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3. EFEITOS DA DECISÃO NO MANDADO DE INJUNÇÃO

3.3 O princípio da separação dos Poderes

A separação dos poderes foi desenvolvida com o objetivo de garantir a liberdade dos indivíduos, ao mesmo tempo em que enfraquece o poder estatal. Tal medida foi necessária após a experiência do absolutismo. A divisão entre os Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo existe em constituições da maior parte dos estados democráticos no mundo moderno. Cada Estado, a partir da ideia aperfeiçoada no século XVIII por Montesquieu em “O Espírito das leis”, a desenvolveu de acordo com as situações sociais, políticas e jurídicas específicas.

A teoria da separação dos poderes, apesar de apontar para uma separação rígida entre os poderes que também foi adotada pelo sistema brasileiro, é mitigada pelo mecanismo de freios e contrapesos (checks and balances), que busca a harmonização dos poderes, possibilitando o controle recíproco e a colaboração entre os mesmos. Cada poder possui autonomia para exercer sua função, mas é controlado pelos outros poderes. Isso serve para evitar que aja excesso por qualquer um dos poderes.

A priori, no Estado Democrático de Direito, não se deve admitir que o chamado “ativismo judicial” se sobreponha ao poder do legislador democrático. Entretanto, também se deve compreender que o Poder Legislativo, por muitas vezes, se omite no desempenho de sua tarefa de elaborar normas que regulamentem determinadas situações, o que traz prejuízos aos jurisdicionados, que têm o exercício de seus direitos restringido ou inviabilizado.

É justamente nesse cenário de omissão legislativa, que prejudica direitos e garantias fundamentais, ou afeta a liberdade, a cidadania ou a soberania popular que tem cabimento o Mandado de Injunção. Portanto, mesmo a Constituição reconhecendo e assegurando a separação dos Poderes, tal princípio poderá ser atenuado sempre que a sua interpretação inflexível acarrete a violação de direitos e garantias contidos naquele mesmo diploma legal.

A decisão em sede de MI sob a teoria concretista é ativista, pois, ao estabelecer as condições que se dará a referida decisão, o Judiciário exerce a aplicação direta da constituição em situações não expressamente contempladas em seu texto e independente da manifestação do legislador ordinário, por meio da utilização de princípios constitucionais.

Para Luigi Ferrajoli, a expansão crescente da atividade judiciária é uma ocorrência comum nas democracias avançadas. Essa dilatação esta ligada à ampliação do papel do Direito como limite aos poderes públicos, decorrente da transformação da estrutura do arranjo

39 político, produzido pelo desenvolvimento contemporâneo do Estado social39. Nesse contexto, Ferrajoli afirma que:

A sujeição à lei, e antes de tudo à Constituição, transforma o juiz em garante dos direitos fundamentais, inclusive frente ao legislador, por meio da censura da invalidade das leis e dos demais atos do poder politico que possam violar aqueles direitos [...]. Não se trata [...] da sujeição somente à letra da lei qualquer que seja seu significado, mas sim da sujeição à lei válida, isto é, coerente com a Constituição.40 Na concepção de Ferrajoli41, o conceito de Democracia passa a englobar a ideia de que será o Judiciário a garantir que maiorias e minorias respeitem a Constituição:

Se a „democracia‟ for entendida [...] no sentido de onipotência da maioria e, portanto, dos poderes politico-representativos, então o fundamento da legitimidade do Poder Judiciário não será mesmo „democrático‟, tão-só „legal‟. Entretanto, se a democracia for entendida também no segundo sentido indicado – o da dimensão a que podemos chamar „constitucional‟ ou „substancial‟, relativa não a „quem‟ se encontra habilitado para decidir (a maioria, desde logo), mas sim a „o quê‟ não é lícito a qualquer maioria decidir (ou não decidir), mesmo que por unanimidade – então são justamente essas mudanças de paradigma que proporcionam um fundamento novo, „democrático‟ no segundo sentido, ao papel do juiz no Estado constitucional de Direito, não antiético, mas sim complementar ao da democracia política.

Os juízes não são eleitos e suas decisões não são legitimadas pelo voto popular, mas segundo o padrão objetivo extraído da interpretação constitucional para a solução do caso “sub judice”. A legitimidade do juiz reside nas garantias de imparcialidade da verdade, não é suficiente apenas que prevaleça a vontade da maioria, mas será necessário um mínimo ético (contramajoritário), cuja aferição ficará a cargo do Judiciário42.

Corroborando com o mesmo entendimento sobre a legitimidade do Judiciário, afirma Alexandre de Moraes43:

A jurisdição constitucional retira sua legitimidade formalmente da própria Constituição e materialmente da necessidade de proteção ao Estado de Direito e aos Direitos Fundamentais, pois as decisões dos Tribunais Constitucionais prevalecem sobre a dos representantes populares eleitos pelo voto, porque presume-se que o povo assim desejou na elaboração da Constituição, por meio do exercício do poder constituinte originário (“legitimidade formal”) e porque os Tribunais ou Cortes Constitucionais são órgãos de garantia da supremacia de seus princípios, objetivos e direitos fundamentais, resguardando, dessa forma, o Estado de Direito e preservando as ideias básicas da Constituição (“legitimidade material”).

Apesar dos ambientes mais adequadas para edição de normas serem o Legislativo e o

39 BOLDRINI, Rodrigo Pires da Cunha. Garantia de direitos e separação dos poderes. Dissertação de Mestrado. USP. 2012. Disponível em <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2134/tde-27082013- 141654/en.php>, acesso em 04.12.2017.

40 FERRAJOLI, Luigi. Democracia y garantismo: edición de Miguel Carbonell. 2.ed. Madrid: Editorial Trotta, 2010. p. 211.

41 Ibidem, p. 214-215

42 BOLDRINI, Rodrigo Pires da Cunha. Garantia de direitos e separação dos poderes. Dissertação de Mestrado. USP. 2012. Disponível em <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2134/tde-27082013- 141654/en.php>, acesso em 04.12.2017.

43 MORAES, Alexandre de. Jurisdição constitucional e tribunais constitucionais: garantia suprema da

40 Executivo, nem sempre há um desempenho adequado desses Poderes. Nesse caso, surgindo uma omissão que viole direitos, necessariamente o Judiciário será convocado a dar uma resposta condizente como ocorre nos casos do MI.

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4. OS EFEITOS DA DECISÃO EM MANDADO DE INJUNÇÃO COM O ADVENTO

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