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2 SEGURANÇA PÚBLICA, PODER DE POLÍCIA E SEUS ÓRGÃOS DE

3.3 PRINCIPAIS ATIVIDADES DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

Frente ao exposto, constata-se que existe uma grande dificuldade em definir em um único conceito as organizações criminosas, e essa complicação não se exaure apenas com a definição, mas se estende também aos delitos praticados por essas organizações.

As organizações criminosas estão em constante transformação, motivadas a sempre acumularem poderes e riquezas, podendo oscilar suas ações criminosas, visando atividades mais lucrativas, procurando por vulnerabilidades no Estado e na legislação para se furtarem da persecução penal.91

91 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

Tampouco podem se limitar a apenas uma atividade criminosa, conforme explica Mendroni:

As grandes organizações criminosas não podem se dar ao luxo de depender de apenas uma atividade criminosa, pois, na eventualidade de ocorrer qualquer atuação da Polícia e da Justiça que impeça ou dificulte o seu prosseguimento imediato, ela se verá diante de uma paralisação das atividades e rompimento da obtenção de dinheiro.92

Assim como muitas vezes se faz necessário a mescla dessas atividades ilícitas com atividades de origem lícita, tendo em vista a necessidade de lavar o dinheiro proveniente dos delitos praticados. Utilizam-se de negócios lícitos para disfarçarem práticas delituosas, como por exemplo, a compra de concessionárias automotivas, a fim de receberem veículos provenientes de furtos e roubos. Também é comum usarem estabelecimentos comercias, a exemplo de bares e lojas, para prática do tráfico de drogas, bem como simular o comércio legítimo de produtos contrabandeados.93

Nas palavras do doutrinador Mendroni, vemos a importância das atividades lícitas para as organizações criminosas:

As organizações criminosas agem, cada vez mais, infiltrando-se no âmbito da economia legal. [...] porque pretendem que os seus ganhos ilícitos tenham “configuração” de legais para que possam ser livremente utilizados. [...] os ganhos ilícitos e assim considerados só têm viabilidade de reaplicação no próprio sistema criminoso, não sendo aceitos no âmbito dos negócios previstos em Lei. [...] Com a infiltração nos negócios legais, os agentes se veem livre do risco de sequestro/confisco, e ainda podem produzir a desejada riqueza “legalizada”, sem contestação das Autoridades.94

Portanto, para as organizações criminosas constituir atividades lícitas é de suma importância, pois destinam-se a lavagem do dinheiro proveniente dos delitos, bem como camuflam os reais interesses das organizações.

De acordo com os estudos de Marcelo Mendroni acerca do ciclo criminal das organizações criminosas, podemos conceber que as mesmas praticam os seus

92 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. p. 50-51.

93 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

94 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

crimes em três estruturas que se comunicam, temos os crimes principais (primeiro nível), crimes secundários (segundo nível), e crimes de terceiro nível.95

Entende-se por crimes principais aqueles destinados as atividades fins das organizações, ou seja, os delitos nos quais as organizações colhem o seu principal lucro e poder. Como exemplo temos os tráficos de entorpecentes, armas, pessoas, assim como furtos, roubos, extorsões, contrabando, descaminho, e infinitas outras transgressões.96

Quanto aos crimes secundários, tido como delitos de assistência, desfrutamos das palavras de Mendroni:

Crimes secundários servem para dar o necessário “suporte” às atividades criminosas principais. Auxiliam o sucesso daqueles crimes, ao mesmo tempo em que favorecem a perpetuação da organização. Normalmente não geram dinheiro, mas promovem a garantia da sua obtenção através da prática dos delitos “principais”, e por vezes até exigem a realização de gastos ou “investimentos”.97

Em vista disso, constatamos que embora os delitos secundários não tenham por objetivo primordial o lucro, são de grande importância para assegurar a execução e o progresso dos crimes principais.

Podemos encontrar exemplos dos delitos de segundo nível em crimes contra a administração pública como a corrupção e a concussão. Também são visíveis em delitos de ameaças, e intimidações, principalmente de vítimas e testemunhas, bem como homicídios, lesões corporais dolosas, fraudes das mais diversas origens, entre outras infinidades de delitos que cooperam com os crimes principais.98

Seguindo o raciocínio, temos por último, os crimes de terceiro nível, que são necessariamente exemplos dessa modalidade a lavagem de dinheiro, que tem por finalidade dar maior “legitimidade” as finanças oriundas das atividades ilícitas exercida pelas organizações. Como já visto, a lavagem de dinheiro é ação indispensável, visto que através das ações mescladas, constituindo negócios lícitos

95 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

96 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

97 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. p. 37.

98 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

podem dar validade aos lucros obtidos, e assim financiar as principais atividades das organizações.99

Posto isto, podemos averiguar que as atividades das organizações criminosas constituem um ciclo criminoso, para melhor compreendermos, vejamos a lição de Mendroni:

[...] as máfias são capazes de gerar uma simbiose entre as atividades criminosas – força intimidativa – ganhos ilícitos – lavagem de dinheiro – investimentos em atividades lícitas e nas próprias atividades criminosas – obtenção de poder – influência política – ganhos (aumento) lícitos e ilícitos.100

Desta forma o ciclo criminal das organizações se mantém forte, com investimentos em armas e tecnologias, obtidos através dos lucros lícitos e ilícitos.

Diante do exposto, agora passaremos a identificar e discriminar as atividades mais costumeiras entre as organizações criminosas, fazendo conexões com a realidade brasileira.

Segundo o doutrinador Mendroni, no Brasil as principais atividades exercidas são:

As formas das organizações criminosas tipicamente brasileiras são fundamentalmente especializadas em crimes contra a administração pública, tráfico ilícito de entorpecentes, quadrilhas de roubo de carros e de cargas, sequestro e lavagem de dinheito.101

O delito mais usual entre as organizações é o tráfico ilícito de entorpecentes, visto que o consumo acontece em larga escala por inúmeros usuários ao redor do mundo, tornando-se assim um negócio bastante rentável.

Segundo Prado “podemos compreender por ‘Tráfico’, de acordo com a terminologia jurídica, todos os fatos ocorridos no mercado destinados à formação de preços e distribuição de riquezas, constituindo comércio de produto ilícito”.102

99 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

100 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. p. 55.

101 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. p. 44.

102 PRADO, Karlos Lohner. O Conceito de tráfico Internacional de Armas no Brasil. Revista

Domtotal.com.br, Belo Horizonte, 22 set. 2011. Disponível em:

<http://www.domtotal.com/direito/pagina/detalhe/32321/o-conceito-de-trafico-internacional-de-armas- no-brasil>. Acesso em: 07 out. 2016.

Assim, o objeto do tráfico são produtos necessariamente de origem ilícita, sobre os quais pretende-se sua comercialização para constituição de patrimônios e riquezas.

Em nosso ordenamento jurídico, com o advento da Lei nº 11.343/2006, optou-se por uma terminologia mais atual, substituindo, pois, a expressão “substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica” pelo termo “drogas”. O artigo 1º, parágrafo único, trouxe um conceito legal de droga: “[...] Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”.103

Algumas das mais importantes organizações utilizavam o tráfico de drogas como principal atividade, exemplos como os cárteis colombianos (Cáli e Medélin), máfias russas, italianas, chinesas, nigerianas, entre outras tantas.104

Ainda sobre a imperatividade e poder do tráfico de drogas dentro das organizações criminosas, vemos os dados alarmantes apresentados por Pacheco:

[...] dentre os crimes, o de maior rentabilidade, prevalece o tráfico de drogas, chamado por muitos doutrinadores como a “vedete do crime”. A arrecadação é assombrosa, visto que as dez principais máfias do mundo, radicadas em 23 países, entre eles o Brasil, movimentam, por ano, em torno de US$ 1,5 trilhão, ou seja, duas vezes a riqueza produzida no Brasil. Com tanto lucro, o crime organizado é a oitava economia do mundo.105

A necessidade de repressão, punibilidade e proibição desta conduta, reside justamente no fato da sua prática envolver a deterioração de bens e condutas consideradas indispensáveis à vida em sociedade. Como elucida Nucci “A saúde pública, bem jurídico imaterial, mas que significa a possibilidade de várias pessoas,

103 BRASIL. Lei nº 11.343, de 23 agosto de 2006: Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas

sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em: 07 out. 2016.

104 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

105 PACHECO, Rafael. Crime Organizado: medidas de controle e infiltração policial. Curitiba: Juruá,

em número indefinido, adoecerem e, por fim, morrerem, é atingido quando há tráfico ilícito de drogas”.106

Assim podemos constatar que o tráfico de drogas é de grande rentabilidade para as organizações criminosas, sendo para algumas sua principal atividade, pela qual através dos ganhos obtidos com a comercialização dos entorpecentes, financiam e aprimoram suas ações.

Outra modalidade de crime praticado pelas organizações é o tráfico de armas. Seja adquirindo ou comercializando, o mercado ilícito de armas é de suma importância, pois é através do poder de fogo das armas que o crime organizado impõe sua vontade e intimida tanto o poder público quanto a população, que fica à mercê da criminalidade frente a impotência ocasionada pelo poder exercido através das armas.107

Em virtude da gravidade diante da constante entrada ilegal de armas em nosso país, o Brasil, através da Lei nº 10.826/2003 batizada como Estatuto do Desarmamento, trouxe uma visão mais rígida quanto as armas, e assim revogou expressamente a Lei nº 9.437/1997, incriminando condutas e aplicando medidas contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, munições, explosivos e outros materiais correlatos, além de adotar uma política de restrição para aquisição e posse de armas.108

Crimes contra o patrimônio como furtos e roubos são frequentes entre as organizações criminosas, são objetos desses delitos mercadorias como eletrônicos, joias, roupas, cigarros, visando sempre cargas com conteúdo de alto valor de mercado.109

O furto ou roubo de veículos automotores é prática bastante comum entre as organizações, visto que existe um mercado consumidor destes para “desmanches”,

106 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 5. ed. rev., atual. e

ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 356.

107 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

108 BRASIL. Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Dispõe sobre registro, posse e

comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, define crimes e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm>. Acesso em: 07 out 2016.

109 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

onde ocorre o desmantelamento dos veículos e posteriormente a comercialização de suas peças em automotivas, ou para a permuta por entorpecentes.110

No Brasil, essa prática é costumeira principalmente em cidades que fazem fronteira com outros países, como exemplo o Paraguai, onde carros brasileiros de origem delituosa são levados até a fronteira e permutados em troca dos mais variados tipos de drogas.111

É importante saliente que em decorrência da prática dessas espécies delituosas, é comum desencadear uma série de outros crimes, como receptação, crimes contra a ordem econômica e tributária. Isso ocorre pelo fato de haver muitas fraudes, e receptadores que tentam dar legalidade aos seus negócios, revendendo produtos de origem ilícita como produtos lícitos.112

Por último entre as principais atividades aqui discutidas, temos a lavagem de dinheiro, como já citado anteriormento, este delito visa dar uma maior legitimidade aos ganhos de origem ilícita percebidos pelas organizações.113

Nas palavras de Baltazar “a lavagem de dinheiro pode ser conceituada como atividade de desvinculação ou afastamento do dinheiro da sua origem ilícita para que possa ser aproveitado”.114

Em nosso ordenamento a Lei n. 9.613/1998 dispõe sobre a seguinte figura típica: “Art. 1o Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal [...].”115

110 SCHELAVIN, José Ivan. A teia do crime organizado: documentário: Força Nacional de

Segurança Pública e Operação no Rio de Janeiro; Crime Organizado: 'Poder paralelo', 'Modus operandi' e Meios de controle. São Paulo: Conceito Editorial, 2011.

111 SCHELAVIN, José Ivan. A teia do crime organizado: documentário: Força Nacional de

Segurança Pública e Operação no Rio de Janeiro; Crime Organizado: 'Poder paralelo', 'Modus operandi' e Meios de controle. São Paulo: Conceito Editorial, 2011.

112 SCHELAVIN, José Ivan. A teia do crime organizado: documentário: Força Nacional de

Segurança Pública e Operação no Rio de Janeiro; Crime Organizado: 'Poder paralelo', 'Modus operandi' e Meios de controle. São Paulo: Conceito Editorial, 2011.

113 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado; aspectos gerais e mecanismos legais. 5. ed.

São Paulo: Editora Atlas, 2015.

114 BALTAZAR, José Paulo Júnior. Crimes federais. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.

p. 598

115 BRASIL. Lei nº 9.613, de 03 março de 1998. Crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos

e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm>. Acesso em: 07 out. 2016.

Os doutrinadores Bitencourt e Monteiro asseveram que a lavagem de dinheiro é uma de uma série de condutas complexas dirigidas à conversão de bens e valores de origem criminosa, em ativos aparentemente de origem lícita, possibilitando uma ampla disponibilidade e integração no mercado econômico. Essa prática envolve inúmeras transações, a fim de ocultar a verdadeira origem dos ativos financeiros, permitindo que sejam utilizados sem comprometer os criminosos.116

Desta forma, percebemos que a lavagem de dinheiro é fundamental para as organizações, pois apenas dessa maneira podem utilizar os valores obtidos de forma ilícita, investindo em outras atividades sem comprometer os indivíduos atuantes nas organizações.

Não podemos exaurir todos os delitos realizados pelas organizações, pois qualquer atividade ilícita que venha a trazer algum proveito, pode ser objeto do crime organizado.

Sendo assim, a seguir passaremos ao último capítulo desta pesquisa, onde discutiremos acerca da constitucionalidade na atuação da Polícia Militar em procedimentos investigatórios.

116 BITENCOURT, Cezar Roberto; MONTEIRO, Luciana de Oliveira. Lavagem de dinheiro segundo

4 A DISCUSSÃO ACERCA DA ATUAÇÃO APURATÓRIA POR PARTE DA POLÍCIA MILITAR

Em relação a discussão acerca da atuação apuratória ou investigatória da Polícia Militar, não há pacificação em relação a matéria, a legislação não é expressa sobre a temática, e existe muita divergência doutrinária e jurisprudencial.

No presente capítulo passaremos a explanar elementos a favor e contra essa atuação em situações onde exista a efetiva apuração dos delitos por parte da Polícia Militar.

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