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Principais princípios eleitos pelo TRIPS

5. REGIME JURÍDICO DE PROTEÇÃO

5.1. A Proteção do Segredo Industrial no Direito Internacional

5.1.2 A proteção do segredo industrial no TRIPS

5.1.2.2. Principais princípios eleitos pelo TRIPS

Selecionamos, para análise, os princípios do single undertaking, do tratamento nacional, da nação mais favorecida e da interação entre os tratados internacionais sobre a matéria objeto do TRIPS220.

Um dos princípios basilares do TRIPS, no contexto da OMC, é o do single

undertaking, que se encontra previsto no artigo 2º, incisos 2 e 3 da Ata Final da Rodada

Uruguai, ou seja, do Acordo Constitutivo da OMC221. Desse princípio, decorre a unidade do sistema de proteção instituído pelo Acordo TRIPS222, visto que em razão dele não é possível aderir parcialmente aos Acordos que compõem os Anexos 1, 2 e 3 do Acordo Constitutivo da OMC, nem são admitidas reservas com relação a esses223.

219

BASSO, Maristela; POLIDO, Fabrício; RODRIGUES JUNIOR, Edson Beas. op. cit., p. 5.

220

Para informações sobre os demais princípios eleitos pelo TRIPS, vide BASSO, Maristela. op. cit., p. 178- 188 e BARBOSA, Denis Borges. op. cit., p. 199-200.

221

O Acordo Constitutivo da Organização Mundial do Comércio – OMC foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994, que promulga a Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Multilaterais do GATT. A sigla GATT designa o General Agreement on Tariffs and Trade.

222

O TRIPS compõe o Anexo 1 C do Acordo Constitutivo da OMC.

223

BARBOSA, Denis Borges. op. cit., p. 179: “2.2 – Os acordos e os instrumentos legais conexos incluídos

nos Anexos 1, 2 e 3 (denominados a seguir de ‘Acordos Comerciais Multilaterais’) formam parte integrante do presente Acordo e obrigam a todos os Membros. 2.3 – Os acordos e os instrumentos legais conexos incluídos no Anexo 4 (denominados a seguir de ‘Acordos Comerciais Plurilaterais’) também forma parte do presente Acordo para os Membros que os tenham aceito e são obrigatórios para estes. Os Acordos Comerciais Plurilaterais não criam obrigações nem direitos para os Membros que não os tenham aceitado”.

Esse princípio também obriga a adoção, pelos países membros da OMC, do Entendimento relativo às Normas e Procedimentos sobre Solução de Controvérsias, que compõe o Anexo 2 do Acordo Constitutivo. Nesse sentido, vale a pena mencionar José Cretella Neto:

“Todos os Acordos constantes dos Anexos foram obrigatória e unanimemente adotados pelos Membros da OMC, exceto quanto aos Acordos Plurilateriais, aos quais a adesão é facultativa, inexistindo a possibilidade de recusa a submeter-se a qualquer um deles, como é próprio dos tratados multilaterais quanto aos signatários desses tratados e/ou quanto àqueles que já os ratificaram. Evoluiu-se da situação anterior, designada como “GATT à la carte” para o princípio do “single undertaking”224.

O princípio do tratamento nacional, mencionado acima para a Convenção da União de Paris, também encontra previsão no artigo 3º(1) do TRIPS225. Nas palavras de Thiago Luchesi:

“De acordo com o Artigo 3º (1) do TRIPS, cada Membro deve conceder aos nacionais dos demais Membros tratamento não menos favorável do que o outorgado a seis próprios nacionais com relação

224

CRETELLA NETO, José. op. cit., p. 76.

225

“Artigo 3

1. Cada Membro concederá aos nacionais dos demais Membros tratamento não menos favorável que o outorgado a seus próprios nacionais com relação à proteção da propriedade intelectual, salvo as exceções já previstas, respectivamente, na Convenção de Paris (1967), na Convenção de Berna (1971), na Convenção de Roma e no Tratado sobre Propriedade Intelectual em Matéria de Circuitos Integrados. No que concerne a artistas-intérpretes, produtores de fonogramas e organizações de radiodifusão, essa obrigação se aplica apenas aos direitos previstos neste Acordo. Todo Membro que faça uso das possibilidades previstas no Artigo 6 da Convenção de Berna e no parágrafo 1 (b) do Artigo 16 da Convenção de Roma fará uma notificação, de acordo com aquelas disposições, ao Conselho para TRIPS. 2. Os Membros poderão fazer uso das exceções permitidas no parágrafo 1 em relação a procedimentos judiciais e administrativos, inclusive a designação de um endereço de serviço ou a nomeação de um agente em sua área de jurisdição, somente quando tais exceções sejam necessárias para assegurar o cumprimento de leis e regulamentos que não sejam incompatíveis com as disposições deste Acordo e quando tais práticas não sejam aplicadas de maneira que poderiam constituir restrição disfarçada ao comércio”.

à proteção da propriedade intelectual. Em outras palavras, um Membro não pode discriminar a proteção dos direitos da propriedade intelectual de um outro Membro.

Vítima de muitas controvérsias no âmbito das Uniões, o termo “proteção” foi definido pelo TRIPS da seguinte maneira: a “proteção” deve incluir os assuntos relacionados a viabilidade, aquisição, extensão, manutenção e executoriedade dos direitos de propriedade intelectual”226.

O princípio da nação mais favorecida encontra-se insculpido no artigo 4º do TRIPS227. Ao tratar desse princípio, no âmbito do sistema GATT-OMC, José Cretella Neto explica que, de acordo com o princípio da nação mais favorecida, o comércio internacional deve ser conduzido e praticado em bases não discriminatórias, ou seja, as partes contratantes devem outorgar-se, reciprocamente, tratamento igualitário ao melhor tratamento outorgado a um parceiro comercial228.

Merecem destaque as observações de Maristela Basso com relação ao artigo 4º do TRIPS:

226

LUCHESI, Thiago. op. cit., p. 107-108.

227

“Artigo 4

Com relação à proteção da propriedade intelectual, toda vantagem, favorecimento, privilégio ou imunidade que um Membro conceda aos nacionais de qualquer outro país será outorgada imediata e incondicionalmente aos nacionais de todos os demais Membros. Está isenta desta obrigação toda vantagem, favorecimento, privilégio ou imunidade concedida por um Membro que:

a) resulte de acordos internacionais sobre assistência judicial ou sobre aplicação em geral da lei e não limitados em particular à proteção da propriedade intelectual;

b) tenha sido outorgada em conformidade com as disposições da Convenção de Berna (1971) ou da Convenção de Roma que autorizam a concessão tratamento em função do tratamento concedido em outro país e não do tratamento nacional;

c) seja relativa aos direitos de artistas-intérpretes, produtores de fonogramas e organizações de radiodifusão não previstos neste Acordo;

d) resultem de Acordos internacionais relativos à proteção da propriedade intelectual que tenham entrado em vigor antes da entrada em vigor do Acordo Constitutivo da OMC, desde que esses acordos sejam notificados ao Conselho para TRIPS e não constituam discriminação arbitrária ou injustificável contra os nacionais dos demais Membros”. BASSO, Maristela; POLIDO, Fabrício; RODRIGUES JUNIOR, Edson Beas. op. cit., p. 4-5.

228

“O campo de aplicação deste artigo é bastante amplo: todas as vantagens, favorecimentos, privilégios e imunidades que um Estado- Parte conceda aos nacionais de outro Estado-Parte serão automaticamente e incondicionalmente estendidas aos nacionais dos demais Estados-Partes”.

Com relação às exceções aos princípios do tratamento nacional e da nação mais favorecida, a professora esclarece, ainda, que:

“É importante observar que as obrigações decorrentes dos princípios do “tratamento nacional” e da “nação mais favorecida” (arts. 3º e 4º) “não se aplicam aos procedimentos previstos em acordos multilaterais concluídos sob os auspícios da OMPI relativos à obtenção e manutenção dos direitos da propriedade intelectual” (art. 5º229)”230.

Por fim, vale a pena mencionar o princípio da interação entre os tratados internacionais sobre a matéria, contido no artigo 2º do TRIPS, que representa o reconhecimento do valor dos documentos que antecederam o Acordo em questão.

Conforme destaca Maristela Basso, alguns autores questionam as relações entre a Convenção da União de Paris e o TRIPS. A autora adota o entendimento de que o Acordo TRIPS não propõe uma ruptura com a Convenção da União de Paris, prevalecendo as obrigações contratadas no âmbito desta sobre o TRIPS231, tendo em vista que essas

229

“Artigo 5

As obrigações contidas nos Artigos 3 e 4 não se aplicam aos procedimentos previstos em acordos multilaterais concluídos sob os auspícios da OMPI relativos à obtenção e manutenção dos direitos de propriedade intelectual”. BASSO, Maristela; POLIDO, Fabrício; RODRIGUES JUNIOR, Edson Beas. op. cit., p. 5.

230

BASSO, Maristela. op. cit., p. 181.

231

obrigações foram mantidas e reafirmadas no referido artigo 2º do TRIPS232. Nas palavras da professora:

“Os tratados não se excluem, contradizem ou disputam a primazia de regular relações jurídicas, mas se somam e completam e, na dúvida, prevalece o bom-senso233.

Ambos os documentos representam a proteção atual dos direitos de propriedade intelectual, suas relações são de interação, não de conflito, porque estamos no contexto do direito internacional de cooperação e não de coexistência, onde são comuns os conflitos entre fontes.

O TRIPS é dirigido aos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio internacional, enquanto a Convenção de Paris não tem esta pretensão234”.

.

Os princípios acima devem ser levados em consideração na aplicação do dispositivo do TRIPS que trata especificamente da proteção às informações confidenciais.

232

BASSO, Maristela. op. cit., p. 186-187.

233

A autora fundamenta seu entendimento no artigo 30 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969, transcrevendo o que segue em nota de rodapé de nº 323: “... 2 – Quando um tratado estipular que

está subordinado a um tratado anterior ou posterior ou que não deve ser considerado incompatível com esse outro tratado, as disposições deste último prevalecerão. 3 – Quando todas as partes no tratado anterior são igualmente partes no tratado posterior, sem que o tratado anterior tenha cessado de vigorar ou sem que a sua aplicação tenha sido suspensa em virtude do artigo 59, o tratado anterior só se aplica na medida em que suas disposições sejam compatíveis com as do tratado posterior. 4 – Quando as partes no tratado posterior não incluírem todas as partes no tratado anterior: a) nas relações entre os Estados partes nos dois tratados, aplicam-se as regras do parágrafo 3º; b) nas relações entre um Estado parte nos dois tratados e um Estado parte apenas em um desses tratados, o tratado em que os dois Estados são partes rege seus direitos e obrigações recíprocos”... Art. 59 (Extinção ou Suspensão da Execução de um Tratado em Virtude da Conclusão de Tratado Posterior”), “1 – Considera-se extinto um tratado quando todas as suas partes concluírem um tratado posterior sobre o mesmo assunto e: a) resultar do tratado posterior ou ficar estabelecido por outra forma que a intenção das partes é regular o assunto por este tratado; ou b) as disposições do tratado posterior forem de tal modo incompatíveis com as do tratado anterior que os dois tratados não possam ser aplicados ao mesmo tempo. 2 – A execução do tratado anterior é considerada apenas suspensa quando se depreender do tratado posterior ou estiver estabelecido de outra forma que essa era a intenção das partes”. op. cit., p. 187. Vide também capítulo 3, seção 3.4

deste trabalho.

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