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Prevenção da Violência Intrafamiliar Contra Criança e Adolescente

2- RE-VISITANDO A VIOLÊNCIA NA HISTÓRIA

2.6 V IOLÊNCIA E S AÚDE

2.6.4 Prevenção da Violência Intrafamiliar Contra Criança e Adolescente

2001, p.356). De forma ampla, a OMS (2002) apregoa que se deve prevenir a violência em nível local, nacional e mundial. Tendo repercussões expressivas sobre a saúde das vítimas, modelos de prevenção desse malefício precisam estar relacionados aos modelos de prevenção de doenças que, em geral, advém dos próprios sistemas de saúde.

Na década de 1950, Leavell & Clarck lançaram o modelo de prevenção de doenças como aquela perspectiva de intervenção no curso de determinadas situações, práticas e comportamentos que possam levar a doença ou agravos. Neste modelo há uma hierarquia de três níveis de atuação. Embora essas medidas

visassem a promoção da saúde, punham grande ênfase no aspecto utilitarista de evitar doenças e agravos.

Já nos anos 70 do último século, Marc Lalonde, ministro da saúde do Canadá, propõe novo modelo para o campo da saúde, o qual integra a biologia humana, meio ambiente, estilo de vida e organização da atenção de saúde. A inovação de tal modelo está na “idéia do protagonismo dos atores e das comunidades para atuar nos seus próprios estados de saúde e nas condições determinantes”, tendo assim, como conceito chave conceito-chave , a “promoção” em saúde (DESLANDES, 2002, p.160).

Várias conferências internacionais, como a de Ottawa em 1986, Adelaide em 1988 e Sunsval em 1991, trabalharam visando desenhar um caminho para o modelo de promoção em saúde. Esse ideário alcança o Brasil, para dar sustentação ao movimento da Reforma Sanitária, que ora germinava aqui.

Assim, apesar das proposições de Lalonde terem sido incorporadas pela OMS na década de 1980, após serem amplamente difundidas como referência para o setor, elas receberam críticas pela pequena ênfase no aspecto do entorno, entendido como a conexão dos aspectos ambiental-ecológico e sociocultural, porque, embora o indivíduo fizesse suas escolhas, escapava-lhe o controle das mesmas. Isto, principalmente com a onda neoliberal “oportunista de uma idéia de substituição da ação pública estatal por iniciativas de apoio social”, pois ao se reconhecer a violência como fenômeno complexo e multicausal, ações intersetoriais e a participação popular são exigidas. Porém, a despeito do modelo de prevenção, na realidade as autoridades ainda estão se indagando: De quem é o papel da promoção da saúde? E quem vem primeiro, a promoção de políticas públicas ou o protagonismo dos indivíduos para mobilizarem-se na direção das conquistas justas? (DESLANDES, 2002, p.160).

Pela definição de políticas saudáveis, por si só, o modelo constituiria uma “perspectiva de enfrentamento estrutural de violência” nos diferentes tipos (DESLANDES, 2002, p.162). Mas, o novo modelo, ao focar demasiadamente o estilo de vida, deixando como responsabilidade individual mudanças no meio ambiente, encobre a impotência estatal e a população fica imobilizada (DESLANDES, 2002). Dessa maneira, no nível macro ainda encontramo-nos em compasso de espera.

Em nível micro, para se prevenir violência intrafamiliar, ainda se está utilizando os três níveis de atuação de Leavell & Clarck, adaptados por Azevedo e Guerra (2001), e novamente apregoados pela OMS (2002) conforme apresentados a seguir:

a) Primária – Todas as estratégias endereçadas à população, visando reduzir a incidência ou a ocorrência de novos casos. Programas de pré-natal para reforçar o vínculo pais-filhos; em escolas para os adolescentes; campanhas pela mídia; palestras e debates.

b) Secundária – Requer identificação precoce da população de risco. Como estratégias são apontadas as visitas domiciliares para cuidados de saúde e sociais; fornecer os telefones úteis para recorrer em caso de crise e necessidade, encaminhamento especializado e creches para as crianças do grupo de risco.

c) Terciária – Dirigida aos indivíduos que já são agressores ou vítimas, para reduzir conseqüências adversas ou até a incapacidade permanente; intervenção terapêutica e esforços para organizar infra- estrutura para as vítimas (AZEVEDO e GUERRA, 2001).

No sentido de prevenir a violência de maneira geral, Zagury (1999) orienta que, ao referenciarmos a História para nossos filhos, podemos estar prevenindo a violência. Poderíamos mencionar, por exemplo, que na Antigüidade ou mesmo na Idade Média não havia quem protegesse o homem comum, lá só havia a lei do poder dos nobres. E dizer que hoje, ainda que haja problemas, os seres humanos já conquistaram o status de cidadão, resgatando seus direitos. A autora nos incita a imaginarmos o que era viver no tempo da escravidão ou da Inquisição. É evidente que falta muito para nos aproximarmos de uma sociedade justa e digna, mas já conhecemos o caminho. Ele deve ser trilhado por cada um de nós, começando pela formação de nossos filhos, apontando-lhes o caminho da ética e dotando-os de uma filosofia de esperança, de fé no mundo e no homem, educando-os para chegarem a ser verdadeiros cidadãos. Pessanha (2002) salienta a necessidade de ensinar a nossos filhos a diferença entre o poder do amor e o amor ao poder.

Para evitar que essas tragédias continuem acontecendo, os integrantes da equipe de saúde, inclusive os da Enfermagem, têm responsabilidades como cidadãos e como profissionais para com esses seres em situação peculiar de desenvolvimento. Portanto, estamos ou somos, em certa medida, todos envolvidos na prevenção deste indesejável fenômeno, a fim de amenizar o sofrimento das vítimas e possibilitar-lhes a realização de seu processo vital.

À medida que cresce o nível de complexidade das ações, por exigir atuação interdisciplinar e intersetorial articuladas, mais difícil é sua realização, pela insuficiência em número e capacitação do pessoal envolvido, realçando assim a necessidade da adoção de um referencial metodológico pela enfermeira, a fim de cuidar adequadamente a vítima.

Como hoje a atuação da enfermeira não está mais restrita apenas ao ambiente hospitalar, é pertinente o estar junto com as vítimas e famílias em todo o processo e, não mais, cuidar somente dos aspectos físicos. Este modo de agir demonstra o comprometimento do profissional com a vítima, num cuidado amoroso, em que interage, negocia e maneja a situação, contribuindo com essas crianças e adolescentes para que assumam seu papel de sujeitos que são.

Talvez já tenhamos uma poderosa ferramenta ao nosso dispor. O cientista Maturana (2001b, p.46) acredita que a produção científica relaciona-se inteiramente com o viver da vida cotidiana das pessoas, afirmando que a integração social depende de uma teoria que não negue o amor, porque depois que

acaba a loucura da destruição [...] que nós seres humanos infringimos uns aos outros, como a guerra [...] o que aflora, é sempre o amor. Portanto, a responsabilidade é sempre do cientista e não da ciência, por isso para que o afazer científico seja um afazer sério, a responsabilidade do cientista é fundamental.

O autor ainda salienta que, mais que perguntas, a humanidade precisa de uma prática de cada um de nós – prática de “ensinarmos nossos filhos a crescer no respeito por si mesmos e no respeito pelos outros... Refletindo no seu afazer, um viver amoroso e ético”.