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Primeira fase: de fevereiro de 1987 a novembro de 1992

5 A ODEBRECHT E O PROJETO CAPANDA

5.1 Primeira fase: de fevereiro de 1987 a novembro de 1992

Os acordos para a construção da hidroelétrica foram assinados em 1984, e, no início de 1985, a Odebrecht entrou efetivamente em Angola. O primeiro ano foi praticamente de negociação com o governo. Foram acertados a segurança dos trabalhadores e equipamentos, a programação e o plano de acesso ao local de construção da hidroelétrica. Era uma região em conflito. Caso acontecesse algum acidente, os custos seriam muito altos e inibiria a expatriação de trabalhadores brasileiros. Foi programada a construção de uma base entre Luanda e Capanda para eventual evasão do local da obra.

Os trabalhos tiveram início em Luanda, já que, na época, a situação político-militar em Capanda não era boa. Houve necessidade de construção de uma vila residencial na capital para acolher os expatriados e suas famílias. A empresa levou tudo relacionado à educação e saúde dos trabalhadores e suas famílias.

Ainda, nessa fase inicial, foi feito um planejamento para a redução da mão-de-obra expatriada e preparação da local. Para a Odebrecht, era conveniente o uso da mão-de-obra angolana: atendia um anseio do governo e reduzia gastos em viagens de trabalhadores expatriados e em adicionais de salários, em função da situação de guerra em Angola.

Em 1987, iniciaram-se as obras em Capanda. Começaram por ser feitas investigações geotécnicas, geológicas e serviços topográficos. No final dos anos oitenta, principiaram a ser executas as obras de infra-estrutura necessárias à acomodação do pessoal envolvido no projeto.

Era necessário instalar água canalizada, rede de esgoto, energia elétrica e criar condições para o transporte aéreo e terrestre, logística, saúde e alimentação. Foram construídos almoxarifados, galpões para equipamentos, clínica médica, escritórios, estradas pavimentadas, uma pista de pouso, vila residencial, além de uma linha de transmissão de telecomunicações. Ou seja, toda uma gama de atividades que tornam Capanda singular e difícil de executar, se comparada a empreendimentos em regiões com infra-estrutura de apoio funcionais e que não tenham vivido anos de guerra.

Ainda no final dos anos oitenta, foram iniciadas as obras civis da barragem. As obras decorreram em um ritmo acelerado, estando já bastante avançadas, quando, em finais de 1992, foram interrompidas e o canteiro de obra evacuado em função dos ataques da UNITA. Recorda-se que foi nessa época que a UNITA rejeitou o resultado das eleições e retomou a guerra.

Quando os conflitos começaram na região, estavam mais de mil pessoas no canteiro de obra e, antes de as aeronaves do exército chegarem, a evacuação era feita por um avião com apenas 100 lugares. De acordo com os entrevistados, não houve tumulto nem tentativa de entrar para a aeronave à força. Enquanto aguardavam a evacuação, as pessoas cantavam e dançavam.

Esse momento crítico também foi vivido em Luanda, onde também foram registrados conflitos. Muitos brasileiros abandonaram o país, sendo que alguns voltaram uma semana depois e outros nem saíram de Angola. Um dos técnicos brasileiros entrevistados disse ter participado dos conflitos.

“Eu por exemplo em 92, não acreditava que fosse acontecer o que aconteceu, tendo em vista que eu estava em Angola há muito tempo. Ouvia os partidos, ouvia as pessoas, conheci alguns elementos da própria UNITA e não se pensava que ia acontecer o que aconteceu. E eu tive de segurar uma arma para defender os meus interesses. Eu vivia com uma angolana. Morei 12 anos na Rua da Guiné, no Cruzeiro. Como é que eu iria embora e deixar todo mundo assim? Não podia, tinha de participar, e participei. Eu segurei uma AK. Quando estourou aquilo, foi numa sexta- feira e nós nos apercebemos no sábado. No sábado, trabalhamos normalmente e, às 16:00 horas, começaram os estrondos na cidade. Eram

tiros. Nós tínhamos um grupo na Cimangola e a coluna11 estava chegando de Capanda e eu tinha de estar na área. Saímos da área às 16:30 para distribuir o pessoal. Quando cheguei em Luanda, para entrar foi problemático. Eu fiquei algumas horas parado no Hotel Safári onde estava a maioria dos brasileiros. Como morava no Cruzeiro, eu tinha de ir para o Cruzeiro. O pessoal ficou bem preocupado. Eu saí com um jipe, ainda levei feridos para o Hospital Militar, voltei e fui para casa. Quando eu cheguei na rua, todo mundo ficou satisfeito. Na terça-feira eu fui o primeiro brasileiro a sair à rua. Saí do Cruzeiro, fui até o armazém e tirei comida para levar pro Hospital Militar, porque estava faltando comida. Tudo isso é uma história que tenho para contar” (técnico brasileiro). De 1992 a 1994, a UNITA esteve de posse de Capanda. As atividades da Odebrecht resumiram- se em manutenção de equipamentos levados para Luanda, conservação da vila residencial e da base de apóio em Luanda e substituição de documentos perdidos.

De 1994 a 1997, a UNITA já não estava em Capanda, mas o canteiro ainda estava ocupado, só que, dessa vez, por populares das redondezas e por alguns militares do exército angolano que lá haviam se abrigado. A segurança na região ainda não estava garantida pelas autoridades militares. Durante esse período, apenas foram feitas visitas ao local para verificação do estado da obra e da infra-estrutura de apoio. Foi constatado que havia sido destruído toda a infra-estrutura, isto é, alojamentos, escritórios, clínica médica, rede de transmissão de energia, rede de esgoto, de abastecimento de água, além de oficinas, máquinas, equipamentos e partes da barragem. Ou seja, praticamente todo o investimento inicial.