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5. EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL COLETIVA SOB A ÓTICA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

5.4 CÓDIGO-MODELO DE PROCESSOS COLETIVOS PARA A IBERO-AMÉRICA

5.4.4 Principais Inovações Propostas

A despeito de o Brasil possuir um sistema jurídico bastante avançado sobre o tema, com destaque no plano constitucional, muitos dos países de sistema jurídico comum ainda não reestruturaram suas constituições e leis para garantir a proteção efetiva aos direitos transindividuais, notadamente dos direitos individuais homogêneos, razão pela qual um Código-Modelo poderá ser fonte útil de inspiração para tais países298.

A primeira inovação proposta se trata da previsão de legitimação ativa concorrente e pluralista insculpida no artigo 3º, já consagrada no direito brasileiro (artigos 129, §1º, 103, 125, §2º, todos da Constituição Federal; artigo 5º da Lei nº 7347/85; artigo 82 da Lei nº 8078/90), que serviu de inspiração do dispositivo299.

O Código-Modelo atribui legitimidade ativa, concorrentemente, às pessoas físicas, ao Ministério Público, à Defensoria Pública, às pessoas jurídicas de direito público interno, às entidades da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica,

298 ALMEIDA. Gregório Assagra de, op. cit., p. 89. 299

e às associações legalmente constituídas há pelo menos um ano que incluam entre seus fins a defesa dos referidos direitos, dispensada a autorização assemblear.

Consoante exposto acima, as associações civis foram reconhecidas, no Código- Modelo, como legitimadas para agir em juízo em defesa dos direitos transindividuais. Devem elas, no entanto, demonstrar a sua adequada representatividade bem como a relevância da tutela coletiva.

A solução proposta pelo Código-Modelo reconhece a necessidade de serem ampliados os requisitos exigidos de tais entidades, a fim de identificar, com maior segurança, a idoneidade das organizações não governamentais como autenticas porta-vozes dos direitos de massa.

De outro lado, ao dar ao juiz da causa o poder de exercer amplo controle sobre a representatividade adequada das associações civis, sem o balizamento dessa atividade com requisitos claros e objetivos, pode-se abrir espaço para análises excessivamente subjetivas, fundadas em critérios personalíssimos do magistrado. Com isso, corre-se o risco de pronunciamentos restritivos às iniciativas das associações, e, conseqüentemente, obstativas da participação popular300.

A previsão constante do artigo 10 do Código-Modelo, segundo a qual nas ações coletivas o pedido e a causa de pedir serão interpretados extensivamente, sendo permitida a alteração do objeto do processo a qualquer tempo e grau de jurisdição, desde que de boa-fé, trata-se de inovação condizente com a principiologia do direito processual coletivo moderno, facilitando a tutela jurisdicional dos direitos individuais homogêneos.

Desta feita, verifica-se que foi feita a opção pela flexibilização. Ademais, a proposta prevê, expressamente, a quebra consensual ou não-consensual da regra de estabilização da demanda, desde que presentes três requisitos, a saber: a) boa-fé; b) ausência de prejuízo injustificado para a parte contrária; c) preservação do contraditório301.

A adoção da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova prevista no §1º do artigo 12 do Código-Modelo tem como orientação incumbir à parte que detiver maiores conhecimentos técnicos, ou informação sobre os fatos, ou maior facilidade em sua demonstração, representando a necessária mobilidade do sistema jurídico.

300 MIRRA. Álvaro Luiz Valery. Associações civis e a defesa dos interesses difusos em juízo: do direito vigente

ao direito projetado. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; WATANABE, Kazuo, op. cit., p. 129.

301 LEONEL. Ricardo de Barros. Causa de pedir e pedido nos processos coletivos: uma nova equação para a

estabilização nas demandas. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; WATANABE, Kazuo, op. cit., p. 150.

O §3º do artigo 12 prevê a possibilidade do juiz da causa, respeitado o contraditório, determinar a produção de prova de ofício, medida de suma importância para a efetividade da tutela jurisdicional coletiva sob a ótica dos direitos individuais homogêneos.

Cumpre destacar que o disposto no artigo 11 do Anteprojeto coordenado por Ada Pellegrini Grinover, a ser tratado no tópico seguinte, tem correspondência com o disposto no artigo 12 do Código-Modelo, que prevê a incumbência do ônus da prova à parte que tiver maior facilidade em sua demonstração. Porém, o diploma ora analisado vai além, ao determinar que, “se por razões de ordem econômica ou técnica, o ônus da prova não puder

ser cumprido, o juiz determinará o que for necessário para suprir a deficiência e obter elementos probatórios indispensáveis para a sentença de mérito, podendo requisitar perícias à entidade pública cujo objeto estiver ligado à matéria em debate, condenando-se o demandado sucumbente ao reembolso. Se assim mesmo a prova não puder ser obtida, o juiz poderá ordenar a realização, a cargo do Fundo de Direitos Difusos e Individuais Homogêneos”.

A possibilidade do julgamento antecipado de parte da demanda conforme previsto no artigo 13 do Código-Modelo poderá representar hipótese que corresponda às necessidades de efetividade da tutela jurisdicional coletiva302.

O artigo 15, §3º prevê que os autores da ação coletiva não adiantarão custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem serão condenados, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogados, custas e despesas processuais, o que facilita o acesso à justiça por parte dos legitimados ativos coletivos e representa avanço em relação aos artigos 18 da Lei nº 7347/85 e 87 da Lei nº 8078/90, que só fazem menção à isenção das associações no tocante as despesas definitivas.

O artigo 16 do Código-Modelo dispõe que o juiz deverá dar prioridade ao processamento da ação coletiva, nas hipóteses de manifesto interesse social manifestado pela dimensão do dano ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido. Frise-se, todavia, que toda a ação coletiva já é de interesse social, devendo, assim, ser evidenciado pela dimensão do dano ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

O Código - Modelo de Processos Coletivos introduziu importantes mudanças no que diz respeito ao regramento das sentenças condenatórias e execuções coletivas em sede de direitos individuais homogêneos. O artigo 22 prevê que a condenação poderá ser genérica, mas, no próprio § 1º dispõe que o juiz calculará o valor da indenização individual devida a

cada membro do grupo na própria ação coletiva. O § 2º dispõe que, quando o valor dos danos individuais sofridos pelos membros do grupo for uniforme, prevalentemente uniforme ou puder ser reduzido a uma fórmula matemática, a sentença coletiva indicará o valor ou a fórmula de cálculo da indenização individual303. A despeito da forte tendência doutrinária e jurisprudencial de preconizar que a tutela coletiva dos direitos individuais homogêneos deve necessariamente se dar em dois momentos, com um processo coletivo de conhecimento culminando em uma sentença genérica, e posteriores liquidações e execuções individuais, o Código-Modelo optou pelo processo coletivo, sempre que possível. Nesse caso, a execução coletiva deve ser efetivada perante o próprio juízo da ação condenatória, que será, sempre que viável, um juízo especializado.

O artigo 30 trata da litispendência, e reza que a primeira ação coletiva induz litispendência para as demais que tenham controvérsia sobre o mesmo bem jurídico, mesmo sendo diferentes o legitimado e a causa de pedir.

O artigo 31, caput trata da relação entre ação coletiva e ações individuais. A ação coletiva não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada coletiva (artigo 33) não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida a sua suspensão no prazo de 30 dias, a contar da ciência efetiva da ação coletiva.

O artigo 31, parágrafo único estatui que cabe ao demandado informar o juízo da ação individual sobre a existência de ação coletiva com o mesmo fundamento, sob pena de, não o fazendo, o autor individual beneficiar-se da coisa julgada coletiva mesmo nos casos em que a demanda individual venha a ser rejeitada, o que se afigura indubitavelmente benéfico ao particular304.

Há quem defenda que as ações para tutela de direitos individuais homogêneos poderiam, em tese, operar litispendência não apenas em relação à outra ação coletiva proposta para defesa de tais interesses, bem como para as ações individuais, propostas por cada um dos lesados para satisfação de suas especificas pretensões305.

O artigo 39 dispõe que a interpretação deve ser feita de forma aberta e flexível, compatível com a tutela dos direitos coletivos que trata e de acordo com a principiologia do direito processual coletivo.

303 MENDES. Aluisio Gonçalves de Castro. O Anteprojeto de código brasileiro de processos coletivos: visão

geral e pontos sensíveis. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; WATANABE, Kazuo, op. cit., p. 31.

304 Id. Ibid., p. 90.

305 MANCUSO. Rodolfo de Camargo. A concomitância entre ações de natureza coletiva. In: GRINOVER, Ada

Por fim, o artigo 40 dispõe sobre a preferência no julgamento das ações coletivas por magistrados especializados