Apesar de não haver orientações formais voltadas para os núcleos para este uso, a experiência desenvolvida pelo NAIA/Unifesspa revela seu potencial, inclusive para que os diferentes setores das universidades, no âmbito da pesquisa, ensino e extensão, setores de infraestrutura, tecnologia da informação e co‐

municação e trabalho pedagógico docente possam compreender a importância do núcleo de acessibilidade e seu papel na coordenação do processo de construção da política de in‐

clusão e acessibilidade na universidade.

Na abordagem aqui realizada, tem-se o Decreto n.º 5.296/2004 (BRASIL, 2004), que, ao re‐

gulamentar as Leis 10.048/2000 e 10.098/2000, lança luz sobre o direito à prioridade e cri‐

térios centrais no tocante à acessibilidade que precisamos adotar como instituição públi‐

ca. Nesse caso específico, urge a necessidade de um núcleo de acessibilidade para divul‐

gar, orientar e prestar consultorias aos diferentes setores da universidade, pois sua atua‐

ção é transversal e precisa compor a estrutura institucional de uma universidade. Mas onde precisa estar situado o núcleo de acessibilidade de uma universidade? As evidências científicas têm apontado experiências de sucesso no país apontando que sua vinculação direta à reitoria mostra-se como modelo que implica melhores resultados para implemen‐

tar a política de inclusão e acessibilidade. Torna-se assim um setor de atuação transver‐

sal, de reconhecimento de referência institucional, dotado de autonomia de gestão e finan‐

ceira, com dotação orçamentária prevista nas instâncias decisórias dos conselhos superiores.

Por seu turno, o Decreto n.º 5.626/2005 (BRASIL, 2005) regulamentou a Lei n.º 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei n.º 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Isso implicou para as universidades públicas a implementação da formação de profissionais em língua de sinais, guias intérpretes, profis‐

sionais especialistas em Braille, viabilizando a comunicação e trazendo uma dimensão im‐

portante para a atuação dos núcleos de acessibilidade nas orientações aos projetos peda‐

gógicos dos cursos de graduação e também de pós-graduação, incentivando formação na área de Libras, difusão da Libras, desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias e inova‐

ção na área.

Os núcleos de acessibilidade têm um protagonismo no processo, tanto na promoção de programas e projetos de extensão que contemplem formação em Libras quanto na colabo‐

ração com pesquisas. No âmbito do ensino, orientam as unidades e subunidades das fa‐

culdades/institutos dos diferentes cursos de graduação neste sentido: a) Licenciaturas ofertarem disciplinas de Libras obrigatoriamente; b) Bacharelados ofertarem essas disci‐

plinas no formato optativo. No âmbito dos recursos humanos, orientam Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas sobre os direitos dos servidores com deficiência, política de cotas e atendimento especializado nos concursos públicos. Sobre a difusão da Libras, orientam sobre a necessidade de contratação de professores de Libras e de tradutores e intérpretes de Libras respaldada legalmente.

Em muitos aspectos, encontramos, na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Defi‐

ciência (ONU, 2006), um conjunto de direitos que nos orienta para discutirmos, institucio‐

nalmente, a condição de prioridade de atendimento às necessidades específicas das pes‐

soas com deficiência, reconhecimento de seus direitos de escolhas, convivência, educa‐

ção, inclusão social, cultural, pedagógica, articulação política, organização social e pleno gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. Para essa seguridade e di‐

vulgação deste documento legal entre outros aqui apresentados, os núcleos de acessibili‐

dade assumem um papel importante de sensibilização da comunidade universitária para reconhecer a deficiência como uma forma diversa de ser no mundo e atuar na supressão de barreiras que geram impedimentos que ferem os direitos das pessoas com deficiência.

Para tanto, é crucial pontuar a necessidade de que os núcleos de acessibilidade tenham essa autonomia de transitar com diálogos junto aos setores das universidades, ter autono‐

mia de gestão e de aplicação de recursos financeiros voltados para a política de inclusão e acessibilidade. Esse tem sido um dos temas mais demandados em contexto de debates em eventos nacionais: II Congresso Nacional de Inclusão na Educação Superior e Educa‐

ção Profissional Tecnológica 34 , I Fórum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Aces‐

sibilidade das IFES 35 e II Fórum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Acessibilida‐

de das IPESPTec 36 , nos quais foram tematizados mais diretamente as realidades, experi‐

ências e desafios das instituições de educação superior (universidades e institutos tecnológicos).

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Institucionalização, gestão e financiamento para atuação dos núcleos de acessibilidades

É possível analisar que na legislação brasileira (BRASIL, 1996, 2008, 2011), no tocante à implementação da política de educação inclusiva, as ações de materialização são mais di‐

retas na educação básica. A despeito de haver uma seguridade do direito da pessoa com deficiência à educação superior (BRASIL, 2011, 2008, 2009; ONU, 2006; BRASIL, 2005, 2004), o apoio financeiro e o desenvolvimento de iniciativas institucionais ainda se mos‐

tram restritas para institucionalização e desenvolvimento da Política de Acessibilidade e inclusão acadêmica nas Instituições Federais de Educação Superior – (IFES).

O Programa Incluir (MEC), que oferecia apoio financeiro do governo federal na forma de chamadas públicas em edital específico, lançado em 2005, perdurou nesse formato até 2011. Nesse contexto, cabe a crítica, pois poucas universidades eram contempladas. As‐

sim, configurou-se como uma política restrita e que não se estendia às universidades das diversas regiões brasileiras. Conforme descrito no Documento de Orientações Programa Incluir – Acessibilidade na Educação Superior Secadi/SESu-2013:

Nesse documento, identificam-se algumas orientações e concepções sobre o significado da inclusão da pessoa com deficiência à educação superior, requerendo a seguridade “do direito à participação na comunidade com as demais pessoas, as oportunidades de desen‐

volvimento pessoal, social e profissional, bem como não restringir sua participação em de‐

terminados ambientes e atividades com base na deficiência” (BRASIL, 2013, p. 11).

A esse respeito, Anache (2018, p. 116) esclarece:

Página 38 A partir de 2012, o MEC, por intermédio da SECADI e da SESu, passa a apoiar projetos das IFES, com aporte de recurso financeiro, diretamente, previsto na matriz orçamentá‐

ria das Instituições, com a finalidade de institucionalizar ações de política de acessibili‐

dade na educação superior, por meio dos Núcleos de Acessibilidade. (BRASIL, 2013, p.

13)

A Secretaria de Educação Continuada e Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) e a Secretaria de Ensino Superior (SESU), desde 2005, propuseram o Programa Incluir, com o objetivo de oferecer recursos financeiros que proporcionem condições de per‐

manência de estudantes com deficiência nas instituições federais de educação superi‐

or, quais sejam a adequação arquitetônica, a aquisição de recursos de tecnologia assis‐

tiva, mobiliários, material pedagógico acessível, fomentando, dessa forma, a implanta‐

ção dos núcleos de acessibilidade ou órgãos similares para assumirem, juntamente com os outros setores das instituições, ações que visem ao sucesso acadêmico desses indivíduos.

A garantia de todas as condições de acessibilidade e inclusão acadêmica dos alunos pú‐

blico-alvo da educação especial cabe às instituições de educação superior (IES) proverem recursos e serviços em todas as atividades acadêmico-científicas e administrativas. O pa‐

pel das IES é clarificado no documento do Programa Incluir (BRASIL, 2013). Nessa direção, um dos aspectos centrais para a efetividade e garantia de condições de funcionamento dos núcleos de acessibilidade refere-se à dotação orçamentária a ser executada anual‐

mente. Sobre o qual fica reiterado que

É importante compreender que, apesar de o MEC destinar, via Programa Incluir, recurso fi‐

nanceiro diretamente na matriz orçamentária das IES com a finalidade de institucionalizar as ações de política de inclusão e acessibilidade através de seus núcleos de acessibilida‐

de, este se constitui apenas parte de financiamentos que precisam ser aplicados e gesta‐

dos pelos núcleos. Desse modo, verbas dos custos gerais envolvendo financiamentos para o ensino, pesquisa e extensão deverão ser destinadas para as ações de inclusão e acessi‐

bilidade. Essa compreensão e leitura não parecem claras em muitas IES, pois um dos pro‐

blemas mais destacados em reuniões dos Fóruns Nacionais de Inclusão na Educação Su‐

perior consiste na interpretação de que o irrisório valor advindo do Programa Incluir seria suficiente para fazer funcionar os núcleos de acessibilidade. Considera-se que o papel de destaque dos núcleos institucionalmente e o conjunto complexo de ações, políticas, ativi‐

dades, disponibilização de recursos, equipamentos e serviços devem garantir condições aos alunos com deficiência, transtorno do espectro autista e superdotação no sentido de acessarem, permanecerem, desenvolverem-se academicamente, aprendendo com sucesso, a fim de que possam conquistar a conclusão de sua formação com a qualidade a que to‐

dos e todas têm direito.

Nos tempos hodiernos, a questão de destinação de recursos financeiros está imbricada na implementação do Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES, criado pelo De‐

creto n.º 7.234, de 19 de julho de 2010 (BRASIL, 2010), com a finalidade de propiciar e for‐

talecer condições para permanência de jovens na educação superior pública federal, dimi‐

nuindo os impactos das desigualdades sociais e regionais até a conclusão do curso.

E ainda, em seu Art. 3º, o PNAES deverá ser implementado de forma articulada com as ati‐

vidades de ensino, pesquisa e extensão, visando ao atendimento de estudantes regular‐

mente matriculados em cursos de graduação presencial das instituições federais de ensi‐

O financiamento das condições de acessibilidade deve integrar os custos gerais com o desenvolvimento do ensino, pesquisa e extensão. As IES devem estabelecer uma políti‐

ca de acessibilidade voltada à inclusão das pessoas com deficiência, contemplando a acessibilidade no plano de desenvolvimento da instituição; no planejamento e execução orçamentária; no planejamento e composição do quadro de profissionais; nos projetos pedagógicos dos cursos; nas condições de infraestrutura arquitetônica; nos serviços de atendimento ao público; no sítio eletrônico e demais publicações; no acervo pedagógi‐

co e cultural; e na disponibilização de materiais pedagógicos e recursos acessíveis.

(BRASIL, 2013, p. 12-13, grifos meus)

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no superior por meio da promoção de ações que lhes prestem assistência em várias áreas, a saber:

Considerando que pobreza e deficiência têm uma relação intrínseca, conforme dados da ONU, entre as pessoas mais pobres do mundo 20% têm algum tipo de deficiência 37 , as‐

sim como informado na “Agenda 2030 para Desenvolvimento Sustentável” 38 , a qual reite‐

ra dados sobre índice de 80% da população com deficiência no mundo viverem na pobreza.

Essa realidade se replica no Brasil, especialmente em região como o Norte do país e mais detidamente em estados como o Pará, em que os dados revelam baixo IDH (Índice de De‐

senvolvimento Humano).

Depreende-se que o financiamento para garantir a permanência dos alunos com deficiên‐

cia nos cursos de graduação, em parte, é atendido pelo recurso PNAES; por outro lado, um conjunto de condições de acessibilidade e práticas inclusivas precisa ser garantido dentro do orçamento mais amplo da instituição, incluindo setores responsáveis pelo ensino, pes‐

quisa e extensão. Esse diálogo é interno e precisa ser discutido e deliberado nas instânci‐

as decisórias da instituição e se constituir uma política que integra a cultura da universida‐

de: diversa, plural e inclusiva.

Da inclusão acadêmico-científica: acesso, permanência e