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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO

3. REVISÃO DA LITERATURA 1 Epidemiologia

3.4 Princípios de tratamento

Os objetivos de qualquer tratamento de fratura óssea são: restaurar a função adequada, assegurando a união dos segmentos fraturados e restabelecendo a resistência pré-lesão; restaurar qualquer defeito de contorno que possa surgir como resultado de uma lesão; e impedir a infecção do sítio de fratura (MILORO et al., 2008).

A restauração da função mandibular, como parte do sistema estomatognático, deve incluir a habilidade de mastigar e falar normalmente e permitir movimentos tão amplos quanto os existentes antes do trauma. Assim, o fator mais importante para se decidir quando ou não a mandíbula requere uma intervenção cirúrgica é o estado da oclusão do paciente, que está alterado em mais de 80% das fraturas mandibulares (PIASECKI et al., 2007).

Tratar fraturas mandibulares envolve o fornecimento do meio ambiente ideal para que a regeneração óssea ocorra: adequado suprimento sanguíneo, imobilização e correto alinhamento dos segmentos fraturados. Como resultado, a maioria das fraturas requerem redução e fixação para permitir regeneração óssea primária e secundária. O tratamento pode envolver redução aberta ou fechada. (KOSHY et al., 2010).

Fraturas de ângulo mandibular são desafiadoras para os cirurgiões. Apesar dos numerosos avanços de técnicas, as fraturas de ângulo permanecem entre as fraturas mais difíceis e imprevisíveis para tratar, em comparação com as outras áreas da mandíbula. As fraturas de ângulo sofrem a maior taxa de complicações dentre todas as fraturas mandibulares (ELLIS; WALKER, 1996). Infelizmente, poucos estudos randomizados prospectivos sobre a técnica operatória em fraturas de ângulo foram realizados. Como resultado, não há geral consenso sobre o seu tratamento ideal (PEREZ; OELTJEN; THALLER, 2011).

Nos últimos quarenta anos, a fixação interna rígida com placas e parafusos tem sido usada por vários cirurgiões, tendo como vantagem de diminuir ou eliminar o BMM no período pós-operatório (ELLIS, 1999). Basicamente existem duas filosofias para usuários desse tipo de tratamento:

1) Sistema Association for Osteosynthesis / Association for the Study of Internal Fixation (AO/ASIF) e Luhr:

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Filosofia que acreditava que a fixação com placas e parafusos deve oferecer rigidez suficiente aos fragmentos, prevenindo a mobilidade inter- fragmentária durante a função muscular. Placas de grandes dimensões fixadas com parafusos bicorticais são utilizadas para se obter tal rigidez. O objetivo desses tratamentos é a união óssea primária que necessita absoluta imobilidade dos fragmentos. Os sistemas AO/ASIF são confeccionados em aço inoxidável e podem necessitar eventual remoção, enquanto o sistema LÜHR é constituído de liga vitálio- cromo-cobalto, que é mais resistente à corrosão. (LUHR, 1968; SPIESSL, 1972).

2) Sistema Champy: Foi descrito na literatura com relatos de Michelet et al. (1973), que fazia uso de pequenas placas, maleáveis e não compressivas para o tratamento de fraturas mandibulares. Estas placas eram colocadas por acesso intrabucal e fixadas com parafusos monocorticais. Como vantagens, esta técnica apresenta prevenção de incisões cutâneas, redução de lesão ao nervo facial e alveolar inferior e reduzido tempo de operação. Porém, os críticos desta técnica citam a falta de rigidez absoluta com o uso de placas pequenas e a exigência de uma dieta sem mastigação para o paciente durante a cicatrização. (BOULOUX; CHEN; THREADGILL, 2012).

A técnica de Champy (CHAMPY et al., 1978) utiliza uma miniplaca com parafusos monocorticais, colocada por meio de acesso intrabucal e posicionadas ao longo da linha oblíqua externa do ângulo mandibular (Figura 3) e promove um baixo grau de morbidade ao paciente. Champy et al. (1978) realizaram uma série de experimentos com a miniplaca delineando “linhas ideais de osteossíntese” na mandíbula, ou seja, os locais onde a colocação das placas deveria oferecer uma fixação ótima e estável. Estes locais são onde as forças mastigatórias exercem tensão na região fraturada. Determinou-se que a melhor localização da placa seria na cortical óssea vestibular na região de terceiro molar (Figura 4). Ao contrário do sistema AO/ASIF, a imobilização absoluta dos fragmentos ósseos e união primária óssea foram considerados desnecessários naquela época.

Champy et al. (1978) mostraram, como resultado de um experimento multidisciplinar associado à experiência clínica, que a

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compressão dos fragmentos não é aconselhada devido: (1) existe uma força natural de compressão ao longo da borda inferior devido às forças mastigatórias; (2) nos métodos anteriormente usados não era possível determinar a força de compressão criada entre os fragmentos, podendo esta ser excessiva e, deste modo, resultando em lise óssea; (3) o uso de compressão torna mais difícil o restabelecimento da oclusão normal; (4) é necessário o acesso extrabucal para colocação do material de fixação.

Ainda de acordo com Champy et al. (1978), a fixação monocortical é sólida o suficiente para suportar as forças exercidas pelos músculos da mastigação e concluíram, assim, que esse é o método mais simples e de maior sucesso de osteossíntese, pelos seguintes motivos: acesso cirúrgico intraoral, simples e sem cicatrizes; redução dos efeitos colaterais e necessidade de correção pós-operatória da oclusão e, principalmente desnecessária fixação intermaxilar pós-operatória, reduzindo o desconforto para o paciente.

Figura 3. Miniplaca única posicionada no

bordo superior da região de ângulo (Técnica de Champy).

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Figura 4. Linha de osteossíntese de Champy.

Fonte: GEAR et al., 2005.

A dificuldade com a utilização de uma miniplaca posicionada na borda superior da linha oblíqua tem sido o fato da variação da angulação da linha oblíqua externa, tornando o acesso e a adaptação da miniplaca mais complicados. A técnica de Gerard & D'Innocenzo (1995) descreve uma modificação usando uma broca esférica de 1.5 mm de espessura para criar uma superfície plana sobre a qual a placa é então facilmente adaptada e fixada (Figura 5).

Figura 5. Técnica descrita por Gerard & D'Innocenzo. À esquerda,

aplainamento da cortical óssea da linha oblíqua externa com uma broca esférica. À direita, a miniplaca idealmente adaptada e fixada.

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Abreu realizou uma análise prospectiva de 20 casos de fraturas mandibulares operados num hospital público terciário do interior de São Paulo no período de fevereiro de 2007 a fevereiro de 2009. Todos os pacientes foram operados pelo mesmo cirurgião através de fixação interna rígida. O autor concorda que a chave para o tratamento adequado de uma fratura de mandíbula é o estabelecimento de uma boa oclusão. Acrescenta que, atualmente, com o uso das melhores técnicas de assepsia, com o desenvolvimento de materiais e com a constante evolução das técnicas cirúrgicas, a maioria dos serviços de cirurgia crâniomaxilo-facial trata cirurgicamente as fraturas de mandíbula, embora o tratamento não cirúrgico ainda seja utilizado. Quanto mais tardiamente é realizada a osteossíntese, associada à gravidade do acidente e à condição clínica do paciente, menores são as chances do estabelecimento de uma oclusão pós-operatória ideal. O autor conclui que a fixação interna rígida como modalidade de tratamento cirúrgico para fraturas mandibulares é uma boa opção, contando que este tratamento não deve ser postergado, para evitar possíveis sequelas oclusais, infecção e retardamento da consolidação óssea (ABREU, 2011).

Em 1999, Ellis III acompanhou por 10 anos métodos de tratamento para fraturas de ângulo mandibular. Seu estudo avaliou comparativamente as seguintes técnicas: (1) redução fechada ou redução aberta intraoral com fixação não-rígida interna, (2) redução aberta extraoral e fixação interna com placas de reconstrução, (3) lag screws, (4) redução aberta intraoral e fixação interna usando duas miniplacas de compressão de 2.0 mm, (5) redução aberta intraoral e fixação interna usando miniplacas de compressão de 2.4 mm, (6) redução aberta intraoral e fixação interna usando duas miniplacas sem compressão, (7) redução aberta intraoral e fixação interna usando uma miniplaca sem compressão, e (8) redução aberta intraoral e fixação interna usando uma placa maleável sem compressão. Resultados mostraram que tanto a redução aberta extraoral com fixação interna com placas de reconstrução ou a redução aberta intraoral com fixação interna usando uma única miniplaca (técnica de Champy) relataram as menores complicações (ELLIS III, 1999; PEREZ; OELTJEN; THALLER, 2011).

Neto realizou um estudo retrospectivo de 24 pacientes com fraturas de mandíbula localizadas em corpo, ângulo e ramo operados entre 2002 e 2006 na região de Feira de Santana, no estado da Bahia. Os pacientes foram divididos em dois grupos, de acordo com a via de acesso utilizada na cirurgia: extra-oral ou intra-oral. A osteossíntese foi feita em 100% dos casos com miniplacas de titânio com parafusos

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monocorticais sem compressão. O autor concluiu que os pacientes submetidos a via de acesso intra-oral tiveram menor tempo cirúrgico, período de internação mais curto, menor custo hospitalar, não apresentaram complicações e tiveram resultado estético melhor, com ausência de cicatrizes expostas (NETO, 2008).

Em 1989, Ellis III e Carlson avaliaram os efeitos da imobilização mandibular no sistema mastigatório. Foram constatadas atrofia dos músculos da mastigação, alterações degeneratias no côndilo e diminuição da abertura bucal passiva após várias semanas de imobilização. Os autores perceberam que procedimentos de fixação que evitam esta imobilização, como a técnica de Champy, minimizam esses problemas.

Jones e Van Sickels (1988) realizaram uma revisão de literatura e constataram que um parafuso de 2 mm de diâmetro tem uma superfície de contato 7 vezes maior que a de um fio de aço de 0.5 mm comparando a superfície de contato para manter a rigidez da área fraturada sob forças mastigatórias.

Kumar et al. (2011) realizaram um estudo retrospectivo, de Julho de 2003 a Agosto de 2009, comparando o tratamento com miniplacas de fratura de ângulo mandibular de 80 pacientes usando três técnicas diferentes: acesso intraoral, extraoral e combinado intraoral e transbucal. Não houve diferença significativa nas taxas de complicações encontradas com estas técnicas. Os autores acrescentam ainda que o acesso intraoral é o método preferido atualmente para o tratamento de fraturas de ângulo devido a sua técnica mais simples e pela maior facilidade na colocação da placa na região.

Karasz et al. (1986) compararam a estabilidade de uma placa de compressão seguindo os princípios do sistema AO/ASIF colocada ao longo da borda inferior da mandíbula, com uma miniplaca seguindo os princípios de Champy et al. Os autores concluíram que uma miniplaca oferece mais resistência a forças verticais de flexão, satisfazendo, então, os requisitos clínicos para osteossíntese funcional estável. Esse estudo afirmou que o uso de uma miniplaca é biomecanicamente estável em todas as situações e superior ao uso de uma placa óssea mais rígida colocada ao longo da borda inferior da mandíbula.

3.5 Complicações

Diversas causas têm sido ligadas a ocorrências de complicações após tratamentos de fraturas mandibulares: localização das fraturas,

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complexidade da fratura, presença de dente no traço da fratura e exposição da fratura ao meio bucal. Fatores referentes aos pacientes, tais como hábitos como o tabaco, álcool e consumo abusivo de drogas, prejudicam muito a reparação das fraturas (OLSON et al., 1982).

As complicações incluem: infecção, condição respiratória deficiente, problemas neurológicos, dor, mobilidade e atraso na reparação. A complicação mais comum é a infecção, podendo até, em casos mais graves, evoluir para osteomielite e pseudoartrose (OLSON et

al., 1982).

Segundo Ellis III, as fraturas de ângulo geram as maiores frequências de complicações, que vão até 32% em relação aos outros sítios de fratura da mandíbula (ELLIS III, 1999).

Em 2002, Silva et al. afirmaram que as fraturas de ângulo mandibular estão envolvidas com o maior índice de complicações pós- cirúrgicas da região maxilofacial (Silva et al., 2002). Isso pode se dar ao fato dessas fraturas apresentarem menor contato ósseo na linha de fratura e, por consequência, problemas de vascularização na área (ELLIS III, 1999; PAZA, 2008).

Lühr (1982) relatou taxas de infecção de 5.7% de 105 casos com acesso extrabucal e de 3.2% de 255 casos com acesso intrabucal, sendo apenas 0.8% destes complicações consideradas sérias, como osteomielite e não-união.

Ardary (1989) realizou um estudo prospectivo do acompanhamento de 71 pacientes com 102 fraturas de mandíbula, tratadas por FIR com placas compressivas e parafusos. Quinze complicações foram relatadas (14,6%), sendo mais da metade (8,8%) causada por infecção. Os sinais e sintomas da infecção eram clínicos e incluiam dor, eritema, edema e secreção purulenta. De nove sítios de fratura, cinco eram localizados na região de ângulo, três no corpo e um na parassínfise.

Em 1991, Iizuka et al. realizaram um estudo clínico e radiográfico para avaliar a ocorrência de infecção após FIR como tratamento de fraturas mandibulares. Foram incluídos na pesquisa 214 pacientes com fraturas tratadas com o sistema AO/ASIF. Treze pacientes (6,1%) desenvolveram infecção pós-operatória.

Em 2007, Barry e Kearns realizaram um estudo retrospectivo para determinar a taxa de complicações em pacientes com fraturas isoladas de ângulo mandibular. Todos os pacientes presentes no estudo foram tratados com FIR sobre a borda superior da mandíbula. Seis pacientes (12%) de 50 apresentaram complicações e necessitaram da remoção dos meios de fixação. As complicações aconteceram após a

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reparação das fraturas, sendo que 4 pacientes (8%) tiveram infecção nos tecidos moles, 1 paciente (2%) teve exposição da placa e o último paciente teve fratura da placa (BARRY; KEARNS, 2007).

Baixos índices de complicações têm sido relatados na literatura para fraturas de ângulo tratadas pelos princípios de Champy. Ellis e Walker, em 1996, relataram 0% de complicações e, em 1999, Ellis III observou 2.5% de casos de complicações para esta técnica.

Cawood (1995) realizou um estudo comparativo em 50 pacientes com 86 fraturas mandibulares tratadas com miniplacas seguindo os princípios de Champy et al. (grupo experimental) e 50 pacientes com 90 fraturas tratadas com fixação intermaxilar (grupo controle), por um período de 6 semanas. A localização anatômica era similar para ambos os grupos. As complicações encontradas foram: deiscência em 12% do grupo experimental - principalmente na região posterior próxima à linha oblíqua -, contra 6% no grupo controle; má- oclusão em 5.7% no grupo experimental e 6% no grupo controle; infecção em 6% do grupo experimental contra 4% do controle; união tardia não aconteceu no grupo experimental, mas ocorreu em 6% dos casos do grupo controle. Ainda foi observado que a abertura bucal, medida interincisalmente, alcançou uma média de 42 mm, em 4 semanas, no grupo experimental, enquanto no grupo controle foi de 34 mm após 15 semanas. Também foi constatada, no grupo experimental, uma perda de peso média de 3kg na 1ª semana, seguido de um rápido ganho de peso após esse período, chegando ao peso normal dentro de 4 semanas. No grupo controle, essa perda foi de 5 kg, continuando a perda de peso por mais duas semanas, voltando ao peso normal após 11 semanas somente.

Em 1994, Tuovinen et al. analisaram 447 fraturas mandibulares isoladas tratadas por miniplacas seguindo os princípios de Champy. Foi relatada uma taxa de 3,6% de infecção pós-operatória, sendo controlada por antibioticoterapia. Maloclusão foi observada em 4,7% e corrigida com um mínimo ajuste oclusal na maioria dos casos; apenas em dois pacientes foram necessárias novas cirurgias. Foi necessária a remoção de 47 placas (8,1%) pelas seguintes complicações: fratura da placa, indicação protética, distúrbio sensorial, deiscência da ferida, desconforto e infecção.

Também em 1994, Nakamura et al. estudaram as complicações pós-operatórias de 110 pacientes com fraturas de mandíbula tratadas com o sistema de miniplaca de Champy. As miniplacas foram removidas em 91 pacientes 8 meses após a cirurgia, quando a união óssea suficiente foi obtida e boas condições dos tecidos adjacentes foram examinadas. 17

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pacientes (15,5%) apresentaram algum tipo de complicação: maloclusão (3,6%), exposição da miniplaca (3,6%), alterações sensoriais (3,6%), união óssea atrasada ou deformada (1.8%), alargamento da distãncia intergoniana (1,8%), infecção/formação de abscesso (1%). As taxas de complicação mostraram-se dentro dos limites aceitáveis, mesmo quando o tratamento foi realizado 24 horas após a lesão ter ocorrido. As condições de cura e os tecidos adjacentes não apresentaram graves problemas. Os autores concluem que, pelo menos a curto prazo de retenção, as placas de aço inoxidável parecem ser eficazes e adequadas para a osteossíntese de fraturas mandibulares.

Em 2000, Moreno et al. não encontraram diferenças na ocorrência de complicações entre as fraturas de mandíbula tratadas com fixação intermaxilar, com miniplacas e parafusos de 2.0 mm de diâmetro, com placas AO e parafusos 2.4 mm e com placas AO e parafusos 2.7 mm de diâmetro. A correlação entre a gravidade da fratura e a ocorrência de complicações é que foi estatisticamente relevante (p>0,05).

Bell e Wilson, em 2008, realizaram um estudo retrospectivo para avaliar as complicações associadas ao tratamento de fraturas de ângulo mandibular pela técnica de Champy. 24% dos pacientes necessitaram reoperação para remoção dos meios de fixação, sendo 21,3% devido à desadaptação da placa e dor.

Seemann et al., em 2010, realizaram um estudo retrospectivo referente às taxas de complicações no tratamento cruento das fraturas de ângulo mandibular por um período de 10 anos. Foram incluídos nesta pesquisa 322 pacientes com 335 fraturas de ângulo mandibular. A taxa de cirurgia de revisão foi de 6,31%, sendo que a taxa de falha na osteossíntese foi de 5,7% e a de pseudoartrose foi de 4,8%.

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