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3 EFICIÊNCIA

3.2 O princípio jurídico da eficiência

A influência do princípio da eficiência na atividade estatal foi um processo historicamente gradual, assim também sua positivação no ordenamento pátrio.

Mesmo antes de ser incluído no rol constitucional de princípios da administração, o princípio da eficiência já recebia atenção da Constituição Federal, elegendo a eficiência e a eficácia como quesitos a serem avaliados pelos sistemas de controle interno dos Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo35. Seu status constitucional de princípio vem somente com

35 Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle

29 a Emenda Constitucional 19/1998.

Mesmo com a crescente valoração do princípio, parte da doutrina entende que a previsão desse princípio é redundante. O raciocínio assumido é de que a eficiência não será princípio, mas tão somente decorrência da aplicação dos demais. Essa corrente doutrinária encontra respaldo nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello que diz:

(...) tal princípio não pode ser concebido (entre nós nunca é demais fazer ressalvas obvias) senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais suma suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é o dever administrativo por excelência. Finalmente, anote-se que este princípio da eficiência é uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o

princípio da ‘boa administração. 36

Sem discussão quanto à influência do princípio da boa administração do Direito italiano na cristalização do princípio da eficiência, discordamos data vênia da suposta circunscrição do princípio da legalidade. Após uma análise mais aprofundada, como se supõe a desenvolvida neste trabalho, o conceito de Eficiência sustenta a autonomia de seu princípio, sendo este, embora intimamente ligado, existente fora do âmbito da legalidade.

Recorrendo ao conceito de eficácia recém-desenvolvido, entendemos que uma administração pública eficaz será aquela que praticar atos que atinjam o seu objetivo, o interesse coletivo, que, conforme extraímos do princípio da legalidade, será o descrito em lei,

e, portanto, o referido “dever administrativo por excelência”. Seguindo o raciocínio,

entendemos que a redução do princípio da eficiência a mera consequência da legalidade se deve a unificação entre os conceitos de eficiência e eficácia, popularmente reiterada, mas cientificamente tida como equívoca.

A eficiência, como vimos, está relacionada com o meio para atingir a eficácia. Preocupada com o método mais idôneo a realização do dever administrativo por excelência, não há de se pensar em uma hipótese onde sua valorização suscitaria uma postergação do cumprimento do dever administrativo, pois sendo este seu ponto paradigmático, será sempre, por definição, em prol dele que será aplicado.

Assim, nossa construção jurídica do conceito admite que o princípio da eficiência não esteja restrito ao da legalidade, pelo contrário, dá maior alcance a este. Não será portanto decorrência, mas um instrumento para melhor aplicação do princípio da Legalidade.

II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado. (grifo nosso)

Encontramos reforço ideológico na doutrina de Hely Lopes Meirelles37:

O princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta com a legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros. (grifo nosso)

Dessa forma, o princípio da eficiência, ainda que mantenha conexões com os demais princípios, o que se mostrou comum, será um princípio autônomo e com peculiaridades próprias. Nesse sentido, concordamos com Gustavo Vettorato38:

(...) entendemos o princípio da eficiência como princípio de atuação sobre o ato discricionário de natureza semelhante aos princípios da racionalidade e moralidade (também provindos do princípio da boa administração), porém todos são aplicados diferentemente sobre o ato administrativo e, por isso, são diferentes entre si. E outro motivo a embalar-nos pela crença da sua existência como princípio específico (que também é um dever como todos os outros princípios da administração pública) é o reconhecimento de toda uma massa de doutrinadores, e, também, da própria jurisprudência que tem pronunciamentos sobre o assunto desde 195439.

A especificidade do princípio pode ser percebida melhor ao identificarmos suas implicações práticas. Sob a orientação da doutrina de Maria Sylvia Zanella Di Pietro40

, percebemos a manifestação concreta da Eficiência em dois patamares: a atuação dos agentes e a estruturação da Administração Pública, ocorrendo harmônica e concomitantemente em ambos os aspectos. É possível extrair uma feição mais concreta do princípio da eficiência ainda no texto constitucional, sobretudo após Emenda Constitucional 45, de 30 de dezembro de 2004, intimamente ligada com os mecanismos administrativos do Estado.

O rol de garantias fundamentais que já previa o acesso à justiça41, tendo como fim a proteção dos direitos individuais, passa, após a EC45/2004, a contemplar também o meio pelo qual essa proteção é obtida. A partir de então se exige especificamente42 que os processos sigam de maneira célere e, portanto, tenham uma duração razoável. Percebe-se então o reconhecimento da eficiência como parâmetro, não limitando sua atuação ao campo judicial, mas estendendo ao âmbito administrativo.

Ao abordamos outro dispositivo constitucional, o princípio da eficiência ganha

37 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34 ed. São Paulo: Malheiros. p. 98

38 VETTORATO, Gustavo. O conceito jurídico do princípio da eficiência da Administração Pública. Diferenças com os princípios do bom administrador, razoabilidade e moralidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 176, 29 dez. 2003 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4369>. Acesso em: 29 out. 2013.

39 A jurisprudência que o autor se refere é o Recurso de Mandado de Segurança no. 2201. Tribunal Pleno do STF, Rel. Min. Abner de Vasconcelos. Diário da Justiça da União de 22 de julho de 1954.

40 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 83 41 XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito;

42 LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

31 maior delineação. Ao orientar a regulação da magistratura43, a Constituição claramente valoriza o princípio da eficiência. Atuando duplamente no mesmo inciso no mesmo inciso44, tanto influenciando a atuação do agente, ao exigir uma atividade caracterizada pela presteza e produtividade45, quanto orientando a estruturação administrativa46, condicionando a promoção de juízes à observação de critérios de eficácia e eficiência, o princípio se faz influente na atividade administrativa do Estado em todos os seus âmbitos.

Dessa forma, entendemos que o princípio da eficiência é instrumental, no entanto, autônomo. Sua aplicação não se restringe ao âmbito de nenhum dos princípios, podendo e devendo ser aplicado a todos os princípios, estabelecendo guias para seu melhor cumprimento.

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