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4.4 ENTREVISTAS COM MORADORES DA REGIÃO

4.4.1 PROBLEMAS AMBIENTAIS DA REGIÃO

A questão levantada aos moradores dos bairros industriais da antiga Enseada de São Lourenço obteve a formulação de críticas à poluição da região. Houve unanimidade no apontamento da degradação das águas como um grave obstáculo ambiental. Menos mencionadas, mas ainda assim lembradas na maioria dos relatos, surgiram apontamentos para a poluição atmosférica e para a poluição sonora. Os entrevistados fizeram alusão direta à indústria naval durante a identificação dos desafios sugeridos.

a) POLUIÇÃO DAS ÁGUAS DA BAÍA DE GUANABARA/ ASSOREAMENTO

No que tange aos problemas ambientais existentes na região, a questão da poluição das águas da Baía de Guanabara surge evidenciada na totalidade das entrevistas. O assoreamento do Canal de São Lourenço é percebido como fonte de preocupação diante da impossibilidade de navegação e prejuízo econômico à pesca artesanal exercida nos bairros. A falta de comprometimento das indústrias da região foi verificada na fala de moradores a partir da percepção da ocorrência de vazamentos de óleo, descarte de efluentes sem tratamento e abandono de embarcações às margens da Baía de Guanabara. Os efeitos deletérios apontados largamente foram os riscos à saúde da população, a contaminação da pesca – principalmente mexilhões – a degradação cênica da enseada e a inacessibilidade ao porto de atracação dos pescadores. A desvalorização imobiliária foi um desdobramento citado residualmente. Repetidamente apareceu a crítica ao poder constituído. Por diversas ocasiões, eclodiu a cobrança à figura da autoridade pública – seja no nome do prefeito, do governador estadual ou até da presidente da república – como responsável pelo descaso ambiental. Além da atividade industrial, aponta-se para o lançamento in natura de esgoto como fonte responsável para a poluição e assoreamento. A associação entre a atividade industrial e a degradação da Baía de

60 Os resultados das entrevistas serão expostos seguidos de trechos literais retirados das dezenas de depoimentos

Guanabara é identificada por moradores da região; mesmo quando há a crítica à esfera pública de poder, não se ignora o papel da indústria no caso, como pode ser exemplificado na fala de uma senhora, residente da Ilha da Conceição, entrevistada:

Presidentes [da República] vêm aqui e acham a indústria uma maravilha. É porque eles chegam de helicóptero. Não tem de aguentar essa confusão, esse lodo. Se viessem de barco não conseguiriam nem chegar. (...) Tem mais de 10 barcos abandonados bem próximos à encosta, cada barco desse libera resíduos e espalha doença. As empresas não fazem nada por anos. É mais barato deixar pra lá.

b) POLUIÇÃO SONORA

Na maioria dos casos, os moradores entrevistados manifestaram reclamações no tocante ao ambiente ruidoso dos bairros. No entanto, raras foram as queixas de barulhos oriundos do interior das fábricas. O sentido prioritário das explanações reside no trânsito da região, comumente adjetivado por “caótico”. Gritaria, arranques e freadas de veículos pesados e, principalmente, o uso indiscriminado da buzina dos automóveis foram elementos ressaltados61. Dentre os responsáveis identificados pelo transtorno aparecem novamente o poder público municipal, acusado de omissão na função de promover o ordenamento do tráfego; a falta de educação cívica dos próprios moradores; e a indústria naval, responsabilizada por atrair uma quantidade de veículos leves e pesados muito superior à capacidade das vias estreitas dos bairros. Número expressivo de relatos arrolou a incidência demasiada de buzinas à pressa dos compromissos profissionais demonstrada por veículos automotores pertencentes a representantes vinculados à indústria – sendo ônibus fretados, caminhonetes de fornecedores, carros de prestadores de serviços variados.

Tem hora que o barulho é tão grande que não dá para assistir televisão dentro de casa. São muitos carros, são ônibus, são caminhões. Todos buzinando, impacientes, com pressa de chegar ao trabalho. Tem a ver com a indústria, que bota muita carreta saindo e entrando aqui. (...) Não dá pra dormir depois do almoço, o alvoroço dessas carretas não deixa.

c) POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA

A contaminação atmosférica apareceu dividida no reconhecimento das fontes. Um grupo apontou a poluição advinda dos veículos automotores, principalmente ônibus e

61 Para constar, um dos depoentes enveredou por articular crítica dissonante ao identificar os bailes noturnos

caminhões. Neste aspecto, a indústria novamente foi percebida como parte intrínseca do problema, ao mobilizar a entrada nos bairros de frota expressiva e incompatível com a estrutura viária existente. O outro grupo concentra-se na poluição percebida como consequência direta da atividade industrial dos estaleiros, oficinas e empresas da cadeia offshore. Surgem citações a contaminantes “químicos” e “tóxicos” criadores de mal estar e de malefícios à saúde. A atividade de pintura industrial impõe-se como a principal causadora de impactos diagnosticada pelos cidadãos.

Fica ruim até de respirar. Aquela fumaçada. (...) Muito ônibus junto, sabe, a gente sente incômodo. Respira mal. (...) Tem hora que a [Rua] Mario Neves é uma fila de ônibus, soltando aquela fumaça preta (...) Ônibus velhos, bons de irem pro “ferro velho”.

O telhado de casa fica completamente empoeirado. Vem dos estaleiros e é tóxico. (...) O pior é a pintura [das embarcações]. Quando solta, aquilo fica no ar. Faz muito mal a minha saúde. (...) Fico com irritação na vista e na garganta. Meu cachorro também sofre, adoece.

A poluição atmosférica pode ser percebida, sim. Acredito que é a pior parte de se morar aqui, tão perto de produtos químicos perigosos. (...) Mesmo estando dentro de casa a pessoa pode estar sujeita aos produtos químicos, eles vem pelo ar, e contaminam mesmo.