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Problemas acerca da cautelaridade da medida de prisão preventiva

Como citado anteriormente, a prisão preventiva apresenta elementos de cautelaridade nos quais deve estar pautada: conveniência da instrução penal,

Observa-se que em Recife, Belém e São Paulo, mais de 35% das prisões provisórias duram mais de 100 dias [...]. No Distrito Federal e em Porto Alegre, o excesso de prazo também ocorre, mas com menor freqüência (7,72% e 8,47%, respectivamente). (BARRETO, 2007, p.57).

garantia da aplicação da lei penal e garantia da ordem pública45. Os dois primeiros

elementos citados podem ser considerados menos problemáticos em sua aplicação: no caso da decretação da prisão preventiva por conveniência da instrução penal, a justificativa de sua cautelaridade pode estar pautada nas ações do réu de tentativa ou de destruição de provas, na tentativa ou suborno de testemunhas, peritos ou funcionários da justiça, bem como ameaças ou violências contra testemunhas, a funcionários da justiça, etc. Quando a decretação da medida é motivada para a garantia da aplicação da lei penal, a cautelaridade pode ser justificada pelo perigo de fuga do réu, de modo que a pena que eventualmente possa ser imposta terá a impossibilidade de ser cumprida.

No que tange ao fundamento de garantia da ordem pública, o entendimento majoritário do Supremo Tribunal Federal, em que pese a contrariedade de alguns de seus integrantes, é o de que a decretação da prisão preventiva baseada neste elemento é justificada quando há a necessidade de que a integridade física ou mesmo psíquica do réu ou de terceiros sejam resguardadas; quando se tem o objetivo de que sejam impedidas novas práticas criminosas por parte do réu, desde que ―lastreado em elementos concretos expostos fundamentalmente no decreto da custódia cautelar‖; e para que seja assegurada a credibilidade das instituições públicas, especialmente a do poder judiciário (AZEVEDO, A., 2008, p. 73-75).

Os argumentos acima citados podem ser considerados problemáticos na medida das polêmicas que podem levantar. Neste sentido, pode-se dizer que, encarcerar o réu com o intuito de que seja protegida sua integridade física ou psíquica torna-se um argumento irracional, uma vez que as condições do local onde o réu possivelmente cumprirá a medida são, por si só, uma ameaça; além de que, para que o réu receba proteção contra a violência de outrem, as autoridades competentes deveriam agir, sendo que esta ação não é realizada, necessariamente, pela prisão preventiva.

45 No artigo 312 do Código de Processo Penal e no artigo 30 da Lei 7.492/86, são verificados cinco

elementos de cautelaridade: conveniência da instrução penal, garantia da aplicação da lei penal, garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica e magnitude da lesão causada nos crimes contra o sistema financeiro nacional. O fato de crimes de ordem econômica serem de responsabilidade da justiça federal justifica o não aprofundamento a respeito dos últimos dois elementos de cautelaridade citados pelo autor. In: AZEVEDO, André Gomma de. Propostas para um estudo das prisões preventivas extraprocedimentais. In: SILVA, Marcelo Cardozo da. Prisão em

Flagrante e Prisão Preventiva. Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4° Região:

O segundo argumento também pode ser observado como problemático, sendo explicitado o contrário por membros do próprio STF (Min. Gilmar Mendes, Min. Cármen Lúcia, Min. Joaquim Barbosa, Min. Eros Grau, dentre outros): a gravidade do crime praticado, bem como os antecedentes do réu não podem ser considerados suficientes para justificar, por si sós, a prisão preventiva do mesmo (AZEVEDO,A., 2008, p.77).

Cabe citar ainda que, mesmo que a crescente demanda social punitiva pressione de forma significativa o poder judiciário, muitos ministros do STF (aqueles anteriormente citados, dentre outros) entendem que o clamor público e o abalo social provocados pelo delito não podem ser transformados em justificativa para que alguém seja preso cautelarmente; o estado de comoção social e indignação popular, motivados pela prática do delito, não podem legitimar a decretação da medida cautelar de prisão preventiva (AZEVEDO, A., 2008, p.78).

Deste modo, pode-se concluir que o STF caminha na direção da real garantia dos direitos individuais, bem como da sua manutenção. O pensamento garantista passa a nortear suas decisões no sentido de que sejam dadas justificativas racionais para a decretação ou manutenção de prisões cautelares, fato que começa a por em xeque o argumento referente à questão da manutenção da ordem social.

Ainda assim, deve-se lembrar que a presente dissertação trata da questão da prisão preventiva no âmbito estadual, ou seja, dos delitos que são julgados pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mais especificamente na comarca de Porto Alegre. Desta forma, é necessário observar que as decisões judiciais realizadas por este tribunal podem não ir necessariamente ao encontro do entendimento do STF.

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A prisão preventiva no sistema judiciário do Rio

Grande do Sul nos anos de 2005 e 2006: análise do

discurso utilizado pelas oito câmaras criminais do TJ/RS

nos julgamentos de pedidos de habeas corpus na comarca

de Porto Alegre.

O quarto capítulo desta dissertação pretende apresentar alguns dados oficiais sobre o sistema penitenciário do Rio Grande do Sul, disponibilizados pelo Departamento Penitenciário Nacional, explicitar como se dá o funcionamento dos grupos e câmaras criminais do Tribunal do estado e, finalmente, demonstrar como foi realizada a pesquisa, bem como os resultados por ela obtidos.

O capítulo está dividido em três partes. A primeira parte busca trazer dados sobre a realidade da prisão preventiva no estado do Rio Grande do Sul durante os anos de 2005, 2006 e 2007. É demonstrada a grande variação no número de presos cumprindo a medida nos três anos verificados, assim como a mudança na quantidade de presos preventivos de acordo com tipo criminal entre 2006 e 2007.

A segunda parte demonstra como foi realizada a pesquisa, desde a busca textual no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, até sua operacionalização. Nesta parte também são trazidas informações sobre como ocorre o funcionamento dos grupos e câmaras criminais, suas funções e responsabilidades, além de mostrar alguns resultados da pesquisa realizada.

Finalmente, a terceira e última parte do capítulo demonstra a tentativa de analisar, através de conceitos de Pierre Bourdieu e Niklas Luhmann, anteriormente explicitados, o discurso utilizado pelos desembargadores das Câmaras Criminais do TJ/RS no julgamento de pedidos de habeas corpus.

4.1 Os dados oficiais: dificuldade para encontrar um diagnóstico