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4.4 ENTREVISTAS COM MORADORES DA REGIÃO

4.4.2 PROBLEMAS SOCIAIS DA REGIÃO

As entrevistas discorreram a respeito de fatores os quais incidem descontentamento dos moradores no tocante à problemática social. Aqui, quatro questões foram suscitadas pela absoluta maioria dos depoimentos: mobilidade urbana, criminalidade, desemprego e carência de equipamentos de lazer e desordem do espaço público.

a) MOBILIDADE URBANA

Conforme já foi apresentado quando se abordavam as questões da poluição atmosférica e sonora, há insatisfação generalizada com as condições do tráfego de veículos nos bairros costeiros industriais. Dentre os problemas sociais enumerados, a mobilidade é, seguramente, aquele dotado de expressões mais reveladoras de exasperação, tais como “ninguém aguenta mais”, “é um martírio”, “não dá mais para viver assim”, entre outros correlatos. Os motivadores do problema amplamente reconhecidos são a prefeitura municipal, pouco atuante na tarefa de ordenar as condutas que infringem as leis e causam o agravamento da paralisia das vias – caminhões que abastecem o comércio local em horários inapropriados,

automóveis estacionados em locais proibidos e disputas por espaços entre veículos em cruzamentos sem semáforos –; a proximidade com a Ponte Rio-Niterói, fator que obstrui a saída dos bairros devido à intensidade do tráfego nas avenidas de acesso aos viadutos da BR- 101/RJ; e a indústria naval, a qual responde pela entrada diária de milhares de trabalhadores na região, pelo fretamento de dezenas de ônibus privados para seus funcionários que permanecem estacionados durante todo o dia nas ruas locais, e pela presença de veículos pesados ligados a serviços industriais que encontram dificuldades de manobrar em curvas tão estreitas. Sobre a indústria naval, atribuem muitas vezes descaso dos empreendimentos com a população, preocupados exclusivamente com a chegada e saída do seu corpo de funcionários, independente dos efeitos negativos que as soluções particulares adotadas gerem ao coletivo.

O trânsito para a Ponte [Rio-Niterói] é pesado quase o dia inteiro. Se você deixar para sair da sua casa após as 16h vai levar duas ou três horas para conseguir sair. O descaso das autoridades é total. (...) O trânsito da Ilha da Conceição é engarrafado também por causa dos estaleiros, que trazem muita gente pra trabalhar aqui. (...) O bairro é dos estaleiros, eles entopem as ruas e ainda se queixam do trânsito parado, são uns comédias.

Os estaleiros são os primeiros a reclamar do trânsito do bairro, mas não ajudam nada. Se o peão chegar no horário e os caminhões puderem entrar e descarregar a carga, está ótimo, dane-se a população que mora aqui. (...) Tem taxista que não quer buscar passageiro aqui para não perder tempo nessa lei da selva.

b) CRIMINALIDADE

Elementos atrelados à criminalidade também foram constantemente citados entre os desafios sociais vivenciados. Assaltos à mão armada, roubos de carros e invasões a residências foram os crimes unanimemente comentados. A expressão “Ilha do Medo” foi repetida por moradores na designação da Ilha da Conceição. Consensualmente, acusam o pouco efetivo policial disponível na região e a chegada de grupos criminosos nos morros dos bairros. Todavia, existe de maneira residual o descontentamento com a quebra do ethos comunitário em decorrência do fluxo de milhares de indivíduos em razão do ofício nos estabelecimentos industriais. “Forasteiros”, “gente estranha”, “de fora” foram classificações manejadas na configuração de um cenário assustador aos residentes.

Sete mil pessoas entram na Ilha [da Conceição] todos os dias por causa dos estaleiros. Antigamente era possível deixar a porta de casa destrancada, você conhecia todo mundo que andava na rua, agora não dá mais. Você não conhece os de fora.

Em um ano fui assaltada cinco vezes. Não tem hora. Pode ser a plena luz do dia. Vivemos assustados. (...) A bandidagem veio pra cá, não tem polícia mesmo. (...) Não é à toa que chamam aqui de Ilha do Medo, quando anoitece todos se trancam em suas casas.

c) DESEMPREGO

Quantidade considerável de entrevistas apontou o desemprego como um grave problema que atinge principalmente os mais jovens residentes da região. A falta de perspectivas gerada a partir da condição de desemprego foi ligada, por vezes, a outros problemas sociais, quais sejam: o alcoolismo, o consumo de drogas e a adesão à criminalidade. A observância deste problema não deixa de ser um dado curioso por se tratar de uma localidade cuja oferta de postos de trabalho é extensa, porém, pouco diversificada.

Tem muito jovem com a cabeça vazia. Que não tem trabalho, que não estuda. Fica só ‘zanzando’ pra lá e pra cá. Isso preocupa hoje e preocupará ainda mais amanhã. Qual o futuro para eles? Tem futuro para eles? Podiam criar cursos profissionalizantes, não podiam?

d) CARÊNCIA DE EQUIPAMENTOS DE LAZER

A pouca oferta de opções de entretenimento é um aspecto que encontra bastante ressonância entre os moradores. Um aspecto interessante nessa seara é a interconexão, na fala dos entrevistados, entre esse problema social e outros já explicitados, quais sejam: criminalidade, assoreamento do canal de São Lourenço e a crise de mobilidade. O acesso a opções de lazer – cinemas, teatro, centros comerciais, praias, casas noturnas, “boas academias” – são encontradas, segundo eles, nas regiões do Centro, Zona Sul e Praias Oceânicas de Niterói. O acesso a elas ficaria dificultado pelo trânsito da saída dos bairros, pelo medo da violência no retorno a casa no meio da noite e pela escassez de transportes coletivos servindo a região nos fins de semana e em horários mais avançados. A atividade pesqueira foi uma forma de lazer acessada localmente manifestada nas conversações, mas o assoreamento do canal foi apresentado como entrave para a navegabilidade.

A indústria ocupa todo o litoral do bairro, todos os cantos. Deviam ao menos cuidar do lugar. Não dá para sair de barco daqui de dentro por causa do assoreamento. Refizeram o terminal, mas o canal é puro lodo, não dá nem para usar no final de semana pra dar uma espairecida.

O espaço público “caótico” ocupa as compreensões dos depoentes a respeito dos óbices locais. Os empreendimentos navais são percebidos como sendo os principais promotores da desordem, mas não os únicos. O comércio local, a companhia de ônibus e parcela dos moradores são elencados entre os promotores do uso irregular do espaço público, incluindo arruamentos, calçadas e praças. Mais uma vez a ausência de fiscalização e de punição do Poder Público são mencionadas como fatores decisivos para a crise. Sobre o desempenho dos empreendimentos industriais, a crítica é quase absoluta, em razão do aporte de quantidade de empregados e veículos acima da capacidade suportada pelos bairros. O estacionamento de veículos, ligados a atividades de apoio da indústria offshore, à frente de garagens privadas; a ocupação irregular de calçadas, sejam com automóveis ou com a deposição de sucatas; e o desrespeito às normas de trânsito estabelecidas são os clamores regulares.

Proibiram o trânsito de carretas aqui dentro de 6h às 9h. Mas os ônibus pro [Estaleiro] Mauá continuam entrando nessas ruelas estreitas, os carros estacionam em fila dupla, sobem na calçada, fazem o que querem. Não tão nem ligando para as reclamações.

4.4.3 SATISFAÇÃO COM O NÍVEL DE RESPOSTAS DOS GRANDES